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O MOVIMENTO PENTECOSTAL

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3 DA RACIONALIDADE À MAGIA: UM NOVO ENCANTAMENTO?

3.1 O MOVIMENTO PENTECOSTAL

A diversidade que caracteriza o movimento pentecostal extrapola o próprio pentecostalismo, arraigado tanto nos movimentos carismáticos em igrejas do protestantismo histórico quanto fora do próprio protestantismo, como é o caso da Igreja Católica, o que não deixa de ser algo paradoxal, pois apesar das similaridades desta com o pentecostalismo, existe uma oposição histórica invencível,

principalmente por questões doutrinárias, com relação às demais igrejas que fazem parte desse movimento. Para analisarmos essa vertente do pentecostalismo na Igreja Católica, faz-se necessário, antes de tudo, conhecermos as raízes do próprio pentecostalismo que se tornou fenômeno mundial, dentro do cristianismo e que se impõe, na era atual, com todo vigor, cujo poder parece sobrepor-se ao das grandes tradições religiosas cristãs, principalmente por se adequar às transformações ocorridas a partir do século XX, que caracterizam a pós-modernidade.

3.1.1 Ancestralidade pentecostal

Quando falamos em ancestralidade pentecostal, pretendemos identificar aquilo que se poderia dizer suas raízes, não as de Azuza Street, mas bem antes, numa época a qual possa evidenciar as características verificadas nas várias correntes desse movimento, nos dias de hoje. A crença nos dons carismáticos, tais como: profecias, línguas estranhas (glossolalia), curas, milagres, revelação etc remonta ao início do cristianismo, cujos dons espirituais são mencionados no Novo Testamento, no capítulo dois do livro dos Atos dos Apóstolos, sobre a descida do Espírito Santo. Esse acontecimento é basilar para a fé dos cristãos pentecostais e carismáticos católicos, pois assim como aconteceu naquele dia, eles também se batizam no Espírito Santo, oram em línguas e também creem na cura divina. Toda essa prática pretende ser uma repetição do que aconteceu no dia de Pentecostes.

A passagem de Atos dos Apóstolos é reforçada por aquela descrita na carta de Paulo aos Coríntios (1 Cor 12, 1-31), em resposta a questões levantadas pela comunidade, a respeito de fenômenos espirituais que estariam ocorrendo ali, o que dá ainda mais plausibilidade àquele acontecimento primevo da fé cristã. No entanto, a compreensão de tal passagem é revestida de uma roupagem completamente nova nos tempos atuais, que embora conserve os mesmos elementos (dons carismáticos), os fins a serem alcançados, são de motivação, antes de tudo, centradas neste mundo, assim como o era toda ação religiosa ou magicamente motivada, descrita por Weber, em sua Sociologia da Religião. Esses fenômenos espirituais envolvendo o falar em línguas estranhas consistiam em certas manifestações espetaculares entusiásticas, um arrebatamento cuja inspiração crida como divina, levava aquela comunidade a tomar fervorosamente a palavra de Deus,

exortando os outros, seja por meio do próprio idioma (profecia) ou de idiomas desconhecidos (glossolalia) (TEB, 1994, p. 2230)14.

Sempre movidos por um acentuado entusiasmo religioso envolvendo “expectativas apocalípticas e com as experiências sobrenaturais ligadas às mesmas, tais como revelações, visões e profecias” (MATOS, 2005, p. 123), a questão sobre movimentos ligados a manifestações e experiências referentes ao Espírito e que causaram tantas controvérsias nos primeiros séculos da Igreja, se constituem um fio condutor que perpassou toda a história do cristianismo (HAHN, 2003, p. 42), até chegar aos dias atuais, caracterizando fortemente movimentos como o pentecostalismo, neopentecostalismo e a Renovação Carismática Católica, dando- lhes uma tonalidade mágica, na perspectiva weberiana.

3.1.2 O espírito sobra onde quer: o começo de uma nova fase do protestantismo

No princípio fundante do Pentecostalismo, duas raízes (uma branca e uma negra) se entrelaçam, dois nomes se destacam, duas mentes opostas culturalmente se imbricam numa experiência que culminou num novo modelo de cristianismo, marcando para sempre o mundo protestante, de uma forma jamais inimaginável desde a Reforma, cujas repercussões se faz sentir na atualidade, tanto na Igreja Católica, quanto no protestantismo histórico. De um lado, Charles Fox Parham (1873-1929) e de outro, William Joseph Seymour (1870-1922), adeptos dos ensinamentos do movimento Holiness e considerados fundadores concomitantes do movimento que na atualidade mais cresce no mundo inteiro.

Charles Fox Parham, ministro metodista, foi o primeiro a estabelecer e desenvolver a doutrina da initial evidence, em que reconhece a glossolalia como sinal comprobatório para o batismo com o Espírito Santo. Em 1900, motivado por conhecer em profundidade um fator constante, um denominador comum, enfim, aquilo que distinguia os cristãos do primeiro século dos cristãos de sua igreja, Parham funda uma escola bíblica, em Tópeka, Kansas, a que denominou de Betel, onde se reunia com seus alunos para estudarem sobre o tema do batismo no Espírito Santo, sem auxílio de qualquer livro além da Bíblia, em busca de evidências ou prova bíblica que comprovasse a crença no batismo no Espírito Santo

14 Nota de Rodapé, letra “o”, em que Paulo embora valorize tais fenômenos, faz-lhe uma

(ROMEIRO, 2005, p. 31). Ao se ausentar para uma viagem, Parham deixou como tarefa a seus alunos a leitura do capítulo II, do livro de Atos dos Apóstolos, em busca de algo que evidenciasse o batismo no Espírito Santo, dado pela primeira vez. Quando retornou, encontrou todos excitados pela constatação unânime de que em cinco diferentes citações daquele livro, sobre a ministração do batismo, havia um fenômeno comum que era o de “falar em línguas”, “asseverado de forma definida, como algo que realmente ocorreu, ou então deduzido pela narrativa registrada” (SHERRILL, 2005, p. 46-47). De início, Parham mostrou-se reticente, porém, depois se convenceu de que “o falar em línguas era um dos sinais que acompanhavam o batismo do Espírito Santo” (MENDONÇA, 1990, p. 47).

O primeiro registro do “falar em línguas”, na escola de Parham, se deu na virada do ano, quando numa reunião de orações e preces, enquanto aguardava a vinda do novo século, uma de suas estudantes, Agnes N. Ozman Laberge (1870- 1937), quando em estado de êxtase, falou em línguas estranhas. Posteriormente, nas semanas e meses que se seguiram a esse acontecimento, outros alunos e o próprio Parham passaram pela mesma experiência, confirmando assim sua tese15. Após esses acontecimentos tidos por Parham como uma terceira bênção, saíram em caravanas para visitar outras regiões dos Estados Unidos (CAMPOS, 2005).

Embora possa se considerar que o Pentecostalismo tenha-se iniciado com Charles Parham, porém, o estopim desse movimento (FRESTON, 1993, p. 74) foi o afro-americano William J. Seymour, ex-aluno de Parham, testemunha ocular do acontecido em Tópeka, cinco anos antes, que em 1906, após ter sido convidado a pregar para uma pequena comunidade holiness, em Los Angeles, de onde foi expulso16, se instala num antigo templo da Igreja Metodista Africana, localizado na Azuza Strett, 312, que estava desativado, tornando-se um marco histórico para o Pentecostalismo. No dia 6 de abril de 1906, acontece a histórica experiência do falar em línguas, desta vez sob a liderança de Seymour, “quando um menino de oito anos falou em línguas, seguido de outras pessoas [iniciando-se assim], pelo menos formalmente, o movimento pentecostal” (MENDONÇA, 1990, p. 47). Esse fenômeno

15 Motivado por essas experiências, Parham funda um periódico quinzenal, denominado “Apostolic

Faith”, importante veículo de divulgação de seus ensinamentos sobre variados temas que aos poucos foram dando base doutrinária para o movimento pentecostal que se iniciava.(CAMPOS, 2005).

16 De acordo com Mendonça (1990, p. 47), Seymour baseou seu sermão em Atos 2,4, declarando que

“Deus tem uma terceira bênção, além da santificação, isto é, o batismo do Espírito Santo”, o que escandalizou a evangelista Nelly Terry, que o expulsou da Igreja.

passou a se repetir cada vez com maior frequência e em grande escala, sempre acompanhado de “manifestações de línguas, profecias e orações em voz alta que ocorriam junto com cânticos espirituais” (ROMEIRO, 2005, p. 32).

Esse grupo, liderado por Seymour, que ficou conhecido como “Missão Apostólica da Fé” (posteriormente Assembléia de Deus), caracterizado pela informalidade, por uma música alegre, por experiências de êxtase, devido principalmente ao seu crescimento vertiginoso acabou por chamar a atenção da imprensa que à época “atribuiu a experiência desse grupo a um processo de africanização da cultura americana, divulgando esse movimento nacionalmente” (SIEPIERSKI, 2001, p. 43). Assim, aos poucos, esse movimento iniciado por Parham, de pequeno que era, torna-se um gigante com William Seymour, ganhando fama e extrapolando o continente norte-americano, pois de Azuza Street, após espalhar-se por todos os EUA, rompe as fronteiras alcançando o mundo inteiro.

Embora possa haver certa dificuldade em situar em que momento surge de fato o Pentecostalismo, se com Parham, com o batismo de Agnez Osman, ou se com Seymour, com o batismo do garoto de oito anos, certo é que há algo em comum a esses dois nomes, importantes para o nascimento desse movimento, que é a centralidade do batismo do Espírito Santo e de seu sinal físico que o evidencia, o falar em línguas estranhas (glossolalia), que na atualidade, juntamente com o dom de cura, dão acentuada característica aos movimentos pentecostalistas atuais como o neopentecostalismo e a Renovação Carismática Católica.

Para o Pentecostalismo Brasileiro, sem dúvida, embora Parham e Seymour sejam considerados fundadores formais do movimento pentecostal, o nome de maior expressão é o de W. H. Durham, por ter sido o responsável pelo envio ao Brasil dos missionários Luigi Francescon, Gunnar Vingren e Daniel Berg, fundadores das duas primeiras denominações pentecostais, em nosso país: a Congregação Cristã do Brasil, que no ano de 2010 completou cem anos e a Assembléia de Deus (AD), que neste ano também completa seu centenário.

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