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A mulher e o cuidado: compreendendo criticamente sobre a naturalização do cuidado feminino

3 O CUIDADO E AS RESPONSABILIDADES FEMININAS

3.2 A mulher e o cuidado: compreendendo criticamente sobre a naturalização do cuidado feminino

Diante do que foi posto, percebemos que o mercado de trabalho para as mulheres é cheio de desvantagens, e isso torna o poder econômico desigual, resultando no fortalecimento e agrava o poder desigual na família, com várias funções dentro e fora de casa, a sobrecarga feminina não é reconhecida pelos indivíduos. Sobre isso, Passos vai afirmar: “São essas relações que demarcam um círculo vicioso

entre trabalho, família e sociedade, colocando as mulheres como reféns da divisão sociossexual do trabalho” (PASSOS, 2018, p.94).

No Brasil, com o início da política neoliberalista que impulsionou a expansão industrial, surgiram as vagas para as mulheres no mercado de trabalho, entretanto, houve redução salarial, e reformulação das carências familiares. O trabalho feminino é sempre acompanhado pela precarização e vulnerabilidade crescente nessa desigualdade sociossexuais nas relações sociais. Outro fator decisivo é o acesso aos processos educacionais, esses fazem uma seleção natural entre os indivíduos, principalmente entre as mulheres, polarizando e agravando as desigualdades entre as próprias mulheres.

Nesse contexto Passos diz:

É importante destacar como esse fenômeno da submissão e desigualdade entre as mulheres é reatualizado na realidade brasileira. Cabe recordar que nos primeiros anos da industrialização, no início do século XX, as mulheres negras (as ex -escravizadas) foram trabalhar para famílias das camadas altas, dedicando-se à prestação de serviços domésticos. Já as mulheres das camadas médias poderiam optar por serem professoras, enfermeiras etc. e as mulheres pobres direcionavam-se para as indústrias. Assim é necessário atentarmos para os processos sócio-históricos que permeiam a divisão sociossexual e racial do trabalho e reafirmam a desigualdade, a submissão e a “exploração” das mulheres em relação aos homens e em relação a elas mesmas, principalmente no caso brasileiro (PASSOS, 2018, p.102).

De um lado teremos as mulheres formadas com nível superior, e o do outro teremos mulheres trabalhando em postos tradicionalmente femininos, muitos relacionados ao cuidado, com o nível de instrução básica.

Segundo Hirata (2010) teremos dois polos entre as mulheres:

Um polo é formado por mulheres executivas, profissionais intelectuais de nível superior (médicas, advogadas, juízas, arquitetas, engenheiras, jornalistas, professoras universitárias, pesquisadoras, publicitarias); Outro polo é constituído por mulheres em setores tradicionalmente femininos: empregadas domésticas e diaristas (categorias profissionais a mais numerosa no Brasil); setor público e de saúde (auxiliares de enfermagem); educação (professoras de maternal e ensino fundamental, sobretudo); prestação de serviços; profissionais do trabalho do cuidado (HIRATA, 2010, p.2).

As mulheres se organizam para conciliar sua vida profissional com sua vida particular, mas ainda hoje o tempo dedicado para atividades domésticas pelas mulheres é superior ao dos homens. Posto isso, Hirata vai trazer quatro modelos de estrutura para essa conciliação:

Modelo Tradicional: a mulher não trabalha fora assumindo cuidados de casa e dos filhos, o homem provedor; Modelo de Conciliação: a mulher trabalha fora, mas concilia trabalho profissional e trabalho doméstico; o homem não concilia; Modelo de Parceria: mulheres e homens repartem tarefas domésticas e cuidados da família (observação: a parceria supõe igualdade); Modelo de Delegação: a mulher delega a outras mulheres o cuidado da casa, família e crianças. (por exemplo: mulheres executivas e com postos de responsabilidades só podem trabalhar se outras assegurem essa tarefa). (HIRATA, 2010b, p.2).

Nas camadas mais altas e médias é adotado o modelo de delegação, o que enfatiza a exploração feminina, e as desigualdades entre as classes e relações sociais. E através dessa mercantilização do cuidado, aos que podem pagar, ganham seu tempo com o rendimento do trabalho doméstico dispensado. O distanciamento feminino na participação da política, reforma sua submissão ao capital, o que as torna cada vez mais vulneráveis e desprotegidas por legislações trabalhistas especificas para as necessidades femininas.

A partir de pesquisas sobre trabalho e desemprego em âmbito internacional, Hirata (2009) apresenta três indicadores do trabalho precário:

Ausência de proteção social e de direitos sociais, inclusive de direitos sindicais: o trabalho informal nos países do Sul concerne a atividades realizadas sem proteção social (previdência social, aposentadoria), férias etc. O mesmo ocorre com um certo número de empregos do setor de serviço nos países no Norte (trabalhadores domésticos, faxineiras etc.); Horas reduzidas de trabalho, resultam em salários baixos e que levam frequentemente à precariedade; por exemplo, uma mulher que trabalhe em tempo parcial, mesmo tendo um contrato por tempo indeterminado, pode ser considerada com alguém que exerce um trabalho precário; Níveis baixos de qualificação: a ausência de qualificação formal e a consequente baixa renda levam, em inúmeros casos, à precariedade e ao desemprego (HIRATA, 2009, p.26).

Com a transformação do trabalho doméstico e a transformação das práticas de cuidado em mercadoria (sob a forma de care), houve um aumento na oferta de trabalho por esse serviço não cobrar uma qualificação, pelo cuidado ser relacionado a qualidades ditas femininas, como: delicadeza e carinho. Entretanto, as condições de trabalho, e a remuneração continuam precárias e subalternizadas. Em meio ao processo da política neoliberal, o Estado recua na sua responsabilidade em oferecer meios para o bem-estar do indivíduo, assim, o trabalho para reprodução social fica na responsabilidade da esfera privada.

Segundo Passos:

[...] é de suma importância avançar na identificação das múltiplas modalidades do care, sendo primordial identificar, através das políticas públicas e nas reconfigurações no padrão de reprodução, como esse fenômeno atinge as famílias e produz a privatização do cuidado, reforçando o papel das mulheres como cuidadoras. (PASSOS, 2018, p.108).

A ideologia patriarcal que orienta a sociedade atualmente, ciente da importância de procurar meios para camuflar suas imposições, busca elementos para sustenta as diferenças entre homens e mulheres. É sabido que sempre existiu essa ideia de pensar nas mulheres como sexo frágil, é aquela que não consegue trabalhar muito tempo, não consegue trabalhar em algumas coisas, enfim, e isso se modifica porque as mulheres aderem ao mercado de trabalho quase igualmente aos homens.

Atualmente, mudou-se o discurso. O que se defende, agora, é que as mulheres deixaram de ser o sexo frágil e passaram a representar o sexo forte, ou seja, a mulher maravilha, a heroína aquela que consegue fazer tudo. Veículos midiáticos vão reforçar esse novo aspecto, que já contam com músicas, comerciais publicitários, várias maneiras para legitimar isso.

A mulher retratada como heroína que consegue fazer absolutamente tudo, que faz várias coisas ao mesmo tempo porque ela é mulher. Porque é maravilhosa e no fim das contas, não se engane, o que essa ideologia está querendo sustentar é o fato de as mulheres serem exploradas, essa fantasia em forma de um falso elogio são estratégias para naturalizar as diversas jornadas femininas.

Figura 4 - Mulher Maravilha

Fonte: Bol.com

A família seria esse espaço de segurança, acolhimento e a mesmo tempo a unidade a partir da qual uma ordem moral, e social adequada se estabeleceria, o maternalismo desempenha um papel central, trata-se não apenas de valorizar as famílias, mas de situar o lugar das mulheres como mães, como um lugar especial na construção de uma ordem familiar que é a base para uma ordem social mais ampla.

É importante observar que a maternidade é uma experiência fundamental, importantíssima para muitas mulheres, e não se trata de negar a relevância da maternidade, mas de perguntar a quem serve a idealização da maternidade. O maternalismo não traz simplesmente uma valorização da maternidade, ele traz uma fusão entre mulher e maternidade que reduz a mulher a um papel e o faz de maneira idealizada. A maternidade carrega vários fatores inerentes as mulheres, como as transformações no corpo, questões psicológicas relacionadas a baixa autoestima, a maioria tem a saúde fragilizada, diversos desafios serão enfrentados pela mulher a partir do momento que se engravida.

Quando ponderamos sobre as imposições da ideologia patriarcal na vida das mulheres, vários aspectos são influenciados, desde a escolha da profissão, as relações sociais, e afetivas. Essa associação entre o feminino e a maternidade representa uma estratégia de condicionalidade cultural, e a partir disso, é preciso diferenciar o que aprendemos a desejar ou o que realmente desejamos.

Como se de um lado a natureza feminina fosse a dedicação aos filhos, fosse feita nesse impulso para a maternidade, e de outro lado como se as mulheres vivenciassem a maternidade em condições muito adequadas e cuidar bem ou não de

filhos fosse algo que pudesse ser escolhido por elas. Então, o ideal da maternidade não permite que a gente trate de fato com as condições reais do exercício da maternidade para que existam é preciso compreender como se define o caráter social e a vulnerabilidade específica de uma parte das mulheres quando se tornam mães.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Já sabemos que metade da população brasileira são mulheres, essa população está cada vez mais qualificada no mercado de trabalho. Quase 50% da força econômica ativa no Brasil são mulheres, atualmente 58% dos universitários são mulheres. Mas voltando o olhar para o mercado de trabalho, é perceptível que nas tomadas de decisões, em aspectos políticos quase não existe presença feminina.

Hoje apenas 11% das grandes empresas brasileiras são coordenadas por mulheres e ninguém ganha com esse cenário. As mulheres não conseguem exercer seu pleno potencial e as empresas também não conseguem usufruir desse talento feminino para gerar mais negócios a economia também perde. O Brasil poderia ganhar muito tendo mais mulheres na economia. Como muda então esse cenário em que tantas mulheres são qualificadas e entram no mercado de trabalho, mas não conseguem ascender nas carreiras, também não conseguem entrarem algumas áreas que são predominantemente masculinas.

É obvio que as mulheres devem ser protagonistas dessa mudança, para ser mais protagonista da sua vida, e sua carreira essa mulher tem que superar alguns obstáculos, ela precisa superar os principais estereótipos que estão nas crenças do que é certo ou adequado para uma mulher, na sua família. No mercado de trabalho nas suas relações sociais, ela precisa estabelecer uma rede de contatos que são aquelas relações profissionais que contribuem para seus objetivos e, é difícil para uma mulher fazer essa rede de contatos sendo que em boa parte dos lugares onde ela que estar as pessoas mais estratégicas com as quais ela precisa se relacionar são homens, que carregam em si toda a superioridade concedida pela sociedade patriarcal.

As mulheres têm um desafio especial para isso, por ter menos tempo também, porque enfrentam um outro obstáculo que é um desequilíbrio dos papeis dentro de casa. As mulheres dedicam quase o triplo do tempo que os homens dedicam aos cuidados dos filhos e da casa. Então, a mulher precisa também construir um relacionamento pessoal familiar mais equilibrado, feito isso ela precisa fazer algumas coisas diferentes na sua carreira, negociar mais, pedir o lhe deve não só esperar o reconhecimento e, se lançar para áreas que talvez não achasse que era seu espaço.

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