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2. A água como bem comum: aspectos socioeconômicos, legislativos e de gestão

2.1 Breve histórico das Políticas Nacional e Estadual de Recursos Hídricos

2.1.2. O papel dos municípios

Com esse arranjo, quando um município tem seu território incluído em mais de uma sub-bacia ele poderá ter direito a voto nos respectivos subcomitês de bacias. No entanto, o município que participar em mais de um subcomitê, somente poderá ser candidato a representante no CBH-AT na região de um dos subcomitês. A criação dos subcomitês representou uma estratégia para descentralizar a gestão na Bacia do Alto Tietê e, com isso, possibilitar uma maior proximidade com os problemas da região, além de agregar mais atores no processo decisório. Enquanto o plenário do CBH-AT conta um total de 54 representantes (distribuídos paritariamente entre 3 segmentos – 18 do poder público estadual, 18 do poder público municipal e 18 da sociedade civil e usuários de água), as composições dos subcomitês totalizam 144 representantes, seguindo a mesma proporção de vagas entre os três segmentos do CBH-AT. No entanto, havia dificuldade de institucionalização dos subcomitês, sobretudo pela falta de condições financeiras para montar uma estrutura operacional eficiente, uma vez que, até quase o final de 2005, não havia sido aprovada a lei estadual de cobrança pelo uso da água. Muito embora não existisse a lei paulista sobre a cobrança, em 1998, o CBH-AT iniciou o processo para criação de sua Agência de Bacia, culminando, no final de 2002, com a constituição da Fundação Agência da Bacia Hidrográfica do Alto Tietê (FABHAT).

Embora a Política Nacional não tenha previsto formas de organizações no âmbito dos municípios para o gerenciamento de recursos hídricos, eles atuam direta ou indiretamente em questões relacionadas à gestão das águas, como por exemplo drenagem e controle de inundações urbanas, gestão do uso e ocupação do solo, conservação de pequenos córregos, riachos e rios, destinação final de resíduos sólidos, tratamento de efluentes, entre outros e, sem seu apoio, não é possível integrar a gestão territorial e hídrica em âmbito de Bacia Hidrográfica. Ao compararmos a distribuição de poderes e competências em relação à gestão de recursos hídricos e a gestão do uso do solo, identifica-se uma desproporção de poderes que pode ser demonstrada pelo diagrama a seguir:

Figura 2.2- Diagrama da distribuição de competências sobre a gestão do uso e ocupação do solo e a

gestão dos recursos hídricos entre as esferas administrativas. Fonte: Adaptado de Aith;Rothbarth (2015)

Com a criação do Estatuto da Cidade em 2001, O Plano Diretor passou a ser o principal instrumento de gestão territorial e municipal, definindo os parâmetros para o cumprimento da função social, ambiental e econômica da propriedade. Neste sentido, os municípios possuem uma grande responsabilidade na proteção dos recursos hídricos. No entanto, não basta recorrer às responsabilidades e competências para esperar que os municípios participem de forma mais ativa nos colegiados do SIGRH. É necessário dispor de incentivos que despertem ou aumentem seu interesse em participar, tais como a disponibilidade de recursos financeiros para projetos que sejam de interesse municipal, de modo a trazer retornos políticos e respostas às pressões da sociedade civil organizada (GUTIÉRRES, 2010, PIZELLA, 2015)

Ao passo que as questões ambientais têm motivado a formação de novas organizações político-administrativas e da gestão territorial, os problemas metropolitanos em geral são tratados em outras instâncias, com diferentes políticas e ações de caráter público. No caso de São Paulo, todas são conduzidas pelo governo estadual imprimindo um caráter de governança específico em que a intermediação não se dá através da escala metropolitana, mas no âmbito das políticas estaduais. Com a instituição da Lei Estadual de Recursos Hídricos (Lei 7.663/91) e a formação dos Comitês e Subcomitês de Bacia, vislumbra-se um tipo de organização política voltada para a gestão das águas que transcende as delimitações político- administrativas tradicionais (Estado e município) e, assim também, é possível traçar um paralelo com as organizações regionais espontâneas, via Consórcios, cuja organização se pauta por assuntos desta escala, na ausência de qualquer outra instância intermediária. Do outro lado, questões como o ordenamento territorial e suas bases de regulação urbanística do uso e

ocupação do solo ficam a cargo dos municípios, cujos instrumentos de controle ficam, na maior parte das vezes, descolados das ações vinculadas a estas instâncias de gestão superiores. Neste sentido, é possível supor um certo descolamento das políticas e ações desenvolvidas nestas várias instâncias, exatamente pela ausência de uma governança metropolitana, nos moldes apontados por Klink (2010)1. Havendo tal descolamento, é possível supor ainda que estas várias instâncias político-administrativas, tanto as mais antigas, quanto as mais novas criadas a partir de novas agendas que passam a integrar as políticas públicas nas mais diversas escalas, não atuam de forma afinada ou coerente com determinados preceitos e princípios estabelecidos, mesmo com a formulação e implementação de planos metropolitanos desenvolvidos pela EMPLASA, reverberando em contradições e impasses que resultam nas mais diversas crises, como as crises hídricas que vêm atingindo com mais frequência os municípios do estado de São Paulo. Assim como aponta Refinetti Martins (2006), estabelecem-se impasses na competência e dificuldade na ação regulatória, gerando feitos concorrentes na gestão de bacias, de forma ainda mais complexa. No caso da bacia Juqueri-Cantareira, a quase coincidência entre a subdivisão administrativa dos municípios e a delimitação da bacia poderia ser um fator facilitador para a integração e mesmo assim há dificuldades para que o alinhamento entre as instituições para efetivar soluções para questões metropolitanas como saneamento básico, habitação de interesse social, gestão ambiental entre outras, o que pode reforçar a necessidade de uma instância política integradora. Nesse “vácuo institucional”, como definem Cardoso e Zveibil (1996), com os temas metropolitanos delegados à esfera estadual, os poderes locais acabam sendo sub-representados em processos políticos ligados a temas essenciais para o desenvolvimento local, centralizados nas esferas estaduais e federal (ROLNIK, SOMEKH, 2002)

1Para o autor, as metrópoles e regiões metropolitanas brasileiras, concentradoras do desenvolvimento econômico do País, deveriam ter emergido também como arenas políticas para negociar e estruturar políticas de desenvolvimento sustentável e de inclusão social, mas a inexistência de institucionalidades metropolitanas com um arcabouço institucional e financeiro adequado e legitimidade funcional-operacional e política levaram as regiões metropolitanas ao agravamento de seus problemas sociais e ambientais.

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