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Planejar a terra para preservar a água : a legislação e o planejamento do uso e ocupação do solo na sub-bacia Juqueri-Cantareira e as interfaces entre as políticas urbana, regional e de recursos hídricos

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo

TÂNIA RIBEIRO SOARES

PLANEJAR A TERRA PARA PRESERVAR A ÁGUA:

A LEGISLAÇÃO E O PLANEJAMENTO DO USO

E OCUPAÇÃO DO SOLO NA SUB-BACIA

JUQUERI-CANTAREIRA E AS INTERFACES ENTRE AS

POLÍTICAS URBANA, REGIONAL

E DE RECURSOS HÍDRICOS

CAMPINAS 2018

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PLANEJAR A TERRA PARA PRESERVAR A ÁGUA:

A LEGISLAÇÃO E O PLANEJAMENTO DO USO

E OCUPAÇÃO DO SOLO NA SUB-BACIA

JUQUERI-CANTAREIRA E AS INTERFACES ENTRE AS

POLÍTICAS URBANA, REGIONAL

E DE RECURSOS HÍDRICOS

Dissertação de Mestrado apresentada a Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo da Unicamp, para obtenção do título de Mestra em Arquitetura, Tecnologia e Cidade, na área de Arquitetura, Tecnologia e Cidade.

Orientador: Prof. Dr. Sidney Piochi Bernardini

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA ALUNA TÂNIA RIBEIRO SOARES E ORIENTADA PELO PROF. DR. SIDNEY PIOCHI BERNARDINI

ASSINATURA DO ORIENTADOR

CAMPINAS 2018

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Ficha catalográfica

Universidade Estadual de Campinas Biblioteca da Área de Engenharia e Arquitetura

Luciana Pietrosanto Milla - CRB 8/8129

Soares, Tânia Ribeiro,

So11p SoaPlanejar a terra para preservar a água : a legislação e o planejamento do uso e ocupação do solo na sub-bacia Juqueri-Cantareira e as interfaces entre as políticas urbana, regional e de recursos hídricos / Tânia Ribeiro Soares. – Campinas, SP : [s.n.], 2018.

SoaOrientador: Sidney Piochi Bernardini.

SoaDissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo.

Soa1. Solos. 2. Urbanização. 3. Gestão ambiental - Planejamento urbano. 4. Recursos hídricos. I. Bernardini, Sidney Piochi, 1971-. II. Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Planning the land to preserve the water : land use law and

planning in Juqueri-Cantareira Basin and the interfaces with the urban, regional and water management policies

Palavras-chave em inglês:

Soil

Urbanization

Environmental management - Urban planning Water resources

Área de concentração: Arquitetura, Tecnologia e Cidade Titulação: Mestra em Arquitetura, Tecnologia e Cidade Banca examinadora:

Sidney Piochi Bernardini [Orientador] Lauro Luiz Francisco Filho

Laura Machado de Mello Bueno

Data de defesa: 05-02-2018

Programa de Pós-Graduação: Arquitetura, Tecnologia e Cidade

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URBANISMO

PLANEJAR A TERRA PARA PRESERVAR A ÁGUA:

A LEGISLAÇÃO E O PLANEJAMENTO DO USO E

OCUPAÇÃO DO SOLO NA SUB-BACIA

JUQUERI-CANTAREIRA E AS INTERFACES ENTRE AS POLÍTICAS

URBANA, REGIONAL E DE RECURSOS HÍDRICO

Tânia Ribeiro Soares

Dissertação de Mestrado aprovada pela Banca Examinadora, constituída por:

Prof. Dr. Sidney Piochi Bermardini Presidente e Orientador/FEC-Unicamp

Prof. Dr. Lauro Luiz Francisco Filho FEC-Unicamp

Profa. Dra. Laura Machado de Mello Bueno PUC-Campinas

A Ata da defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no processo de vida acadêmica do aluno.

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amigas e meus amigos, por acreditarem sempre em minha mudança de rota; a meus colegas de pós-graduação, pelas angústias compartilhadas e aliviadas; e a meus professores, em especial meu orientador, por sempre lançar a luz na direção correta.

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“Tenho o privilégio de não saber quase tudo E isso explica O resto”

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RESUMO

O recente agravamento da crise hídrica na Região Metropolitana de São Paulo demonstrou não apenas a fragilidade o sistema de abastecimento de água como das políticas públicas locais e regionais, suscitando questões sobre o papel do planejamento urbano e da legislação do uso do solo no controle da expansão urbana para a minimizar os impactos da urbanização sobre o ciclo hidrológico. A pesquisa tem como objetivo avaliar como as políticas de caráter ambiental na esfera metropolitana do Estado de São Paulo interferiram nas políticas de uso e ocupação do solo nos municípios que integram a sub-bacia Juqueri-Cantareira, no âmbito da Bacia Hidrográfica do Alto Tietê. Com a instituição da Lei Estadual de Recursos Hídricos (7.663/91) e a formação dos Comitês de Bacias, um conjunto de ações foram levadas a cabo a partir de uma estrutura institucional montada em paralelo às antigas estruturas vinculadas às políticas metropolitanas. Ao mesmo tempo em que este recorte institucional atende a alguns objetivos impostos pela lei, questiona-se a sua pertinência para as políticas de uso e ocupação do solo que interferem diretamente sobre as questões ambientais. A região conta com diversas Áreas de Proteção Permanente (nascentes, remanescentes de vegetação, cristas de morro, etc.) importantes para a preservação de mananciais e sofre os impactos de uma gestão inadequada do uso do solo, resultando em problemas de recomposição dos níveis dos mananciais locais. Esta conjuntura pode estar relacionada com a falta de articulação entre os instrumentos locais de regulação do uso do solo e de gestão de Recursos Hídricos metropolitanos.

Palavras-chave: urbanização, gestão ambiental, ordenamento territorial, recursos hídricos, uso e

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The recent worsening of the water crisis in the São Paulo Metropolitan Region has demonstrated not only the fragility of the water supply system but also local and regional public policies, raising questions about the role of urban planning and land use legislation in controlling expansion to minimize the impacts of urbanization on the hydrological cycle. The research aims to evaluate how environmental policies in the metropolitan area of the State of São Paulo have interfered in land use and land use policies in the municipalities that form the Juqueri-Cantareira Basin, within Alto Tietê Basin. With the establishment of the State Law on Water Resources (7.663 / 91) and the formation of the Basin Committees, a series of actions were carried out from an institutional structure set up upon the old structures linked to metropolitan policies. At the same time as this institutional escope meets some of the objectives imposed by the law, its pertinence is questioned for land use and occupation policies that directly interfere with environmental issues. The region has several Permanent Protection Areas (springs, vegetation remnants, hill ridges, etc.) that are important for the preservation of springs and suffer the impacts of improper management of land use, resulting in problems with the conservation of water sources. This situation can be related to the lack of articulation between the local instruments of regulation of the use of the ground and of management of Metropolitan Water Resources.

Key words: urbanization, environmental management, land use planning, water resources,

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Sumário

Introdução ...10

1. A água como recurso natural: aspectos físicos e ambientais...17

1.1. Água e Ecossistemas Urbanos... 22

1.1.1. Uso do solo... 25

1.1.2. Água como limite... 26

1.2. Aspectos físicos e ambientais dos Recursos Hídricos no Brasil e na Região Metropolitana de São Paulo... 28

1.3. Água como centro de conflitos ambientais ... 41

2. A água como bem comum: aspectos socioeconômicos, legislativos e de gestão ...46

2.1 Breve histórico das Políticas Nacional e Estadual de Recursos Hídricos ... 55

2.1.1. A Política Estadual ... 61

2.1.2. O papel dos municípios ... 65

2.2. A composição e a atuação dos Comitês Alto Tietê e Juqueri-Cantareira... 68

2.3. Outros instrumentos da Política Estadual ... 83

3. A sub-região Norte da RMSP, na sub-bacia Juqueri-Cantareira, e seus municípios...87

3.1. Histórico da ocupação territorial ... 95

3.2. Aspectos demográficos e socioeconômicos ... 100

3.3. Aspectos Ambientais ... 105

4. A Legislação Urbanística dos municípios e sua relação com a política estadual de proteção de recursos hídricos ... 107

4.1. Leis de Delimitação de Perímetro Urbano ...107

4.2. Leis de Uso e Ocupação do Solo ... 109

4.3. Planos Diretores ... 109

4.4. Planos e Programas de Saneamento, Habitação e Meio Ambiente ...112

4.5. As Leis Municipais e a Política Estadual de Recursos Hídricos ...115

5. Água e Terra: descompassos entre a gestão de recursos hídricos e o planejamento do uso do solo na sub-região Juqueri Cantareira ...128

6. Considerações Finais ...137

Referências Bibliográficas ...139

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Introdução

Em 2014, o Brasil atravessou uma séria crise hídrica em suas principais metrópoles, evidenciando mais uma vez os problemas de infraestrutura, gestão e de políticas ambientais consideradas avançadas, mas distantes de serem integralmente aplicadas devido às contradições com outras políticas públicas que ainda privilegiam o crescimento econômico a qualquer custo (ACSELRAD, 2004; OJIMA, 2007; HOGAN, 2010; MARANDOLA JR, 2014).

A crise hídrica de 2014 foi ainda mais profunda na região mais populosa do País, a Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), onde os habitantes viveram um dos mais severos períodos de racionamento de água dos últimos 80 anos. A razão para as torneiras secas dada pelos órgãos governamentais foi a estiagem, também uma das mais longas dos últimos 50 anos. Mas as circunstâncias climáticas eram apenas um dos vários fatores que agravaram a crise hídrica na região, indicando tanto a fragilidade do sistema de gerenciamento dos recursos hídricos como das políticas urbanas locais (MARENGO, 2015; CUSTÓDIO, 2015).

Muitos dos discursos e apontamentos que circunscrevem o problema da água e de sua importância como bem indispensável à sobrevivência das espécies tratam da questão de forma alarmista, identificando a ameaça no mundo contemporâneo sob o argumento da sua escassez que assombra os mais diversos habitats, em especial, as grandes cidades e metrópoles. Conforme aponta Porto-Gonçalves (2004), o discurso da escassez da água associa-se a um novo protagonismo de agentes interessados em controlar a sua produção e distribuição. Cabe acrescentar, neste sentido, que a ideologia que se constrói a partir daí atinge outros níveis de inserção, inclusive governamentais, que, ao se coadunar com determinadas práticas de políticas públicas, acabam por se vincular de alguma forma a tais discursos. Assim é que, nas discussões sobre a crise hídrica, privilegiam-se as constatações acerca dos baixos índices pluviométricos, que, embora verdadeiras, fazem-se em detrimento de outras questões que estão diretamente vinculadas à produção da água no âmbito de seu ciclo.

A desvinculação entre o uso e ocupação do solo e as questões ambientais contribuem, neste sentido, para a disseminação de um ideário que se sustenta a partir da ausência de lógica de ordenamento territorial em que o não acesso da população mais vulnerável à terra urbanizada é o centro da questão. Deste modo, justificam-se, com mais naturalidade, as razões pelas quais os problemas sazonais comprometem a produção da água, reforçando as atitudes omissas em relação às práticas de gestão do uso e ocupação do solo, difíceis de serem resolvidas considerando os entraves na adoção de políticas fundiárias e habitacionais adequadas

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ao déficit e demanda habitacionais presentes nas cidades brasileiras, principalmente nas médias e grandes cidades, o que suscita questões sobre como se relacionam as diferentes esferas públicas e de que maneira seus respectivos instrumentos de gestão contribuem para o planejamento urbano-ambiental visando a manter a eficiência do sistema de abastecimento de água.

Diante deste problema, o principal objetivo da pesquisa foi avaliar como as políticas de caráter ambiental na esfera metropolitana do Estado de São Paulo interferem nas políticas de uso e ocupação do solo nos municípios que integram a sub-bacia Juqueri-Cantareira, no âmbito da Bacia Hidrográfica do Alto Tietê. A região compreendida pela bacia Juqueri-Cantareira é uma área estratégica para o abastecimento dos habitantes da RMSP. Apesar da quantidade de água produzida na Bacia Hidrográfica do Rio Juquery e utilizada para abastecimento não ser muito grande (média de 2m³/s), a barragem de Paiva Castro é o último reservatório do Sistema Cantareira, o maior sistema de abastecimento público de água na RMSP, e o que recebe toda a água proveniente das quatro represas do Sistema Cantareira (Figura I). Desta forma, metade de água consumida pelos quase 20 milhões de habitantes da RMSP passa pelo Paiva Castro. A gestão deste reservatório, bem como os usos do solo existentes em sua Bacia Hidrográfica, são portanto determinantes para a manutenção da qualidade como para a quantidade de água destinada ao abastecimento da população.

Figura 1. Perfil esquemático do Sistema Cantareira, seus reservatórios e estações elevatória e de tratamento. Fonte: ANA (2015)

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A área do Subcomitê Juqueri-Cantareira abrange os municípios de Caieiras, Francisco Morato e Franco da Rocha (integralmente) e Cajamar, Mairiporã, Nazaré Paulista, Pirapora do Bom Jesus, Santana do Parnaíba e São Paulo (parcialmente). O recorte territorial para a pesquisa elegeu os municípios de Caieiras, Cajamar, Francisco Morato, Franco da Rocha e Mairiporã por também comporem a divisão administrativa metropolitana estabelecida pela Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano (Emplasa), onde o uso e ocupação do solo na sub-região é bastante diversificado, incluindo atividades de extração mineral e indústrias químicas, o que promove uma série de impactos, de modo que a realização de ações de monitoramento, controle e preservação dos corpos d’água é fator essencial para a recuperação e manutenção da qualidade ambiental e a gestão sustentável dos recursos hídricos.

Este estudo encarou um desafio em termos das escalas de seu recorte territorial. A gestão da água, além de ser de competência das esferas Estadual e Federal, circunscreve-se numa escala territorial que ultrapassa os limites da Região Metropolitana de São Paulo, que importa água de outras bacias, como visto anteriormente, seja por conta do volume necessário para seu abastecimento ou da deterioração dos principais corpos d´água da região, como os rios Tietê, Pinheiros, Tamanduateí e reservatório Billings. Já a gestão do uso do solo é de competência da esfera municipal e não há um ente institucional que integre a gestão do uso do solo dos municípios. Com esferas e escalas diferentes, a pesquisa se deparaou com uma dificuldade metodológica que foi amenizada pela coincidência da Bacia Juqueri-Cantareira e a subdivisão administrativa determinada pela Emplasa (Figura II), o que tornou possível verificar como as diferentes esferas administrativas atuam sobre o planejamento do uso do solo para a preservação da água neste recorte.

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Figura 2. Correspondência da delimitação da bacia Juqueri-Cantareira e os Municípios da sub-região Norte da RMSP. Fonte: Elaboração própria a partir de dados Instituto Socioambiental (ISA, 2008)

A sub-bacia Juqueri-Cantareira conta com diversas Áreas de Proteção Permanente (nascentes, remanescentes de vegetação, cristas de morro etc.) importantes para a preservação de mananciais e sofre os impactos do aumento do consumo por diversos setores da sociedade e da gestão inadequada do uso do solo, como periferização e dispersão urbana, falta de saneamento, desmatamento e impermeabilização do solo. Esta conjuntura está relacionada com a pouca articulação entre os instrumentos locais de regulação do uso do solo (Planos Diretores Municipais, Leis de Uso e Ocupação do Solo etc.) e de gestão ambiental e de recursos hídricos metropolitanos, realizadas pelo governo estadual por meio de diferentes organismos, como a Coordenadoria de Planejamento Ambiental (CPLA) e as os órgãos gestores estaduais Sabesp, Cetesb e Emplasa, e os comitês de bacias hidrográficas.

A pesquisa de natureza indutiva utilizou-se de procedimentos de caráter experimental com base em fontes documentais primárias relacionadas com as atividades de gestão desenvolvidas pelos órgãos estudados. A partir das constatações evidenciadas por Brenner (2004), no tocante aos novos arranjos e recortes territoriais, em questionamento aos tradicionais enquadramentos e delimitações dados pela figura política-administrativa do Estado, como ente hegemônico na definição e implementação de ações planejadas, a pesquisa procurou chegar a constatações que revelassem como os atuais arranjos institucionais e seus resultantes relacionados com as políticas de ordenamento do uso e ocupação do solo,

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demonstrando sua fragilidade especialmente para o caso das políticas de caráter ambiental e de gestão de recursos hídricos. Ainda nesta perspectiva, demonstrou-se que estas políticas de ordenamento do uso e ocupação do solo não se consubstanciam a partir das problemáticas ambientais, elevando as contradições entre as prerrogativas formuladas pelos programas e ações de caráter ambiental, muitas delas vinculadas à gestão dos recursos hídricos pelos Comitês e Subcomitês de Bacias (REFINETTI MARTINS, 2006).

A partir destas premissas principais, foram adotados os seguintes procedimentos metodológicos:

A - Pesquisa bibliográfica com revisão de literatura sobre os aspectos físicos, socioeconômicos e de gestão da água, bem como estudos sobre o impacto da urbanização sobre os corpos d´água;

B – Levantamento e análise de documentos relacionados ao planejamento territorial e à gestão ambiental realizados pelas instâncias estadual e municipais, incluindo os municípios pertencentes à sub-bacia Juqueri-Cantareira, assim como das estruturas político-administrativas e respectivas organizações para a realização da gestão dos recursos hídricos (Comitê Alto Tietê e Subcomitê Juqueri Cantareira). O conhecimento e análise de documentos, incluindo planos, instrumentos legais, programas, atas de reuniões e outros foi a base principal de análise e avaliação da relação existente entre discursos e ações desenvolvidas pelos agentes envolvidos com a gestão ambiental e as decisões, ações e medidas de controle realizadas no âmbito da gestão do uso, ocupação e parcelamento do solo, tomando como base os pressupostos teóricos que circunscrevem a temática da pesquisa, conforme exposto acima.

C – Sistematização de todos os elementos levantados e analisados em um quadro comparativo entre aquelas vinculadas às políticas de caráter ambiental do governo estadual e das instâncias de gestão dos recursos hídricos e as estabelecidas pelos instrumentos de ordenamento territorial nos municípios, observando vínculos, interfaces e contradições, inclusive do ponto de vista da gestão das políticas territoriais.

D – Análise comparativa e descrição analítica das constatações resultantes do cruzamento realizado anteriormente, evidenciando os aspectos desta relação. Ao final, esta análise apontou, de um lado, as sinergias, coerências e complementaridades vinculadas às ações planejadas e, de outro, as contradições, confrontos e incoerências entre os aspectos relacionados à gestão dos recursos hídricos pelo governo estadual e Comitê / subcomitê de Bacia e política de ordenamento territorial dos municípios da sub-bacia.

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Estes procedimentos deram origem a cinco Capítulos, mais um item de considerações finais. Organizados em três partes: a primeira sobre a água e todos os aspectos relacionados a ela, como hidrologia, histórico dos paradigmas de gestão da água no mundo e no Brasil, e estudo do modelo de gestão em vigor, bem como a apresentação de programas estaduais voltados ao meio ambiente e recursos hídricos, distribuídos nos Capítulos 1 e 2; a segunda, sobre o uso e ocupação do solo, com a caracterização física e socioeconômica da região estudada e seus municípios, bem como a legislação e os instrumentos de gestão do uso e ocupação do solo, como distribuídos nos Capítulos 3 e 4; e a terceira, no capítulo 5 que apresenta um cruzamento dos documentos estudados, de forma a demonstrar como as deliberações do comitê e do subcomitê repercutem nas ações municipais de gestão do solo.

Além de vasta pesquisa bibliográfica sobre os fundamentos relacionados à produção de água e sua interface com os aspectos físico-naturais e os impactos relacionados com as formas de uso e ocupação do solo e questões relacionadas com governança metropolitana, apresentados nos Capítulos 1 e 2, foi realizada a análise das atas das assembleias do Comitê de Bacia Hidrográfica Alto Tietê e subcomitê Juqueri Cantareira para identificação de deliberações ou discussões sobre os temas voltados ao planejamento de uso do solo e assuntos correlatos, bem como os instrumentos da política ambiental do governo estadual, apresentados no Capítulo 2. As características da região estão apresentadas no Capítulo 3, com informações sobre relevo e vegetação, histórico da formação e da apropriação do território da região e sua relação como o desenvolvimento da Região Metropolitana de São Paulo, e a caracterização econômica e demográfica da região, com cartografia cedida pelo Instituto SocioAmbiental, que realizou o mais recente estudo publicado sobre a área em 2008, sob encomenda do Subcomitê Juqueri-Cantareira. Há um estudo da área em andamento pela Emplasa, mas os resultados não se encontram publicados. Foram também analisados os documentos relacionados ao planejamento territorial dos municípios da sub-região Norte, como legislação de delimitação de perímetro urbano, leis de uso e ocupação do solo, planos diretores, planos de saneamento e planos de habitação, apresentados no Capítulo 4, que também traz mapas de elaboração própria com a espacialização das políticas territoriais locais e sua relação com as unidades de conservação estaduais e áreas de proteção e recuperação de mananciais, além de um quadro síntese dos instrumentos de planejamento urbano frente às diretrizes de uso do solo para conservação da água estabelecidas pela política estadual em vigor. O Capítulo 5 traz um quadro demonstrativo relacionando as deliberações e discussões relacionadas ao uso e ocupação do solo ou saneamento básico, ambas atribuições municipais, e de que forma

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repercutiram nas ações municipais, indicando não apenas a pouca permeabilidade que tema uso e ocupação do solo teve nas reuniões do comitê e do subcomitê, mas também a incongruência entre o que é decido nessas reuniões e as tomas de decisão dos gestores municipais. Nas Considerações Finais, faz-se uma síntese geral dos aspectos mais relevantes levantados no trabalho, discutindo suas relações e apontam-se algumas proposições.

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1. A água como recurso natural: aspectos físicos e ambientais

Grande parte dos tratados de hidrologia1 iniciam com alguma afirmação sobre o

quanto a água é essencial para a vida no Planeta ou sobre como é insubstituível em diversas atividades humanas, fatos incontestáveis geralmente acompanhados de uma demonstração em números sobre sua quantidade e distribuição no globo que muito se assemelha a apresentada pela UN Water, em 2016, para a qual, o volume de água existente na Terra é praticamente constante há 500 milhões de anos e corresponde a aproximadamente um bilhão e trezentos e quarenta milhões de quilômetros cúbicos, ou 75% da superfície terrestre. As variantes são sua distribuição pelos continentes e seu estado físico devido ao ciclo hidrológico, o movimento da água no planeta, tanto na superfície quanto nas camadas subterrâneas (Figura 1.1). Cerca de 97% do total de água é salgada, correspondente aos oceanos e mares, e 3% corresponde aos rios, lagos, pântanos, água subterrânea, água presente na atmosfera e gelo das calotas polares ou neve permanente, sendo essas duas últimas formas a maior parte da água doce, ou seja, 2,5% do total, restando 0,5% do total de água disponível para uso humano, parcela tecnicamente definida como recursos hídricos. Desses 0,5%, a maior parte se encontra em aquíferos subterrâneos, e apenas 0,04% está na superfície em rios, lagos, mangues entre outros. Devido às peculiaridades climáticas causadas por diferenças de latitude e altitude, a água doce não se encontra distribuída de maneira uniforme entre os continentes. As Américas somam 41% de todos os recursos hídricos disponíveis, sendo que a América do Sul conta com 25% do total e o Brasil com 12%. Em seguida vem a Ásia, maior continente e o mais habitado, com 30%, depois a África com 10%, depois a Europa com 7%, a Oceania com 5% e a Antártida com 5% (UnWater, 2016).

Nesses tratados e estudos hidrológicos, esses números podem ser interpretados de duas maneiras, a depender do ponto de vista: o da abundância ou o da escassez. Adeptos da abundância podem demonstrar que a quantidade de água doce disponível, os 2,5%, embora seja uma parcela pequena do total de água na Terra, é um grande volume: mais de 10 milhões de quilômetros cúbicos circulando em movimento permanente (UN Water, 2016). Os adeptos da escassez podem enfatizar o fato de que desses mesmos 2,5%, somente 0,04% está disponível em corpos d'água superficiais e o restante está em aquíferos subterrâneos de difícil acesso. No entanto, pensar em termos de extremos pode levar a equívocos com consequências bastante

1 De acordo com a definição do United States Federal Council of Science and Technology, é a ciência que trata da água na Terra, sua ocorrência, circulação e distribuição, suas propriedades físicas e químicas e sua relação com o meio ambiente, incluindo sua relação com a vida.

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problemáticas. A ideia de abundância de água no Brasil, por exemplo, baseou a exploração predatória dos recursos hídricos desde os tempos de colônia e ajudou a promover a cultura do desperdício em diversos setores, como a agricultura, a indústria e até mesmo no consumo doméstico. A ideia de escassez nos países europeus, por outro lado, ao mesmo tempo que criou uma cultura de economia e uso racional, especialmente entre usuários domésticos de água, também abriu portas para a exploração mercantilista dos recursos hídricos. Essa dicotomia não ajuda a compreender com clareza questões importantes sobre a água: sua distribuição e disponibilidade, os padrões de consumo das sociedades contemporâneas, os modelos de produção econômica e os paradigmas de gestão desse recurso. Além do desafio natural da distribuição de recursos hídricos pelo globo, questões socioeconômicas e políticas dificultam o acesso de determinadas populações à água.

Se as fontes de água doce são relativamente reduzidas, a poluição agrava ainda mais essa situação. De acordo com levantamentos de 2013 realizados pela Unesco, mais de 2 milhões de toneladas resíduos por dia são despejados em cursos d´água, inclusive despejos industriais e químicos, esgoto doméstico e despejos agrícolas (fertilizantes, pesticidas e outros resíduos). Embora dados confiáveis sobre a extensão e a gravidade da poluição sejam incompletos, pode-se estimar que a produção global de águas pode-servidas pode-seja de 1500 km3 todos os anos. Presumindo que 1 litro de esgoto polui 8 litros de água limpa, calcula-se que a quantidade total de água poluída pode estar acima dos 12.000 km3 em todo o mundo anualmente. Como sempre os pobres são os mais afetados, com 50% da população de países em desenvolvimento expostos a fontes poluídas de água. Há estimativas de que 2 bilhões de pessoas em 48 países sofrerão com a indisponibilidade de água potável até 2050, e uma outra conta ainda mais pessimista: 7 bilhões de pessoas em 60 países – este será o resultado se forem retirados investimentos da área de saneamento (Unesco, 2013). Dados da Organização Mundial de Saúde demonstram que 1,5 milhão de pessoas, sendo cerca de 20% desse total crianças com menos de cinco anos, morrem diariamente de doenças diarreicas, incluindo a cólera, o equivalente à devastação que poderia ser causada por 15 tsunamis ou 12 quedas de aviões Boeing 747 todos os dias. Desse número de vítimas pelo menos a metade poderia ser salva por meio do acesso a suprimentos de água seguros, serviços de saneamento adequados e melhores práticas de higiene (OMS, 2014). Embora uma série de programas venham sendo realizados por organizações internacionais para enfrentar a falta de acesso a água nessas comunidades, como modernização das tecnologias de reservação e transporte de água; sistemas de dessalinização de fontes salobras, que têm aumentado a disponibilidade de água em países do Oriente Médio e em várias cidades da região Nordeste do Brasil; introdução de técnicas de reuso, entre outras medidas, pouco se tem feito

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para reduzir importantes causas de impacto sobre os recursos hídricos, como a avidez no uso de atividades como a mineração, o agronegócio e a indústria, também grandes poluidoras de água.

A pensadora e ativista ambiental indiana Vandana Shiva faz um alerta em sua obra “Guerras por Água”, apontando a chamada crise hídrica mundial da água como a dimensão mais difusa, mais severa e mais invisível da devastação ecológica da Terra:

“Testemunhei a conversão da minha terra natal de um país com abundância de água para um país com falta dela. Vi o último riacho perene no meu vale natal secar em 1982 por causa da mineração feita em aquíferos nas bacias dos rios. Tenho visto reservatórios e riachos secarem no planalto do Decã conforme se multiplicam as monoculturas de eucaliptos. Testemunhei estado após estado na Índia ser levado para a escassez de água enquanto as tecnologias da Revolução Verde entornavam água à vontade. Lutei ao lado de comunidades em regiões ricas em água enquanto a poluição envenenava seus mananciais. Caso após caso, a história da escassez de água tem sido uma história de ganância, de tecnologias negligentes e de retirar mais do que a natureza pode abastecer e limpar”. (SHIVA, 2006, p. 18).

O entendimento das características da água, seus aspectos físicos e ecológicos, a começar pelo ciclo hidrológico e o papel da hidrodinâmica e seus serviços ecossistêmicos, é fundamental para desmistificar visões extremistas e compreender melhor a complexidade da ecologia da água e como as ações antrópicas interferem nesses processos.

Figura 1.1: O ciclo hidrológico, moto perpetuo da água. Fonte: Elaboração própria

A Figura 1.1 descreve o os componentes do ciclo hidrológico (DOLMAN & GASH, 2011): - Precipitação: água adicionada à superfície da Terra a partir da atmosfera. Pode ser líquida

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(chuva) ou sólida (neve ou gelo);

- Evaporação: processo de transformação da água líquida para a fase gasosa (vapor d'água). A maior parte da evaporação se dá a partir dos oceanos; nos lagos, rios e represas também ocorre evaporação;

- Transpiração: processo de perda de vapor d'água pelas plantas, o qual entra na atmosfera; - Infiltração: processo pelo qual a água é absorvida pelo solo;

- Percolação: processo pelo qual a água entra no solo e nas formações rochosas até o lençol freático;

- Drenagem: movimento de deslocamento da água nas superfícies, durante a precipitação. As características únicas da molécula de água permitem as mudanças de estado físico que, por sua vez, constituem um movimento constante e realizam a transferência da água entre as reservas sólida e líquida, na superfície da Terra, e gasosa (vapor d'água), na atmosfera. Este movimento que a água descreve pelos diferentes ecossistemas é o princípio unificador fundamental que alimenta todos os processos integrantes da dinâmica funcional da natureza, tornando-a substância participante e ao mesmo tempo habitat para diversas formas de vida. Cada ação hidrodinâmica descrita acima tem influência e é influenciada pela condição de diferentes ecossistemas: o vapor que emana dos corpos d'água e das formações vegetais se mistura aos gases da atmosfera, agindo sobre a temperatura e a formação de chuvas por exemplo; a umidade do solo mantém a vida de microrganismos importantes para a troca de nutrientes, que por sua vez terão um papel decisivo na qualidade do solo empregado na agricultura e assim com todos os movimentos em todos os ecossistemas, constituindo a noção de serviços ecossistêmicos, benefícios obtidos direta ou indiretamente da natureza, por meio dos ecossistemas, que garantem a sobrevivência e bem-estar humanos (MILLER, 1977; ELSER; STERNER; GOROKHOVA et al, 2008), abordagem das Ciências Ambientais que tem sido adotada em outros campos do conhecimento como a engenharia e o planejamento urbano. O estudo dos serviços ecossistêmicos permite ampliar o conhecimento sobre a relação do ciclo hidrológico com outros ciclos biogeoquímicos e contribui para tomadas de decisão relativas ao gerenciamento dos recursos hídricos e de riscos ambientais. É o exemplo das pesquisas realizadas nos últimos 30 anos pelo Instituto Florestal do Estado de São Paulo, no Laboratório de Hidrologia Florestal Walter Emmerich, que têm proporcionado o entendimento dos processos hidrológicos e hidroquímicos da Mata Atlântica, produzindo um conhecimento fundamental sobre a importância da preservação dos remanescentes de floresta

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para o manejo de bacias hidrográficas. Os experimentos foram realizados com diversas ferramentas, incluindo modelagem matemática de dados hidrológicos (captação pluvial, índices de deflúvio etc.) nas instalações do laboratório no município de Cunha (SP), onde três microbacias hidrográficas recobertas por Mata Atlântica foram monitoradas. Observou-se que mesmo pequenas captações de chuva têm alta produção hidrológica e um regime de fluxo contínuo e que a cobertura florestal em bacias hidrográficas promove a regularização do regime de rios e a melhora na qualidade da água. Os experimentos apontaram que parte da água da chuva é retida pelas copas das árvores, evaporando em seguida, no processo de interceptação, que em florestas tropicais pode variar de 4,5% a 24% da precipitação. O restante da água alcança o solo florestal por meio de gotejamento de folhas e ramos ou escoando pelo tronco de árvores. No solo, a água infiltra-se ou é armazenada em depressões, não ocorrendo o escoamento superficial para as partes mais baixas do terreno, como aconteceria em uma área desprovida de floresta. A simulação indica que se a floresta for desmatada, as áreas de saturação aumentarão e, consequentemente, o fluxo superficial se intensificará, ou seja, em uma bacia sem a proteção florestal, a infiltração da água da chuva no solo é menor para alimentar os lençóis freáticos, aumentando a intensidade do escoamento superficial, provocando inundações nos períodos de chuva, uma vez que as águas pluviais atingem rapidamente a calha do corpo d´água, seja rio ou córrego, e nos períodos de estiagem, o corpo d’água vai reduzindo de volume podendo até ser extinto. Outro efeito da falta de vegetação nas bacias é a erosão do solo devido ao intenso processo de carregamento de material para a calha do rio provocando turbidez da água e o assoreamento(ARCOVA; CICCO; RANZINI; SANTOS, 2011).

Com base nesses estudos, é possível afirmar que o ciclo hidrológico é um processo ecológico, e a quantidade de água em um ecossistema particular depende do clima, do relevo, da vegetação e da geologia da região. Todos esses fatores recebem impactos das ações antrópicas. O modo de vida moderno, com atividades predatórias como a mineração, a agricultura monocultora e o uso crescente de combustíveis fósseis que afeta a atmosfera, para citar apenas as principais, abusou do meio ambiente e destruiu a capacidade das bacias hidrográficas em receber e armazenar água, entre outros processos ecossistêmicos importantes para o equilíbrio e a manutenção da vida (ODUM, 1971; SHIVA, 2006).

Mesmo com todas essas ações prejudiciais ao meio ambiente e à própria espécie, a humanidade é parte da natureza e dependente dela como sempre. A Ciência já demonstrou que o Planeta já sobreviveu a mudanças profundas e cataclismos, sempre preservando a vida e agora não seria diferente, mas é necessário cessar os efeitos nocivos das ações humanas sobre a natureza. Daí a urgência, segundo Boff, em inaugurar um novo pacto social entre os povos e aplicar todo o

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conhecimento disponível na construção de uma cultura do cuidado, no sentido de respeito e preservação de tudo o que existe e vive, um novo ethos civilizacional, a começar pela construção da sustentabilidade nas cidades: “Sustentável é a sociedade que produz o suficiente para si e para os seres dos ecossistemas onde se situa; que toma da natureza somente o que ela pode repor; que mostra um sentido de solidariedade generacional, ao preservar para as sociedades futuras os recursos naturais que elas precisarão” (BOFF, 2011,p.137).

1.1. Água e Ecossistemas Urbanos

Pode-se definir um ecossistema como "um grupo de espécies e seu ambiente não-biológico em funcionamento conjunto para sustentar a vida" (MOLL & PETIT, 1994). Uma vez que as sociedades humanas estão se tornando cada vez mais urbanas – hoje 54% da população mundial vive em cidades e até 2050 serão 66% (UN, 2015) -, muitos estudiosos têm considerado o ambiente urbano como um habitat, sendo possível definir as cidades tanto como um único ecossistema ou como una rede de vários ecossistemas individuais, caracterizados pela complexidade das interações entre aspectos sociais, econômicos e ambientais. De forma geral, especialistas em Ecologia têm descrito as cidades como ecossistemas heterotróficos altamente dependentes de altas inserções de energia e materiais e vasta capacidade de produzir emissões e resíduos (REBELE, 1994; BOLUND & HUNHAMMAR, 1999; ALBERTI, 2005). Howard Odum (1971) chegou a definir as cidades como “simples parasitas na biosfera” porque degradam habitats naturais, simplificam e homogeneízam composições de espécies, causam distúrbios nos sistemas hidrológicos e modificam os fluxos de energia e os ciclos de nutrientes. Quando comparados aos ecossistemas naturais, os ecossistemas produzidos pelo homem são imperfeitos ou imaturos devido a características como crescimento acelerado e o uso ineficiente de recursos como energia e água, o que de certa forma torna o futuro dos ecossistemas da Terra cada vez mais dependente do crescimento urbano. A urbanização crescente influencia significativamente o funcionamento de ecossistemas locais e globais e os serviços que estes prestam à espécie humana e a outras formas de vida no planeta.

Entre os padrões urbanos que podem causar impacto na biodiversidade e no fluxo de nutrientes e materiais (entre eles os recursos naturais) estão a forma urbana e a intensidade, heterogeneidade e a conectividade do uso do solo (HAUGHTON & HUNTER, 1994; ALBERTI, 2005). Um dos principais mecanismos pelos quais o desenvolvimento urbano afeta as funções ecossistêmicas é a mudança de cobertura do solo, que provoca efeitos diretos e indiretos que alteram os componentes do ciclo hidrológico natural, com mudanças significativas nas propriedades físicas da superfície do solo e na drenagem de águas pluviais

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(Figura 1.2). Com a pressão dos sistemas urbanos, as bacias hidrográficas passam a ter grandes extensões impermeáveis, o que gera desequilíbrios críticos, tendo como efeitos o aumento do escoamento superficial e redução do tempo de escoamento, causando enchentes, deslizamentos e erosões; a redução do escoamento subterrâneo e da infiltração da água no solo afeta o nível do lençol freático e a recarga dos aquíferos subterrâneos o que, consequentemente, impede a recuperação natural dos cursos d'água superficiais, causando problemas de abastecimento para a população (TUCCI, 2008; TUNDISI, 2011).

Figura 1.2: Principais problemas causados pela urbanização que afetam a quantidade e a qualidade das águas. Fonte: TUCCI apud TUNDISI (2011)

Nas bacias hidrográficas com intensa ocupação urbana, portanto, com o aumento da densidade de construções e impermeabilização das superfícies, a drenagem das águas pluviais torna-se fator preponderante e muitas vezes tem sido tratada como acessório no contexto do planejamento territorial de grandes metrópoles em todo o mundo. Historicamente, a ocupação urbana de grande parte das cidades do globo se deu nas áreas mais baixas, para facilitar o acesso à água. Mais tarde, as várzeas foram incorporadas aos sistemas viários, muitas vezes com retificação e canalização de riachos e córregos, acelerando ainda mais os escoamentos e aumentando os picos de vazão, com inundações, poluição dos cursos d´água entre outras consequências da supressão das várzeas. Além de selar o solo da água da chuva, a urbanização também faz surgir outras formas indesejadas de recarga das águas subterrâneas,

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como vazamentos no sistema de canalização, esgotos, tanques sépticos e galerias de drenagem, causando contaminação do lençol freático e consequentemente das nascentes dos rios (CANHOLI, 2005). Em países como Estados Unidos, Canadá, Austrália, diversas partes da Europa, como Reino Unido, França e Alemanha, e também no Oriente Médio e Ásia são adotados procedimentos e tecnologias para a captação e o tratamento das águas residuárias da drenagem urbana, bem como seu aproveitamento como recurso hídrico para usos industriais e de irrigação. Esses países acumulam experiências importantes na drenagem urbana e no controle da poluição hídrica, com diversos exemplos de práticas que associam o controle das cheias à melhoria da qualidade ambiental das bacias hidrográficas (ARDEN; BROWN, 2014; ABO; MERKEL, 2015). Nas cidades brasileiras, o objetivo ainda é o controle qualitativo das enchentes, embora há pouco mais de duas décadas tenha se alcançado uma mudança de paradigma, com a substituição da visão “higienista” de livrar-se rapidamente das águas pluviais, o que sempre provoca problemas a jusante, por uma visão “conservacionista”, com a retenção ou retardamento dos escoamentos no local de precipitação e a melhoria das condições de infiltração, baseada na compreensão do funcionamento dos sistemas naturais e nas ações de planejamento integradas (CANHOLI, 2005).

Outro impacto causado pelas ações humanas sobre os recursos hídricos é a eutrofização dos ecossistemas aquáticos e das águas subterrâneas. O problema resulta do excesso de nutrientes, principalmente fósforo e nitrogênio, despejados de forma dissolvida ou particulada diretamente em lagos, represas e rios. De acordo com Tundisi (2011), há a eutrofização natural, processo bioquímico de descarga do fósforo e do nitrogênio nos sistemas aquáticos, e a “cultural”, proveniente dos despejos de esgotos domésticos e industriais não tratados e da descarga de fertilizantes químicos empregados na agricultura. Esse despejo acelera o crescimento de plantas aquáticas que produzem substâncias tóxicas que podem afetar a saúde humana e causar intoxicações e a morte de animais. A deterioração de lagos, rios, represas e aquíferos subterrâneos pela eutrofização já representa grave problema ambiental em todo o Planeta, produzindo impactos ecológicos, econômicos e sociais. “O desenvolvimento da eutrofização aumenta os custos do tratamento necessário para produzir a potabilidade da água, agravando os cursos de obtenção de água adequada para o consumo humano” (TUNDISI, 2011, p. 119).

Se Odum (1971) definiu as cidades como “parasitas”, estudiosos de diversas áreas do conhecimento têm trabalhado para encontrar maneiras de minimizar ou sanar por completo os impactos causados pelas cidades e melhorar a qualidade de vida de seus moradores. Manter fragmentos dos sistemas naturais dentro dos limites da cidade, embora não seja exatamente uma

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novidade, tem sido uma prática bastante comum adotada pelos planejadores urbanos. Os chamados ecossistemas naturais urbanos contribuem com serviços ecossistêmicos que beneficiam a população urbana como filtragem do ar, regulação de microclimas, redução de ruído, drenagem de água da chuva, tratamento de esgoto, além de preservar valores recreacionais e culturais. Uma vez que grande parte dos problemas atuais das áreas urbanas são gerados localmente, como os causados pelo trânsito de veículos, o modo mais eficiente, e em alguns casos o único, de lidar com esses problemas são soluções também locais a esse respeito. Pesquisas internacionais em diversas partes do mundo confirmam que serviços ecossistêmicos gerados localmente no meio urbano trazem uma substancial melhoria para a qualidade de vida nas cidades e deve ser considerado no planejamento do uso do solo (BOLUND & HUNHAMMAR, 1999; ALBERTI, 2005).

Para Henri Acselrad (1999), o ajustamento das bases tecno-materiais da cidade em modelos de metabolismo urbano ou de sua representação ecossistêmica aponta para novos modelos técnicos do urbano. “Para se reduzir o impacto entrópico das práticas urbanas, caberia assim adotar tecnologias poupadoras de espaço, matéria e energia, e voltadas para a reciclagem de materiais” (ACSELRAD, 1999, p.83). Neste sentido, planejadores em todo o mundo têm implementado práticas do chamado “Water Sensitive Urban Design”, como pavimentação permeável, telhados verdes e vales de infiltração (swales), entre outras. A utilização de vegetação, solos e paisagens para gerenciar fluxos hidrológicos e, simultaneamente, trazer benefícios ao ambiente urbano tem atraído muito interesse de planejadores que querem melhorar tanto a qualidade quanto a funcionalidade de áreas verdes urbanas. A infraestrutura verde compreende fragmentos ou corredores de áreas naturais que fornecem habitat para diversas espécies, proteção contra enchentes, além de ar e água mais limpos. Entretanto, o impacto cumulativo tanto temporal e espacial dessas novas intervenções no fluxo hidrológico na escala da cidade ainda não foi completamente entendido. Sabe-se, no entanto, que as florestas urbanas influenciam o microclima e a concentração atmosférica de poluentes e o fluxo local de carbono. Entre as importantes funções ecológicas das florestas urbanas estão a redução fluxo de águas pluviais e o controle de enchentes (ARCOVA et al, 2011; CARROL, 2013; BALDWIN & JEFFREY, 2014).

1.1.1. Uso do solo

Entender as relações entre o ciclo hidrológico, os ecossistemas e sua importância para o equilíbrio do meio ambiente, bem como o papel que a água exerce sobre as economias urbanas e rurais, tanto em excesso quanto em falta, e o impacto das ações humanas pode

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contribuir para a criação de medidas efetivas para proteção das fontes de água superficiais e subterrâneas. Entre as medidas mais importantes está a integração do planejamento do uso do solo e de recursos hídricos. Das diversas formas de uso do solo, algumas apresentam maior impacto para as águas superficiais: a descarga de efluentes resultante das atividades da indústria; resíduos das estações de tratamento de água e esgoto; obras viárias que envolvam aterros ao longo de rios, estuários e áreas costeiras; mineração superficial, com alteração na hidrologia e fontes não pontuais de poluição; construção de represas para abastecimento, regulação de vazão ou geração de energia; canalização de rios; desmatamento para atividade agrícola, que resulta em poluição; projetos de irrigação; resíduos perigosos provenientes do comércio, aterros sanitários industriais, com poluição difusa, e as características destes empreendimentos devem sempre ser levadas em conta no planejamento, não apenas para sua localização, mas para a criação de regras de mitigação e prevenção desses impactos (MONTANO & SOUZA, 2016). Há diversas formas de possibilitar a regulação da oferta de recursos hídricos, ao aumentar a quantidade de água disponível nas bacias, promovendo a recarga dos aquíferos, e a melhoria de sua qualidade, por meio de ações conservacionistas do solo em áreas livres, principalmente nas áreas rurais e áreas de mananciais, o que pode ajudar a reduzir os processos erosivos e o volume de efluentes lançados nos corpos d'água. Segundo Santos e Romano (2005), “outro efeito é que a visão de conservação promove a gestão da demanda, utilizando técnicas e procedimentos voltados à racionalização dos usos nos diversos setores usuários”.

1.1.2. Água como limite

Todas as formas de organização social possuem uma relação muito estreita com os recursos hídricos e os aspectos demográficos são importantes. Segundo Carmo e Hogan, mesmo com a diminuição das taxas de crescimento, a população vai estar crescente, ainda durante muitos anos, em números absolutos, ou seja, a demanda por água vai continuar aumentando à medida em que aumenta o número de pessoas. É preciso que exista água para atender a essa demanda crescente. Em estudo sobre a relação distribuição espacial da população e os recursos hídricos, os autores chegaram a uma definição da disponibilidade de água como limite, numa conotação diferente da que se encontra na perspectiva malthusiana ou neomalthusiana. A situação-limite não é um sinônimo de catástrofe, mas de uma mudança importante na qualidade de vida. “Em termos de recursos hídricos, atingir a situação-limite significa que aquela população que depende daquele recurso hídrico específico vai encontrar dificuldade para manter seu padrão de utilização do recurso, com atendimento intermitente da demanda” (CARMO & HOGAN, 2001). Essas situações-limites precisam estar previstas nos sistemas que apoiam as ações de planejamento, daí a importância de se considerar dados demográficos

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aliados do planejamento urbano-ambiental.

Uma discussão importante a respeito da sustentabilidade ambiental nas cidades tem sido sobre o tipo de crescimento que os planos e a legislação devem direcionar, se permitem o espraiamento ou se priorizam altas densidades em cidades compactas. Estudos sob a ótica dos ecossistemas urbanos indicam que cidades espraiadas, por ocuparem porções maiores de terra, poderiam produzir mais serviços ecossistêmicos, desde que sejam conservadas as áreas verdes, mas podem implicar em maiores custos do sistema de distribuição de água, o que, por outro lado, poderia ser compensado por medidas de eficiência de uso da água como coleta de água da chuva, reuso de águas cinzas e saneamento sem água, consideradas mais simples de serem aplicadas em residências de baixa densidade. Já as cidades compactas, embora gerem vários distúrbios, sobretudo a concentração de poluentes, como visto anteriormente, também criam oportunidades para soluções ambientalmente benéficas, como o transporte público na redução de emissões de gases de efeito estufa e sistemas compartilhados de uso racional de água e aproveitamento de águas das chuvas, por exemplo, além de ocuparem porções menores de terra, liberando o solo para áreas livres (BOLUND & HUNHAMMAR, 1999; ALBERTI, 2005). Diversos autores defendem que, por conta do alto valor econômico que as áreas urbanas adquirem, o planejamento deveria combinar diferentes categorias de uso do solo numa mesma área para garantir a geração de serviços ecossistêmicos. Para aumentar as áreas de vegetação, estratégias já conhecidas podem ser retomadas e incentivadas, como a criação de parques e calçadas arborizadas, a determinação de áreas permeáveis nos lotes privados por meio da aplicação de taxas de ocupação, mas a criação de novas estratégias para a realidade atual é mais do que necessária.

Estudos realizados por pesquisadores do Lincoln Institute of Land Policy demonstram que estratégias para aumentar a equidade no acesso à água e reduzir a vulnerabilidade dos sistemas de armazenamento e distribuição, face às mudanças climáticas que trazem a baixa pluviosidade, têm claras implicações para o planejamento do uso do solo e o desenvolvimento urbano. Um estudo de caso realizado em El Alto, Bolívia, mapeou o consumo de água da cidade para identificar as áreas de maior demanda, tanto por área como por unidade consumidora (residências, comércios, industrias etc.). Este mapeamento revelou as características do uso de água industrial e ajudou a determinar se o programa nacional de água de reuso poderia promover incentivos como facilitação de empréstimos às empresas que conseguissem reduzir seu consumo. Usuários urbanos residenciais com o uso de águas cinzas no sistema de descargas sanitárias também foram indicados para o programa. A pesquisa identificou que a configuração das áreas residenciais pode ser um fator de influência tanto

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quanto a densidade, por conta de características como renda familiar, tamanho do domicílio, tipologia da habitação, comportamento ou práticas culturais dos habitantes, e concluiu que, além da reciclagem de águas servidas para uso industrial e a redução da perda de água na rede, outras estratégias podem ajudar a reduzir a demanda futura de água no meio urbano, tais como: - Integrar desenvolvimento, água e planejamento de infraestrutura através da criação de um ambiente interdisciplinar;

- Reforçar a capacidade técnica e financeira das autoridades responsáveis pelo planejamento territorial para a criação de medidas de desenvolvimento do uso da terra, a fim de reduzir a dispersão periurbana e, consequentemente, a demanda e os custos de distribuição de água; - Construir sistemas comuns de recolha e armazenamento para melhorar a resiliência à seca, bem como a criação de redes de áreas verdes para drenagem, minimização de poluição e promoção da recarga dos aquíferos;

- Criar uma força-tarefa local com envolvimento das organizações comunitárias para tanto gerar ações coletivas de conscientização para o uso racional da água como para maior participação junto às entidades de gestão dos recursos hídricos

Para a equipe de pesquisadores, as medidas de planejamento de recursos hídricos deveriam levar mais em consideração a relação entre densidade urbana e consumo de água para estimar as demandas de maneira mais precisa e alocar investimentos de forma mais racional. Neste sentido, planejadores e tomadores de decisão do meio político deveriam colaborar para a construção de um entendimento das terras urbanas como meios para alcançar cidades mais eficientes no uso de recursos e não apenas como oportunidades de especulação pelo mercado imobiliário (SHI, ESCOBAR, JOYCE & JAMES KOSTARAS, 2013).

1.2. Aspectos físicos e ambientais dos Recursos Hídricos no Brasil e na Região Metropolitana de São Paulo

O Brasil conta com 12% do total da água doce do mundo, uma grande disponibilidade hídrica. Devido às condições geoclimáticas, os recursos hídricos nacionais encontram-se distribuídos de forma não uniforme por suas regiões (Figura 1.3): cerca de 70% da água doce encontra-se na Região Hidrográfica Amazônica, onde habitam menos de 5% da população nacional, enquanto que a Região Hidrográfica do Paraná conta com 6% do total de água doce, 32% da população nacional e os maiores aglomerados urbanos do País, como São Paulo, a cidade mais populosa da América do Sul e outros importantes centros populacionais

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como Brasília, Curitiba, Goiânia, Campinas, Campo Grande e Uberlândia. A maior parte da população se concentra nas unidades hidrográficas dos rios Tietê e Grande, que, juntas, correspondem a 61% da população total (ANA, 2016). Esses números podem dar uma ideia de “desequilíbrio” entre população e disponibilidade de água, que segundo Hogan, Marandola e Ojima, pode levar a “soluções desastrosas”:

“Dentre essas soluções, podemos lembrar os incentivos aos movimentos migratórios para a região Amazônica, como no período de ocupação da fronteira agrícola dos anos 1970, visando, em última instância, ocupar o território brasileiro de forma mais “homogênea” e levando a resultados ainda pouco compreendidos do ponto de vista dos seus impactos ambientais; ou propostas de transposição de recursos hídricos de uma bacia para outra, como vemos no caso do Sistema Cantareira, em São Paulo, ou no caso do São Francisco, na região Nordeste. Esses casos tiveram impactos sociais econômicos e ambientais importantes. (HOGAN; MARANDOLA JR.; OJIMA, 2010 p. 36)

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Figura1.3: Regiões hidrográficas do Brasil. Fonte: ANA (2016)

Rios e riachos em abundância, vastas áreas alagadas com lagos permanentes e temporários, regiões de várzea associadas aos rios principais e seus afluentes no interior do continente e grandes reservas de águas subterrâneas, fundamentais para o abastecimento e irrigação de muitas regiões, são característicos dos recursos hídricos do Brasil. Além de importantes reservas de água doce, empregadas em múltiplos usos, os rios brasileiros são habitat para flora e fauna de grande diversidade, constituindo diversos biomas únicos no Planeta, como a Amazônia, o Cerrado e o Pantanal Mato-grossense. Os sistemas hídricos próximos à costa são igualmente relevantes, já que grande parte da população ocupa as regiões costeiras ou áreas muito próximas, a menos de 100 quilômetros, o que causa inúmeros impactos como a eutrofização das águas por conta de despejos urbanos em rios que desaguam no oceano.

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Segundo Tundisi (2011), do ponto de vista do funcionamento ecológico e hidrológico, há pelo menos três características fundamentais para os usos dos recursos hídricos e sua conservação no território nacional:

a) flutuações no nível de águas de grandes rios e em suas várzeas, inundando periodicamente vastas áreas de terra;

b) interações entre sistemas terrestres e aquáticos – as áreas terrestres inundadas periodicamente fornecem nutrientes, biomassa e alimento para muitas espécies de peixes, como frugívoros e herbívoros, além de servirem como filtros biológicos para os rios, protegendo os sistemas aquáticos;

c) interações entre organismos e sistemas aquáticos, com a presença de diversas espécies, sobretudo grandes vertebrados que aceleram os ciclos de nutrientes, removem ou contribuem para a remoção de biomassa de peixes e crustáceos e enriquecem a biodiversidade animal e vegetal (TUNDISI, 2011, p.122).

Em termos de ocupação humana, a região mais povoada é a região hidrográfica do Paraná (Mapa 1.2), que possui a maior demanda por recursos hídricos do País, equivalente a 736m3/s, o que corresponde a 31% da demanda nacional. A irrigação é a maior usuária de recursos hídricos (42% da demanda total), seguida do abastecimento industrial (27%). O crescimento desses grandes centros urbanos, em rios de cabeceira, gera grande pressão sobre os recursos hídricos, não apenas pelo aumento das demandas por água causadas pelas altas densidades populacionais e padrões de consumo intenso, mas também pela redução da disponibilidade de água devido à contaminação por efluentes domésticos, industriais e o mal planejamento da drenagem urbana.

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Originalmente, a Região Hidrográfica do Paraná, da qual o Estado de São Paulo ocupa 25% (correspondentes a 70% da área do estado), apresentava os biomas de Mata Atlântica e Cerrado e cinco tipos de cobertura vegetal: Cerrado, Mata Atlântica, Mata de Araucária, Floresta Estacional Decídua e Floresta Estacional Semidecídua. A formação geológica sedimentar e localização geoclimática em zona intertropical do Estado de São Paulo, que ocupa também outras duas regiões hidrográficas, Atlântico Sudeste e Atlântico Sul, proporciona abundância de água superficial (Mapa 1.3). No entanto, a ocupação do relevo na região passou por profundas transformações ao longo dos ciclos econômicos do País, o que ocasionou um grande desmatamento e, consequentemente, grande impacto sobre os recursos hídricos. “Alterações no ciclo hidrológico, produzidas pela inadequada ocupação do espaço, geram frequentes enchentes urbanas, problemas de coleta e disposição de lixo urbano, que resultam em contaminação dos aquíferos e águas superficiais e perdas na distribuição” (TUNDISI, 2011).

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O Tietê é o maior rio do Estado de São Paulo e também um dos mais degradados do País devido às atividades humanas. Com nascente na Serra do Mar no município de Salesópolis, a 840 metros de altitude e 22 quilômetros do Oceano Atlântico, dirige-se para o interior do Estado, na direção sudeste-noroeste, percorrendo 1.100 quilômetros no território paulista, desaguando no rio Paraná, na divisa com Mato Grosso do Sul. O Tietê é também o principal rio que percorre a Região Metropolitana de São Paulo, onde se concentra quase a metade da população do Estado de São Paulo, sendo a região de maior densidade demográfica do Brasil, segundo o IBGE (IBGE, 2014). Mas o maior curso d'água do Estado foi transformado ao longo dos séculos em um canal de esgoto a céu aberto e um dreno de dinheiro público. Desde 1992, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) administra o Projeto Tietê, cujo objetivo é ampliar a coleta e o tratamento de esgoto na Grande São Paulo e, consequentemente, despoluir o rio. A conta não é exata, mas pelo menos R$ 8,1 bilhões já foram direcionados para as obras, e para que o rio volte a viver no trecho da Grande São Paulo ainda serão necessários 10 anos de obras e um investimento de cerca de R$ 4 bilhões, segundo dados do Governo do Estado. O problema (ou o paradoxo) é que a própria companhia de saneamento é responsável pelo despejo de 450 milhões de litros diários de esgoto no Tietê, segundo dados do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS, 2016), o que torna os investimentos e as obras realizadas praticamente inúteis. A título de comparação, grandes metrópoles do mundo conseguiram despoluir seus rios em menos tempo e com menos recursos financeiros. O caso mais emblemático é o do rio Cheonggyecheon, em Seul, Coreia do Sul, que teve seus 5,8 km de extensão despoluídos em quatro anos (2003 a 2007) pelo custo total de US$ 370 milhões. O ponto de partida foi a implosão de um viaduto sobre o rio, devolvendo-o como paisagem para cidade, o que ajudou a promover sua valorização pelos habitantes. O plano combinou diversas ações, como uma política de transporte público, a construção de parques lineares às margens do rio e novas regras e procedimentos sobre a emissão de efluentes nos cursos d'água. Para a despoluição do rio Tejo, em Portugal foram investidos €800 milhões, entre 2000 e 2012, na construção de infraestrutura de saneamento de águas residuais e renovação de condutas de abastecimento de água, beneficiando 3,6 milhões de habitantes. A cidade de Cleveland, no estado de Ohio, Estados Unidos, investiu cerca de US$ 3,5 bilhões para a purificação da água do rio Cuyahoga e dos seus sistemas de esgoto, e para manter os resultados na despoluição serão investidos US$ 5 bilhões pelos próximos 30 anos (HAYDÉE, 2014). Esses e outros exemplos como o rio Tâmisa em Londres, o rio Sena em Paris, e o rio Reno em várias cidades europeias, demonstram que a despoluição de rios é possível e o Tietê, em São Paulo, não deveria ser uma exceção.

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A Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) foi institucionalizada em 1973 e é formada por 39 municípios, com uma população estimada de 21 milhões de habitantes (IBGE, 2014), o que a coloca entre os maiores aglomerados urbanos do mundo juntamente com Tóquio, Cidade do México, Nova Iorque, Seul e Bombaim. Segundo o IBGE, população do Brasil é da ordem de 200 milhões de habitantes, cerca de dez vezes mais que a metrópole paulista. A RMSP ocupa área de aproximadamente 8,5 mil km². O Brasil ocupa área de 8,5 milhões de km². Isso significa que a densidade demográfica da RMSP é cerca de 100 vezes maior do que a densidade demográfica do Brasil. Nesta região, a malha hídrica se constitui pelo fluxo da Bacia Hidrográfica do Alto Tietê, que drena 70,17% da região metropolitana, possui uma superfície de 5.985Km2 e é integrada por 34 dos 39 municípios da Grande São Paulo. Apenas 5% da área da bacia estão fora da RMSP (CBH-AT, 2009). A disponibilidade hídrica é considerada baixa diante das necessidades da região, sendo necessária a captação em outras bacias para dar conta do abastecimento que é realizado por seis sistemas produtores de água, sendo o mais importante deles o Sistema Cantareira, implementado na década de 1970, considerado um dos maiores sistemas produtores de água do mundo, produzindo 33 mil litros de água por segundo em uma área de aproximadamente 228 mil hectares, abrangendo 12 municípios, quatro deles no Estado de Minas Gerais (IBGE, 2014). As águas produzidas pelo sistema são provenientes, em grande parte, das bacias dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí, e transpostas para a região da bacia do Alto Tietê, onde se localiza a grande São Paulo. O Sistema Cantareira produz metade da água consumida na RMSP e foi o primeiro grande projeto de transposição de água entre bacias para o abastecimento doméstico da região. Segundo Whately e Cunha, o território do Sistema Cantareira já foi predominantemente rural, mas sofreu intensas mudanças desde a implantação dos reservatórios, na década de 70, e da construção e duplicação das rodovias Dom Pedro I e Fernão Dias, que cortam a região, onde se instalaram diversas indústrias nas décadas seguintes. “Além da localização privilegiada para a instalação de empresas, a proximidade com a RMSP faz com que a região, caracterizada por belas paisagens, seja extremamente atraente para o mercado imobiliário” (WHATELY; CUNHA, 2007, p6). Na época de sua realização, a transposição do Cantareira levou a inúmeros debates na sociedade civil, pois havia um grande receio de que a obra comprometesse o desenvolvimento econômico da região de Campinas, no interior de São Paulo. Como resultado, criou-se o Consórcio Intermunicipal das Bacias dos Rios Piracicaba e Capivari (posteriormente, também do rio Jundiaí) que ampliou a rede de discussões no Estado de São Paulo e culminou com a criação dos Comitês de Bacia Hidrográfica, tornando-se um dos exemplos da gestão integrada no tornando-setor de recursos hídricos para o País, como tornando-se verá mais detalhadamente no Capítulo 2.

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