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Capítulo 3 – Padrão Tecnológico dos Aglomerados da Área Central e Leste do Município

3.3. Níveis de Aprendizado nos Aglomerados Central e Leste

Considerando a estabilidade do regime tecnológico e a baixa complexidade produtiva das atividades do vestuário (Campos et al, 2003), a apropriação do aprendizado tecnológico torna-se fundamental para a empresa, tanto as tarefas de produção, quanto àquelas anteriores e posteriores a produção.

Nas tarefas de produção o aprendizado está associado à operação de máquinas e equipamentos e em alguns casos na adaptação de máquinas de costura para obtenção de determinadas formas de costura, tarefa que é feita em conjunta com o contratante. Este tipo de atividade proporciona um aprendizado com competências do tipo learning by doing e learning by using, capacitando as empresas especialistas neste tipo de atividade nas operações de produção.

Já o aprendizado das tarefas anteriores e posteriores à produção, que estão mais próximas dos serviços produtivos, estão relacionados como o desenvolvimento de produto (onde se inclui a pesquisa indumentária e antropométrica), design, engenharia, marketing, canais de comercialização, marcas, manutenção e assistência aos fornecedores. Essas tarefas são as funções inteligentes do setor do vestuário, pois comportam maior conhecimento, conteúdo tecnológico, capacitando as empresas para administração e coordenação da cadeia, assim como a coordenação

e gestão da inovação e o desenvolvimento de projetos, ou seja, são aquelas estratégicas para o setor.

As tarefas anteriores e posteriores à produção podem proporcionar um conteúdo mais amplo e integrado de aprendizado, compreendendo os níveis de competência do tipo de learning by doing, learning by using, learning by interacting ou ainda nos termos de Bell e Pavitt (1992), estas empresas apresentam as competências relacionadas à capacidade inovadora.

Exatamente por ser atividade intensiva em trabalho, a produtividade da mão-de-obra pode representar proxy razoável da capacitação técnica, uma vez que tal índice representa a eficiência da mão-de-obra da firma. Com a tendência crescente de valorização dos ativos intangíveis que pressupõe acumulação de conhecimento e agregação das funções mais qualificadas à produtividade, tem assumido padrões mais dinâmicos.

Nesse sentido, observa-se que a produtividade do AAC sugere um conjunto produtivo mais eficiente, pois quando comparado à média do Estado este aglomerado apresenta índice 14 % maior. O mesmo ocorrendo quando a comparação é feita em relação ao AAL e às demais regiões do ESP, o AAC apresenta-se 31 e 164 % superior respectivamente. Tal desempenho da produtividade da Área Central corrobora perfeitamente com as estratégias observadas no esforço tecnológico deste aglomerado, que como já visto, privilegia as atividades de desenvolvimento de produto e design (Ver Tabela 3.3).

Quanto ao AAL, ainda que a produtividade seja inferior ao aglomerado do Centro, apresenta-se 43% acima das demais regiões do ESP, mas abaixo da média do Estado (Ver Tabela 3.3). Mas se ponderarmos a inferioridade da produtividade da Área Leste pelas características mais populares do produto e a limitação do padrão tecnológico, é possível fazer ainda uma avaliação positiva no AAL.

A comparação da produtividade do vestuário com as demais regiões indica ainda que, mesmo tendo sido identificados outros arranjos produtivos em regiões fora da Metrópole como o Circuito das Águas, Ibitinga, Americana e Amparo30, a eficiência e a capacidade técnica destes

30 Foram identificadas algumas regiões com elevada concentração de produtores inseridos na cadeia têxtil/vestuário.

Todavia, essas regiões são especializadas em algum segmento da indústria, como a região de Americana, especializada na produção de tecidos planos artificiais e sintéticos, a cidade de Ibitinga, especializada na produção de bordados, a região do Circuito das Águas, especializada na confecção de malhas, entre outras (Ver Souza e

arranjos são inferiores às duas grandes aglomerações do MSP, que são formados basicamente por pequenas e médias empresas.

Tabela 3.3

Índice de Produtividade e Índice Salarial dos Aglomerados do Vestuário da Área Central, Leste e demais Regiões do Estado, em 2001

Áreas Selecionadas Índice de Produtividade Índice Salarial

Estado São Paulo 100,0 100,0

Área Central 114,7 116,2

Área Leste 87,5 93,7

Demais Áreas do ESP 43,3 68,9

Fonte: Paep/01. Elaboração própria.

Garcia e Cruz-Moreira (2004) apontam que a RMSP tem perdido participação na produção brasileira de artefatos de tecidos, mas ainda possui participação relevante na dinâmica da cadeia têxtil-vestuário, uma vez que parcela significativa da produção do vestuário é manufaturada na região, centralizando as funções inteligentes, que é um elemento estratégico para o vestuário da RMSP e mais especificamente o Município de São Paulo31. Mas estas características mostram-se mais condizentes com o AAC, fato que contribui para construção de vantagens competitivas dinâmicas deste aglomerado. Na mesma linha, outro referencial importante para avaliar as condições de aprendizado tecnológico da mão-de-obra, complementando o índice de produtividade, é o índice salarial.

A concentração das funções inteligentes fomenta ocupações qualificadas com salários maiores, ocupando profissionais mais valorizados no setor, como os Modelistas (ou Designer), Ampliadores (ampliam os desenhos, quando essa tarefa não está automatizada), Cortadores (cortam grandes quantidades de tecido) e Piloteiras (profissionais que montam as primeiras peças que servirão como modelo para a produção em escala, as chamadas peças piloto) etc.

Garcia, 1999). Já o Município de Amparo abriga um aglomerado de confecções infantis formado por pequenas e médias empresas (Ver Nakamatsu e Furtado, 2003).

31 As empresas que possuem tais ativos, quando apoiadas por mecanismos de financiamento, são capazes de

comandar sua cadeia de produção, determinando os parâmetros de funcionamento dos atores nela inseridos. (Lupatini, 2004; Garcia e Cruz-Moreira, 2004)

No caso dos aglomerados estudados o melhor índice salarial é mais uma vez apresentado pelo AAC, que além de estar acima da média do Estado, é quase o dobro pago nas demais regiões e mais de 20% superior ao aglomerado Leste.

No AAL, devido à heterogeneidade expressiva do conjunto de unidades produtivas, o índice salarial é inferior à média paga no aglomerado Central, assim como à média paga no Estado, mas fica acima das demais regiões do Estado, o que caracteriza nível de aprendizado voltado para as funções operacionais, empregando ocupações menos qualificadas como a Bordadeira, Costureira, Passadeira etc, cujos salários tendem a ser inferiores às ocupações ligadas às funções inteligentes.

Dentre as funções inteligentes descritas anteriormente, as atividades de desenvolvimento e gerenciamento de novos projetos, podem ser consideradas como uma das parcelas mais nobres de aprendizado do setor, pois proporcionam às empresas que detém esse tipo de atividade a coordenação e gestão da inovação com o desenvolvimento de coleções próprias, mas o domínio destas atividades, normalmente limita-se a poucas empresas.

Nos aglomerados estudados, ainda que tais atividades sejam reduzidas, são mais freqüentes no AAC, pois cerca de 20 % das empresas executam estas tarefas, contra apenas 5% no AAL. Ressalta-se ainda que o desenvolvimento de novos projetos no setor pode ser uma função sub-contratada, indicando a atuação de profissionais e/ou empresas especializados na identificação das “tendências da moda” (os consultores de moda, designers) no aglomerado, bem ao estilo das empresas que trabalham no segmento de prêt-à-porter. Neste modelo a articulação entre as empresas e os profissionais de desenvolvimento ocorre quando as coleções são repassadas aos modelistas das firmas por meio da prestação de serviços.

Ao que parece é justamente este o caso do aglomerado Central, pois cerca de 18% das atividades de desenvolvimento de projeto é sub-contratada. No AAL essas atividades são muito pouco presenciadas.

Tabela 3.4

Execução de Atividades Relacionadas ao Desenvolvimento de Produtos nas Empresas do Vestuário do Aglomerado da Área Central e Leste do Município de São Paulo, em 2001 (Em %)

Execução das Tarefas no

Centro Execução das Tarefas no Leste Tarefas Selecionadas

Externa Interna Inexistente Externa Interna Inexistente Desenvolvimento e Gerenciamento de

Projetos 18 3 79 3 2 95

Desenvolvimento de Produtos 19 67 14 3 61 36

Fonte: Paep/01. Elaboração própria.

No desenvolvimento de produto, mesclam-se as tarefas realizadas pelos desenhistas, modelistas, montadores das peças piloto e técnicos que realizam adaptações na manufatura do produto, dentre outros. Estas atividades são normalmente realizadas dentro das principais firmas internalizando o know-how envolvido no desenvolvimento dos modelos e de adaptações, onde estão incluídas as réplicas. As informações da Tabela 3.4 confirmam as expectativas tanto para AAC quanto para o AAL, já que mais de 60% das empresas internalizam algum tipo de tarefa relativa ao desenvolvimento do produto nos aglomerados.

A diferença fundamental neste caso é que no AAC, a proporção de empresas que não têm algum tipo de atividade de desenvolvimento de produto (13,6%), é muito inferior que no AAL (35,4%), ou seja, as informações relativas às tarefas de desenvolvimento de produto reforçam as evidências de que o AAL possui características de aprendizado mais elementar. Nesse sentido a capacitação e inovação geradas no AAC proporcionam vantagens competitivas dinâmicas em relação às demais regiões do Estado, assim como em relação à Área Leste do Município de São Paulo.

Conclusões

Este capítulo teve como objetivo discutir o padrão tecnológico dos aglomerados do vestuário da Área Central e Leste do Município de São Paulo, comparando as evidências empíricas das condições de absorção e acumulação de conhecimento, esforço tecnológico e níveis de aprendizado nos aglomerados da Área Central e Leste.

O item 3.1 recuperou o debate em torno das dificuldades de mensuração da inovação tecnológica no setor do vestuário, analisando a descrição das inovações disponibilizadas pela PAEP. Fica evidente que os indicadores de inovação privilegiam as parcelas tangíveis do investimento em inovação do setor, deixando de fora outros aspectos intangíveis como o design, que quando de fato planejado e desenvolvido pela empresa é tarefa agregadora de conhecimento.

Verificou-se que esta parcialidade é decorrente da forma com que são tratadas as questões relacionadas às transformações do conhecimento acumulado e cultura local em design inovador e o desenvolvimento de marcas, atividades que estão mais próximas do que se pode chamar de serviços produtivos.

Neste sentido a análise pautou-se do dispêndio tecnológico com bens tangíveis e intangíveis para caracterizar o padrão tecnológico do vestuário nos aglomerados. No AAC o padrão tecnológico privilegia os bens intangíveis, ou seja, as empresas deste aglomerado se esforçam para desenvolver ou adaptar design, consolidar marcas etc, que pode ser uma estratégia fundamental a ser fomentada e desenvolvida pelos agentes locais.

No AAL o padrão tecnológico está voltado para os bens tangíveis, especialmente para a atualização das máquinas e equipamentos de produção. Essas constatações indicam que os esforços estão direcionados para que as empresas atendam as tarefas de produção adequadamente, manufaturando provavelmente réplicas mais simplificadas e tarefas de facção, o que não necessariamente pode ser uma decisão equivocada, mas que possibilita inserção mais limitada na cadeia de produção, seja ela local ou global.

No item 3.2, foi analisado o período de instalação das unidades produtivas dos aglomerados, onde verificou-se que as condições de acumulação de conhecimento nos aglomerados têm notáveis diferenças. Com a sedimentação das unidades ocorridas num período mais longo e anterior à abertura de mercado da década dos 90, o AAC apresenta condições mais apropriadas para absorver e desenvolver os ativos decorrentes da dimensão intertemporal como learning by doing e using etc. Já o AAL apresenta aproveitamento reduzido deste tipo de aprendizado, essenciais para a nova indústria do vestuário, principalmente para os segmentos voltados para a moda, apresentando neste sentido certa fraqueza.

No item 3.3, foram analisados os níveis de aprendizado tecnológico, considerando a hipótese de que a concentração das funções inteligentes implica em maior oferta salarial e o

acúmulo de experiência proporciona eficiência e capacidade técnica às firmas do aglomerado. O AAC também apresentou os melhores níveis de aprendizado tecnológico, já que apresenta índice de produtividade e índice salarial acima da média do Estado de São Paulo, assim como das demais localidades. O AAL expõe mais uma vez algumas fraquezas principalmente quando comparado ao AAC, já que possui índices de produtividade e salarial inferiores, apresentando ainda baixa concentração das funções inteligentes, mas mesmo diante destas limitações têm desempenho muito superior às demais regiões do Estado.

Observa-se que a estratégia tecnológica do AAC proporciona vantagens competitivas dinâmicas, com a valorização das funções inteligentes que são estratégicas para o setor. O padrão tecnológico do AAL está direcionado para as tecnologias de produção, que conduzem a vantagens competitivas estáticas.

Entretanto é importante considerar que a competitividade na indústria do vestuário está cada vez mais condicionada pelos requisitos de preço-qualidade-criatividade (diferenciação do produto), ou seja, centrada em produtos que incorporem os conceitos de estilo e design que acabaram por edificar novas barreiras de entrada para os países, regiões ou até clusters que competem por este mercado. Dessa forma o AAC mostra-se mais apto a atender os condicionantes de mercado que exigem um processo de inovação mais dinâmico.

CAPÍTULO 4 – MECANISMOS DE INTERAÇÃO DOS AGLOMERADOS DA ÁREA CENTRAL E LESTE DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO

Nos processos de inovação e aprendizado tecnológico, a apropriação do conhecimento e da informação constitui-se em elemento crítico tanto para a competitividade das firmas quanto para os aglomerados. Tal processo pode ser fruto do esforço interno da firma, mas também externo (Lundvall, 1992), remetendo-se aos mecanismos de interação formal e informal. Neste contexto, este capítulo trata os mecanismos de interação nas relações inter-firmas, institucionais e com o mercado dos aglomerados da indústria do vestuário da Área Central e Leste do Município de São Paulo.

O capítulo foi dividido em três itens, no primeiro são discutidas as relações inter-firmas, onde são analisados e comparados os impactos da externalização e especialização das atividades entre as empresas de cada aglomerado, podendo proporcionar maior interação, pois as firmas trabalham de forma complementar, possibilitando fluxo de informação entre contratado e contratantes.

O item 4.2 caracteriza os mecanismos de interação formal e informal das atividades do vestuário voltados para a interação com instituições locais e o ambiente em que os aglomerados estão inseridos, analisando a proporção das relações locais na cadeia de produção e a estrutura de apoio aos aglomerados do setor do vestuário, além das trocas de informações de caráter informal. No último item são analisados os mecanismos de interação com o mercado que podem proporcionar aos aglomerados melhores condições de aprendizado e inovação dos produtos.