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CAPÍTULO 2 – CONHECENDO A ÁREA DE ESTUDO

2.3 Micromosaicos de Áreas de Proteção Ambiental municipais no interior do

2.3.4. Núcleo Sempre-Vivas

Esse núcleo é composto pelas APAMs Serra Mineira e Serra de Minas pertencentes aos municípios Bocaiuva e Buenópolis, respectivamente e fazem sobreposição com o PNSV. A existência de espécies de flores de sempre-viva, típicas

deste território, derivou o nome deste Parque e, consequentemente subsidiou a denominação deste núcleo.

Conforme a Fundação Biodiversitas (2005), mais de 80% das espécies de flores de sempre-vivas do país são encontradas nesta região, propiciadas por ambientes constituídos pelos campos rupestres. Por esse motivo, as áreas onde ocorrem esses ambientes são classificadas como de importância biológica especial e são consideradas como áreas prioritárias para a conservação.

A instituição dessas UCs de uso sustentável se deu pela necessidade de proteger os recursos hídricos das cabeceiras dos rios Jequitaí, afluente do Rio São Francisco e o rio Preto na vertente oeste do PNSV, os quais têm suas águas classificadas como de Classe Especial (BUENÓPOLIS, 1999b).

Quanto às condições estruturais e gerenciais dessas APAMs, Franco et. al. (2018) nos mostra que elas possuem sérios problemas que comprometem a consolidação dessas áreas voltadas à conservação. Segundo apresenta o documento, essas UCs carecem de infraestrutura de apoio à gestão, gestor/funcionário específico para a área, plano de manejo e sinalização de acesso aos atrativos.

Dentre as metas estabelecidas nas leis de criação dessas APAMs, constam a construção de infraestrutura de apoio ao turismo, estudos potenciais sobre sua fauna e flora, promover ações de educação ambiental com as comunidades integradas à unidade de conservação e proteger nascentes (BUENÓPOLIS, 1999b; BOCAIUVA, 2001), mas pelo que foi apontado por Franco et. al. (2018), não é o que tem sido observado na prática. No Capítulo 7, que trata sobre a análise de conteúdo feita a partir das entrevistadas realizadas com os gestores de uma APAM representante de seu núcleo, poderemos observar as interfaces que envolvem a gestão da APAM Serra de Minas.

As APAMs deste núcleo possuem mais da metade de seus territórios inseridos no interior do Parque, o que representa 58,31% da APAM Serra de Minas e 59,89% da APAM Serra Mineira. Nesse contexto, 52,20% do território do PNSV é integrado por APAMs. Cabe mencionar que criação desta UC foi em 2002, enquanto as APAMs já haviam sido instituídas por seus municípios, em 1999 e 2001.

Em termos práticos, na parcela sobreposta,essas áreas não podem se constituir de fato em UCs de uso sustentável, pois o PNSV é de categoria mais restrita que admite somente o uso indireto dos recursos naturais, possuindo, portanto, legitimidade no território. Dessa forma, devido as APAMs terem mais da metade de suas extensões

territoriais dentro dos limites do Parque, incidem para que as ações dos órgãos gestores dessas áreas se concentrem onde possuem possibilidade de intervenção direta.

A realidade dessas áreas nos instiga a problematizar acerca da sobreposição de UCs. Pádua (2012) comenta que essa situação é muito recorrente, de maneira que um território some duplamente a mesma área protegida. Ademais, o município pode receber o ICMS Ecológico duas vezes. Como veremos no Capítulo 6, a arrecadação municipal pela existência da APAM Serra de Minas, manifesta-se como a terceira mais representativa no Mosaico do Espinhaço. Buenópolis nesse contexto recebe duplamente pela existência desta APAM e pelo PNSV. Em contraponto, poderemos visualizar que a APAM Serra Mineira, de Bocaiuva, não tem recebido repasse do ICMS-E em virtude de não estar inserida no cadastro estadual de unidades de conservação de Minas Gerais e não apresentar iniciativa de gestão.

Em sua pesquisa sobre os apanhadores de flores de sempre-vivas do PNSV, Monteiro (2011) observou que quatro20 dos sete campos de coleta identificados inicialmente por ela estão inseridos na porção sobreposta das APAMs. De acordo com a autora, no processo de criação do PNSV, houve embates entre populações e órgãos ambientais devido ao cerceamento das práticas desses grupos, onde o manejo das espécies vegetais foi apontado como um dos fatores que degradam o ambiente onde estão localizadas. As populações residentes ao longo deste território fazem parte de comunidades tradicionais e quilombolas, que encontram na ruralidade e posse comunal de suas terras, a base para o desenvolvimento de suas práticas sociais.

Tal conflito ocorrido no momento de criação do PNSV vem sendo desconstruído ao longo dos anos diante da promoção do diálogo entre o órgão gestor da UC junto às comunidades que vivem no interior do Parque, por meio da tentativa e/ou estabelecimento de termos de compromisso que visam firmar estratégias que possibilitem o desenvolvimento de determinadas atividades nas propriedades existentes no interior do Parque e ao mesmo tempo, garantir a proteção ambiental deste território (SCALCO, 2019). Essa aproximação vem contribuir para o fortalecimento e estreitamento de relações entre os grupos mencionados e ao mesmo tempo inibir a pressão de agentes econômicos que desejam explorar este território.

Desse modo, as formas de uso e ocupação do solo nessas áreas e sua representatividade para as comunidades rurais, tradicionais e quilombolas desse

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Na APAM Serra Mineira: Campo Triste

território, conferem maior complexidade na gestão dessas áreas que devem ser articuladas de forma conjunta. Os conflitos socioambientais existentes na UC de proteção integral também compõem a realidade das referidas APAMs, diante da mencionada sobreposição.