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2 APONTAMENTOS PARA UMA HISTÓRIA SOCIAL DO

2.4 NARRATIVA CLÁSSICA HOLLYWOODIANA

A narrativa cinematográfica pode conter diversas vertentes, tornando-se fundamental não defini-la como uma categoria fechada e linear. A narrativa é um elemento imprescindível para entender o cinema como indústria, pois ela é responsável por definir gêneros e escolas cinematográficas. Sendo assim, nosso intuito neste tópico visa expor alguns elementos presentes na narrativa clássica hollywoodiana, visto que a trilogia Batman: The Dark Knight está inserida nessa perspectiva.

De acordo com David Bordwell (2004, p. 277), a narrativa cinematográfica pode ser estudada como uma representação – o modo que ela se refere ou confere a algo –, como estrutura – o modo como ela combina elementos para formar um todo diferenciado – e como ato – o processo de como a história se apresenta ao receptor. Trabalharemos com esses elementos no decorrer do capítulo, tendo como foco os filmes de Hollywood.

A narrativa clássica hollywoodiana apresenta personagens claramente definidos e uma trama baseada em causa e efeito. Existe um problema ou um objetivo evidente a ser resolvido que geram conflitos com outros personagens e (ou) circunstâncias externas. Normalmente sua trama é composta por um estágio de equilíbrio, sua perturbação, a luta e a eliminação do elemento perturbador (BORDWELL, 2004, p. 279). Essa estrutura fortalece outro procedimento bem comum na narrativa clássica: o ultimo momento/prazo final. Ele pode ser representando por algo que delimita um tempo espacial ou temporal – calendário, relógio – por uma simples indicação de que o tempo está passando – a qualquer momento o trem cairá dos trilhos, obrigando o herói a derrotar o inimigo rapidamente (BATMAN BEGINS, 2005)

A narrativa também apresenta dois elementos na trama, que de certa maneira estarão conectados no final: uma que envolve um romance, e outra que envolve a outra esfera: guerra, combate ao crime, trabalho, etc. Elas são distintas, porém interdependentes. Ao final da história, as duas envolverão o mesmo clímax, mesmo que uma se resolva antes da outra.

Todas as personagens agem de acordo com seus objetivos: entram em um duelo, tentam arrumar soluções para acabar com o crime organizado, enfrentam os fantasmas do seu passado, a morte de seus pais, etc (BATMAN BEGINS, 2005). Essas relações não estão separadas, todas terão um objetivo específico no desenvolvimento da trama. Nesse meio, a personagem principal (protagonista) – principal

objeto de identificação com o público – torna-se a principal agente casual responsável por interligar todos os elementos presentes no filme. É por meio dela e por ela que todos os elementos ramificados se unificam.

O cenário, bem como os objetos que o compõe, também tem um objetivo específico nas cenas. Todos os elementos presentes aparecem com o objetivo de formar um todo. Eles terão papel fundamental para organizar a ordem, frequência e duração dos eventos: o trem aparece no início da história para compor um elemento importante no final, o plano que coloca as empresas Wayne no centro das telas, etc (BATMAN BEGINS, 2005) ou o close de um grande edifício (THE DARK KNIGHT, 2008).

Ou seja, todos os elementos são expostos para apresentar uma tríade linear. De acordo com Ricardo Zani (2009, p. 133), essa tríade é definida pelo início da obra – quando se apresentam a posição das personagens (protagonista e antagonista), o problema principal e o conflito –, pelo desenvolvimento da trama – etapa que conecta o início com o final do filme, desenvolvida em uma linha crescente –, e pelo desenlace – ponto de virada da narrativa. Localizado entre o clímax e o final da obra, é aqui que o conflito e a resolução deste se tornam claros.

Importante ressaltar que, ao analisar esses elementos, os autores estavam tendo como base os filmes dos anos 1915 aos anos 1960. De acordo com Mascarello (2006, p. 335 apud COUTO, 2013, p. 5), a partir dos anos 1970 houve um rompimento com a narrativa clássica hollywoodiana devido às demandas de marketing, da venda em cadeia midiática e a influência de outros tipos de cinema. Nos anos 1970 e 1980, com o advento da televisão, o público semanal do cinema caiu drasticamente, fazendo com que as empresas abarcassem mais os interesses de mercado e explorassem os avanços tecnológicos nas produções cinematográficas.

Isso fez com que fossem criados três termos para os estudos sobre Hollywood contemporânea:

O primeiro, American Art Film, vai do fim de 1960 ao início dos anos 1970, sendo feito por cineastas que dialogavam com o modernismo europeu. O segundo, Nova Hollywood, refere-se à produção mainstream com início em 1975, que ganha força com os blockbusters de George Lucas e Steven Spielberg. Nessa forma de produção há o abandono da narrativa típica do cinema

hollywoodiano dos anos 1960 e também a maior busca pelos mercados secundárioscomo TV, vídeo, jogos. O terceiro termo, high concept, é usado para classificar os filmes pós-1975, que rompem com a estrutura do cinema hollywoodiano clássico, devido a pressão econômica, que faz com que a estética das produções sofra modificações de narrativa, estilo e temática, visando às demandas do marketing e da venda em cadeia midiática. Disso há a integração horizontal dos grandes estúdios aos outros segmentos da indústria do entretenimento (COUTO, 2013, p. 6).

Tubarão (Jaws, 1975) e Guerra nas estrelas (Star Wars, 1977), dirigidos respectivamente por Steven Spielberg e George Lucas, são as principais obras citadas para marcar a geração de filmes pós 1975. O primeiro apontou na estreia simultânea e na lógica de lançamento e publicidade, enquanto o segundo criou a primeira produção-franquia que funcionou como incentivo para a criação de reprises e sequencias. Era certo que, em decorrência do cenário mundial e das novas tecnologias, o modo de fazer cinema se modificou. No entanto, não acreditamos que a fórmula da narrativa clássica deixou de estar presente nos filmes.

Kristin Thompson, se referindo ao Tubarão, Poderoso Chefão e Guerra nas Estrelas, afirma que:

é difícil imaginar filmes mais clássicos em suas narrativas. Eles exemplificam perfeitamente como Hollywood continua a ter sucesso através da sua habilidade em contar histórias fortes baseadas em ação rápida e personagens com traços psicológicos claros. O filme americano ideal ainda gira em torno de uma série bem estruturada, cuidadosamente motivada de eventos que o espectador pode compreender de forma relativamente fácil (THOMPSON, p. 8 apud)

Sendo assim, acreditamos que a fórmula da narrativa clássica hollywoodiana proposta por David Bordwell ainda permanece na estrutura dos filmes. Em muitos casos, a mudança dos modos de produção de um filme por conta da tecnologia até fortalece esses elementos. Em decorrência disso, mostraremos no capítulo quatro, ao analisarmos as fontes, como a narrativa da trilogia do Batman dirigida

por Christopher Nolan apresentam essas mesmas características e como essas são fundamentais para construir a estrutura dos personagens. Seria impossível analisar as representações e modelos veiculados pelo filme sem um estudo detalhado da narrativa de um filme.

2.5 A IMPORTÂNCIA DO GÊNERO CINEMATOGRÁFICO EM