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2.1.5. Integração das ações ao planejamento

2.1.5.6. Natureza da organização

Considerar as especificidades intrínsecas à natureza organizacional das universidades é reconhecidamente um fator relevante para o planejamento estratégico (ARAÚJO, 1996; BORGES e ARAÚJO, 2001; ATHANÁZIO, 2010; COSTA, 2014). “Parece necessário compreender que as universidades são organizações com características próprias e específicas, o que requer uma forma diferenciada de gestão” (FALQUETO, 2012, p. 29).

Araújo (1996) destaca que compreender a natureza da instituição é da maior importância, pois as características da organização universitária têm consequências diretas na atividade do planejamento. A autora destaca as seguintes características:

• um elevado profissionalismo domina a tarefa; as operações habituais devem ser preparadas por especialistas; isso significa que os profissionais demandam autonomia no trabalho e liberdade de supervisão; os professores escolhem o que investigar e como ensinar, influenciam nas decisões coletivas e desenvolvem lealdades interinstitucionais;

• as decisões são descentralizadas; em consequência, diferentes partes da organização podem progredir de forma diversa, com ritmos próprios, obedecendo a circunstâncias específicas;

• coexistem concepções distintas de universidade, em função de fatores culturais, históricos e ambientais diferentes, presentes nas unidades que compõem a instituição;

• a multiplicidade de concepções traz dificuldades para a definição da missão, dos objetivos e das metas;

• o poder é ambíguo e disperso; pelo fato de existirem concepções distintas, os indivíduos lutam internamente para fazer prevalecer suas orientações;

• há reduzida coordenação da tarefa; as estruturas são debilmente articuladas, com a participação de muitos atores distintos;

• a universidade tem metas ambíguas e vagas. Quais são as metas de uma universidade? Ensinar? Pesquisar? Servir à comunidade? Os objetivos prestam-se a diferentes interpretações, e, em função disso, também não há concordância em como alcançá-los;

• a universidade trabalha com tecnologias diferenciadas, pelo fato de lidar com clientes com necessidades variadas.

Estrada (2000) e Falqueto (2012) também realçam os diversos modelos de organização e administração da universidade, que devem ser considerados no processo de planejamento:

Modelo Burocrático: Aproximando-se da burocracia profissional apontada por

Mintzberg (1995 apud ESTRADA, 2000), a universidade possui como características o fato de que os especialistas têm treinamento elevado e é dado a eles considerável controle sobre seu trabalho; o controle do próprio trabalho leva o profissional a atuar relativamente independentemente dos colegas; a estrutura da organização é essencialmente burocrática, e a coordenação é obtida no delineamento de padrões que determinam o que e para que ser feito; os processos de trabalho são muito complexos para serem padronizados, pois os resultados do trabalho não podem ser facilmente medidos; a autoridade de natureza profissional é muito enfatizada; os profissionais controlam seu próprio trabalho e também buscam o controle coletivo sobre as decisões administrativas que os afetam; frequentemente, são encontradas duas hierarquias paralelas, a acadêmica e a administrativa.

Modelo colegiado: Tem como pressuposto o consenso entre os participantes da

universidade. Alguns estudiosos sustentam que as qualificações profissionais, a falta de regras claramente definidas e a ambiguidade organizacional são de tal forma que as decisões deveriam ser tomadas pela obtenção do consenso entre os profissionais e os

administradores. Ao considerar a comunidade como a base da universidade, o poder é compartilhado por professores, estudantes e administradores.

Modelo Político: Quando analisada sob este ponto de vista, a organização é observada

sob os aspectos de interesses concorrentes, conflitos e jogos de poder. São premissas desse modelo o conflito ser natural e esperado em qualquer organização complexa; nas organizações de ensino superior, encontram-se diversos blocos de poder e grupos de interesse, que se esforçam para garantir a propriedade de seus valores e metas; muitas das decisões principais são controladas por pequenos grupos de elite do poder; a tendência democrática é similar à sociedade em que está inserida; a pressão política e a barganha pelos interesses dos grupos ultrapassa os limites da autoridade formal do sistema burocrático; interesses de grupos externos também exercem poder sobre as decisões dentro da universidade.

Modelo anárquico: No modelo de gestão anárquica, cada indivíduo assume sua

autonomia e tem poder de decisão, e não há prática de controle ou revelação de ação previamente pretendida ou analisada, tornando difícil prever resultados. Permite que as pessoas sigam em diferentes direções sem coordenação de uma autoridade central, sendo que as lideranças são fracas e as decisões tomadas pela ação individual, geradas por processos não planejados e emergentes. Falqueto (2012, p. 35) exemplifica este modelo no qual cada indivíduo assume sua autonomia e tem poder de decisão, ao citar que “os professores decidem o quê, quando e se vão ensinar. Os estudantes decidem se vão aprender, quando e o que vão aprender”.

Modelo cibernético: O modelo cibernético surge a partir da coexistência de outros

modelos dentro de uma mesma organização, podendo tratar-se de uma estrutura que obedece a dois sistemas de controle: um estruturado, com regras, controles e regulamentos explícitos; e outro social, com controles implícitos centrados na interação entre os indivíduos. Esse modelo admite tanto o modelo burocrático quanto o colegiado e o político da organização, e as instituições de ensino superior, um sistema que possui muitas variáveis, no qual a direção se dá através de mecanismos de autocorreção que monitoram as funções organizacionais, por meio dos quais as várias partes da universidade tomam ações corretivas espontaneamente.

Universidade como uma organização mista: Criado a partir dos modelos básicos,

como o burocrático, colegiado, político e anárquico, o modelo traz uma visão mais realista da dinâmica universitária, numa tentativa de aproveitamento das melhores características dos modelos anteriores.

A universidade, na perspectiva do modelo misto, pode ser considerada uma

burocracia quando certas características burocráticas aparecem combinadas

com a autonomia profissional descentralizada; uma anarquia organizada, quando se trata do processo decisório e o comportamento humano não tem propósito; uma organização colegiada, quando há busca por consenso em uma tomada de decisão; uma organização cibernética, quando a capacidade de autocorreção da dinâmica organizacional está em destaque e uma

organização política, quando enfatiza o dissenso, o conflito e a negociação

entre os grupos de interesse. (FALQUETO, 2012, p. 38, grifos do autor).

As Instituições de Ensino Superior são consideradas organizações complexas, possuindo características que tendem a gerar certas resistências e limitações ao planejamento estratégico. (ARAÚJO, 1996; COSTA, 2014; VIDIGAL e CAMPOS, 2015). O gestor universitário deve levar em consideração essas características específicas das organizações acadêmicas, sob pena de comprometer o processo de planejamento estratégico (FALQUETO, 2012).

Se, por um lado, a utilização do PE em instituições de ensino superior não é uma tarefa fácil, as dificuldades encontradas não indicam a inviabilidade de adoção do planejamento estratégico, mas a necessidade de repensar a própria atividade do planejamento e ajustar os instrumentos existentes à dinâmica organizacional (ARAÚJO, 1996).