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A natureza dos erros ao se fazer inferências de causalidade em textos de diferentes

6 DISCUSSÃO E CONCLUSÕES

6.2 Principais conclusões do Estudo 2: examinando-se o papel da natureza da

6.2.2 A natureza dos erros ao se fazer inferências de causalidade em textos de diferentes

Assim como no Estudo 1, os dados obtidos no Estudo 2 confirmam os resultados da pesquisa de Spinillo e Hodges (2012) ao apontarem que os erros de compreensão são de naturezas distintas revelando, portanto, diferentes níveis de domínio, não podendo ser considerados em bloco.

Adotou-se também o mesmo sistema de análise de erros (ver SPINILLO; HODGES (2012). Dessa forma, as respostas incorretas dos participantes foram classificadas em quatro tipos, a saber: Tipo 1 (opinião) expressa preferência ou avaliação de natureza moral sobre os personagens, os eventos, os pontos de vista abordados, ou sobre a conclusão do texto; Tipo 2 (repetição de informação intratextual) caracterizado por repetições literais ou parafraseadas da informação textual; Tipo 3 (integração de informações intratextuais) integração de informações que estão literalmente expressas no texto, mas que gera uma inferência desautorizada.; Tipo 4 (integração de informação intratextual e extratextual) consiste na geração de uma informação desautorizada a partir da integração de informações intra e extratextuais.

De forma geral, houve uma maior concentração do erro Tipo 4 (integração de informação intratextual e extratextual) nos textos narrativo e argumentativo e em todos os anos escolares investigados. Ao considerar os erros em termos de tentativa de integração de informações (erros em que não se evidencia a tentativa de integrar informações - Tipo 1 + Tipo 2; e erros em que se evidencia a tentativa de integrar informações - Tipo 3 + Tipo 4), observou-se um maior percentual de erros com integração em ambos os tipos de texto e em todos os anos escolares.

No que diz respeito às análises entre aos grupos de participantes em função dos tipos de erros em cada tipo de texto, observou-se pouca variabilidade entre anos escolares e tipos de erros. Sendo assim, pode-se concluir que os anos escolares investigados não influenciaram o tipo de erro apresentado pela criança.

Ao comparar os tipos de texto em função dos tipos de erros em cada ano escolar, verificou-se que o texto argumentativo concentrou o maior número de erros do Tipo 1 (opinião), enquanto que o texto narrativo apresentou maior frequência dos erros Tipo 3 (integração de informações intratextuais) e Tipo 4 (integração de informação intratextual e extratextual). Portanto, o texto argumentativo foi o que mais apresentou erros de opinião e, talvez, isso seja explicado pelo fato do texto argumentativo trabalhado nesse estudo ser do tipo opinião. Isto pode ter estimulado a criança a emitir apreciações particulares a respeito do que era questionado, desconsiderando os pontos de vista dos personagens do texto levando, assim, a geração de inferências desautorizadas.

De modo geral, se observa, no texto argumentativo, um conflito de pontos de vista a respeito de um determinado assunto possibilitando, assim, a contestação e a contra- argumentação. De acordo com Leitão (2001), os estudiosos afirmam que o texto argumentativo é composto por: a) ponto de vista, em que há expressão da opinião do autor sobre um tema polêmico que provoca diferentes pontos de vista; b) justificativas, que são as razões que sustentam o ponto de vista do autor; c) contra-argumentos, caracterizados por críticas diretas a posição levantada pelo autor. Sendo assim, a principal função do texto argumentativo é o convencimento, a persuasão e a apresentação de um ponto de vista a respeito de um determinado tema (SPINILLO; SILVA, 2010; TRAVAGLIA, 2007).

Tais características, de fato, marcavam o texto adotado no Estudo 2 (A internet – ver Apêndice D), uma vez que o texto trata de um tema polêmico, que é o uso da internet por crianças. Além disso, apresenta sequências contrastivas explícitas ao abordar as opiniões dos adultos, que expõem ideias e fatos que justificam a não utilização da internet, e de crianças, que, com os mesmos recursos, defendem o uso da internet.

Embora o texto A internet retrate as opiniões dos adultos e das crianças entrevistadas, ao responderem às perguntas inferenciais, os participantes emitiram sua própria opinião, não sendo estabelecidas relações de causalidade entre as informações intratextuais e extratextuais, mas apenas uma de natureza moral acerca do que foi lido, gerando, assim, erros no estabelecimento de inferências causais.

Outro ponto que pode ter gerado o estímulo de opiniões pessoais dos participantes em detrimento da consideração dos pontos de vista dos personagens do texto pode ter sido o tema

abordado: internet, o qual é bastante atual e polêmico, sobretudo, em relação ao seu uso pelas crianças. Nesse sentido, este tema atrativo, talvez, tenha incitado a criança a emitir um julgamento de valor ou expor sua opinião, não focando nas relações causais existentes entre os pontos de vistas dos personagens e entre eles e os seus conhecimentos de mundo. O exemplo a seguir ilustra isso:

Exemplo do texto argumentativo

Pergunta causal: Por que as crianças acham que a internet facilita a aprendizagem? Criança: A internet não facilita nada. Quem facilita é livro, pesquisa de livro escrito.

O exemplo acima demonstra que o participante desconsiderou o ponto de vista das crianças entrevistadas no texto e emitiu a sua avaliação a respeito do uso da internet no processo de aprendizagem, não considerando as relações causais no texto, fornecendo uma resposta equivocada.

Embora o erro Tipo 1 (opinião) não expresse uma tentativa de integração entre informações intra e extratextuais, sendo considerado, portanto, menos sofisticado, é extremamente importante trabalhar os erros com as crianças a fim de compreender o processo cognitivo que está por trás e pensar em estratégias outras de superação das dificuldades.

Sendo assim, tais resultados ratificam o estudo de Spinillo e Hodges (2012) ao apontarem que os erros de compreensão não podem ser considerados em bloco, uma vez que expressam diferentes níveis de dificuldade, existindo erros mais elementares e outros mais sofisticados quanto ao nível de processamento cognitivo. Os erros mais elementares são aqueles em que não há uma tentativa de integrar as informações veiculadas no texto aos conhecimentos prévios do ledor. Enquanto que os erros mais sofisticados demonstram a associação de informações intra e extratextuais, porém, por equívocos, distorções ou generalizações inadequadas, as inferências geradas não são autorizadas pelo texto. Nesse sentido, as autoras afirmam que os erros que indicam uma tentativa de integração de informações são menos problemáticos do que aqueles em que o leitor não realiza tal tentativa, pois, mesmo resultando em erros, essa tentativa de integração aponta para um salto qualitativo na compreensão.

Os resultados do Estudo 2 também ratificam a importância dos erros, tal como os acertos, como indicadores do processo cognitivo. Sendo assim, o erro é um elemento importante no processo de ensino-aprendizagem, pois, além de revelar o limite das estruturas cognitivas do sujeito em um determinado momento do seu desenvolvimento, quando a criança

toma consciência dele, provoca uma contradição cognitiva interna contribuindo para uma nova reorganização estrutural do pensamento e conduzindo, posteriormente, à reorientação de procedimentos e estratégias para resolver o problema adequadamente.