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2. METODOLOGIA DE PESQUISA

3.2 NAVEGANDO POR CONCEITOS HISTÓRICOS E PEDAGÓGICOS ENVOLVIDOS

Ao debater a respeito dos desdobramentos da cultura pós-moderna, Manacorda (2009) afirma que essas ideias na verdade apropriam-se do que o conhecimento científico tem a oferecer com o upgrade da tecnologia a serviço de uma suposta sociedade que não está mais cravada nos princípios da modernidade. Ideia que surgiu nos séculos XVII e XVIII a partir da apropriação política, econômica, social e ideológica da classe burguesa enquanto terceiro Estado detentor do sistema econômico capitalista, que na reflexão do autor, permanece por produzir imensas desigualdades, ainda que se esteja numa outra perspectiva histórica,

A sua característica parece-me que possa ser definida assim: serve-se das técnicas da ciência mais avançada não para fazer progredir a humanidade, e sim para produzir de tal forma que gera desigualdades até piores, correndo o risco de deteriorar o próprio planeta Terra (MANACORDA, 2009, p. 21).

Nesse sentido, é preciso promover o diálogo científico com as correntes pós-modernas da educação e da própria história, compreendendo que a virada linguística (LYOTARD, 2006) trouxe enormes contribuições, sobretudo para repensar o sujeito histórico que faz parte

Administrativa do Plano Piloto (Brasília).

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Baseia-se na obra: LOMBARDI, José Claudinei; SAVIANI, Dermeval (Org.). Navegando pela História da

da sociedade e é também indivíduo que pertence ao ambiente educativo, entretanto não se abandona a premissa de que as contradições geradas na chamada “Era das Revoluções” (HOBSBAWM, 1996) ainda são fortemente propulsoras para a organização das sociedades contemporâneas de forma que os sujeitos não podem ser compreendidos descolados de sua própria historicidade enquanto pertencentes a uma classe social.

A negação da superação do modo de produção capitalista ou a condenação antecipada de uma suposta sociedade socialista traz o conformismo social e a supervalorização da luta por grupos pulveriza o próprio conflito de classes (MALANCHEN, 2015) visto que “A lição que talvez sejamos forçados a aprender de nossas atuais condições econômicas e políticas é que um capitalismo humano ‘social’ e verdadeiramente democrático e igualitário é mais irreal e utópico que o socialismo” (WOOD, 2011, p. 250).

Apresenta-se a primeira concepção importante nesta tese, a de história: ela está atrelada a partir da perspectiva marxiana dos modos de produção (MARX, 1974) e ao próprio método de pesquisa do alemão, o materialismo histórico dialético, na busca por uma objetividade histórica possível de descrever, analisar, intervir e transformar os processos sociais pelos quais a humanidade passa. Longe de qualquer relativismo, por isso, o conselho vigilante de Hobsbawm (1998) se torna muito pertinente nessa pesquisa: é primordial defender Marx e o marxismo dentro e fora da história, contra aqueles que os atacam no terreno político e ideológico. Ao fazer isso também estar-se-á preservando a história e a capacidade do homem de compreender como o mundo veio a ser o que é hoje e como a humanidade pode avançar para um futuro melhor.

Completa-se o argumento inicial por uma historiografia marxista na visão teórico- metodológica de Thompson (1981) que defende a lógica histórica como um método de investigação própria da ciência história que rompe com a ideia de escrita ilusória e fragmentária e sustenta o discurso histórico a partir de muitas vertentes metodológicas:

Por ‘lógica histórica’ entendo um método de investigação adequado a materiais históricos, destinado, na medida do possível, a testar hipóteses quanto à estrutura, causação, etc., e a eliminar procedimentos autoconfirmadores (‘instâncias’, ‘ilustrações’). O discurso histórico disciplinado da prova consiste num diálogo entre conceito e evidência, um diálogo conduzido por hipóteses sucessivas, de um lado, e a pesquisa empírica, do outro (p. 49).

A partir do conceito de ciência histórica em Marx, Hobsbawm e Thompson, a concepção de ideia pedagógica da tese repousa inicialmente nas advertências de Araújo (2009):

As ideias pedagógicas não desempenham funções atomatizadoras, e nem são atomizáveis; pelo contrário, alicerçam as diferentes visões de mundo que permeiam a totalidade social, compartilhando dos confrontos histórico-socais concretos [...] é mister que as interpretações sobre o campo histórico-educacional não fragmentem a própria história, ou mesmo a cultura. Concepções pedagógicos ou quaisquer das locuções em apreço nesta reflexão não são objetos de investigação que devem viver abstratamente, entre os pesquisadores, como se estivessem fora ou além da história (p. 201-218).

Captou-se de Cury (1989) uma noção relevante sobre como são constituídas as sínteses epistemológicas quando o objeto de estudo é a educação. Isso é possível se souber promover o diálogo nem sempre harmônico, por vezes dialético, entre os elementos que o autor apresenta como singulares para compreender, por exemplo, de que modo as ideias pedagógicas se manifestam na tentativa de a concepção de mundo da classe dominante se tornar totalizante:

O momento propriamente educativo, nesse contexto, fica mais claro seja descrito em seus elementos dialeticamente complementares e contraditórios. Esses elementos são: idéias pedagógicas, as instituições pedagógicas, os agentes pedagógicos, o material pedagógico e o ritual pedagógico (p. 87).

Com o intento de romper com a ideia de “marginalidade científica” (FRANCO, 2003, p. 70) que muitos creditam à Pedagogia e que acabou “[...] produzindo a não valorização científica da pedagogia que, abdicando de ser a ciência da educação, foi se contentando em ser apenas um instrumento de organização da instrução educativa. Outras ciências, distantes da ótica do pedagógico, foram assumindo esse papel”, avoca-se a concepção de ciência pedagógica de Saviani (2012) no qual há um vínculo direto com sua pedagogia histórico-

crítica de base marxiana e marxista em que fundamentam-se as análises educacionais a partir

das condições históricas de produção da existência humana, que são resultado da forma social existente, dominada pelo capital:

[...] é tributária da concepção dialética, especificamente na versão do materialismo histórico. [...] A educação é entendida como o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens. Em outros termos, isso significa que a educação é entendida como mediação no seio da prática social global (p. 201-218).

Nesse texto há o entendimento de que a pedagogia é uma ciência que tem um objeto de estudo específico: a relação entre teoria e prática e seus vínculos com a prática social. Destarte, é a ciência da prática educativa com base em Libâneo, (2013; 2011; 2011b), Pimenta (2011a; 2011b), Franco (2003;2011) e Mazzoti (2011b), que compreendem que a Pedagogia deve visar à formação dos sujeitos para além do curso de licenciatura na área. A ciência da Educação tem nesse objeto uma perspectiva interdisciplinar (FRIGOTTO, 2008) que se faz

valer pelas contribuições de várias áreas como a História, Psicologia, Antropologia, Sociologia etc. Contudo, a ciência pedagógica deve estar em constante busca por tal status, amparando-se em uma epistemologia, num método de pesquisa, que faz uso de técnicas, instrumentos que irão proporcionar a produção de “conhecimentos poderosos” (YOUNG, 2007).

Vale a pena dialogar com a tese de Gauthier (1998) quando discorre sobre os obstáculos que a Pedagogia enfrenta: de ser um ofício sem saberes e de possuir saberes sem ofício. Para resolver o dilema, o autor apresenta seis saberes indispensáveis para a elaboração de uma teoria geral da pedagogia: “saber disciplinar”, “saber curricular”, “saber das

ciências da Educação”, “saber da tradição pedagógica”, “saber da experiência” e “saber da ação pedagógica”. Sem desconsiderar nenhum dos conceitos anteriores, Gauthier (idem)

elabora sua teoria geral da Pedagogia centrada no ato pedagógico e no uso consciente dos diversos conhecimentos do professor que passa a ser visto como:

[...] profissional, ou seja, como aquele que, munido de saberes e confrontando a uma situação complexa que resiste à simples aplicação dos saberes para resolver a situação, deve deliberar, julgar e decidir com relação à ação a ser adotada, ao gesto a ser feito ou á palavra a ser pronunciada antes, durante e após o ato pedagógico (p. 331).

Cabe salientar a concepção de “saber objetivo e escolarizado” apresentada por Saviani (2012b) quando combate qualquer tentativa de classificações que insistem em considerar os saberes clássicos como tradicionais ou mesmo neutros. Pode-se levar em conta o ponto de vista do autor não só quando trata da educação básica, mas especialmente para se pensar nos currículos que formam os pedagogos. Esse saber, baseado na pedagogia histórico-crítica, supera a superficialidade de propostas curriculares aparentemente desinteressadas e baseadas nas “pedagogias do aprender a aprender” (DUARTE, 2000) ou ainda nas definições de saberes carregados de desinteresse e relativismo das ideias pós-críticas questionadas por Malanchen (2016):

[...] o debate educacional das últimas décadas tem se caracterizado pela hegemonia das “pedagogias do aprender a aprender”, do construtivismo, da pedagogia do professor reflexivo, da pedagogia das competências, da pedagogia de projetos e do multiculturalismo (p. 81).

Com os conceitos de história, ideias pedagógicas e pedagogia devidamente esclarecidos, torna-se importante revisitar as origens históricas do curso de Pedagogia no Brasil.