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Nicos Poulantzas: apontamentos preliminares

No documento greicedosreissantos (páginas 57-59)

CAPÍTULO 2 POULANTZAS E A QUESTÃO BUROCRÁTICA

2.1 Nicos Poulantzas: apontamentos preliminares

Os anos 1960 foram determinantes no cenário intelectual da formação social francesa. Para Motta (2014a, p. 406), “foi um contexto em que a criatividade intelectual somou-se a um ousado e engajado espírito de rebeldia”. Se, no início dessa década, Sartre era a referência, ainda mais após a elaboração de sua obra Crítica à razão dialética, posteriormente, o estruturalismo começou a marcar presença num terreno completamente contrário e divergente do marxismo combinado com a fenomenologia de Sartre. Essa virada é marcada pelo início dos trabalhos de Lévi-Strauss seguido por outros pensadores como Foucault, Lacan, Barthes e Althusser que, como veremos, p “ x ” será a principal referência para Nicos Poulantzas (MOTTA, 2014a).

Nascido no ano de 1936, em Atenas, e prematuramente falecido em 1979, a relação de Poulantzas com o direito teve início em seu lar24. De acordo com Motta (2014a, p. 406-407),

Seu pai, Aristides Poulantzas, era uma liderança no campo jurídico grego, exercendo a carreira de advogado e também como acadêmico, pois ensinava grafologia forense. Poulantzas ingressou na Faculdade de Direito da Universidade de Atenas em 1953 e se formou em 1957, destacando-se como um excelente aluno. Embora tenha sido registrado na Associação de Advogados de Atenas, nunca exerceu a profissão de advogado. Ao invés disso, optou por continuar estudando o direito em nível de pós- graduação na Alemanha. Residiu durante um tempo em Munique no ano de 1960. Contudo, devido às influências do nazismo que ainda perduravam na Alemanha, mudou-se para Paris, o lar da diáspora dos intelectuais gregos exilados [...], e lecionou filosofia do direito na Universidade Pantheón-Sorbonne. Durante esse período, ele preparou a sua tese de pós-graduação O Renascimento do Direito Natural na Alemanha após a Segunda Guerra Mundial e, em seguida, a sua tese de doutorado sob orientação de Michel Villey, A Natureza das Coisas e do Direito: Um Ensaio sobre a Dialética do Fato e do valor. Nesse período, Poulantzas esteve plenamente envolvido com o círculo intelectual ligado à revista Les Temps Modernes de Jean – Paul Sartre, em que se destacavam Maurice Merleau – Ponty e Simone de Beauvoir. As influências do marxismo-exitencialista de Sartre, além das concepções historicistas de Lukács e Goldmann, foram evidentes nesse seu período inicial, influências essas que já vinham desde os tempos do seu bacharelado em direito em Atenas.

Entretanto, conforme observado pelo autor, a influência de Sartre e Lukács dissipou-se a partir de 1965, quando o marxista grego erradicado na França começou a estabelecer contato com a obra de Louis Althusser. Se antes, na sua fase sartreana, os estudos de Poulantzas giravam em torno do direito, a partir de sua aproximação com o marxismo de Althusser, o

24 Conforme esclarecido por Motta (2014a, p.406), os dados bibliográficos de Nicos Poulantzas foram extraídos

enfoque de sua pesquisa voltou-se à análise do Estado. De qualquer maneira, é interessante notar que Poulantzas não abandonou a problemática do direito, ao contrário, ele procurou tratá-la sob a ótica do Estado capitalista (MOTTA, 2014a).

A aproximação de Poulantzas com as análises de Althusser é que viabilizou essa mudança de foco.

No ano de 1965, em meio ao eclipse do existencialismo de Sartre e a emergência do estruturalismo, o cenário intelectual francês foi sacudido pelo lançamento de dois livros de Louis Althusser: A Favor de Marx (Pour Marx) e Ler o Capital. Esses dois livros tornaram Althusser a principal expressão teórica do marxismo francês e isso se deveu, sobretudo, pela sua criatividade teórica em que propôs a nova leitura e interpretação da obra de Karl Marx, o que o fez um marxista sui generis naquilo que convencionalmente se chama de marxismo ocidental. Se para autores como Sartre, Lukács, Korsch e Gramsci o marxismo filia-se à perspectiva humanista e historicista, de origem hegeliana, e tem como foco central a alienação do trabalho e a reificação, além da consciência revolucionária e transformadora de um sujeito coletivo histórico que é a classe operária, a posição de Althusser é completamente distinta e oposta. Para Althusser, o marxismo deve ser entendido não como uma filosofia, mas sim enquanto uma ciência (MOTTA, 2010, p. 10).

Conforme indica Carnoy (1988), a discussão sobre o estruturalismo como epistemologia (e como filosofia do conhecimento e da ciência) foi extensa e envolvente. Ao analisá-la, o autor sublinha dois pontos centrais da obra de Louis Althusser que merecem ser sinalizados. Em primeiro lugar, enquanto estruturalista, Althusser nega a noção do homem j h “ ” “ ” õ P A thusser, são as relações de produção (classes sociais) os sujeitos da história, não os indivíduos tratados isoladamente. Apenas as classes é que possuem uma história, haja vista que se desenvolvem e entram em conflito num dado modo de produção. Em segundo lugar, apesar de ter sido rotulado como neo-stalinista, em contraposição ao stalinismo, as teorias de Althusser recusam o determinismo econômico e, dessa forma, defendem a autonomia relativa da política e da ideologia em relação à estrutura. Embora o autor reconheça que a estrutura econômica é quem x “ ú â ” f ê ( ô ) “ â ” N numa determina formação social, um desses níveis poderia ser a estrutura dominante, porém, quem determina isso é a estrutura econômica (CARNOY, 1988, p. 120).

Ao desenvolver sua teoria do Estado, portanto, Poulantzas lança mão desses elementos desenvolvidos por Althusser. Como veremos, tais elementos estarão presentes, precisamente, na sua obra de 1968. Para Carnoy (1988, p. 129) “ x f

por Althusser, foi aplicada pela primeira vez a uma investigação do Estado por Nicos P ”

Quando analisa a trajetória intelectual do marxista grego, em linhas gerais, Codato (2008) argumenta que Poulantzas foi, entre os marxistas, o autor com o qual e contra o qual mais se debateu nos anos 1970 e imediatamente nos anos posteriores, sua trajetória intelectual funcionou como um verdadeiro ponto de orientação, tanto para desenvolver uma história política das ideias políticas da segunda metade do século XX quanto para fazer um balanço das contribuições do marxismo ao debate público.

Quando Poulantzas faleceu, em 1979, aos 43 anos, possuía uma importantíssima obra. Em uma década, publicou cinco livros de teoria política – dentre eles: Poder Político e

Classes Sociais (1968) e O Estado, o poder e o socialismo (1978) – e já havia protagonizado

o conhecido debate com Ralph Miliband sobre como entender o marxismo e como explicar a política capitalista (CODATO, 2008). Ademais, dirigiu uma coleção de estudos empíricos de Sociologia Política para a conceituada Presses Universitaires de France. Frente a tudo isso, Codato (2008) considera que Poulantzas foi o teórico político marxista mais importante do pós-guerra25.

Esboçadas essas considerações, podemos agora tomar como objeto de reflexão as obras Poder Político e Classes Sociais (1968) e O Estado, o poder e o socialismo (1978). Ao analisá-las, em primeiro lugar, buscaremos tecer considerações sobre a relação entre estrutura e superestrutura. Feito isso, trataremos a questão do Estado e, posteriormente, refletiremos sobre o fenômeno burocrático.

No documento greicedosreissantos (páginas 57-59)