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Noção de competência e competências profissionais

1.2 Desenvolvimento e competência profissional

1.2.1 Noção de competência e competências profissionais

O conceito de competência tem sofrido vários desenvolvimentos e diversas influências ao longo do tempo. A sua discussão tem abrangido vários universos, quer o académico, quer o empresarial, associado a indivíduos (competências individuais), a organizações (competências organizacionais) e até mesmo a países, quando relacionado com sistemas educacionais e de formação de competências (Fleury & Fleury, 2001). É possível verificar na literatura a existência de várias abordagens quanto a este tema. A abordagem francesa distingue entre (i) os saberes (savoirs) que se traduzem na dimensão teórica das competências, (ii) o saber-fazer (savoir faire) que correspondem às competências de carácter prático, e (iii) o saber-ser (savoir être) que integra as competências sociais e comportamentais. Assim sendo, para além das capacidades técnicas (saber e saber-fazer), existem aptidões e caraterísticas pessoais (saber- ser). Nesta linha, Le Boterf (2003) considera que os recursos incorporados ao profissional lhe permitem mobilizar e combinar (i) os saberes teóricos, do meio e procedimentais, (ii) os saber-fazer formalizados, empíricos, relacionais, cognitivos e ainda (iii) os saberes relacionados com as aptidões ou qualidades, os recursos fisiológicos e emocionais.

25 A abordagem anglo-saxónica divide as competências em hard e soft. Enquanto a competência hard engloba os conhecimentos sobre conteúdos em concreto (knowledge) e o saber-fazer, que corresponde à demonstração comportamental de um conhecimento (skills), a competência soft integra os traços de personalidade e as motivações. Segundo Bilhim (2006), as competências do tipo hard são fundamentais para se ser competente no trabalho, no entanto, são as competências do tipo soft que permitem diferenciar as realizações pessoais, contribuindo para se atingir um desempenho de nível superior.

Ceitil (2006) contribui para a construção do conceito de competência, identificando quatro perspetivas: (i) as competências como atribuições, (ii) as competências como qualificações, (iii) as competências como traços ou características pessoais; e (iv) as competências como comportamentos ou ações.

Na primeira perspetiva, as competências são vistas como atribuições, o que significa que a competência existe como elemento formal, quer a pessoa a use ou não. Na segunda perspetiva, as competências designam as qualificações, sendo definidas como atributos. Nestas duas perspetivas, as competências são consideradas como elementos extrapessoais, o que significa que não dependem da pessoa que as possui, mas de fatores externos. O que as distingue é que a segunda perspetiva enfatiza a noção de competências como um conjunto de saberes ou de domínios de execução técnica que se adquire por via do sistema formal de ensino ou por via da formação profissional, ou ainda por outras modalidades de aprendizagem ao longo da vida. Integra-se, nesta perspetiva, a certificação realizada a partir de um currículo, que contenha um conjunto de qualificações reconhecidas para exercer uma determinada função, papel ou cargo.

26 Em síntese, nas perspetivas das atribuições e das qualificações, as competências não dependem do desempenho, o que significa que, apesar de alguém possuir as competências necessárias para uma determinada finalidade ou função, o seu desempenho pode não corresponder às expetativas decorrentes dessas mesmas competências, pois segundo Ceitil (2006, p. 27):

“… nas perspetivas em que as competências são consideradas como atributos ou fatores extrapessoais, não existe contemporaneidade entre a permanência do atributo ou qualificação da pessoa e a expressão fenomenal desse mesmo atributo ou qualificação na realidade do seu desempenho quotidiano”.

Na terceira perspetiva, que Ceitil (2006) denomina de traços ou

caraterísticas pessoais, as competências são consideradas como

características intrapessoais e são definidas como capacidades. Neste âmbito, a competência é constituída por um conjunto interligado de fatores que, segundo Boyatzis (1982), inclui qualidades pessoais, motivações, experiências e características comportamentais que são evidenciadas e demonstradas em determinados contextos, permitindo aos indivíduos responder a diferentes adversidades enfrentadas nos mais diversos cenários.

Finalmente, na quarta perspetiva, as competências como

comportamentos ou ações são consideradas como fenómenos

interpessoais, definidas como resultados de desempenho ou modalidades de ação. Neste sentido, a expressão dos traços ou caraterísticas pessoais só é considerada na ação, uma vez que as competências são o próprio desempenho. Assim, as competências tornam-se visíveis e mensuráveis. Nestas duas últimas perspetivas, a competência não se limita ao potencial nem a uma lista de capacidades, mas inclui também o processo que

27 conduz a um desempenho superior, sobressaindo, como uma condição essencial para a definição de competência, a sua relação com o contexto. Nesta sequência, a definição de competência profissional, dada por Bilhim (2006), como uma combinação de conhecimentos, de saber-fazer, experiências e comportamentos, exercidos num contexto preciso, constitui uma síntese das várias perspetivas identificadas por Ceitil (2006).

Já para Le Boterf (2006) a competência é equivalente a profissionalismo. Para este autor, um profissional competente é aquele que articula três dimensões da competência: (i) a dimensão dos recursos disponíveis que pode mobilizar para agir, que são os conhecimentos, o saber-fazer, as capacidades cognitivas e as competências comportamentais; (ii) a dimensão da ação e dos resultados que produz, e que corresponde às práticas profissionais e ao desempenho; e (iii) a dimensão da reflexibilidade, que consiste no distanciamento das duas dimensões anteriores.

Assim, de acordo com este autor, no âmbito da primeira dimensão, um profissional competente deve combinar e mobilizar tanto os recursos pessoais (as suas competências) como os recursos do seu meio envolvente. Assim sendo, é impossível ser-se competente sozinho e de forma isolada.

Quanto à segunda dimensão, que diz respeito à prática profissional, esta pode ser definida como o conjunto dos atos que um sujeito executa para realizar uma atividade prescrita, para resolver uma situação/um problema ou para encarar um determinado acontecimento. Neste sentido, o profissional competente sabe articular as sequências de ações, tendo em vista alcançar um objetivo que faça sentido.

28 A terceira dimensão é aquela que se concretiza na análise das práticas e que consiste em distanciar-se para uma melhor tomada de consciência das suas práticas, no sentido de as formalizar ou conceptualizar. Ou seja, o profissional competente não se limita a descrever como age, mas também explica as razões dessa ação.

Os pontos comuns sobre o conceito de competência, entre os vários autores citados, são a relação triangular entre: (i) os recursos - as capacidades e os atributos intrapessoais ou extrapessoais; (ii) a ação ou o desempenho; e (iii) o contexto de trabalho, em que se desenvolve a ação. Contudo, Le Boterf (2006) adiciona ainda um novo elemento ao conceito de competência e que nos parece central na profissão docente, a reflexão crítica sobre a prática (Figura 1).

Figura 1. Conceito de competência.

Elaborado pela autora

Outro contributo importante na área das competências é o de Boyatzis (1982), para quem a competência é uma caraterística subjacente da pessoa, que leva a um desempenho efetivo ou superior. Ele identificou três conjuntos de competências que, segundo ele, diferenciam os desempenhos notáveis dos médios.

O primeiro refere-se às (i) competências cognitivas, como o pensamento sistémico e o reconhecimento de padrões; o segundo diz respeito (ii) às

29 competências de inteligência emocional, incluindo autoconsciência e competências de autogestão, tais como autoconsciência emocional e autocontrole emocional e, finalmente, o terceiro conjunto são (iii) as competências de inteligência social, incluindo competências de consciencialização social e gestão de relacionamento, como a empatia e o trabalho em equipa.

Este autor define uma competência inteligência emocional como uma habilidade para reconhecer, entender e usar informações emocionais sobre si mesmo; uma competência de inteligência social como a capacidade de reconhecer, compreender e usar informações emocionais sobre os outros; uma competência de inteligência cognitiva como uma capacidade de pensar ou analisar informações e situações.

Assim, na perspetiva deste autor, a competência consiste na capacidade de coordenar diferentes conjuntos de conhecimentos, habilidades e atitudes, sendo esta capacidade que permite um desempenho superior.