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No Triângulo: espaços e imagens do comércio e da vida social

“A sociabilidade é um instinto do coração, tão forte e necessario como o Amor, é como um dos mandamentos da lei de Deus: precisa ser cultivada nas relações com o mundo” 57.

Neste capítulo nosso interesse é pensar a geografia do comércio e da cidade, os espaços de sociabilidade e lazer da cidade de São Paulo construída nas representações dos anúncios e das notas sociais presentes nos periódicos. Interessa-nos especialmente explorar as mensagens publicitárias e as crônicas sociais sobre os novos lugares da sociabilidade moderna do centro como os hotéis, confeitarias, cafés, teatros, restaurantes, clubes, parques, assim como a rede comercial que alimenta e propõe novos hábitos e novas formas de consumo.

Começaremos pela região central da cidade – o Triângulo – área formada pelas Ruas Direita58, XV de novembro59 e São Bento60. Num dos vértices do Triângulo (Rua São Bento com Rua XV de novembro) localizava-se a Praça Antonio Prado (antigo Largo do Rosário), no outro vértice (Rua São Bento com Rua Direita), a Praça do Patriarca e o Viaduto do Chá, que ligava o “centro histórico” ao “centro novo” e próximo à cabeceira deste, em posição dominante sobre o Vale do Anhangabaú, o

57 A cigarra, edição nº 47 (31/07/1916).

58 Logradouro aberto no século XVI, com intuito de fazer a ligação do centro da cidade com a antiga estrada que levava à aldeia indígena de Pinheiros. Seu nome foi mudado várias vezes. Em 28/08/1899 (Lei nº 416) a denominação “Direita” foi restaurada.

59 Esta rua começou a ser aberta no século XVI para facilitar o acesso entre o Pátio do Colégio e o Largo São Bento. Antes de receber esse nome, era conhecida como Rua do Rosário e Rua da Imperatriz. Com a Proclamação da República passou a ser chamada definitivamente de Rua XV de novembro.

60 Uma das mais antigas ruas da cidade. Aberta alguns anos depois da fundação de São Paulo. O nome “São Bento”, dado a esta rua refere-se ao Mosteiro de São Bento, localizado no Largo do mesmo nome. Dados coletados no site: www.prefeitura.sp.gov.br– História das Ruas de São Paulo, consultado em 13/03/2011.

42 Theatro Municipal61, destacado esplendidamente, visto do Viaduto do Chá ou da Rua Líbero Badaró e, no terceiro vértice, o encontro das Ruas Direita e XV de novembro.

E, “dentro” da área delimitada pelo Triângulo que se estabelecia o comércio elegante da cidade, com seus estabelecimentos conceituados, as novas lojas de departamento e os profissionais liberais de prestígio.

Ao analisarmos os anúncios e as notas sociais e culturais dos periódicos, na representação proposta pela publicidade, pudemos perceber que, com algumas exceções, a grande maioria dos estabelecimentos de comércio e lazer encontrava-se no Triângulo e no seu entorno que, como já exposto no primeiro capítulo ganhou ares europeus na administração do prefeito Conselheiro Antonio Prado.

Percebe-se que tudo, ou quase tudo que se procurava podia ser encontrado no centro da Cidade. A imagem construída pelas revistas é a de que boa parte da vida urbana da Paulicéia se desenrolava no Triângulo e no seu entorno e, os periódicos através dos anúncios divulgavam o “centro” e os diversos serviços e estabelecimentos ali presentes. Como aponta Sutti em seu estudo sobre a publicidade em São Paulo, o que se construía era uma visão de

“encantamento da região do Triângulo, ostentado pela sofisticação das lojas e das modistas mais requisitadas, procuraram traduzir o requinte e a elegância do centro comercial da metrópole paulista, atraindo verdadeiras peregrinações por parte da sociedade paulistana, que se dividia entre as distintas damas e senhoritas que buscavam avidamente as novidades das vitrines e a solenidade dos cavalheiros de chapéu-coco e bengala, que se postavam as portas dos cafés e das charutarias” 62.

Por essa razão, optamos por selecionar os estabelecimentos comerciais que lado a lado dividiam as ruas do Triângulo e divulgavam seus produtos e serviços nas revistas ilustradas por meio dos reclames, de acordo com a rua em que estavam localizados. Esses endereços encontrados nos anúncios dos periódicos nos proporcionam ter acesso a essa área de comércio.

61 SEGAWA, Hugo. Prelúdio da metrópole: Arquitetura e urbanismo em São Paulo na passagem do século XIX e XX. São Paulo: Ateliê Editorial, 2004, p.58.

62SUTTI, Paulo. O reclame: A transição da reprodutibilidade persuasiva. Dissertação de Mestrado. São Paulo: PUC/SP, 1996, p. 78.

43 Muitas eram as casas comerciais instaladas no Triângulo. Nas Ruas São Bento, Direita e XV de novembro encontramos livrarias, como a Livraria Universal e a Livraria Alves, bancos, como o Banco de São Paulo, Banco Comercial do Estado de São Paulo, João Bricola e Cia Casa Bancária, ainda o banco inglês, London e Brazialian Bank, Limited, agências de viagem, como A Transoceanica , alfaiatarias, como a Alfaiataria Academica de Irmãos Infantes & C. e a Alfaiataria Hipolito, salão de barbearia e cabeleireiro, drogarias, clínicas dentárias, ateliers de costura, camisarias, como a Camisaria Barros, leiloeiros, como o leiloeiro Quirino do Canto, joalherias,dentre outros.

Pelos anúncios o comércio localizado no centro ganha visibilidade através de suas lojas elegantes, que nessas mensagens oferecem uma grande variedade de produtos qualificados como finos e requintados, em sua grande maioria importados da Europa e da América do Norte. A publicidade, divulgando imagens do progresso cobiçado pelas camadas abastadas, propondo novos hábitos e sociabilidades, estabelecia uma relação com os consumidores que aspiravam viver num grande centro comercial aos moldes das grandes capitais, principalmente Paris.

Neste sentido, no início do século XX a imagem veiculada é a de que o consumidor podia fazer tudo ou quase tudo no centro, ou seja, descendo do bonde e caminhando pelas ruas do Triângulo encontravam-se artigos de vestuário, calçados, tecidos, artigos de cama, mesa e banho, utensílios domésticos, enxovais, papelarias, livros, artigos de beleza e higiene, remédios, artigos para presentes, armarinhos, chapéus, oferecendo ainda serviços de médicos, dentistas, advogados, barbeiros, cabeleireiros, seguros e pecúlios, bancos, viagens, apostas nas casas lotéricas e na sede do Jóquei Clube, cursos de línguas, leiloeiros e fotógrafos.

Nessa geografia do centro comercial da cidade moderna o maior destaque é dado para a Rua Direita como podemos ler na representação do cronista d‟A cigarra:

“Hoje a rua de maior transito é a rua Direita – rua que as senhoras palmilham com vivo interesse, direi com alvoroço, porque é nella que estão as casas de modas e dos artigos que mais seduzem o seu espírito. Poder-se-ia chamar à rua Direita a das senhoras, porque, com effeito, de uma determinada hora em deante quem nella predomina e brilha é o elemento feminino.(...) O que alli passa, enchendo o ambiente de

44 perfumes, é a graça, a belleza, a mocidade, é a expressão da vida vitoriosa.

(...) A rua Direita, ao menos por agora, é o organismo maior e mais perfeito do Triangulo. Atravesse-a o leitor entre as 4 e 6 da tarde e verá como nas physionomias das moças se póde ler cmo num livro aberto. O pensamento que della vem dar-lhe-á immediatamente, uma ideia muito nítida da vida de escol, da gente seleccionada, dos brocados e setins (...) É a chama da vida, a salamandra do sonho, derretendo o gelo da velhice, dando-lhe por um instante, no espectaculo da rua, um pedaço de ilusão e de doçura”63.

A cigarra no texto acima atribui adjetivos para a Rua Direita que nos

possibilitam perceber a sua importância para o período, chegando até ser tratada como a maior e mais perfeita Rua do Triângulo, ou seja, o flanar pela rua, principalmente das senhoras e moças seduzidas pelas casas de moda a enchia de graça e beleza. Assim, como nos propõe Prado em seu estudo sobre a mulher na revista A cigarra entre 1915- 1930, “a Cidade é a „vida‟, a exposição das pessoas faz da rua um „espetáculo‟, que exibe o luxo e ostenta a riqueza. Estar na rua é „rejuvenescer‟” 64.

Em nosso passeio pela Rua Direita através dos anúncios encontramos como citado na referida nota estabelecimentos comerciais voltados para perfumaria e vestuário.

63 A cigarra, edição nº26 (14/09/1915).

64PRADO, Sabrina G. do. Imagens femininas na revista “A Cigarra” – 1915/1930. São Paulo, Dissertação de Mestrado em História Social, PUC/SP, 2004.

45 Figura 8: A cigarra, edição nº 7 (07/1914)

46 Nos dois anúncios veiculados na revista A cigarra, encontramos características da Paulicéia desse período, por exemplo, a Casa Baruel, informava que possuía o “mais moderno e fino em extractos, pós de arroz, sabonetes, entre outros itens, dos mais reputados fabricantes franceses, ingleses e americanos”, como Guerlain, Colgate e Roger & Gallete e chamava atenção também ao anunciar as “ultimas novidades”.

No reclame da casa Au Bon Diable, que embora não anunciasse produtos importados, possui informações necessárias para chamar a atenção do consumidor, como os dados sobre o estabelecimento, sendo uma casa fundada há trinta e oito anos, demonstrando ser uma casa comercial sólida e séria; com grande sortimento de ternos, capas e sobretudos de borracha, enxovais e ainda, os preços módicos. Chama a atenção também o uso de palavras no diminutivo – “roupinhas”, o que nos aponta para além das roupas para colegiais como as mostradas no desenho do anúncio, também possuía roupas para crianças em tenra idade.

Outro estabelecimento importante da Rua Direita era a famosa Casa Alemã, fundada em 1883, com variadas seções de artigos, como tecidos, armarinhos, camisarias, perfumarias, mobílias, tapeçarias, roupas brancas e enxovais para noivas e noivos. Vale ressaltar que possuía filiais em Campinas, Ribeirão Preto, Santos e Jaú. Assim, ao se anunciar como a mais importante casa no gênero em todo Brasil, demonstra ser um estabelecimento sólido que oferecia seus artigos e mercadorias e possuía oficina própria e, a fachada do magazine estampada no centro do anúncio nos da indicação da suntuosidade da casa (Figura 10).

47 Figura 10: A cigarra, edição nº39 (31/03/1916)

Um dos itens destacados pelos anúncios dos estabelecimentos do Triângulo é o vestuário. Muitos dos anúncios de página inteira e ilustrados são de estabelecimentos que se dedicam a vestir os paulistanos de maneira moderna e refinada, como aconselhava o cronista d‟A Cigarra. Na publicidade, a mulher aparece como

48 personagem central deste novo comércio de vestir; não só as representações femininas estão mais presentes nos anúncios como as lojas dedicadas às vestimentas femininas aparecem em maior quantidade.

Assim, em sua edição de 14/09/1916, A Cigarra traz uma reportagem entusiasmada sobre a inauguração de um elegante estabelecimento de moda feminina na Rua São Bento, a Casa das Fazendas Pretas. Esta destacava a arte complexa e delicada de vestir a mulher com os finos e distintos tecidos pretos, uma vez que o uso destes realçava a beleza feminina “envolvendo de mistério, os corpos, destacando a alma das carnes, o brilho dos olhos, pondo em relevo um perfil e cortando em linhas estatuaria e elegância uma silhueta”, ou seja, vestir-se com as últimas criações da alta costura recebidas diretamente de Paris, como os lindos vestidos, os mantôs, os tailleurs, as blusas e os chapéus, tornavam a mulher elegante e ressaltavam sua beleza65. Ao falar da inauguração e da qualidade do novo estabelecimento, a revista conclama seus leitores a conhecê-la indicando que além dos artigos importados a casa mantinha uma modista francesa para dirigir o atelier de confecções, a fim de atender às senhoras “desejosas de se vestir bem no mais fino estilo parisiense”, chamando assim as “famílias de bom gosto” para visitar o estabelecimento.

Interessante apontar que, muitas vezes, as crônicas das revistas tomam estes estabelecimentos comerciais como assunto, promovendo eventos como inaugurações de novos estabelecimentos, mudanças de endereço ou reformas das instalações das casas comerciais como acontecimentos sociais de destaque.

49 Figura 11: A Lua, edição nº1 (janeiro/1910)

Embora a casa das Fazendas Pretas tivesse sido inaugurada em 1916, a Cidade já possuía outras casas elegantes. Exemplo disso é a casa Au Palais Royal de propriedade do Sr Leandro Pitta & Madeira também localizada na Rua São Bento, que chama atenção primeiramente pelo nome – Palácio Royal – o que já demonstra construção de uma idéia de suntuosidade ao se referir a casa como um palácio, e pelos produtos importados que chegavam através do vapores, ou seja, a começar pelo nome, era um estabelecimento que procurava se manter em sintonia com as novidades vindas

50 principalmente da Europa. Encontravam-se roupas femininas, roupas brancas, enxovais, tecidos, roupas de cama e mesa, acessórios para vestuário e para decoração.

Embora se comercializasse tecidos finos, sedosos e bordados como, crepes, linhos, nanzouck, schantungs, cassas, também possuía em seu estoque os tecidos de algodão ou sarja, como a chita, o brim e o cretone, ou seja, para confecção de roupas mais populares, para trabalhadores, empregados e criados em geral.

Assim, quanto à diferenciação dos tipos de tecidos, podemos observar o tom preconceituoso em relação aos artigos nacionais, logo considerados mais populares nessa crônica de Americano, mostrando um diálogo entre uma senhora e o vendedor:

“(...) – Deixa ver aquela fazenda ali em cima, faz o favor. Não! Não é essa, a outra.

Desceu o caixeiro com a peça de fazenda. Desenrolou, amassou com a mão e esticou para mostrar que não vincava.

– É estrangeira? – Não, é nacional.

– Ah, então não serve. O senhor acha que vou comprar fazenda nacional?

– Temos estrangeira. – Ah, isso sim.

– É que a senhora não tinha avisado.

– Mas não era preciso avisar, eu não estou fazendo compras para as criadas.

– A senhora me desculpe. (...) 66.

Ao lermos esse diálogo podemos notar até um tom de ironia que indica como se constituem signos da diferenciação social por meio do comércio de tecidos; importados para a “boa sociedade” e nacionais para os criados.

Desta forma, caminhando mais um pouco pela Rua São Bento, praticamente na mesma calçada, encontramos outro estabelecimento que chamava atenção para os artigos finos e as novidades enviadas semanalmente de Paris e Londres, a casa Ao Preço

66

AMERICANO, Jorge. São Paulo naquele tempo: 1895-1915. São Paulo: Carrenho Editorial / Narrativa Um / Carbono 14, 2004, p. 77.

51

Fixo - Camisaria. Na Au Palais Royal observamos que era uma casa que oferecia

artigos femininos, uma vez que anunciava echarpes, luvas, “corpinhos”, mantilhas,

tailleurs, saias, entre outros.

Embora em menor quantidade, para além dos públicos femininos, os anúncios desse comércio elegante voltam-se também para as necessidades de vestir com elegância os cavalheiros, as crianças e jovens e até o interior das casas.

Figura 12: A Lua, edição nº 2 (janeiro/1910)

Na casa Ao Preço Fixo, a especialidade eram as roupas brancas para cavalheiros e meninos, além dos artigos de cama e mesa. Outro detalhe também

52 observado foi o compromisso da loja em ressarcir o valor pago ao produto que não oferecesse garantia. Como outros anúncios analisados, vale destacar que a toda semana a casa recebe produtos novos e novidades trazidas de além mar.

53 Figura 13: A Cigarra, edição nº 50 (14/09/1916)

54 Outra casa especializada em artigos masculinos era a Camisaria Barros, também localizada na Rua São Bento. No detalhe, um cavalheiro bem trajado segurando e apontado para o slogan do estabelecimento, demonstra que a casa comercializava artigos finos para homens e meninos, como gravatas e colarinhos, bem como, enxovais para noivos, o que nos sugere que os homens também preparavam enxovais para o casamento. Nota-se também em primeiro plano, antes mesmo do nome da casa em letras grandes, “ROUPAS BRANCAS E FINAS”, reforçando o uso das roupas brancas como um sinal de limpeza e higiene.

Num outro anúncio (Figura 14) da mesma casa veiculado também n‟ A Cigarra quase um ano depois, chamava a atenção as novidades para o inverno, como os sobretudos, as luvas e os cachecóis e mais uma vez reforçava que era um estabelecimento para fregueses de gosto apurado e demonstrava que embora o comércio do Triângulo fosse voltado principalmente para artigos do vestuário feminino, existiam também casas especializadas em artigos masculinos que poderiam ser apreciados nas vitrines, o que nos permite considerar que embora em menor escala, os cavalheiros também podiam flanar pelo centro afim de observarem as novidades.

55 Figura 15: A Cigarra, edição nº 88 (30/03/1918)

56 O Mappin, por sua vez mantinha uma seção especializada em artigos para o vestuário masculino e, em mais um anúncio observamos a forma de se referir ao público, neste caso masculino, como o “cavalheiro mais distinto”, trazendo novamente o tom preconceituoso, haja vista, a pose do senhor elegantemente vestido no desenho trajando um terno bem cortado. Assim, como nos anúncios para o público feminino, realçava-se a variedade dos artigos importados, como os tweeds ingleses.

Ainda em relação aos artigos que compunham o vestuário masculino, não podemos deixar de mencionar as casas especializadas em chapéus, como a Chapelaria Souza Pereira, que comercializava além dos modelos de fabricação própria e os modelos americanos e italianos. Localizada na Rua Direita possuía um grande sortimento de modelos, como as palhetas, o que nos permite destacar que os confeccionados com palha e preços mais em conta eram utilizados em ocasiões menos formais.

57 Figura 17: Vida moderna, edição nº29/30 (25/12/1907)

Ao compararmos o anúncio de 1915 d‟ A Cigarra com o da Vida moderna veiculado na primeira década, podemos observar que já existiam casas especializadas no comércio de chapéus dos mais variados modelos e materiais, como as cartolas para casamentos e soirées e, os mais informais como, os bonés, os chapéus de palha e os chapéus para sol, além é claro, como outros estabelecimentos comerciais mencionados neste estudo, os artigos importados principalmente da Europa.

A Rua XV de novembro é outra via que se destaca na composição desta geografia do moderno consumo dos paulistanos e paulistas.

58 Figura 18: A Lua, edição nº 3 (janeiro/1910)

A casa Au Bon Marché na Rua XV de novembro era mais um estabelecimento do Triângulo onde se encontravam tecidos finos de seda, rendas, galões, enxovais de linho, blusas e, como nas outras casas mencionadas um rico sortimento de roupas brancas, ressaltando ser essa sua especialidade e, também como encontrado em outros estabelecimentos, tecidos mais grosseiros se misturavam aos mais finos. A loja de propriedade do Srs. Ferreira, Vasconcelos & Comp., com o nome em língua francesa destacado ao alto e vitrine com mercadorias expostas, nos indica uma forma de atrair os clientes, além de anunciarem seus artigos a preços módicos.

59 Assim, se a casa das Fazendas Pretas se anunciava especialista em moda feminina com finos tecidos pretos, as outras três com grande quantidade de artigos importados esbanjavam nos seus anúncios as roupas brancas e enxovais, o que nos dá indícios que a “roupa debaixo” era toda branca, demonstrando sinal de limpeza e higiene oferecido pela brancura. As famílias de posses usavam grande quantidade de roupa branca no seu cotidiano, roupas de cama, mesa e banho, e também as próprias roupas dos homens, mulheres e crianças67.

Entretanto, na Paulicéia que se desejava moderna e civilizada, não bastava apenas se vestir com as “últimas novidades” vindas principalmente da Europa. Era preciso também incorporar essas novidades dentro das residências, “vestindo” também as casas e os espaços privados, que agora também deveriam ser mostrados e admirados. Desta forma, encontramos anúncios de estabelecimentos, como a Casa Netter (Figura 19), que comercializava artigos de prata, como faqueiros, lavatórios e conjuntos para chá, jóias e relógios, além de lançar um desafio anunciando que comercializava seus artigos com preços mais em conta que outras casas do ramo.

Por esta razão, ao que tudo indica a aparência passava a ser uma forma de distinção e, para ser considerado elegante e chique, as residências abastadas deveriam compor na sua decoração o luxo e o glamour propagado pelas lojas refinadas da cidade. Nesses anúncios as residências viram “homes” e devem ser guarnecidas com faqueiros de prata, jarras de cristal e serviços de chá para recepção dos convidados e, as salas de visita recebem porta retratos, almofadas e abajures importados.

60 Figura 19: A cigarra, edição nº 2 (30/03/1914)

Outro anúncio (Figura 20) que nos permite notar a preocupação com a decoração da residência é o da Casa Michel, dos irmãos Worms, localizado na Rua XV de novembro que, além das jóias de ouro, pérolas e diamantes, comercializava também peças para se mostrar, ou seja, artigos para decoração como, porta-retratos, vasos e licoreiras de cristal.

A Casa Bento Loeb (Figura 21), localizada na Rua XV de novembro, também destacava seus artigos para decoração, como estátuas, abajures e serviços de prata (faqueiros, baixelas, etc.), chamando atenção para a longevidade da casa, o que proferia a garantia dos objetos comercializados.

O Mappin Stores por sua vez exibia no anúncio (Figura 22) sua exposição de acessórios para sala, como abajures e almofadas de várias cores e modelos de fabricação própria, cuja finalidade era completar a decoração, principalmente da sala de visitas e

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