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Capítulo 3. FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES

3.2 A integração da tecnologia na formação inicial de professores de Matemática

3.2.2. Normas sobre o uso da tecnologia na formação inicial de professores

Para Krumsvik (2014) “há uma necessidade de desenvolver tanto fundamentos como modelos teóricos para uma compreensão mais profunda da competência digital na formação de professores” (p. 272). Deste modo, na última década, organizações internacionais têm proposto modelos que visam definir princípios ou normas sobre o uso

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da tecnologia pelos professores e, consequentemente, orientam a integração da tecnologia nos programas de formação inicial de professores. Por exemplo, a International Society

for Technology in Education (ISTE) apresenta cinco normas (ISTE, 2008), que são

amplamente usadas nos Estados Unidos da América, e que tem como destinatários os professores em formação inicial. Estas normas estabelecem que o professor deve:

i. Facilitar e inspirar a aprendizagem e a criatividade dos alunos. Os professores usam

seus conhecimentos sobre conteúdo, ensino, aprendizagem e tecnologia para facilitar experiências que promovam a aprendizagem, a criatividade e a inovação dos alunos tanto em ambientes presenciais como virtuais.

ii. Planear e desenvolver experiências de aprendizagem e avaliações da era digital. Os

professores planificam, desenvolvem e avaliam experiências autênticas de aprendizagem, incorporando ferramentas e recursos contemporâneos para maximizar a aprendizagem do conteúdo e desenvolver os conhecimentos, habilidades e atitudes dos alunos.

iii. Trabalhar e aprender dentro do modelo da era digital. Os professores exibem

conhecimentos, habilidades e processos de trabalho representativos de um profissional inovador em uma sociedade global e digital.

iv. Promover e modelar cidadania e responsabilidade digital. Os professores entendem

as questões e responsabilidades locais e globais da sociedade numa cultura digital em evolução e exibem um comportamento legal e ético nas suas práticas profissionais.

v. Envolver-se em crescimento profissional e liderança. Os professores aprimoram

continuamente a sua prática profissional, modelam a aprendizagem ao longo da vida e exibem liderança em sua comunidade escolar e profissional promovendo e demonstrando o uso efetivo de ferramentas e recursos digitais.

Um outro conjunto de normas que visam orientar o uso da tecnologia na formação inicial de professores é o framework de competências nas TIC para professores (UNESCO ICT Competency Framework for Teachers, ICT-CFT), apresentado e divulgado pela UNESCO (2008). Para esta organização é importante definir os princípios básicos que devem guiar o uso das TIC no ensino, acrescentando que “as TIC oferecem ambientes de aprendizagem envolventes e em rápida evolução, confundem os limites entre a educação formal e informal e estimulam os professores a desenvolver novas formas de ensinar e a permitir que os alunos aprendam” (UNESCO, 2008, p. 4). Este

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framework está organizado em três abordagens: alfabetização tecnológica (Technology Literacy), aprofundamento do conhecimento (Knowledge Deepening) e criação do

conhecimento (Knowledge Creation). Cada abordagem é composta por seis componentes: política, currículo e avaliação, pedagogia, uso da tecnologia, organização e administração da escola e desenvolvimento profissional; estabelecendo assim um total de 18 normas ou princípios sobre as competências dos professores em relação ao uso das TIC (Figura 3.3).

Figura 3.3. Framework de competências nas TIC para professores (UNESCO, 2008)

De forma geral, segundo UNESCO (2008), na primeira abordagem – alfabetização

tecnológica – espera-se que as competências dos professores incluam habilidades básicas

de alfabetização digital e cidadania digital, juntamente com a capacidade de selecionar e usar tutoriais, jogos, software de treino prático e a web. Os professores também devem poder usar as TIC para gerenciar dados de sala de aula e apoiar a sua própria aprendizagem profissional. Já na segunda abordagem – aprofundamento do conhecimento – as competências do professor incluem a capacidade de gerenciar informações, estruturar tarefas problemáticas e integrar ferramentas, como software, no ensino e na aprendizagem de conteúdos específicos mediante estratégias de ensino centradas no aluno. Também devem apoiar projetos colaborativos, para o qual os professores devem usar recursos em rede e baseados na web, poder usar as TIC para criar e monitorar planos de projetos dos alunos, bem como para colaborar com outros professores para apoiar a sua própria aprendizagem profissional. Finalmente, na terceira abordagem – criação do

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aprendizagem baseados nas TIC, usar as TIC para apoiar o desenvolvimento da criação de conhecimento e as habilidades de pensamento crítico dos alunos, apoiar a aprendizagem contínua e reflexiva dos alunos e criar comunidades de conhecimento para alunos e colegas. Eles também serão capazes de desempenhar um papel de liderança com os colegas na criação e implementação de uma visão da escola como uma comunidade baseada na inovação e na aprendizagem contínua, enriquecida pelas TIC.

Não obstante, a considerar os referenciais descritos anteriormente (ISTE, 2008; UNESCO, 2008), assim como outros relacionados com as normas e princípios que orientam tanto o uso da tecnologia por parte dos professores como a integração da tecnologia nos processos da sua formação, Costa et al. (2008) argumentam que os programas de formação inicial de professores ainda estão longe do que seria de esperar, identificando uma lentidão significativa em assumirem as tecnologias como objeto de reflexão pedagógica e de trabalho didático na preparação dos futuros professores. Os autores acrescentam que a deficiente preparação específica dos professores recém- formados para integrar efetivamente a tecnologia no ensino e na aprendizagem é uma das barreiras que impedem uma maior e mais efetiva utilização dos computadores nos processos educativos:

No caso da formação inicial, são diversos os autores que consideram deficitária e manifestamente insuficiente a preparação que aí é realizada, uma vez que o que as escolas de formação tipicamente oferecem se circunscreve à realização de um determinado curso ou conjunto de sessões de formação relacionadas com a aprendizagem das próprias tecnologias, não implicando necessariamente a sua utilização do ponto de vista curricular, pelos alunos (p. 42).

Deste modo, os autores apresentam um quadro referencial sobre as competências que os professores e futuros professores devem de desenvolver durante os seus processos de formação para integrar efetivamente a tecnologia no ensino e na aprendizagem dos conteúdos disciplinares correspondentes. Para os autores, “a competência refere-se ao que uma pessoa sabe e sabe fazer em circunstâncias ideais” (Costa et al., 2008, p. 57). Particularmente, a competência digital envolve a utilização segura e crítica das tecnologias, nomeadamente, o uso de dispositivos para recuperar, avaliar, armazenar, produzir, apresentar, trocar informação, comunicar e participar em redes de cooperação.

A competência digital alicerça-se, assim, nas competências gerais dos professores, nos seus conhecimentos prévios, de natureza científica e didática, adquirindo o seu grau de especificidade na situação

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pedagógica que medeiam. Isso permite a professores com diferentes formações, interesses e necessidades, adquirir as competências TIC requeridas, à medida do seu processo de desenvolvimento profissional (Costa et al., 2008, p. 57).

Neste quadro referencial, os autores definem três níveis de certificação das competências digitais dos professores:

i. Competências digitais. Competências focadas no conhecimento de ferramentas, de

procedimentos e capacidades técnicas. O professor utiliza instrumentalmente as TIC como ferramentas funcionais no seu contexto profissional.

ii. Competências pedagógicas com TIC. Competências centradas na integração da

tecnologia e da didática. Integra as TIC como recurso pedagógico, mobilizando-as para o desenvolvimento de estratégias de ensino e de aprendizagem, numa perspetiva de melhoria das aprendizagens dos alunos.

iii. Competências pedagógicas com TIC de nível avançado. Competências que se focam

na inovação, criação e investigação. Inova práticas pedagógicas com as TIC mobilizando as suas experiências e reflexões, num sentido de partilha e colaboração com a comunidade educativa, numa perspetiva investigativa.

Além disto, ainda dentro do pressuposto teórico destes autores e considerando que as crenças e conceções constituem um fator que influencia o processo de ensino e aprendizagem, especificamente no que diz respeito a aprender a ensinar com tecnologia, Costa et al. (2008) identificam cinco fases de desenvolvimento (Figura 3.4) pelas quais os professores passam à medida que vão substituindo, gradualmente, as suas crenças e conceções: entrada, adoção, adaptação, apropriação e invenção.

A observação das práticas dos professores ao longo de mais de uma década permite concluir que a introdução das tecnologias deve ser encarada como um processo gradual pelo qual os professores têm de passar, de forma a poderem realizar as mudanças que as próprias tecnologias sugerem e podem induzir (Costa et al., 2008, p. 44).

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Figura 3.4. Fases de desenvolvimento na utilização pedagógica da tecnologia (adaptado de

Costa et al., 2008, p. 44)

Um outro modelo, com alguma proximidade aos modelos anteriores, é proposto por Krumsvik (2014). Intitulado pelo autor como Digital Bildung ou Alfabetização Digital (Figura 3.5), este modelo pretende enquadrar as competências digitais dos futuros professores durante o seu processo de formação, no qual se define que a competência digital no contexto da formação de professores é a competência individual do futuro professor no uso das TIC. Este uso implica um bom julgamento pedagógico, consciência das suas implicações para estratégias de aprendizagem e a sua própria alfabetização digital. O autor acrescenta que a alfabetização digital dos professores é mais complexa do que a alfabetização digital de outros profissionais, pelo que:

A formação de professores precisa considerar o uso pedagógico das TIC e a competência digital para preparar os professores para a prática, mas também para desenvolver uma definição mais estreita de competência digital no nível individual e o que isso significa para a aprendizagem dos futuros professores durante a sua formação (Krumsvik, 2014, p. 273).

No centro da Figura 3.5 encontram-se três elementos principais: (i) habilidades

digitais básicas, associadas às habilidades para gerir informação e comunicar com outros;

(ii) competência didática nas TIC, referentes ao uso de ferramentas digitais no processo de ensino e aprendizagem mediante uma estratégia didática; e (iii) estratégias de

aprendizagem, consiste na capacidade do professor para identificar recursos que lhe

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Figura 3.5. Alfabetização Digital (adaptado de Krumsvik, 2014, p. 274)

O nível destes três elementos vai aumentando em função do domínio prático e da autoconsciência. Em relação ao domínio prático (eixo horizontal) o autor considera que o primeiro passo consiste na adoção de habilidades digitais básicas para posteriormente ascender a uma adaptação e apropriação dessas habilidades até se transformarem em competências didáticas nas TIC, finalmente espera-se que o professor consiga atingir a inovação. Quanto à autoconsciência (eixo vertical), começa desde o nível mais baixo no qual o professor não tem competência digital; a seguir – na adaptação – pode ter consciência digital, mas não tem a competência correspondente; já depois na apropriação espera-se que o professor tenha tanto consciência como competência digital; e finalmente, adquirir o nível mais alto no desenvolvimento tanto da sua consciência digital como da sua competência digital.

3.2.3. Estudos sobre a integração da tecnologia na formação inicial de professores