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OS LIVROS DE MEMÓRIA E A IDENTIDADE PETROLEIRA

2. Nos livros de memória

Essa pequena introdução sobre a identidade, ou as identidades, do petroleiro serve, ao menos, para enfatizar que essa identidade nem sempre foi igual. Os livros de memória, contudo, têm seu foco na permanência e, quando não enfatizam uma identidade abarcadora de todas as pluralidades, tendem a assentar as identidades em um contexto de harmonia. Quando tratam de conflitos, têm em meta sua amenização; quando reconhecem as diferenças, as consideram como diversidade. As identidades, tanto da empresa, quanto de seus trabalhadores, são enfatizadas como um continuum, permanente ao longo do tempo. Qualidades desejadas nos trabalhadores de hoje são reconhecidas em tempos remotos, e sobre o homem do presente é criada uma expectativa de ser o que sempre teria sido no passado.

No livro da unidade de Sergipe-Alagoas, quando o texto se refere à plataforma Sevan Piranema, inaugurada em setembro de 2007, na costa marítima de Sergipe – portanto, um acontecimento recente –, o texto busca no passado a característica que se mantém ao longo do tempo naquela unidade operacional e nos seus trabalhadores:

(...) o empreendimento veio reafirmar uma marca que tem caracterizado a atuação da unidade ao longo dos seus mais de 50 anos de existência: o

166 pioneirismo – o mesmo que levou às descobertas do maior campo terrestre do país, o de Carmópolis, em 1963, e do primeiro campo da plataforma continental brasileira, o de Guaricema, em 1968.

Pirarema também foi conduzida com paixão e inabalável determinação diante de obstáculos que em muitos momentos pareciam intransponíveis. O impulso de superar os desafios – um atributo definitivamente incorporado ao DNA corporativo da Petrobras – revelou-se um fator fundamental para o êxito do projeto. A sua realização demonstrou, mais uma vez, a forte presença do pioneirismo código genético da UN-SEAL. (PETROBRAS, 2009, p. 159-160)

O pioneirismo e a capacidade em superar desafios são atributos da unidade, atributos incorporados à companhia. E as características vistas na companhia e na unidade são, consequentemente, espelhadas nos trabalhadores, como veremos. O livro da unidade de Sergipe-Alagoas tem um capítulo todo dedicado à identidade do trabalhador da empresa, intitulado “Petroleiro, profissão desafio” (PETROBRAS, 2009, p.195). Aqui aparece o termo “petroleiro” ausente do restante do livro, talvez porque, nos outros capítulos, mais centrados na história do que na identidade, tenha-se procurado poupar na redação do uso de um conceito anacrônico para se referir ao trabalhador da atividade petrolífera. A epígrafe, recurso utilizado na abertura de todos os capítulos do livro, inicia-se com “Tenho orgulho de ser petroleiro”104 e o capítulo parece assumir como sua missão justamente explanar e demonstrar tal orgulho. O texto inicia-se com a narrativa da história de Benedito Jorge da Silva, conhecido por Dom Birro, considerado “um lutador”, por, a exemplo de outros, mesmo com pouca formação escolar, conseguir aprender as técnicas ensinadas pelos americanos, a ponto de, posteriormente, ser responsabilizado pela transmissão de seu conhecimento aos jovens engenheiros da empresa. Segundo o texto, Dom Birro é uma figura comum entre os outros trabalhadores da empresa, sendo todos “Brasileiros que se tornaram petroleiros sem qualquer formação técnica” (PETROBRAS, 2009, p197). E são estes igualmente marcados pela “A coragem, a competência e a dedicação”, considerados “traços

104 A epígrafe é uma frase de Samuel Cândido da Silva, técnico de operações. Transcrevo aqui a epígrafe

na íntegra: “Tenho orgulho de ser petroleiro, me sinto honrado de ter sido pioneiro dessa história. Se hoje temos um Brasil autossuficiente, isso teve o nosso suor e o nosso sangue”.

167 recorrentes entre aqueles que fizeram a história da Bacia de Sergipe-Alagoas” (PETROBRAS, 2009, p.197).

A primeira parte do capítulo é centrada em depoimentos de trabalhadores da empresa, sempre evidenciando as dificuldades enfrentadas para a realização de suas atividades. As moradias precárias, a alimentação fria e insípida, os difíceis meios de transporte e comunicação, a sujeição a chuvas e sujeiras, as barreiras linguísticas, devidas ao difícil convívio com trabalhadores estrangeiros, o atraso técnico de tempos remotos e a ausência de equipamentos de segurança apropriados, a distância da família e a constante necessidade de transferências são aqui parte de um cenário de pioneirismo e de superação de desafios. O texto toca em questões que podem ser consideradas espinhosas em uma releitura do passado, no que se refere aos direitos dos trabalhadores e às preocupações que hoje assumem a ordem do dia na companhia, como segurança do trabalho. O texto não fornece muitas informações sobre o contexto histórico para ajudar na compreensão dessa mudança cultural em relação às condições de trabalho, mas esclarece que as melhorias se deram por “iniciativa da empresa e por reivindicações dos trabalhadores”; cita algumas greves e algumas ações da empresa consideradas pioneiras em relação aos trabalhadores (PETROBRAS, 2009, p. 204). As condições difíceis do passado referendam o caráter “lutador” do empregado da companhia, mas, ao mesmo tempo, revelam situações consideradas hoje impróprias ao bem estar do trabalhador, narrativa possível, a meu ver, porque o passado é visto como algo já superado, sendo a única permanência no tempo a identidade. As condições de trabalho inadequadas não existem mais, o que existe é o trabalhador, sempre capaz de superar desafios.

Um trecho do depoimento de Roberto Theobald, gerente de Segurança, Meio Ambiente e Saúde (SMS), é inserido no livro para atenuar algumas dessas evidências de precariedade no ambiente de trabalho. Sua fala surge para permitir ao leitor apreender, sem manchas, apenas o que se deseja na construção narrativa:

Se não atentarmos para o contexto da época, aquelas condições vão parecer absurdas, mas tudo tem seu tempo, tem seu ritmo de evolução. Na época, era a condição que se tinha, era o que se podia fazer naquelas condições pioneiras que o desbravamento do setor petrolífero exigia. A mudança de postura veio com a mudança do patamar cultural, da mentalidade da própria sociedade. Nós fomos evoluindo também nesses aspectos. (PETROBRAS, 2009, p.212)

168 O capítulo dedicado aos “petroleiros” tem uma ruptura interna que o divide em dois momentos: uma parte com imagens em preto e branco e outra com imagens coloridas, sendo a segunda marcada pelo uso de equipamentos de segurança e por conforto no ambiente de trabalho. Nesse capítulo, pela primeira vez no livro, algumas legendas são acompanhadas também por textos em caixa alta, como se as imagens e legendas objetivas, à maneira como vinham sendo utilizadas no livro, não fossem suficientes para se transmitir a mensagem desejada e esvaziassem o conteúdo presente nas imagens. Para se ter dimensão das mensagens escritas em caixa alta, transcrevo-as aqui; primeiro aquelas que acompanham algumas legendas das fotos em preto e branco:

Grandes laços de amizades duradouras nasceram das atividades de trabalho, normalmente realizadas pelos pioneiros em condições extremamente duras. (PETROBRAS, 2009, p. 206)

O espírito de equipe e a cooperação se firmaram como marcas das relações profissionais e pessoais naqueles primeiros anos. (PETROBRAS, 2009, p. 208)

A descontração, o bom humor e a alegria extravasam nos momentos de lazer, durante os períodos de folga. (PETROBRAS, 2009, p. 209)

Como se vê, nas mensagens que acompanham as legendas das imagens do passado, em preto e branco, ressaltam-se o bom clima de trabalho e os relacionamentos entre os trabalhadores. Nas imagens atuais, em cor, as mensagens que acompanham as legendas seguem outro rumo, como se vê nas citações abaixo.

A Petrobras destaca-se como uma das empresas que mais investem em capacitação. Cerca de mil pessoas são treinadas diariamente na universidade corporativa, nos campi do Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo. (PETROBRAS, 2009, p. 211)

As ações simuladas, previstas no avançado sistema de segurança da Petrobras, são executadas regularmente pela Un-Seal [Unidade Operacional de Sergipe-Alagoas], como preparação para eventuais emergências (PETROBRAS, 2009, p. 213)

As condições de trabalho registraram notável evolução, no quesito segurança e comunicação, nas unidades de Sergipe e Alagoas. (PETROBRAS, 2009, p. 214)

169 O trabalho feminino se afirma numa área industrial antes exclusivamente masculina. (PETROBRAS, 2009, p. 215)

A preocupação com um ambiente saudável de trabalho e com a qualidade de vida do trabalhador tem sido uma constante nas iniciativas da companhia, o que se traduz na promoção de atividades ligadas à cultura, lazer e esporte. (PETROBRAS, 2009, p. 216)

A realização profissional e a interação positiva com a empresa explicam os elevados índices de satisfação registrados nas pesquisas de ambiência organizacional aplicadas entre os trabalhadores da Petrobras. (PETROBRAS, 2009, p.218)

Esses textos remetem ao investimento da empresa em formação profissional, em sistema de segurança para prevenção de acidentes de trabalho, em condições adequadas à presença feminina em ambiente operacional, em promoção de atividades culturais e esportivas para o trabalhador e em bons resultados na pesquisa de ambiência. Ou seja, se, no passado, ressalta-se o bom clima de trabalho proporcionado pelos próprios empregados, no presente, ressaltam-se as iniciativas da empresa para a garantia de tal satisfação. As imagens em preto e branco marcam o passado, o tempo dos pioneiros, cuja maior contribuição teria sido a consolidação de uma cultura corporativa, enquanto as imagens coloridas marcam o presente, tempo de respeito aos trabalhadores e de garantia de sua segurança. Na cor, evidencia-se a resposta da companhia ao que o mercado de trabalho e os direitos dos trabalhadores têm exigido a uma empresa moderna e socialmente responsável, colorido presente em muitos outros livros de memória da companhia.

Ainda no livro da unidade de Sergipe-Alagoas, ao fim do capítulo dedicado aos “petroleiros”, o texto rompe, em dois parágrafos, com o tom de linguagem utilizado até então e busca interpretar os depoimentos coletados em seu conjunto, de forma a conectar a identidade do trabalhador com a identidade da Petrobras.

A diversidade de depoimentos afunila sempre para a unanimidade, quando se trata do vínculo e da admiração pela Petrobras. Entre os funcionários e ex-funcionários, são muitas as respostas para tentar explicar essa ligação. Coesão, garra, determinação, empreendedorismo, são algumas das palavras que utilizam ao tentar definir a empresa.

170 Há os que localizam a origem da identificação na defesa da nacionalidade, que acompanha a empresa desde o movimento “O petróleo é nosso” até a atualidade, com a descoberta das jazidas do pré-sal. Assim como para seus empregados, no imaginário coletivo dos brasileiros a estatal continua sendo percebida como um patrimônio da nação, ainda que se constitua juridicamente em empresa mista de capital aberto, com ações negociadas em bolsas de valores internacionais. (PETROBRAS, 2009, p. 219)

A identidade do “petroleiro” é fundida à identidade da empresa, sendo que ambas possuem as mesmas qualidades. E os trabalhadores da unidade operacional, assim como a própria unidade operacional, são entendidos como a parte de um todo, em plena conformidade:

O expressivo saldo das conquistas e realizações acumuladas nesses mais de 50 anos de existência da UN-SEAL e os depoimentos dos que fizeram essa história atestam que também em Sergipe e Alagoas a Petrobras afirmou a sua vocação para o desafio, assegurando igualmente à vontade humana a possibilidade de ultrapassar fronteiras por meio do trabalho. (PETROBRAS, 2009, p. 219)

A referência aos trabalhadores de outrora como os pioneiros, submetidos a um contexto adverso e exótico em relação à atualidade é uma recorrência nos livros de memória aqui analisados. No livro da unidade da Bahia, os trabalhadores da nascente indústria petrolífera são retratados como verdadeiros propulsores da modernidade, “impetuosos pioneiros”, como afirma o texto, sujeitos que dividiam a história em duas partes, galgando para si o lugar de ponto divisor: “Os que transitavam apressados, com as atenções voltadas para o subsolo, eram agentes da história, porque carregavam, cada um e todos, a responsabilidade de conduzir a nação a seu destino de nação petrolífera.” (PETROBRAS, 2012a, p.14). A precariedade do trabalho é evidenciada em outras passagens do livro, que faz uso de depoimentos para dar vida aos desafios enfrentados pelos trabalhadores, como o trecho baseado no depoimento de Bráulio Moreira da Silva, que “começou a vida de petroleiro” na função de plataformista:

Na memória, ele conserva o quadro de grandes carências e riscos: os colchões de palha para abrigar 10 pessoas no mesmo espaço, a refeição geralmente fria e a falta de botas ou óculos protetores. O contato com a soda

171 cáustica da lama química, usada no processo de perfuração, acabou por lhe afetar parcialmente a visão. (PETROBRAS, 2012a, p. 33-34)

O trabalhador, portanto, carrega no próprio corpo as marcas de uma atividade perigosa, mas, não por isso, abala sua determinação e engajamento na missão de encontrar petróleo no Brasil:

Trabalhando em tempos de austeridade e comprometido com a causa da construção da indústria petrolífera brasileira, desde cedo Bráulio combateu o desperdício de materiais (...). Ainda mais inaceitável para ele era o desperdício de tempo. Guiando-se pelo lema “a sonda não pode parar”, que orientou os trabalhos naqueles primeiros anos, ele nunca permitiu que uma sonda sob seu comando parasse, mesmo frente a pressões sindicais, que rejeitava, taxativo: “Sonda minha não para, ela vai furar direto”. (PETROBRAS, 2012a, p. 34)

O livro da unidade da Amazônia não escapa desse retrato do trabalhador da atividade petrolífera, capaz de superar desafios para encontrar o petróleo esperado pela nação. A narrativa destaca a dificuldade do exercício da tarefa desse trabalhador em meio à floresta amazônica e avultam, como característica desse homem, as qualidades de “precisão, paciência e esperança” (GARCIA, 2010, p. 34), necessárias à superação dos desafios impostos pela natureza. Eram trabalhadores que faziam longos percursos a pé, em meio à floresta (GARCIA, 2010, p. 37), e sempre preocupados com a preservação da natureza, guiados por uma técnica precisa:

A cada cinco quilômetros era montado um novo acampamento. Quando se concluíam os trabalhos em determinada área, as equipes de apoio desmontavam os alojamentos improvisados e deslocavam-se para montá-los em outros locais indicados para a prospecção sísmica, abrindo novas picadas na selva, cuidando em não derrubar as árvores e em preservar a capacidade de recomposição natural da cobertura vegetal.

O trabalho das equipes obedecia ao ritmo de precisão que caracteriza a aplicação sísmica (...). (GARCIA, 2010, p. 38)

Três páginas do livro, muito bem ilustradas, são dedicadas ao “Expressinho Urucu”, uma invenção atribuída a Mauro Martinez Marques e sua equipe da gerência de Transportes, que inaugurou o uso do transporte fluvial nas operações de Urucu. O

172 peculiar destaque que se dá a tal invenção talvez se deva ao fato de ela conciliar duas características caras à narrativa do livro. A invenção revela a criatividade do trabalhador e o uso da tecnologia, entendida como timbre da atividade da companhia na região.

O foco na tecnologia é evidente em muitos livros de memória da Petrobras. O texto do livro da unidade de Sergipe-Alagoas, ao se referir ao processo de modernização de Alagoas, coloca os trabalhadores da exploração petrolífera na região como personagens que trazem, em sua tarefa, uma contribuição a essa modernização:

Os elementos novos na paisagem eram os portadores de utopia. Homens com os pés firmemente arraigados ao chão, mas atraídos por uma ideia fixa. Por isso a observação tão persistente da paisagem, a determinação no olhar, a firmeza dos gestos, a tensão, o esforço e a entrega naquilo que faziam. A perícia na execução das tarefas denunciava a condição de profissionais especializados. Mas a missão que cumpriam era mais do que técnica. Estavam ali com a imensa responsabilidade de realizar a utopia. E esta não era apenas deles, era de todo o povo brasileiro, que teimosamente insistia no sonho de tornar o Brasil uma nação petrolífera. (PETROBRAS, 2009, p. 19,21)

O trabalhador da Petrobras é pintado como aquele que trabalha em uma atividade peculiar, de controle da natureza, possível apenas com rigor técnico e tecnologia. Ainda no livro da unidade de Sergipe-Alagoas, são desenhadas as figuras do engenheiro do petróleo e do geólogo, sempre nessa leitura de desafios impostos pela natureza e o uso da técnica. As qualidades do profissional são destacadas e atribuídas a uma qualidade da empresa:

Movimentando-se com desenvoltura no plano da materialidade e no terreno da lógica, esses profissionais delimitam o universo do possível numa atividade de risco, aquilatando com precisão as variáveis envolvidas, definindo os elementos que irão assegurar a viabilidade de cada intervenção e finalmente executando a ação. (...)

Essa capacidade de racionalização e de realização define igualmente, na sua essência, a atuação da Petrobras. Por intermédio da engenharia, a companhia busca assegurar o acesso às reservas petrolíferas localizadas a milhares de metros de profundidade, bem como a sua retirada do subsolo, o que equivale

173 a dizer que, nos tempos de pioneirismo como na atualidade, o êxito de cada novo empreendimento se medirá sempre pelo resultado dessa operação. (PETROBRAS, 2009, p. 68)

O mesmo ocorre com a descrição do geólogo:

(...) Naquele momento crucial da empresa, a responsabilidade se concentrou em um profissional que, juntamente com o engenheiro, se tornou uma espécie de figura-símbolo das atividades de exploração e produção da companhia. (...)

Essa largueza e profundidade de visão não atenuam, entretanto, o grau de dificuldade, imprevisibilidade e risco da atividade. Como o objetivo do seu interesse se encontra num plano invisível, a milhares de metros de profundidade da superfície terrestre ou marítima, ele trabalha sempre com a capacidade de abstração, criando hipóteses, projeções simulações. Ainda que amparado, como na atualidade, em recursos tecnológicos que lhe facilitam a interpretação de dados, diante de cenários promissores, o geólogo estará sempre frente a incertezas. Noutras situações, diante de contextos improváveis, estará diante de possibilidades. (PETROBRAS, 2009, p. 25)

Como no livro da unidade de Sergipe-Alagoas, o texto do livro da unidade da Bahia inicia, embora mais brevemente, com ênfase na característica rural, ainda à espera da industrialização. Segundo o texto, o recôncavo baiano estava “praticamente incontaminado pelo processo industrial – um atributo do Brasil moderno que tardava a chegar à Bahia, como reclamavam os homens públicos daquela época” (PETROBRAS, 2012a, p. 13). Diante deste contexto, as equipes que procuravam petróleo na região eram, em verdade, os portadores do desenvolvimento:

A década de 1940 trouxe novidades. Nos caminhos de terra se via passar agora turmas de geólogos sacolejando dentro de Jeeps, equipes de geofísica abrindo acessos com tratores, levando pesados equipamentos montados sobre caminhões. De vez em quando, a explosão de cargas de dinamite, e, no solo, aparelhos captando os abalos sísmicos. Em seguida viria muito mais gente, carros, equipamentos maiores, e então se ouviram as vibrações

174 da broca perfurando o subsolo, as estocadas das sondas no fundo da terra. (PETROBRAS, 2012a, p. 13)

Os sons, as pessoas, os equipamentos e veículos que adentravam o Recôncavo naquele momento eram parte de um projeto antigo e ambicioso, que finalmente começava a se concretizar. Naqueles ermos, começava a ganhar contornos de realidade um empreendimento grandioso, que envolvia interesses diversos, porém ancorados por um interesse maior, uma aspiração nacional que tinha pressa em se realizar. Estava em implantação ali a indústria brasileira de petróleo. (PETROBRAS, 2012a, p. 14)

O livro da unidade da Bahia, a exemplo do da unidade de Sergipe-Alagoas, recorre a imagens de equipamentos e de trabalhadores para compor o cenário do início da atividade petrolífera na região, num período ainda anterior à criação da Petrobras. Compõe o primeiro capítulo com imagens de um carro sonda, de equipamentos com dificuldade de trânsito, juntas de boi no auxílio do transporte, um trabalhador admirando a sonda e o marco histórico do considerado poço pioneiro de Lobato. Nessas imagens constrói-se uma narrativa que parte da novidade dos equipamentos petrolíferos, passa pela determinação dos trabalhadores e chega à meta alcançada, a identificação de petróleo em solo brasileiro (PETROBRAS, 2012a, p. 14-15).

Entre as imagens exibidas no livro de memória da Bahia, uma contém a assinatura de Getúlio Vargas sobre a emulsão fotográfica. Trata-se de uma imagem “clássica”, muito utilizada em produtos de memória na Petrobras. Getúlio Vargas aperta a mão banhada de petróleo de um trabalhador das operações petrolíferas. O que estende a mão ao presidente é Haroldo Ramos e tem seu nome na legenda, precedido de sua profissão “engenheiro”; trata-se do homem mais alto e, no ângulo da foto, parece até desproporcional em dimensão, quando comparado aos demais. Homem grande, branco e de bigode, o único de capacete, o que o identifica como trabalhador, mas não qualquer trabalhador, um engenheiro e brasileiro. Todos na foto sorriem e Getúlio, também, com seu costumeiro sorriso, tem a face voltada para baixo e os olhos fechados. O