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Não é fácil num “pequeno” capítulo estipular princípios base de como escrever um argumento e ferramentas, mecanismos, que ajudam na sua construção. Há tantos livros inteiros com páginas e páginas sobre como escrever guiões, e aqui estamos a tentar dizer tudo num só capítulo? Por isso mesmo, não tentámos dizer tudo, estabelecer tudo, fazer um ABC de escrita de argumento. Procurámos, em vez disso, fazer uma viagem pelo mundo de escrita de argumento, oferecer ferramentas, mapas possí- veis para esta viagem do argumentista, e dar conselhos. Agora, cada um pode tomar estes conselhos e mapas da maneira como mais lhes aprou- ver, criando e construindo novas rotas, reconstruindo, apagando… Por- que escrever argumentos é isso mesmo, um processo orgânico, um jogo, quase nunca linear e nunca com fases estanques.

Para finalizar, alguns últimos conselhos breves: nunca escrevam uma longa-metragem se nunca escreveram uma curta; comecem pelo formato

Ana Sofia Pereira

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mais curto, descubram o vosso estilo, a vossa voz, e depois disso sim, passem para a longa ou série. Se puderem, escrevam só aquilo de que gostam; se não puderem, apaixonem-se por aquilo que escrevem. Es- crever um argumento é maravilhoso, mas é horrível, é cansativo, vão ter pessoas a dizer-vos para não ir por aí, vão ter problemas que não sabem resolver e, ou são apaixonados pela história, pelas personagens, pelo trabalho, ou o argumento nunca vai ser finalizado. Não cortem ca- minhos, percorram o caminho que querem percorrer, mas não apressem o trabalho, não viciem o jogo: dêem tempo ao argumento, deixem-no percorrer a sua jornada para que se torne sólido. Aprendam a cortar, a ser críticos, a deixar ir, a errar e a reescrever. É normal, isso não faz de ninguém um mau argumentista, faz de nós óptimos argumentistas. Não há argumentos / guiões perfeitos. Há sempre pormenores, detalhes, um fio de cabelo que hoje ou daqui a uns anos gostávamos de ter mudado. É normal. Mas isso nunca nos deve bloquear, só impulsionar a fazer me- lhor, desta vez e para a próxima. Por fim, habituem-se à ideia de que o argumento é um objecto mutável, um castelo de areia ao vento. Se forem os realizadores do argumento, esse castelo está nas vossas mãos (mas irá ainda assim alterar-se), se não, construam os alicerces do castelo de for- ma a que este seja o mais forte possível e depois, deixem-no ir... Mesmo que o argumento / o castelo mude com o vento, há de se aguentar de pé, não há de ruir.

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Notas

1 Para o esquecimento do objecto do argumento e do argumentista, contribui também a emergência da Teoria de Autor no início dos anos 50. Em Portugal, onde o cinema de autor ainda hoje impera, temos uma forma distinta de ver e de trabalhar com argumentos, estes não funcionam exactamente como objectos autónomos. Ainda assim, neste capítulo, tentaremos oferecer ferramentas e estratégias para a escrita de argumentos autónomos que poderão ou não ser realizados pela mesma pessoa e que poderão funcionar em Portugal ou em qualquer lado do mundo.

2 Sobre a questão da nomenclatura do argumento / guião, escreve Paulo Filipe Monteiro de forma mais clara e extensa na sua tese de doutoramento orientada pelo Professor Eduardo Lourenço “Os argumentos da ficção cinematográfica portuguesa desde os anos sessenta até aos nossos dias”.

3 Paradigma do argumento: conceito desenvolvido por Syd Field que diz respeito à estrutura dos guiões e que estandardiza os elementos da estrutura do argumento: divisão em três actos (apresentação, confrontação e resolução), número ideal de páginas de um argumento (120), localização dos plot points. Estes parâmetros analisados e estandardizados por Syd Field, que ajudariam a criar um melhor argumento, são usados, ainda hoje, como modelo de estrutura para os guiões de Hollywood.