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1. CONTRA-HEGEMONIA, MEDIAÇÃO E APROPRIAÇÃO SOCIAL

2.4 NOTAS SOBRE A URBANIZAÇÃO BRASILEIRA

O processo de urbanização no Brasil tem que ser analisado a partir da falta de políticas de distribuição das terras no início da colonização da América Latina. Em países como o Brasil, onde nunca houve reforma agrária, fica claro que a terra sempre foi encarada como valor de troca. Mas com o avanço do capital, faz-se necessário concentrar a produção dando mais impulso à urbanização. De forma mais abrangente, a produção e o consumo do espaço, assim como a urbanização, estão inseridos no amplo processo de reprodução das relações sociais.

No Brasil a população urbana saltou de 18,8 milhões (26,3% do total) em 1940 para 138 milhões (81,2% do total) em 2000, um aumento de 135 milhões na carga de

habitantes urbanos em 60 anos; apenas na última década do século XX a população urbana brasileira cresceu em 22.718.968 habitantes – mais da metade da população do Canadá ou um terço da população da França (MARICATO, 2000).

Nas últimas décadas o Brasil passou de ser eminentemente rural para ser urbano, já que atualmente a maioria da população brasileira encontra-se na cidade. Sendo as capitais dos estados mais atraentes para esses setores que saíam do campo à procura de emprego e de novas condições de vida – devido também à revolução verde –, gera-se uma grande ampliação espacial das cidades com essas características. A cidade vai crescendo, mas pelas suas características históricas locais - à instalação de empresas em determinados lugares devido à isenção fiscal desde a década de 1970, havia uma tendência à concentração dos postos de trabalho em algumas regiões ou bairros. Com o avanço e o surgimento de novas empresas, e muitas vezes graças à própria especulação imobiliária, os preços dos imóveis nessas localidades ou próximos a elas tornam-se mais caros, então, impossibilitados os trabalhadores são condicionados a morarem nas zonas mais longínquas do centro da cidade.

Concentrando muitos trabalhadores formais e informais, muitos sem casa e alguns poucos com moradias insalubres, o Estado brasileiro começa a planejar uma política de urbanização e habitação popular. Segundo Maricato (2001), durante o governo militar (1964- 1985) foram criados o Banco Nacional de Habitação (BNH) e diversas Companhias de Habitação iniciaram um processo de urbanização e construção de moradias populares nas cidades. Mas esse processo fortalecia às grandes construtoras e a especulação imobiliária. O projeto desenvolvimentista não alterava o centro da questão sobre a cidade. Em 1986, o banco foi extinto e sua atribuição foi transferida à Caixa Econômica Federal.

O fim dos projetos de habitações na década de 90 compreende o processo de reestruturação produtiva que leva a privatizações e a terceirizações profundas nos países da América Latina, cresce o trabalho informal com reduzidos salários somado à retirada de direitos. Mesmo através dos investimentos estrangeiros diretos, o que as grandes corporações fazem é movimentar-se entre os Estados, pagando menores impostos e contratando trabalhadores informais. Segundo os pesquisadores do Banco Interamericano de Desenvolvimento, a economia informal emprega atualmente 57% da força de trabalho latino- americana e oferece quatro de cada cinco novos empregos.

Em outras palavras, a tendência macroeconômica real do trabalho informal é a reprodução da pobreza absoluta. Mas, se o proletariado informal não é a menorzinha das pequenas burguesias, também não é um ―exército de reserva de mão-de-obra‖ nem um ―lumpemproletariado‖, em nenhum dos sentidos obsoletos do século XIX. Parte dele, é verdade, é uma força de trabalho invisível da economia formal, e

numerosos estudos já mostraram como as redes de terceirização da Wal-Mart e de outras megaempresas penetram profundamente na miséria das colônias e chawls. Mas no fim das contas a maior parte dos favelados urbanos, radical e verdadeiramente, não encontra lar na economia internacional contemporânea (DAVIS, 2011, p. 211).

Com menor arrecadação, o Estado brasileiro paralisa por décadas a priorização de políticas de construção de moradias urbanas. Depois de treze anos de movimentações de urbanistas, arquitetos, intelectuais, ONGs – também criadas nesse contexto de redução dos direitos sociais – e movimentos sociais, a política de urbanização, que era centralizada na esfera federal foi transferida para a esfera municipal. O Ministério das Cidades e o arcabouço legal do Estatuto da Cidade (2001) surgem como direção de um novo processo institucional de urbanização a partir de uma perspectiva que abre margem para contestação dos projetos de cidade (MARICATO, 2013).

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2007; 2007-2011) – com Dilma Rousseff na Casa Civil – lança em 2007 o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), como a grande plataforma de desenvolvimento do país. Em um cenário de crise econômica mundial, o PAC 1 (2007-2011) minimiza os efeitos da crise financeira e apresenta- se como uma política conjunta ao projeto de habitação popular ―Minha casa, minha vida‖ (MCMV) iniciado em 2009. Com a inserção do Brasil em uma agenda mundial de megaeventos, como a Copa do Mundo (2014) e as Olimpíadas (2016), os capitais da construção civil orientaram-se na captação dos recursos públicos interessados no lucro da construção das habitações populares. Em 2005, o crédito imobiliário para construção e aquisição no país era de 4,8 bilhões, no ano de 2014, passou para 102 bilhões de reais. Paradoxalmente, o problema da habitação popular, mesmo com a construção de dois milhões de casas pelo programa, o déficit habitacional passou de 6,8 milhões de famílias, para apenas 6,2 milhões 8. Ou seja, a construção de mais casas não necessariamente resolve o problema da habitação, mas no caso do programa MCMV, enriqueceu mais ainda os capitais da cidade e reordenou a malha urbana para jogar os pobres para cada vez mais distantes dos centros.

A formação urbana capitalista é uma fábrica de sem-teto. Esse processo de segregação limita a possibilidade do trabalhador adquirir sua casa no centro, obrigando com o que o mesmo ocupe terrenos na periferia e construa as favelas.

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Cidades Rebeldes- Ganhar e perder a vida na periferia da periferia do capital" https://www.youtube.com/watch?v=pSLXCSO1XPs