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Novas estratégias, mesmos fins: pensando o Sistema Penal contemporâneo à luz de

foucault

Sophia de Lucena prado1

introdução

A ciência sempre foi percebida como a portadora da verdade por excelência, como objeto privilegiado de saber, como se a sua cons- trução não estivesse diretamente relacionada a uma série de disposi- tivos de poder que fazem exigências e desenvolvem mecanismos para a consecução destas. Afinal, o poder produz saber e vice-versa e am- bos não apenas refletem uma realidade como a produzem também. Foi o que Foucault (1987) defendeu ao afirmar que “não há relação de poder sem constituição correlata de um campo de saber, nem saber que não suponha e não constitua, ao mesmo tempo, relações de po- der” (FOUCAULT, 1987, p. 27).

A partir dessa compreensão, pretendemos pensar o Direito Penal brasileiro como um dispositivo de poder-saber, com o fim de com- preender os rumos que este vem tomando nos últimos tempos, tão diferentes daqueles a que ele, supostamente, se propõe a perseguir. A ideia, portanto, não é pensar seu conteúdo material, mas o modo

1 Mestra em Antropologia Social pela UFRN, especialista em Teoria Geral do Crime pelo IBCCRIM e pela Universidade de Coimbra, graduada em Direi- to pela UFRN, advogada criminalista.

pelo qual ele se constituiu, como se formaram seus atuais alicerces, a fim de refletir sobre as consequências dos efeitos de verdade a ele atribuídos.

Evidentemente, até pela limitação do artigo, não esperamos aqui fazer uma genealogia do Direito Penal brasileiro, como seria o mé- todo foucaultiano, mas tão somente refletir sobre algumas das téc- nicas, táticas, estratégias, mecanismos, relações e dispositivos que, atualmente, lhe dão suporte e outros que possibilitaram a sua consti- tuição tal qual ele existe hoje.

Fundamental, portanto, destacar que, dentre os inúmeros dis- positivos de poder-saber que interferem diretamente nos rumos do Direito Penal, trabalharemos apenas alguns deles, muitos dos quais estão diretamente relacionados ao sistema de produção capitalista, não porque acreditamos que tudo, necessariamente, decorra dele, mas tão somente porque, inseridos nesse formato de organização so- cial em que vivemos, simplesmente não poderíamos negar sua cru- cial interferência.

Novas realidades, novas necessidades

Desde Rusche e Kirchheimer2, o caráter político dos sistemas pu-

nitivos e a sua relação com os sistemas de produção em que estão inseridos vem sendo evidenciados. Entretanto, apenas em Foucault (1987), é que se poderá identificar o que ele denominou de “econo- mia política dos corpos”, um investimento político com vistas à sua utilização econômica. Estes corpos, atravessados por relações de po- der, foram se constituindo como um novo campo de saber de modo que as práticas penais passaram a ser vistas muito mais como um tó- pico de uma “anatomia política” do que uma mera consequência do

desenvolvimento das “teorias jurídicas”. Assim, percebeu-se que as relações de poder e saber se retroalimentavam de modo que as teo- rias jurídicas, como campo de saber, e, consequentemente, os siste- mas punitivos delas decorrentes, não poderiam ser compreendidas sem que se considerassem as relações de poder que as permeavam.

O que Foucault vem demostrar, em Vigiar e Punir (1987), é que, ao contrário do discurso ingênuo de que a diminuição dos suplícios como prática punitiva no Estado moderno teria sido uma decorrên- cia de uma maior sensibilização por parte da população, esta teria se dado em função de uma necessidade de adequar os mecanismos de punição a uma nova realidade social. Surgia uma necessidade de vigilância que fosse atenta não apenas ao indivíduo delituoso, mas a todo o corpo social, exigindo uma política de controle mais eficaz e menos custosa econômica e politicamente. Não se tratava, portanto, de “punir menos”, mas de “punir melhor”.

O que isso acabou demonstrando foi que, cada vez que se instaura um novo modelo de organização social, torna-se necessário, tam- bém, uma atualização das formas de punir do Estado, bem como das leis que lhe dão suporte. A partir desse momento ficava claro que as elaborações legislativas, enquanto decorrência e fundamento de de- terminados campos de saber, não são meras formulações despreten- siosas e desinteressadas, mas resultado de um intenso processo que envolve a atuação de incontáveis dispositivos de poder, alguns dos quais buscaremos identificar no decorrer deste artigo.

Apesar do exposto, grande parte dos princípios decorrentes do Iluminismo ainda permeiam as legislações ocidentais até os dias de hoje de modo que, para o discurso jurídico oficial, a lei continua sen- do percebida como uma determinação neutra e imparcial. Isso fica muito evidente quando se observa que, muitas vezes, atribui-se à própria lei uma ideia de justiça, como se esta, em qualquer circuns-

tância, representasse a manifestação do correto, da retidão. É evi- dente que, no Brasil, a queixa de que “o problema é a lei” ainda é comum, mas, em regra, ela parece estar imbuída de um manto de au- toridade, assumindo uma posição hierárquica tal que a coloca acima e à frente de tudo e de todos. Desenvolve-se, então, no imaginário social, a falsa ideia de que a lei positivada, apesar de artificialmente criada e, muitas vezes, arraigada de conceitos tendenciosos, deter- mina aquilo que se passa a assumir como verdade universal.

Foucault (1987) percebeu a falha desse modo de pensar o Direito em um estudo voltado para um local e uma época específicos. Novas realidades, porém, vão fazendo surgir novos mecanismos de otimi- zação dessa economia política dos corpos, os quais passaremos a ex- por ao longo deste artigo.

o surgimento de uma classe economicamente descartável

Callegari e Wermuth (2010) chamam atenção para o fato de que, com o advento das novas tecnologias de produção, prescinde-se dos “corpos dóceis” aos quais se referia Foucault (1987). Isso porque o trabalho que outrora era realizado, exclusivamente, por meio da for- ça física, ao ser automatizado, teria levado enormes contingentes hu- manos a se tornarem, de uma hora para outra, “corpos supérfluos”. Assim, restariam absolutamente disfuncionais ao sistema produtivo moderno porque não suficientemente qualificados para operar essas novas tecnologias ou porque sua força de trabalho tornou-se, de fato, inútil. É evidente que o argumento dos autores não problematiza a reapropriação que se deu a essa força posto que a mão de obra barata continua sendo explorada. Além disso, segundo esta lógica, a “eco- nomia dos corpos” pensada por Foucault (1987), restaria reduzida a um viés meramente economicista, que acreditamos não ter sido a in- tenção original do autor.

O fato é que o posicionamento de Callegari e Wermuth (2010), apesar de aparentemente criticar o pensamento foucaultiano, na verdade, o reafirma, porque o que Foucault vem defender é que toda teoria é construtiva, dialógica e historicamente situada, como fica claro em grande parte dos seus livros e nos esclarece Roberto Macha- do (1984), na introdução de Microfísica do Poder (1984), ao afirmar que para Foucault:

Toda teoria é provisória, acidental, dependente de um estado de desenvolvimento da pesquisa que aceita seus limites, seu ina- cabado, sua parcialidade, formulando conceitos que clarificam os dados – organizando-os, explicitando suas inter-relações, desen- volvendo implicações – mas que, em seguida são revistos, refor- mulados, substituídos a partir de um novo material trabalhado (MACHADO, 1984, p.11).

Foucault, portanto, não imprimia às suas conclusões um status de verdade absoluta e inalterável, mas, ao contrário, afirmava a dinami- cidade social e a sua influência sobre aquelas. Assim, o que se busca a partir desse estudo, muito mais do que utilizar suas conclusões, é reproduzir suas perguntas com o fim de encontrar novas respostas para novas realidades.

Neste sentido, a crítica exposta importa para pensar que estamos vivendo uma nova realidade, o que modificou a lógica interna dos mecanismos de punição, fato que precisa ser ponderado para que se possa alcançar uma compreensão consistente sobre o que está por trás dessa mudança e dos efeitos que ela tem gerado.

Na economia de mercado, alguns indivíduos passam a ser identi- ficados como consumidores falhos que, segundo Costa (2011), cons- tituem justamente o público preferencial do sistema penal3. Para

3 Foucault (1989) já identificava direcionamentos semelhantes nos proces- sos de recrutamento da delinquência.

estes, então, só restaria a segregação, seja pela via da marginalização social e espacial (em favelas e bairros periféricos) seja por meio do encarceramento ou da eliminação pura e simples, a partir da inter- venção violenta do aparato policial.

Em sentido semelhante, Bauman (1999, p. 119-120) aduz que “o confinamento é antes uma alternativa ao emprego, uma maneira de utilizar ou neutralizar uma parcela considerável da população que não é necessária à produção e para a qual não há trabalho ao qual se reintegrar”. Assim, o cárcere surgiria, nesse contexto, como uma forma de resolver o problema do ser excedente à lógica do capital. Granduque José afirma, ainda, que:

Na sociedade de consumo o controle penal, que na sociedade indus- trial valia-se de uma disciplina fabril, abandona o propósito de ma- ximização da força do corpo em termos econômicos de utilidade, ao mesmo tempo em que exorbita a redução dessa mesma força em ter- mos políticos de obediência dócil.

[...]

Em outras palavras, o sistema penal, cuja passagem maciça na socie- dade industrial era constituída por “fábricas de disciplina”, na socie- dade pós-industrial passa a ser habitado por “fábricas de exclusão”, destinadas tão somente a conter e neutralizar os “refugos humanos” (GRANDUQUE JOSÉ, 2011, p. 222).

Nesse diapasão, nota-se que enquanto as antigas casas de corre- ção europeias “limpavam” as cidades com o propósito de, por meio do trabalho forçado, tornar este excedente útil economicamente ao passo em que se reafirmava o valor social desta atividade, hoje, o capitalismo pós-industrial ou financeiro ressignifica o corpo do ho- mem que, mais do que produtor, passa a interessar, acima de tudo, como consumidor em potencial. Isso irá gerar uma consequência di- reta na eleição do tipo de pena a ser aplicada em cada caso, fazendo

surgir uma popularidade no que se refere às penas alternativas para os “possíveis consumidores” enquanto que se dissemina o encarce- ramento neutralizante e duradouro para os chamados “consumido- res falhos ou frustrados”.

Corroborando com a análise, cabe apresentar os dados do Mapa do Encarceramento de 2015 referente ao ano de 2012, segundo o qual 45,3% dos apenados no Brasil não completaram o ensino fundamen- tal, ao passo que 1,2% deles têm nível superior e nenhuma pessoa tem nível acima de superior. Some-se a isso o fato de que de toda a população carcerária do Brasil na atualidade, “menos de 20% estão envolvidas em atividades educacionais e menos de 25% estão envol- vidas em atividades laborativas” (SILVA, 2009, p. 142).

Ou seja, o que podemos perceber é que a população carcerária possui um público bastante definido, formado justamente por aque- les que não têm uma possibilidade de participação massiva no con- sumo de bens.

No mesmo sentido, Wacquant (1999) defende que a prisão é utili- zada para governar a pobreza porque contribui para regular os seg- mentos mais baixos inseridos no mercado de trabalho. Desse modo, ela serviria como um mecanismo de confinamento dessa população desviada e perigosa, ou ainda supérflua, segundo o ponto de vista da planificação econômica e política. Segundo o autor, a prisão está co- nectada com toda a gama de organizações e programas de assistência a populações vulneráveis.

Assim, se seguirmos essa premissa veremos que aqueles que são falhos tanto como produtores quanto como consumidores, tornam- -se muito mais úteis como afirmadores da lógica punitiva do que como mantenedores da lógica de mercado.

A construção social do inimigo

A situação real da criminalidade no Brasil ainda é algo bastante discutido. Há quem defenda que a ideia de que esta teria aumenta- do surgiu em função da maior divulgação dos crimes violentos pela mídia, o que levaria ao maior envolvimento da população com esse fenômeno; há quem diga que isso decorreu do fato de o crime hoje não ser mais um fenômeno restrito às periferias urbanas do país; há ainda quem argumente que o que aumentou, na verdade, foi a nos- sa percepção da violência, dentre outras hipóteses4. O que importa

aqui, porém, não é descobrir se houve ou não um real crescimento da criminalidade no Brasil, mas refletir sobre os efeitos dessa crença que se difunde de maneira generalizada na mídia.

O fato é que a típica demonização do “sujeito criminoso”, nesse contexto, acaba se agravando de modo que ele passa a ser encara- do como a personificação do mal, a anomalia social a ser erradicada, o responsável por todos os problemas enfrentados pela sociedade, como identificado por Caldeira (2003). Assim, nas vistas da popu- lação, ele passa a assumir um papel de “inimigo social”, portador de uma “essência criminosa”.

Note-se que, nessa lógica, o crime se distancia da ideia de ente ju- rídico abstrato e passa a ser localizado a partir da figura do “crimino- so”, que se transforma em uma espécie de “tipo identitário” prede- terminado que, essencializado neste ato, não existe para além dele. Fabrica-se, assim, a partir, também, do incentivo da mídia, esse ser

4 Isso porque é fundamental que se diferencie criminalidade (que se refere ao cometimento de crimes) de violência (palavra de caráter polissêmico e cuja percepção é imanentemente subjetiva) bem como da noção de vio- lência urbana que, como afirma Machado da Silva (2004), é uma repre- sentação social que ajuda a descrever e organizar o sentido das práticas legalmente definidas como “crimes comuns violentos”.

dotado de uma moralidade desviada que, por ter rompido com as leis do “contrato social”, não merece sequer ser reconhecido pelo Estado enquanto indivíduo.

Esse sujeito, destituído de sua condição de humanidade, é colo- cado em posição diametralmente oposta à sociedade, ente genérico e abstrato a ser protegido daquele que ameaça romper suas regras mo- rais, o que legitima essa caça desenfreada aos desviantes degenera- dos portadores de perigo. Essa ideia fica muito clara quando pensa- mos, por exemplo, nas chamadas funções “R” da pena: ressocializar, reintegrar, reinserir etc. Afinal, quando é preciso “ressocializar” um indivíduo significa que é necessário que este seja reconduzido à so- ciedade e aos valores dela, como se o crime fosse algo externo, alheio a ela e, consequentemente, como se ele, ao se encontrar nessa condi- ção, não fizesse mais parte dela.

Neste modelo de sociedade excludente, cede-se à teoria de que a decisão pelo ato criminoso é uma escolha espontânea, livre, inde- pendente e dissociada da realidade social. A opção pelo crime é vis- ta como uma inclinação natural decorrente de um fracasso pessoal, assim como deve ser a sua punição. O crime, em uma perspectiva quase lombrosiana5, passa a ser visto como a consequência de uma

condição natural, uma maldade intrínseca à constituição deste indi- víduo, que não pode mais sequer ser “corrigido”, como defendiam as teorias correcionalistas. Esse delinquente, que muito se asseme- lha à figura do anormal descrita por Foucault (2001), já que é aquele que viola as leis da sociedade e da natureza, o ser comprovadamente

5 Referência à Cesare Lombroso que, com a publicação de L’uomo delin-

quente, deu origem ao que foi chamado de Escola Antropológica Italiana

ou Escola Positivista da Criminologia, segundo a qual o delito seria uma decorrência de fatores biológicos do autor.

incurável, deve, agora, apenas ser vomitado da sociedade sadia em razão da sua impossibilidade de sobreviver neste meio6.

Relata-se que para criar um “bom inimigo” deve-se acreditar que ele é a causa de grande parte dos problemas do grupo e que é in- trinsecamente diferente daqueles que o constituem. Esse processo de desumanização nos permite separá-lo do resto da humanidade e aplicar sobre ele tudo aquilo que não aceitaríamos para alguém que fosse visto enquanto parte deste grupo, como também perce- beu Caldeira (2003).

A propagação desse ideal, no caso brasileiro, se mostra deveras importante justamente porque é preciso acreditar que tais pessoas são verdadeiras inimigas da sociedade para que se continue aceitan- do a deplorável situação do sistema carcerário brasileiro.

Um Direito Penal máximo e preventivo

Como dissemos, independentemente de ter havido ou não um real crescimento da criminalidade no Brasil, o fato é que a dissemi- nação dessa ideia tem levado a população a crer que isto seria uma decorrência de um Direito Penal maleável e de autoridades fracas7,

como também aponta Zaluar (2009). Passa-se, então, a exigir uma

6 Esta fase será marcada justamente pela passagem da patologização do cri- me para a sua naturalização, do fim do positivismo criminológico para a criminologia administrativa.

7 Nos anos setenta, o aumento da criminalidade levou à formação de um errôneo consenso social de que esta teria se dado em razão do excesso de benevolência com que se tratavam os criminosos. Formava-se o terreno propício para a disseminação de ideais baseados em doutrinas com as de

law and order e de control and punishment. Muitas dessas teorias, apesar

de comprovadamente falhas, ainda são utilizadas em políticas criminais contemporâneas com o fim de dar embasamento científico a medidas cla- ramente irracionais de recrudescimento punitivo.

legislação cada vez mais severa, acreditando que esta seria a medi- da mais adequada para lidar com essa situação que surge, politica- mente, como um meio de fornecer uma resposta rápida para con- ter a insatisfação popular. Depreende-se, erroneamente, que uma resposta razoável seria o recrudescimento do sistema punitivo en- quanto única medida passível de conter o aumento da criminalida- de. Enquanto isso, alimentam-se as lucrativas indústrias midiática e de segurança privada.

A divulgação dessa suposta situação de emergência instaurada no Brasil – um país que já tende a associar a ideia de justiça à de punição, como demonstrou Kant de Lima (2008), acaba influenciando o sur- gimento de um sentimento de total desapreço pelas garantias penais e processuais penais. Passa-se a procurar, então, estratégias de au- mento do custo do crime, o que é lido, simploriamente, como sinô- nimo de ampliação da pena, do número de condutas criminalizadas, bem como de criação de novos requisitos para se obter a liberdade.

Essa tendência, incentivada por uma onda de intolerância moral também influenciada pela mídia e justificada como uma medida de tentativa de redução da violência urbana, embora muito popular, é de baixa eficácia. Isso fica muito claro quando se considera que, apesar do alto índice de encarceramento no país, que, atualmente, conta com 600 mil presos, número que tem crescido 7% ao ano8 e,

hoje, segundo o International Centre for Prison Studies,9 constitui

a quarta maior população carcerária do mundo, este alega que a falta de segurança pública é um de seus maiores problemas.

8 Segundo dados recentes do InfoPen. Disponível em: <http://www.info- pen.gov.br/>. Acesso em: 12 jun. 2015.

9 Disponível em: <http://www.prisonstudies.org/>. Acesso em: 12 jun. 2015.

Apesar disso, esse discurso é tomado como verdade e finda por ensejar uma crescente demanda social por proteção e segurança, o que leva ao surgimento de políticas criminais fundamentalistas e hi- pertrofiadas bem como à edificação de um Direito Penal de exceção, cujo objetivo maior é a gestão da insegurança a partir de uma per- seguição a um tipo identitário bem-definido: o inimigo social, o in- conveniente que precisa ser constantemente vigiado, e, sempre que possível, punido. Aquele contra o qual o Estado estaria legitimado a abrir concessões e permitir todo tipo de violência.

Assim, abandonam-se as já fragilizadas ideias de ressocialização, reintegração e reinserção, que são substituídas pelas de exclusão, neutralização e extermínio. Observa-se que, segundo essa crimino- logia demonóloga, em expressão de Zaffaroni (2012), deve-se estar muito bem-definido quem participa do novo pacto social e quem está dele excluído.

No Direito Penal em si, um dos efeitos dessa nova tendência é jus- tamente a substituição da análise do dano decorrente do delito pelo estudo do paradigma do risco (referente artificial, volátil e inconsis- tente) como critério determinante na definição do grau de interven- ção daquele. Assim, mais do que punir, o Direito Penal tem se pre- ocupado em estabelecer meios de prevenir delitos. Posicionamento acompanhado sobretudo pela polícia.

Dentro desse contexto, a nova política criminal tem buscado