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Capítulo 2 – O consumo colaborativo e o alojamento peer-to-peer

2.2. Economia da partilha e consumo colaborativo: uma nova era

2.2.1. O novo fenómeno da partilha

O termo “economia da partilha” (do inglês sharing economy) foi usado pela primeira vez para indicar o bem-estar social, no qual os participantes partilham entre si, a fim de aumentar o seu propósito comum, sugerindo-se uma alternativa à compra tradicional (Weitzman, 1986). Já o seu termo alternativo, o “consumo colaborativo” (do inglês collaborative

consumption), foi evocado pela primeira vez por Felson e Spaeth (1978) como sendo

indivíduos ou grupos interagindo em atividades de consumo de bens ou serviços com interesses em atividades conjuntas. Uma vez que estes primeiros estudos foram publicados antes da difusão da Internet, não houve qualquer referência relativamente a plataformas tecnológicas e intermediações entre os atores do sistema de partilha.

No entanto, esse conceito evoluiu e, mais recentemente, Botsman e Rogers (2010c) reinterpretaram o termo no seu livro O Que É Meu É Seu: Como o Consumo Colaborativo

11 negociação, empréstimo ou aluguer de produtos e serviços permitindo o acesso à propriedade mediante meios tecnológicos.

Apesar de esta ser uma realidade cada vez maior na sociedade contemporânea, sociólogos, economistas e investigadores ambientais têm partilhado diferentes perspetivas sobre o fenómeno (Dredge & Gyimóthy, 2015), oferecendo uma série de terminologias relacionadas. Entre elas, pode-se encontrar: “participação do consumidor” (Fitzsimmons, 1985); “sistemas produto-serviço” (Mont, 2002); “voluntariado online” (Postigo, 2003); “cocriação” (Prahalad & Ramaswamy, 2004); “coprodução” (Humphreys & Grayson, 2008); “consumo colaborativo” (Belk, 2010; Botsman & Rogers, 2010c, 2010a; Botsman, 2013); “a malha” (Gansky, 2010); “prosumption” (Ritzer & Jurgenson, 2010); “sistema de partilha do consumidor” (Lamberton & Rose, 2012); “acesso baseado em consumo” (Bardhi & Eckhardt, 2012); e “consumo conectado” (Dubois, Schor, & Carfagna, 2014; Schor & Fitzmaurice, 2015).

Dada a variedade de termos associados a este fenómeno, torna-se, assim, difícil de defini-lo de forma clara e homogénea (Martin, 2016). De acordo com Frenken e Schor (2017) esta confusão em torno do fenómeno deve-se ao fato de este ser recente, não havendo uma distinção clara entre as diferentes designações (Belk, 2014b; Dredge & Gyimóthy, 2015; Gansky, 2010), dificultando uma definição consensual.

Segundo Belk (2014b), grande parte dos termos anteriormente descritos, apresentam duas semelhanças: a aplicação de modelos de acesso temporário e de “não-propriedade” na utilização de bens e serviços de consumo; e a confiança e o poder da Internet para fazer estes modelos funcionar.

Assim, vários foram os autores que abordaram este fenómeno de acordo com diversas perspetivas. Na Tabela 2.1, de uma perspetiva evolucionária, estão patentes algumas das definições predominantes deste conceito e a sua respetiva designação.

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Tabela 2.1 - Designações e definições adotadas para o fenómeno da partilha

Autores Designação Definição

Felson e Spaeth (1978)

Consumo colaborativo

Indivíduos ou grupos interagindo em atividades de consumo de bens ou serviços com interesse em atividades conjuntas.

Gansky (2010) A malha

Sistema socioeconómico construído em torno da partilha de recursos humanos e físicos, incluindo a criação, produção, distribuição, comércio e consumo partilhado de bens e serviços entre pessoas e organizações através de plataformas online.

Botsman e Rogers (2010c)

Consumo colaborativo

Modelo económico baseado na partilha, troca, doação, negociação, empréstimo ou aluguer de produtos e serviços, permitindo o acesso à propriedade, redefinidos por meio de tecnologia e comunidades P2P.

Bardhi e Eckhardt (2012)

Consumo baseado em acesso

Transações que podem ser mediadas pelo mercado, mas sem transferência de propriedade.

Lamberton e Rose (2012)

Sistema de Partilha do Consumidor

Mercados mediados pelos vendedores, permitindo aos seus clientes beneficiar de um produto sem o acesso à sua propriedade.

Rachel Botsman

(2013) Economia da partilha

Modelo económico baseado na partilha de ativos subutilizados como espaços, habilidades e outras coisas, por benefícios monetários ou não monetários.

Belk (2014b) Consumo colaborativo

Pessoas que coordenam a aquisição e distribuição de um recurso mediante uma taxa ou outra compensação (não monetária).

Hamari, Sjöklint e Ukkonen (2016)

Consumo colaborativo

Atividade P2P que tem como objetivo obter, oferecer ou partilhar o acesso a bens e serviços coordenado por serviços online em comunidade.

Frenken e Schor

(2017) Economia da partilha

Consumidores concedem, uns aos outros, o acesso temporário a ativos físicos subutilizados, possivelmente por dinheiro.

Parente, Geleilate e

Rong (2018) Economia da partilha

Empresas facilitadoras de transações de ativos entre utilizadores/fornecedores para uso temporário.

Fonte: Elaboração própria com base nos autores referidos na tabela

De acordo com Belk (2014b), a definição proposta por Felson e Spaeth (1978) não captura os verdadeiros aspetos de partilha de consumo, isto é, a distribuição de recursos a outros para o seu uso. Relativamente à definição de CC sugerida por Botsman e Rogers (2010c), Belk (2014b) defende que esta é muito vaga, misturando trocas de mercado, doação e partilha, não caracterizando, assim, as novas práticas do fenómeno. Este autor oferece então, a sua própria definição de CC (Tabela 2.1), excluindo, assim, atividades de partilha onde não

13 exista qualquer tipo de compensação, bem como atividades que remetam para a transferência permanente de propriedade, como as doações.

A economia da partilha e o CC aparecem como sendo os termos mais amplamente citados na literatura e de facto, enquanto que a maioria dos autores acredita que são sinónimos (Bellotti et al., 2015; Benoit et al., 2017; Schor & Fitzmaurice, 2015), por outro lado existem autores que defendem que estes são dois conceitos distintos (Belk, 2014b; Frenken, 2017; Hamari et al., 2016).

A partir das diferentes abordagens apresentadas anteriormente, e tendo em conta que o tema central desta dissertação é o alojamento local, isto é, a partilha de um alojamento mediante uma retribuição monetária (cujas características se assemelham ao alojamento P2P), adotar- se-á a definição de CC enunciada por Belk (2014b) estando, assim, englobadas neste conceito, atividades de organizações como a Airbnb, a Uber, a ZipCar e outras em que exista uma coordenação entre pessoas na aquisição e distribuição de determinado recurso mediante um pagamento ou outra compensação. Desta forma, ficam de fora as atividades que abrangem uma transferência efetiva de propriedade (ex. eBay) ou o acesso a recursos sem qualquer tipo de compensação monetária (ex. couchsurfing) que, por esse motivo, se encaixam melhor no conceito de economia da partilha.