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Novo pensamento político: representação e justiça

CAPÍTULO II LIBERALISMO E REPÚBLICA

1. Novo pensamento político: representação e justiça

Joaquim Francisco de Assis Brasil: o autor e a apresentação da obra política

Três dias após sua morte, portanto aos 27 dias de dezembro de 1938, o escritor e acadêmico Austregésilo de Athayde, em artigo ao Correio do Povo, lembraria J. F. de Assis Brasil131: "Homem 'a la

131 Natural de São Gabriel (1857), região da campanha rio-grandense, Joaquim Francisco de Assis Brasil bacharelou-se pela Faculdade de

Direito de São Paulo, tradicional centro de formação de homens públicos da política brasileira. Desde então, iniciou sua carreira política como o primeiro Deputado Republicano pela Assembléia Legislativa da Província de São Pedro do Rio Grande do Sul, reeleito para a legislatura seguinte (1885/1887). Foi Deputado Federal Constituinte em 1891, se opondo ao Golpe de Estado do Marechal Deodoro da Fonseca. Participou da Junta Governativa no Rio Grande, mas perdeu para Júlio de Castilhos, que com sua Constituição estadual de 1891, a "Carta de 14 de Julho", dominaria a política regional por três décadas. Decidiu-se então pela vida diplomática, exercendo papel de relevo nos primórdios da diplomacia brasileira republicana, chefiando as legações da Argentina (1892 e 1905), Portugal (1895), Washington (1898), México (1902), até pedir sua exoneração (1907). No cargo de Ministro Plenipotenciário, promoveu o reatamento das relações diplomáticas do Brasil com Portugal, rompidas pelo Marechal Floriano Peixoto, por ocasião da revolta da Armada, em 1893, bem como trabalhou arduamente, em Washington, pela anexação do Acre ao Brasil, concretizado pelo Chanceler Barão de Rio Branco, através da assinatura do Tratado de Petrópolis (1903), com a Bolívia. Em meio à vida diplomática, iniciou sua carreira de publicista e filósofo político, escrevendo, dentre várias obras literárias, as duas mais importantes: Democracia Representativa. Do voto e da maneira de votar (1893), texto que anteciparia em 50 anos aspectos essenciais do conceito contemporâneo de Democracia Representativa, e que lhe autorizou, em 1932, a co-autoria do primeiro Código Eleitoral Brasileiro, instituindo a representação proporcional, o voto secreto e universal e o voto feminino; e Do Governo Presidencial da República Brasileira (1895), publicação doutrinária que faz uma defesa erudita e bem fundamentada dos princípios gerais do sistema presidencialista, atualmente em vigor no Brasil.

Na política estadual, fundou em 1908, o Partido Republicano Democrático, apoiando, dois anos depois, a campanha Civilista de Rui Barbosa. Na década de 1910, dividiu sua vida pública entre atividades políticas regionais com os chefes locais que se opunham ao herdeiro de Castilhos, o Presidente do Estado, Antônio Augusto Borges de Medeiros, e suas atividades de ruralista, que eram pautadas pelos estatutos da Sociedade Brasileira para Animação da Criação e Agricultura, fundada por ele e outros rio-grandenses eminentes, em Paris (1895). Esta entidade, sem fins lucrativos, atuava distribuindo sementes e instrumentos agrários, publicando instruções, traduzindo e divulgando obras de ensino prático, incentivando a criação de estações agrícolas e centros de reprodução de raças puras para fecundação, bem como fazendo concursos rurais, distribuindo prêmios e recompensas. Seu ideal era atingir o Brasil rural, portanto era político sem ser partidário, traduzido no propósito de firmar um pacto social que disponibilizasse a ciência ao homem do campo, viabilizando seu acesso à civilização. Entre suas obras principais nesta área, encontram-se a publicação de Cultura dos Campos (1898) e o planejamento e construção da Granja de Pedras Altas, que tratava-se de um projeto geopolítico que aliou a convivência rural da campanha aos contatos partidários com a elite política regional, preparando o terreno para a Revolução de 1923. Logo, na década de 1920, manifestará sua veia revolucionária, através de longo e planejado projeto político, que visa integrar o Brasil às Democracias civilizadas. Luta contra o governo estadual para derrubar a ditadura castilhista, alinhando-se aos chefes maragatos sobreviventes da guerra civil de 1893 e aos republicanos dissidentes, transformando um conflito regional (1923) na bandeira dos libertadores da república. Então exilado no Uruguai, junta-se aos ideais dos revolucionários paulistas de 1924 e à Coluna Prestes, ganhando o cargo de "Chefe Civil" deste ciclo revolucionário, que alcança até 1926. No ano seguinte, é eleito Deputado Federal pela Aliança Libertadora, quando organiza o Partido Democrático Nacional, e sua "ala meridional", o Partido Libertador, defende a anistia aos revolucionários e participa ativamente, como pregador da Liberdade, dos preparativos para a Revolução de

page', com literatura do mundo e espírito inclinado às boas expressões de arte, conversador cheio de encantos, 'grand riposteur du tac au tac', como Cyrano, malicioso e irônico, foi um monumento de cultura, civilização e graça na solitude do Pampa".

Do final do século XIX aos anos de 1930, dividido entre a ação e o pensamento político, o escritor Assis Brasil deixaria, dentre vastíssima produção intelectual, que incluía poesias, crítica literária, jornalismo político, discursos e obras científicas, quatro obras teóricas de doutrinação, tornadas paradigma do pensamento político. Iniciadas em pleno Império e amadurecidas nas primeiras décadas da República, o conjunto da obra do publicista absorve a tradição política pombalina, na sua versão do legado da representação e constrói uma argumentação normativa, com clara intenção de ultrapassar o conceito. Trata-se de um pensamento político que é moldado por uma diversificação de fontes clássicas, produzindo uma fusão original de influências e idéias de continuidade e ruptura com a antiga ordem monárquica, na determinação de instituir a república presidencialista democrática.

Portanto, estas quatro obras permitem analisar o pensamento político de Assis Brasil, pois concentram em seu texto elaborado, ao mesmo tempo claro e distinto, a essência de seu percurso intelectual e político. A primeira, A República Federal, seria publicada na mocidade acadêmica, em plena propaganda republicana, quando o jovem estudante de Direito da Faculdade de São Paulo contava 23 anos de idade.

O livro dividia-se em quatro partes, ao gosto doutrinário da época. O livro primeiro apreciava as formas de governo e a sua relatividade, ressaltando a legitimidade e a superioridade da forma republicana, concluindo a indicação da preferência do país pela república, remontando à Inconfidência Mineira. O livro segundo destinava-se a refutar as objeções dos monárquicos e a mostrar a oportunidade da república no Brasil. O livro terceiro era dedicado à federação, estudava a idéia e a natureza da federação, cotejava o unitarismo e o federalismo e evidenciava a imperativa inclinação do Brasil para essa forma de governo. No livro quarto, a última parte, defendia o sufrágio universal. Tratava-se de um livro de mestre: vigoroso, preciso, erudito e realista. Iniciava-se o ideário da vida pública de Assis Brasil.

Esta obra, que à época causou admiração e espanto, pois seria o livro de maior número de exemplares já publicado no Brasil, foi editada seis vezes, entre 1881 e 1889. Seguindo-se a primeira, o Partido Republicano de São Paulo logo promoveria uma segunda edição, lançada em 1882 ou 1883, de dez mil exemplares e distribuição gratuita, com o objetivo de realizar ampla divulgação das idéias que remetiam aos conceitos de Federação e República.132

1930. Ao iniciar o chefe do Governo Provisório, Getúlio Vargas, o nomeia para a Pasta da Agricultura, entretanto, até 1934, quando retira-se da vida pública, atua como Conselheiro do Partido Libertador, lutando pela constitucionalização da nova república. Volta à Diplomacia como Ministro Plenipotenciário representando o Brasil novamente na Argentina (1931) e também em missão em Londres (1933). Ainda em 1933, é reeleito Deputado Federal Constituinte, pronunciando-se em discursos onde prega sua vasta experiência político- democrática, até dezembro daquele ano. Em 1934, retorna a Pedras Altas, onde virá a falecer, em 24 de dezembro de 1938, aos 81 anos.

A segunda, Democracia Representativa. Do voto e da maneira de votar, teria uma primeira edição em 1893, no Rio de Janeiro; no ano seguinte uma segunda edição, vertida para o espanhol e publicada em Buenos Aires; em 1895, conheceria sua terceira edição que, embora em português, seria impressa em Paris; e finalmente em 1931, pela Imprensa Nacional do Rio de Janeiro, o autor conheceria em vida sua quarta edição.

Decorrência de sua pregação passada; escrito, apenas com o propósito de aperfeiçoar o processo democrático, não pode, entretanto, Assis Brasil fugir à sua vocação doutrinária – e abre o livro com larga exposição sobre a evolução do sistema, partindo da democracia direta para chegar à forma representativa.

Fiel ao conceito de um de seus mestres, segundo o qual “o que se há de aperfeiçoar, pois, não será o poder direto do povo, mas sua capacidade para escolher bons governos”, conclui pela afirmativa: “os povos livres atuais tem mais vantagens em ser representados do que em comparecer. Além de que o governo do plebiscito não é o mais sábio, deve-se também considerar que os males materiais e morais provenientes do comparecimento direto seriam muito superiores à teórica probabilidade de mais legítima deliberação.

É preciso, pois, que o povo seja representado, e essa representação só se pode fazer por meio do voto, ou sufrágio”. A obra passa pois, a examinar a condição mesma do voto e o caráter da representação verdadeira, para rematar na crítica dos principais sistemas eleitorais com a indicação segura de suas preferências. Dois tópicos deste alentado volume de quase quatrocentas páginas merecem especial registro. O primeiro é a defesa do voto feminino, feito com os melhores argumentos, as melhores críticas aos preconceitos reacionários da época. O segundo é o referente ao aspecto material de dar o voto, vale dizer, saber se o mesmo deveria ser público ou secreto.

À época, o Partido Republicano Rio-Grandense defendia o voto a descoberto, na eleição e no júri, como imposição da dignidade e da cidadania.

Assis Brasil, ainda integrante daquele partido, embora desavindo com a chefia, já não lhe seguia a ortodoxia programática. Mais tarde, ao participar da elaboração do Código Eleitoral de 1932, reconhece que só o voto secreto evitaria o degradante espetáculo que era a “arregimentação de rebanhos eleitorais, desfilando publicamente diante do chefe, ou dos seus caixeiros de eleições, de quem recebem a ração de opinião que tem de deitar na urna”. As idéias e as medidas preconizadas na Democracia Representativa conheceram uma quarta edição, em 1931, destinada a servir de justificativa e comentário à colaboração do publicista na reforma da Lei e Processo Eleitorais. Portanto, o ideário democrático, converteu-o em texto legal o Código Eleitoral de 32, obra sua, coadjuvada, é certo, por outros homens de semelhante formação, como o jurista e professor João C. da Rocha Cabral .133

A terceira obra de doutrinação política, intitulada Do Governo Presidencial na República Brasileira, conheceria sua primeira edição em Lisboa, no ano de 1896. Parece inclusive ter sido revisada por Eça de Queiroz, de quem Assis Brasil tornara-se amigo.

Mantinha no livro, que foi um de seus mais densos, com redação impecável, a intenção apostólica de orientar, retificar, salvar o que era “público”. Como não o animava nenhum sentimento subalterno, não queria destruir a obra comum de que também participara, pois na Constituição encerrava-se o sonho ardente de sua juventude, o seu perene pensamento político – a República Federativa presidencialista. Fruto de meditação prolongada e estudos intensos, divididos com a observação aguçada de um experimentado pensador, Assis Brasil perpassa, "ordinariamente de memória", os argumentos de Laboulaye, Tocqueville, Hamilton, Madison, Jay, Macauly, Stork, Freemann, Dupriez, Montesquieu, Bryce, Blackstone, buscando uma solução brasileira para o caso brasileiro, pois "queria falar ao senso comum e ser por ele facilmente entendido".

Depois de afirmar que uma sábia constituição política não se deve presumir eterna e justificar a oportunidade de seu aprimoramento – defende-a e encarece o dever de preservá-la. Passa, pois, a evidenciar o caráter de originalidade que devem ter as nossas Constituições, para que sejam relativas ao modo de ser da Nação. Após, aponta as razões do princípio de descrédito em que tinha incorrido o governo presidencial no Brasil, para entrar, em seguida, no longo paralelo dos dois sistemas, com o objetivo de patentear, à saciedade, a superioridade do regime presidencial. Por fim, expõe suas idéias sobre a organização e exercício dos poderes legislativo e executivo, dentre as quais cumpre ressaltar duas. A primeira é a condenação da eleição do Presidente da República pelo processo direto, já atacado na sua obra Democracia Representativa. Preconiza a eleição indireta na fórmula: “Os representantes devem ser eleitos, o Presidente nomeado.” Sua segunda idéia é o comparecimento dos ministros ao Congresso, que a Constituição de 1891 proibia expressamente, e que Assis Brasil pleiteia com argumentos e senso realista. Enfim, neste seu trabalho o que pode ser ressaltado como linear e simples, é que mantém-se fiel a si mesmo, ao ideário de toda sua obra de pregador e publicista. Desconsiderando a tradicional erudição jurídica do pensamento político brasileiro, carregada por citações excessivas, que apoiavam-se em "conceitos de sábios, que não escreveram para o caso brasileiro, nem o conheceram", mantém a extrema coerência, legado às futuras constituições brasileiras de 1934 e 1946.134

E ainda uma segunda edição da obra em 1934, publicada no Rio de Janeiro e com prefácio escrito em Pedras Altas.

Não me parece lícito reimprimir o livro sem o desenvolver na proporção do meu constante estudo, observação e meditação sobre a especialidade;

E faltou-me sempre esse momento simpático, tão reconhecido pelos escritores, e tão essencial à integridade da produção intelectual como a estação própria o é para a frutificação; falta explicável pela singular e caprichosa movimentação da minha existência, batida sempre por tão variadas vicissitudes.

Se esse momento simpático não chegou ainda agora em toda a sua plenitude, ao menos uma oportunidade imperiosa se ostenta com a circunstância de dispensar a outra condição - a da refusão da obra.

Perlustrando o texto primitivo, persuadi-me de que, para fazer corresponder à atualidade, bem pouco teria de mudar nele. A mudar bem pouco, preferi não mudar cousa alguma. Não considero alteração substancial a obediência ao conselho de Horácio quanto a algum trabalho de lima, aperfeiçoador da forma. Esse foi quase exclusivamente limitado à pureza da língua e da linguagem. A nova edição é virtualmente uma reprodução da antiga.

133 AITA, 2006, op. cit., pp. 69-70. 134 AITA, 2006, op. cit., pp. 74-5.

Fica assim demonstrado que eu penso em 1934 como pensava em 1896. O mínimo de 38 anos de inalterabilidade mental, e mesmo muito mais, se refletirmos em que as idéias não foram improvisadas quando emitidas, nem se extinguem quando repetidas. 135

A quarta e última obra de doutrinação, trata-se de uma fala de Assis Brasil por ocasião da fundação do Partido Republicano Democrático, proferido pelo publicista na cidade de Santa Maria, em 20 de setembro de 1908. A partir das notas que o guiaram na exposição do assunto, em palestra que chegaria a ultrapassar sete horas, e pelas anotações de um amigo que, a seu pedido, registrou os temas que iam sendo abordados, posteriormente, publicaria aquele que ficou conhecido como o Discurso de Santa Maria, editado no mesmo ano de 1908, sob o título Ditadura, Parlamentarismo, Democracia. Em 1909, conheceria uma edição vertida para a língua alemã, Diktatur, Parlamentarismus, Demokratie. Novamente em língua portuguesa, a obra seria reeditada em 1927, pela Livraria Editora Leite Ribeiro, do Rio de Janeiro, com algumas notas, conforme observações de seu autor, "a pôr quanto possível up to date o meu pensamento sobre algumas das teses discutidas, complementando-o em outros casos".

Este discurso, que na ocasião não seria estenografado, foi, em verdade, o sopro ideário, mas não programático, do Partido Libertador, posteriormente fundado em 1928. Isto se deve ao fato de que o líder deste partido, Raul Pilla, apesar da reverência assumida a Assis Brasil, professava a cartilha parlamentarista.

O item primeiro deste programa repetia “sustentar a presente Constituição Federal inalterável nos seus princípios essenciais, que são – A República Democrática, a Federação, e o regime representativo, com a separação de poderes nela estatuída.” [...] Assis Brasil defenderia ainda a revisão da Constituição federal, a ampliação da autoridade estadual e municipal e a alteração do sistema de eleições presidenciais, que deveriam ser feitas indiretamente pelo Congresso.

[...] O lema Representação e Justiça passaria a ser a máxima da condução política, reeditado periodicamente nas campanhas oposicionistas e, posteriormente, referência simbólica do Partido Libertador.

[...] Sua atividade intelectual mais importante recaiu exatamente na argumentação que dava forma às teses defendidas no encontro da fundação partidária, sistematizadas em sua obra Ditadura, parlamentarismo e democracia.

[...] Rica em idéias, quer clássicas, quer originais, ou ambas as coisas, a síntese doutrinária de seus princípios políticos era perene, contudo, a duração do Partido Republicano Democrático foi efêmera, e Assis Brasil mais uma vez, afastou-se da política partidária.136

A produção impactante do ideário político de Assis Brasil não conheceria o sucesso pedagógico almejado pelo autor, um aplicado leitor de Rousseau. Entretanto, viria a obter o reconhecimento da instituição que nas últimas décadas do Império apresentava-se como o espaço histórico que possuía a

135 Do Governo Presidencial, op. cit., p. 211. 136 AITA, 2006, op. cit., pp. 101-103.

missão de desvendar "os fundamentos da nação e a capacidade de corrigir nossas falhas". Chegada a República, tanto a prosa de Rui, o "brasileiro mais eloqüente", como a "história arte" de Nabuco, perderiam primazia política, circunscrevendo a Academia Brasileira de Letras à

defesa do panteão cultural, com a chancela das novas glórias literárias e com a defesa de nosso idioma. Ressentidos com a república que os espinafrara, arrogaram-se novamente ares superiores, só que desta feita por ficarem com a pureza da arte. E a língua? Esta lhes dava, ainda, a posse de nossa identidade nacional. E os identificava como aqueles que, sem a necessidade da política, definiam se tínhamos ou não o necessário para sermos civilizados. O idioma expressava nosso apenas tênue liame com as nações cultas. Cabia aos homens de Estado, de ciência e de ação apontar os caminhos e as medidas para nossa redenção, na forma de nosso encontro definitivo e completo com a civilização. Aos imortais cabia apenas vigiar para que nossos exemplos de cultura e elevação espiritual ficassem na memória do país e para que nossa língua não se desvirtuasse. Escolheram não ocupar o plano principal onde se jogava nosso destino, mas um papel secundário, de apoio.137

Apesar da preocupação com a língua portuguesa, que ocupara estudos e ações de Assis Brasil138, esta não era exatamente a posição que interessava ao autor na divulgação de seus escritos políticos. Entretanto, é corrente que chegou a ser candidato à Academia, na vaga do amigo Eduardo Prado. Contudo, parece que desistiria diante da candidatura de Afonso Arinos, que além de cunhado de Prado, disputava a mesma cadeira. Lúcio de Mendonça, então em seu nome, retiraria sua candidatura. E, ao que parece, não voltaria a concorrer, embora a idéia ressurja na correspondência entre Joaquim Nabuco e Machado de Assis, que no seguimento dos anos de 1899 a 1907, teve como tema recorrente comentários de ambos os escritores sobre a suposta campanha pela eleição de Assis Brasil139. E mesmo depois disto, em 1908, do Rio de Janeiro, em carta ao próprio Assis Brasil, Euclides da Cunha ainda se ocupará do tema.

Conforme prometi, prolongo, por escrito, a rápida troca de idéias que tivemos, a propósito da sua eleição para a Academia Brasileira. Compreendo e avalio a sua justificada relutância, mas julgo

137 RODRIGUES, João Paulo Coelho de Souza. A dança das cadeiras: literatura e política na Academia Brasileira de Letras

(1896-1913). Campinas: Editora da Unicamp, 2003, pp. 229-30.

138 Em 1918 escreveria o artigo Brasil se escreve com "s", publicado pelo autor, em encarte da Livraria do Globo. Contudo, durante

sua missão em Lisboa, tornara-se sócio da Real Academia das Ciências, apresentando a esta instituição a seguinte sugestão: "indico que esta Academia convide a Academia de Letras do Rio de Janeiro para ambas, em combinação, assentarem um sistema de ortografia portuguesa, baseado nos dois seguintes princípios: 1º simplicidade lógica, que torne a língua escrita mais acessível ao estrangeiro do que é atualmente; 2º determinação dos acentos tônicos das palavras, deixando os prosódicos inteiramente entregues à evolução natural, que vai criando variedades de pronunciação, sobre as quais é impossível legislar eficazmente. Indico finalmente, que, estabelecido o sistema de ortografia, as duas Academias tratem de organizar e publicar um vocabulário da língua. Lisboa e Sala das Sessões da 2ª Classe da Academia Real das Ciências, 29 de abril de 1898.", In: BROSSARD, 1º v., op. cit., pp. 345-6.

139 GRAÇA ARANHA (organização, introdução e notas). Machado de Assis & Joaquim Nabuco. Correspondência. Rio de