• Nenhum resultado encontrado

Por isso, nunca faltam males, mas, sim, Queres Diversas e aflições e estragos imprevistos

Existem pros mortais. Se o meu conselho ouvissem, Nós não desejaríamos o mal, nem dores

Terríveis nossos ânimos maltratariam.

O fragmento 1 de Semônides, como tantos outros do corpus deste trabalho, trata do tema da velhice, porém não apenas dela. Os vinte e quatro versos em trímetros jâmbicos desse poema constituem um todo passível de ser divido em quatro momentos principais. O primeiro deles, que introduz o poema e define o início do problema a ser tratado, vai dos versos um a cinco. A estrutura “mšn ... dš” (“por um lado ... por outro lado”) estabelece, no campo da sintaxe, o contraste que é feito, no contexto desses versos, entre Zeus e os mortais; entre a onisciência e o poder supremo daquele e a efemeridade e a falta de recursos desses. Em seguida, há um momento de aparente otimismo no poema, dos versos seis a dez, onde o poeta fala a respeito da esperança que move os homens. No entanto, logo depois, ele mostra que essa esperança é vã por causa da velhice e dos muitos males que recaem sobre os mortais antes que eles possam dar cabo de seus planos. Essa terceira parte, ao contrário das outras, é mais extensa e dura nove versos, mostrando a falta de equilíbrio entre a esperança anterior e a desgraça subseqüente. Por fim, na última parte, o poeta conclui, um tanto quanto

enigmaticamente – ou talvez assim nos pareça por falta de alguns versos ou de maiores informações a respeito do contexto – que essa é a razão de haver tantos males para os mortais e que, se todos seguissem seu conselho, não desejariam coisas ruins nem sofreriam.

Ao contrário do que se tomou como norma para esse trabalho, no primeiro verso do texto, foi preferível traduzir o epíteto “barÚktupoj” do original pelo igualmente composto “plenitroante” em Português. Isso foi feito, em primeiro lugar, para manter o valor sonoro e impactante do vocábulo grego. Em segundo lugar, foi uma solução mais adequada pelo fato de que não havia muito espaço no verso para uma perífrase que tivesse a mesma força que ele.

O segundo verso do poema original apresenta um andamento mais pesado, devido à repetição dos sons oclusivos /t/, /th/, /k/ e /p/, presentes nas palavras: “ka•”,

“Ókhi”, “p£ntwn”, “™st•”, “t…qhs'” e “qšlei”). Ao mesmo tempo, o verso também foi composto de uma forma ininterrupta e melódica, devido às sinéreses nos vocábulos “Ós' ™st•” e “t…qhs' Ókhi”, que fazem com que a passagem adquira uma consistência maior. Em Português, o efeito que se criou para compensar a característica melódica do original foi a assonância entre “engendra”, “bem” e “entende”, ao passo que se tentou manter um número de sons oclusivos (/t/, /d/ e /b/) ao longo do verso para recriar o andamento pesado do texto grego (“engendra”, “estabelece”, “como”, “bem” e “entende”).

Um efeito de natureza semelhante ao do descrito acima ainda pode ser notado, no verso seguinte do texto original, “d' oÙk”, “™p' ¢nqrèpoisin” e “¢ll' ™p»meroi”. O efeito melódico, novamente, foi compensado por uma assonância, presente nos vocábulos “inteligência”, “entre” e “efêmeros”. Por outro lado, a repetição de /p/ que havia no original não pôde ser recriada nem compensada, uma vez que havia um efeito de maior prioridade: a presença do termo “™p»meroi” em posição final. Pareceu importante manter o vocábulo que o traduz na mesma posição, além de não empregar nenhum outro termo para traduzi-lo que não “efêmeros”, devido tanto à correspondência entre as duas palavras, quanto ao sentido do vocábulo de “durar apenas um dia”, o qual é extremamente importante ao imaginário criado pelo poema.

Por fim, há uma série de palavras significativas em posição de destaque no início ou no final de verso, como: “barÚktupoj”, “p£ntwn”, “qšlei”, “noàj”, “™p»meroi”, “qeÒj”, “™lp•j”, “brotîn”, “PloÚtwi”, “fq£nei”, “brotîn”, “cqonÒj”, “¡lÕj”, “qn»skousin”, “zÒein”, “mÒrwi”, “f£oj”, “mur…ai”, “broto‹si”, “¥lgesin” e “kako‹j”. Dessas, foram mantidas em posição de destaque na tradução as seguintes: “barÚktupoj” (“plenitroante”), “™p»meroi” (“efêmeros”), “qeÒj” (“deus”), “™lp•j” (“esperança”), “brotîn” (“mortais”), “¡lÕj” (“mar”), “zÒein” (traduzido aqui como “sustento”), “mur…ai” (“inúmeras”), “¥lgesin” (“dores”) e “kako‹j” (“terríveis”).

Estrofe Sáfica

Os dois poemas de Safo presentes neste trabalho seguem um mesmo esquema métrico, comumente denominado estrofe sáfica, que recebeu este nome por ter sido o padrão métrico que notabilizou a poetisa na antigüidade. Copiada por poetas posteriores, como Catulo (11 e 51) e Horácio (Carmen Saeculare), a estrofe sáfica se caracteriza por possuir três versos seqüenciais de mesma conformação, a saber, um metron trocaico, um pé dáctilo e novamente um metron trocaico, seguidos por um quarto verso de menor extensão, que se estrutura na forma de um pé dactílico e um pé trocaico com anceps na última posição, como pode ser observado no esquema abaixo:

Como exemplo prático, tomemos a primeira estrofe do fragmento 31 de Safo, a fim de analisarmos sua estrutura métrica:

fa… / ne / ta… / moi / kÁ / noj / ‡ / soj / qš / oi / sin

œm / men' / ê / nhr, / Ôt / tij / ™ / n£n / ti / Òj / toi

„s / d£ / nei / ka• / pl£ / si / on / « / du / fw / ne…-

saj / Ù / pa / koÚ / ei

O esquema, seguido rigorosamente, cria um ritmo descendente, por conta da exclusividade de troqueus e dáctilos, que pode ser mais ou menos truncado dependendo das posições livres serem ou não preenchidas por sílabas longas.

Para a tradução, tentou-se seguir o esquema métrico com certa fidelidade, ainda que tomando algumas licenças, para não comprometer as informações e demais efeitos do poema em demasia.

A primeira das liberdades tomada foi a de permitir versos cataléticos, de modo que a última posição, a do anceps, nem sempre estará preenchida, ainda que se tenha evitado isso tanto quanto possível.

A segunda das licenças usadas diz respeito à ordenação das palavras nos versos. Muitas vezes foi preciso mover vocábulos de um verso para outro, além de usar traduções menos literais, a fim de preservar tanto o ritmo e a sonoridade suave do original.

Para ilustrar de forma prática como o esquema métrico foi empregado no processo de tradução, observemos o exemplo abaixo, um trecho escandido do fragmento trinta e um de Safo:

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

E / le / me / pa / re / ce / ser / par / dos / deu / ses, 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 O ho / mem / que / se / sen / ta / pe / ran / te / ti 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 E / se in / cli / na / per / to / pra ou / vir / tua / do / ce 1 2 3 4

Voz / e / teu / ri / so

Apesar de os primeiros versos de cada estrofe serem de dez sílabas em Português, eles obedecem um ritmo pouco usual em nossa língua e reproduzem, com um bom grau de fidelidade, a seqüência de marcação rítmica do original.

De modo geral, empregou-se um metro composto pela justaposição de dois troqueus, um dáctilo e mais dois troqueus, com a possibilidade do último ser catalético. A única exceção em que o anceps da quarta posição acabou sendo ocupado por uma sílaba forte foi o seguinte:

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

Fil / ha / de / Zeus / que ur / de / em / ga / nos, / pe / ço-

Como resultado, esse verso da Ode a Afrodite se estruturou pela seqüência de um troqueu, um espondeu, um dáctilo e dois troqueus, sendo o único nos dois poemas de Safo do corpus a usar de modo diferente o anceps da quarta posição.

Safo – Ode a Afrodite

po]ikilÒqro[n' ¢qan£t'AfrÒdita, pa‹] D[…]oj dol[Òploke, l…ssoma… se, m» m'] ¥saisi [mhd' Ñn…aisi d£mna, []pÒtn]ia, qà[mon,

5 ¢ll]¦ tu…d' œl[q', a‡ pota k¢tšrwta t¦]j œmaj aÜ[daj ¢…oisa p»loi œk]luej, p£tro[j d dÒmon l…poisa []c]rÚsion Ãlq[ej

¥r]m' Ùpasde[Úxaisa· k£loi dš s' «gon 10 ê]keej stroà[qoi per• g©j mela…naj

pÚ]kna d…n[nentej ptšr' ¢p' çr£nw‡qe- []ro]j di¦ mšssw·

a]ya d' ™x…ko[nto· sÝ d', ð m£kaira, meidia…[sais' ¢qan£twi prosèpwi 15 ½]re' Ôtt[i dhâte pšponqa kêtti

[]dh]âte k[£l]h[mmi

k]êtti [moi m£lista qšlw gšnesqai m]ainÒlai [qÚmwi· t…na dhâte pe…qw .].s£ghn [™j s¦n filÒtata; t…j s', ð 20 []Y£]pf', [¢dik»ei;

ka]• g[¦r a„ feÚgei, tacšwj dièxei, <a„ d dîra m¾ dšket', ¢ll¦ dèsei,> <a„ d m¾ f…lei, tacšwj fil»sei> []<kwÙk ™qšloisa.>

<™k mer…mnan, Ôssa dš moi tšlessai> <qàmoj „mšrrei, tšleson, sÝ d' aÜta> []<sÚmmacoj œsso.>

Afrodite eterna de etéreo trono,

Filha de Zeus que urde enganos, peço- Te: com mágoa e náusea não domines, Dona, minh'alma,

5 Mas pra cá descende se alguma vez,