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Capítulo IV: Os Desafios Colocados aos EUA

4.3. O Bloqueio Financeiro

Uma das primeiras medidas adotadas pelos EUA foi a de engendrar uma maneira de bloquear financeiramente o WikiLeaks. A moldura da segurança nacional ajudou a servir os seus propósitos e, assim, o governo norte-americano e atores da sociedade civil implementaram, à larga escala, um conjunto de ações por forma a enfraquecer o poder do WikiLeaks. O site foi o alvo de um ataque DDoS e, para além disso, como referido por Karhula,

“várias instituições financeiras, incluindo Swiss PostFinance, PayPal, Bank of America, Visa and MasterCard, cessaram relação/fecharam as contas do WikiLeaks pouco tempo depois da publicação dos cables”.469

As resposta da indústria financeira, pressionada pelo governo dos EUA, respondeu aos vazamentos com um bloqueio financeiro à escala global nunca antes visto. Grandes empresas de financiamento, como a MasterCard, Visa e PayPal, acederam aos pedidos, embora não tenha havido qualquer acusação legal de delitos. Em outubro de 2010, foi relatado que a organização Moneybookers, que arrecadou doações para o WikiLeaks, tinha terminado a sua relação com o site. A Moneybookers afirmou que a sua decisão tinha sido tomada "para dar cumprimento à investigação sobre lavagem de dinheiro e outras conduzidas pelas autoridades governamentais, agências ou comissões.”470 A 18 de dezembro de 2010, o Bank of America anunciou "não

processar transações de qualquer tipo que nos dê razões para acreditar que são destinadas ao WikiLeaks", citando "o WikiLeaks pode estar envolvido em atividades … incompatíveis com as nossas políticas internas para o processamento de pagamentos"471. Como retaliação, o WikiLeaks

incentivou os seus simpatizantes que eram clientes do BoA a fechar as suas contas. O Bank of America foi, no entretanto, apontado como alvo do próximo grande lançamento do WikiLeaks. No

469 BRUCKMANN, M. and FLESCH, J. 2012. "Framing Transparency in the U.S. – A Cross-Media Analysis of the Debate on WikiLeaks"

in Transparency in Perspective, Edition 2013, Volume II. [online] MaRBLe Research Papers, pp.165. (Disponível em: https://www.academia.edu/8866110/K%C3%B6rfer_A._Lappe-Osthege_T._and_R%C3%B6hrig_K._2013_._Aid_Transparency_in_the_Making_- _What_Compliance_with_the_International_Aid_Transparency_Initiative_Reveals_about_Ideational_Dynamics_in_the_Aid_and_Development_R egime._In_Marble_Research_Papers_Vol._II [Acedido a 17 outubro 2015].

470 Paki Wiki Leaks. 2010. “Investigations, censorship, harassment and surveillance”. (Disponível em: http://paki-wiki-

leaks.blogspot.pt/2010/12/investigations-censorship-harassment.html [Acedido a 20janeiro 2015])

471 MACCART, Brad.2010. “Bank of America now refusing to process payments believed to be for Wikileaks”. (Disponível em:

http://thenextweb.com/media/2010/12/18/bank-of-america-now-refusing-to-process-payments-believed-to-be-for-wikileaks/ [Acedido a 20janeiro 2015])

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final de 2010, o Bank of America entrou em contacto com a empresa legal Hunton & Williams para parar o WikiLeaks.

Em 3 de dezembro, a PayPal, processador de pagamentos propriedade do eBay, encerrou permanentemente a conta da Fundação Wau Holland que tinha redirecionado doações para o WikiLeaks. A PayPal alegou que a conta do WikiLeaks violava a sua "Política de Utilização Aceitável", especificando que a conta foi usada para "atividades que incentivam, promovem, facilitam ou instruem outros a envolverem-se em atividades ilegais"472. O vice-presidente da PayPal

declarou posteriormente que pararam de aceitar pagamentos após o "Departamento de Estado dizer-nos que estas eram atividades ilegais. Foi simples.473" Mais tarde no mesmo dia, arrependeu-

se da sua declaração e disse que a mesma se baseava numa carta do Departamento de Estado para o WikiLeaks. A 6 de dezembro, o banco suíço PostFinance anunciou que tinha congelado os ativos que Assange detinha - um montante de 31.000euros. Num comunicado no seu site, o banco afirmou que isso ocorreu porque Assange "forneceu informações falsas sobre o seu local de residência" ao abrir a conta474. No mesmo dia, a MasterCard anunciou que estava "a tomar

medidas para assegurar que o WikiLeaks já não pudesse aceitar os produtos da marca MasterCard", acrescentando que "as regras da MasterCard proíbem os clientes de, direta ou indiretamente envolvidos, facilitarem qualquer ação ilegal"475. No dia seguinte, a Visa Inc. anunciou

que estava a suspender pagamentos para o WikiLeaks, enquanto se aguardavam "novas investigações"476. Num movimento de apoio ao WikiLeaks, a organização XIPWIRE estabeleceu uma

maneira de doar ao WikiLeaks, e prescindiram das respetivas remunerações. Datacell, a empresa de tecnologias de informação com sede na Islândia, controlada por investidores suíços que permitiram que o WikiLeaks aceitasse doações por cartão de crédito, anunciou que iria tomar medidas legais contra a Visa Europa e MasterCard, a fim de retomar a permissão de pagamentos para o site477.

472 POULSEN, Kevin. 2010. “PayPal Freezes WikiLeaks Account”. (Disponível em: https://www.wired.com/2010/12/paypal-wikileaks/ [Acedido a

20janeiro 2016])

473 Ibidem

474 JONES, Sam. 2010. “Julian Assange's Swiss bank account closed” (Disponível em: https://www.theguardian.com/media/2010/dec/06/julian-

assange-swiss-bank-account [Acedido a 20janeiro 2015])

475 MCCULLAGH, Declan. 2010. MasterCard pulls plug on WikiLeaks payments! (Disponível em: https://www.cnet.com/news/mastercard-pulls-

plug-on-wikileaks-payments/ [Acedido a 20janeiro 2015])

476“Visa suspends payments to WikiLeaks”. 2010. The Associated Press. (Disponível em: http://www.cbc.ca/news/visa-suspends-payments-to-

wikileaks-1.951087 [Acedido a 20janeiro 2015])

477“Visa, MasterCard sued for blocking donations to WikiLeaks”. 2014. (Disponível em: https://www.rt.com/usa/214007-datacell-wikileaks-bank-

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O facto do WikiLeaks ter parado com as suas ações de vazamento em outubro de 2011, foi o resultado do bloqueio/embargo que lhe foi imposto. O bloqueio representou uma quebra de 95% da receita do WikiLeaks478.

Mais uma vez, fica patente a resposta e ataque desmedido empreendido sobre o WikiLeaks. O bloqueio financeiro demonstrou a força transversal do Estado em controlar os desafios que lhes são impostos por atores desconhecidos. Verifica-se um aumento das capacidades e táticas por parte dos EUA nos quadros da defesa e inteligência. Como forma de contra-ataque, durante 5 e 6 de fevereiro de 2011, o grupo Anonymous invadiu o site da HBGary, copiou dezenas de milhares de documentos, postou dezenas de milhares de e-mails da empresa on-line479.

A 18 de julho de 2012, o WikiLeaks, abandonado pelas empresas financeiras e quase falido, anunciava um um novo método para receberem doações. O Fund for the Defense of Net Neutrality (FDNN) concordou em canalizar as doações via Carte Bleue, e o WikiLeaks afirmou que obrigações contratuais impediriam a Visa e a MasterCard de bloquear tais transações. A 24 de janeiro de 2014, o WikiLeaks anunciou via Twitter que a maioria das suas doações chegavam por Litecoin e Bitcoin (moeda criptografada). Foi a criptomoeda Bitcoin que salvaguardou a sobrevivência da organização que enfrenta dificuldades jurídicas e financeiras480.

A Alta Comissária da ONU para os Direitos Humanos, Navi Pillay, afirmou que a Visa, a MasterCard e a Amazon podiam estar a "violar o direito à liberdade de expressão do WikiLeaks", ao retirarem os seus serviços, e, que a situação “é verdadeiramente aquilo a que a media chamaria de ciberguerra” 481.