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Capítulo I O campo geográfico no Brasil e no Piauí

1.3. O campo do ensino da Geografia em Teresina

A breve reconstituição da trajetória de formação do campo científico geográfico no Brasil e os dados que dela emergiram, permite-nos formular a hipótese da inexistência de um prolongamento desse campo na cidade de Teresina ou da inexistência de um sub campo científico geográfico nesse espaço de observação. Os achados levam-nos, no entanto, a inferir que estamos diante de um espaço social marcado por práticas essencialmente voltadas para o ensino dessa disciplina. Vejamos quais foram os nossos achados.

1.3.1. A ciência geográfica no Piauí

A Geografia, enquanto disciplina acadêmica, conquistou seus primeiros espaços através dos cursos superiores, inicialmente em âmbito federal e, posteriormente, estadual.

Como já referido, os cursos superiores de Geografia instalaram-se, no Brasil, a partir de 1930. No Piauí, isso só aconteceu em abril de 1958, com a instalação do primeiro curso na Faculdade Católica de Filosofia (FAFI).

Em seus primeiros treze anos de funcionamento a FAFI-Piauí formou trinta e quatro profissionais com o título de bacharel em Geografia e História; vinte e oito com o título de licenciado em Geografia e História; e trinta e cinco profissionais com licenciatura específica em Geografia (FREITAS FILHO, 2003, p.52-53). A formação para o magistério era um dos objetivos da FAFI que funcionou como Escola Isolada até o ano de 1971, quando foi incorporada à Universidade Federal do Piauí. Nesse ano, o curso de Geografia constituía-se como licenciatura específica, mas, nessa nova instituição, passou a compor o Departamento de Geografia e História. Vínculo que mantém até os dias atuais. Apesar de surgir em forma de bacharelado o que orientaria a sua prática para a pesquisa científica, esse curso logo foi transformado em Licenciatura, uma vez que, na época, a demanda no estado era por professores de 1º e 2º graus (atuais ensino fundamental e médio). Dessa forma o conhecimento veiculado pela ciência geográfica, embora trabalhado em cadeiras isoladas, não conferia título acadêmico isolado, mas vinculado ao curso de História.

Como já observamos, o ensino superior de Geografia em território piauiense iniciou-se cerca de vinte e oito anos após a sua institucionalização no Brasil. Nesse período, a hegemonia da escola francesa começou a arrefecer entre os geógrafos brasileiros. A AGB, mesmo tendo passado por muitas vicissitudes, ainda se mantém como órgão importante no processo de produção, organização e difusão do saber geográfico pelo país.

Após a reforma estatutária, em 1945, essa instituição iniciou um processo de expansão para todo o país, seguindo um modelo federativo. No Piauí, a AGB tem assento na década de 1980. Inicialmente, sob a iniciativa e presidência de professores universitários, depois sob a responsabilidade de discentes do curso de graduação em Geografia, quase sempre oriundos de antigas diretorias do Centro Acadêmico ou recém- formados que atuavam na Educação Básica. A AGB-Secção-Teresina, contudo, sobreviveu

precariamente mantendo-se à margem dos acontecimentos da AGB-nacional. No final da década de 1990 foi abandonada por completo, desaparecendo do cenário piauiense e nacional.

Com relação ao IBGE, existe no estado uma filial desse Instituto cumprindo apenas a função de agência divulgadora e auxiliar da sua congênere nacional, portanto, não exercendo nenhuma influência nos rumos da Geografia no estado.

No Piauí, duas universidades, uma federal e outra estadual, mantém curso de graduação em Geografia, ambos voltados para a formação de licenciados(as). Quanto à produção científica, essa continua incipiente, representada basicamente por dissertações e teses defendidas por docentes das instituições citadas, em universidades de outros estados, particularmente, na Universidade de São Paulo (USP) e de Pernambuco (UFPE). Inexiste cursos de pós-graduação stricto sensu na área de Geografia e, igualmente, qualquer veículo de divulgação científica exclusivo da ciência geográfica no estado. Ressalte-se, da mesma forma, que quase não há produção científica desses pesquisadores divulgada em veículos de caráter nacional. A pouca produção existente concentra-se na Universidade Federal do Piauí (UFPI). A Tabela 1, ilustra a incipiente produção científica dessa Instituição.

Tabela 1 - Produção científica dos docentes do curso de graduação em Geografia da UFPI (1991 – 2002)

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completo resumo Livros

Publica- dos

Local Nacional Internac.

Local Nacional Internac. Local Nacional Internac. 03 08 00 00 00 00 00 17 02 01

Fonte: Catálogo de Produção Científica da UFPI. Anos: 1991-1992; 1993-1994; 1995-1996; 1997-1998; 1999-2000; 2001-2002.

Essa universidade, por sua vez, apesar de apoiar-se, de acordo com o discurso oficial, no tripé ensino-pesquisa-extensão, na verdade está voltada fundamentalmente para a formação profissional (PASSOS, 2004, p.282). Como já mencionamos, o curso de graduação em Geografia dessa instituição está voltado para a formação de professores(as), tendo em vista atender à pressão externa oriunda das necessidades da Educação Básica.

As práticas de pesquisa nesse curso são muito recentes, pois iniciadas no começo deste século com a criação da pós-graduação lato sensu, portanto, em nível de especialização. Por essa razão, os poucos doutores existentes no curso de Geografia são

obrigados a se engajarem na pós-graduação de outros Departamentos que possuem afinidades com as temáticas do seu interesse.

1.3.2. O espaço social das práticas geográficas em Teresina

O movimento pela institucionalização da Geografia no país e a construção de um campo das práticas científicas relacionadas com essa disciplina, como apontamos aqui, não aconteceu no estado do Piauí, nem particularmente na sua capital. A população investigada por nós, em conseqüência, está inserida num espaço social de práticas não caracterizadas por atividades científicas, mas de ensino.

Como disse Gingras (1991), citado por Bourdieu, a construção social de um campo científico envolve tanto a emergência de práticas de pesquisa, quanto a constituição de um grupo socialmente reconhecido e portador de uma identidade social seja disciplinar, por meio de associação científicas, seja profissional, por meio de uma corporação, como explicitamos algumas páginas antes. Dessa aplicação dos pressupostos da formação de um campo científico à realidade da cidade de Teresina, podemos concluir pela inexistência aí de um sub campo do campo científico nacional. Defendemos, no entanto, a existência de um campo social de práticas voltadas quase exclusivamente para o ensino. Trata-se de um espaço social submetido às regras gerais de funcionamento desses microcosmos teorizados por Pierre Bourdieu. Por conseguinte, para ser professor(a) de Geografia, circular pelo cotidiano das instituições aí presentes, dominar os códigos lingüísticos e gestuais, os enjeux e jogos desse espaço faz-se necessário estar dotado do habitus que lhe corresponde. Como bem ilustrou Bourdieu (apud DOMINGOS SOBRINHO, 2002, p. 51), não podemos fazer atuar um filósofo com os enjeux do geógrafo. No caso específico que estamos investigando, observamos não ser possível fazer agir os(as) professores(as) de geografia com os enjeux dos cientistas.

Nos capítulos que se seguem vamos apresentar as evidências empíricas e as interpretações teóricas que sustentam o arcabouço da nossa tese. Ao final, apresentamos as articulações que justificam o nosso caminho.

Capítulo II - Da aquisição de capitais e