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3 À IMPOSIÇÃO AOS TERRITÓRIOS.

3.1 O CAPITALISMO EUROPEU E O DES-ENVOLVIMENTO HUMANIDADE NATUREZA

Não concluiu bem a sua graduação aquele ou aquela estudante de geografia que sai de seu curso sem saber das regras básicas deastronomia: a terra gira em torno do sol, a lua gira em torno da terra, o mundo gira em torno dos nórdicos. Ou pelo menos é isso

des- envolver o povo de sua natureza o corpo de sua mente des- envolver raiz

do sustento de seu chão

onde mata exuberante veio cana sufocante regada como se fosse ao tinto sangue doce

mas persiste existência existindo em resistência povos em territórios que no mundo de hoje em dia dependem damoeda mas como consequência pois aquilo

que semeiam é sua vida própria colhendo liberdade

eles vieram

pelos mares vieram devastar

por um império peles empalecidas olhos azuis de gula navegando

de outros mares a morte pelos ares ataque à diversidade exuberância

pois desde então jáse previa não caber questionamento

queimperialistaseuropeus e americanos seguem querendo impor como regra, como algo natural.

Ironias à parte, desde que o mundo europeu desenvolveu tecnologias para se locomover pelos oceanos por eles desconhecidos, e armas suficientemente poderosas para se impor, se iniciou processo de articulação hierarquizada entre os mais diversos territórios do planeta. Estando à frente destas navegações em direção ao que denominaram de “Novo Mundo”, já concebido como algo novo, sem considerar toda a história previamente existente, os colonizadores se percebiam superiores às demais culturas que encontravam. Compreendiam, e compreendem, o seu próprio modo de vida como o adequado, o mais evoluído, o necessário para toda sociedade humana viver bem. É preciso entender que este não é apenas um processo econômico de construção de hierarquizações, mas sim que envolve os mais diversos aspectos sociais, culturais e humanos que regem nossas vidas, incluindo aí este sentimento de superioridade existente para eles, e o de inferioridade para nós latino americanos.

Tal sentimento de superioridade, fortalecendo uma visão de mundo eurocentrista, os fazia acreditar que as suas instituições eram próprias e legítimas para todo o planeta, e que assim poderiam guiar os rumos deste último. Foi assim que a igreja católica e os reinos ibéricos, instituições máximas da Europa da época, se sentiram no direito de, no final do século XV, dividirem terras com as quais nunca haviam tido anteriormente alguma ligação histórica, e se determinarem como seus proprietários, pelo conhecido Tratado de Tordesilhas (BECKER, 1999).

A compreensão de suas instituições como hegemônicas sobre o mundo parte de um olhar sobre si mesmo como estandovivenciando o correto modo de existir, o “mais evoluído”. Tal ponto influiu e influi sobre a política exercida pelo que ainda hoje é conhecido como “velho continente”, como se fosse algum tipo de ancião que estivesse há mais tempo no planeta. Foi a partir deste olhar, quando aqui chegaram, que os europeus encontraram uma imensa diversidade de fauna e flora e, por tamanha exuberância e heterogeneidade de espécies, enxergaram os povos nativos como subalternos, por supostamente não terem tido a capacidade de “domesticar a natureza”. Acreditaram que os povos originários que aqui viviam eram incapazes, distantes da “evoluída capacidade” europeia, como se percebe nesta fala de Buffon, um importante naturalista francês, sobre o “Novo Mundo”.

Há, portanto, na combinação dos elementos e das outras causas físicas, algo de contrário ao crescimento da Natureza viva, neste novo mundo; [os germes] apertam-

se e diminuem sob este céu avarento e nesta terra vazia, onde o homem, em pequeno número, estava esparso, errante; onde, longe de usar em senhor este território como seu domínio, ele não tinha poder algum; onde não tendo submetido os animais nem os elementos, não tendo domesticado os mares, nem conduzido os rios, nem trabalhado a terra, ele próprio era apenas um animal de primeira linha, e só existia pela Natureza. (BUFFON, 1749, p.103)

Vindos de uma tradição de enxergar a natureza como algo a ser dominado, e olhando para os povos originários como em estado de natureza, os europeus colonizadores os compreenderam comoseres em “(...) condição de ‘natural’, portanto, explorável, sem direitos,

instituições ou crenças dignas de menção, portanto de reconhecimento.” (DABAT, 2010,

p.45). Foi sob este argumento que se confirmaram – para si mesmos - como legítimos exploradores destas terras e de seus habitantes. A partir de um ponto de vista vindo de outro modo de vida os europeus enxergaram a exuberância da vida em terras tropicais como sinal de inferioridade.

A mata nativa, contrariamente ao pensamento dos invasores, não era em nada natural, se tomarmos sua própria concepção de natureza, como algo afastado do ser humano, intocado por ele. Por outro lado, se tomarmos como referência a noção de natureza incluindo o homo sapiens enquanto espécie animal deste ecossistema, compreendemos esta mata nativa enquanto natural. Em outras palavras, o que estou dizendo é que a mata aqui encontrada não era “intocada”, como os invasores acreditavam, mas sim o resultado de uma série de interações antrópicas com outros seres e o ambiente, e vice-versa. A especialista em ecologia, Carolina Levis, concluiu tal afirmativa (LEVIS, C. et al, 2017; LEVIS, C. et al, 2018). Sua pesquisa foi publicada pela revista Science(LEVIS, C. et al, 2017) e noticiada pelo jornal El

País(OLIVEIRA, 2017), que reportou os resultados encontrados pela pesquisadoraacerca da

floresta amazônica, como mostra o trecho da reportagem:

Esses resultados sugerem que a influência das primeiras atividades humanas na região desempenha um papel importante e duradouro na distribuição de espécies e plantas, e poderia ser utilizada para se descobrir áreas não identificadas de civilizações do passado. “Nosso trabalho rompe o paradigma ecológico de que a selva nunca tinha sido tocada e de que os processos ambientais eram os únicos que regiam a organização da floresta”, diz Levis. (...)“A domesticação de plantas na floresta começou há mais de 8000 anos. Primeiro eram selecionadas as plantas com características que poderiam ser úteis ao homem e em um segundo momento era feita a propagação dessas espécies. Começaram a cultivá-las em pátios e jardins, por meio de um processo quase intuitivo de seleção, similar ao que ocorreu no Egito”, descreve a pesquisadora. (OLIVEIRA, 2017)

O fato de enxergarem uma suposta “mata intocada”, ou ainda uma inferioridade dos povos originários por estes “não domesticarem” a natureza – vista enquanto algo externo ao humano – vem da racionalidade cristã ocidental europeia. Se compreende a natureza a partir de determinado ponto de vista. Tanto a visão científica ocidental, quanto a cristã, as

fontes de conhecimento concebido como válido mais referenciadas na cultura ocidental, compreendem a existência de um mundo pré-humanos, de um mundo onde os humanos ainda não existiam. De fato, pensando no Big Bang e na evolução das espécies, ou até mesmo no mundo criado em sete dias por Deus, em que o homem só aparece no sexto, existe um mundo sem humanidade, até que ela aconteça, que ela se dê, exista. Ao pensarmos assim, criamos certa separação entre o humano, o meio, e os demais seres. Mais ainda, sendo nestas visões o homem e a mulher seres que “apareceram no final”, estes se veem como aperfeiçoados, mais “evoluídos”, mais prontos, superiores a toda a vida terrena.

Em seu livro Há mundo por vir? Ensaio sobre os medos e os fins, DéborahDanowski e Eduardo Viveiros de Castro debateram, a partir de contos ameríndios, como esses povos originários percebem o início dos tempos, afirmando outro raciocínio diferenciado daquele da cultura cristã e ocidental. Este primeiro trecho que aqui cito da obra confirma a afirmação:

Resta, bem entendido, a possibilidade de mais uma versão mitocosmológica (...). Uma versão, em suma, na qual o humano é posto como empiricamente anterior ao mundo. Esta hipótese é explorada em numerosas cosmogonias ameríndias. Ela se acha convenientemente resumida no comentário que abre um mito dos Yawanawa, povo língua Pano da Amazônia ocidental, recolhido por Miguel Carid (1999: 166, apud Calavia 2001): “A ação [do mito] transcorre em um tempo no qual ainda não havia nada, mas já existiam as pessoas”. A versão em epígrafe dos Aikewara, Tupis que vivem no outro extremo da Amazônia, acrescenta aquela curiosa exceção: não havia nada no mundo, só gente – e jabotis! (CALHEIROS, 2014: 41). Na origem, enfim, tudo era humano, ou melhor dizendo, nada não era humano (...). Um número considerável de mitos ameríndios, e, talvez um pouco menos comumente, de diversas outras regiões etnográficas, imaginam a existência de uma humanidade primordial (seja simplesmente pressuposta, seja fabricada por um demiurgo) como única substância ou matéria a partir da qual o mundo viria ser formado. (DANOWSKI; CASTRO, 2014, p.87)

Seria então a partir desta substância ou matéria, desta humanidade primordial, que se formariam “(...) as espécies biológicas, acidentes geográficos, fenômenos meteorológicos e

corpos celestes que compõem o cosmos atual.” (DANOWSKI; CASTRO, 2014, p.88). É a

partir desta análise que os autores vão discutir o perspectivismo ameríndio, compreendendo que os povos originários possuem outra matriz de racionalidade diferente da cristã ocidental que invadiu as terras que habitavam naquela época, como se percebe com este segundo trecho do mesmo livro.

(...) “perspectivismo ameríndio” foi o nome que T. S. Lima e E. Viveiros de Castro escolheram para designar uma noção muito difundida na América indígena, segundo a qual cada espécie de existente vê-se a si mesma como humana (anatômica e culturalmente), pois o que ela vê de si mesma é a sua “alma”, uma imagem interna que é como a sombra ou o eco do estado humanoide ancestral de todos os existentes. A alma, sempre antropomorfa, é o aspecto dos existentes que enxergam, quando olham para/interagem com os seres da mesma espécie – é isso, na verdade, que

define a noção de “mesma espécie”. A forma corporal externa de uma espécie é, portanto, o modo como ela é vista pelas outras espécies (essa forma é frequentemente descrita como uma “roupa”). Assim, quando um jaguar olhar para outro jaguar, ele vê um homem, um índio, mas quando ele olha para um homem – para o que os índios veem como um homem -, ele vê um queixada ou um macaco, já que estas são algumas das caças mais apreciadas pelos índios amazônicos. Assim, todo existente no cosmos se vê a si mesmo como humano, mas não vê as outras espécies como tal (isto, ocioso sublinhar, se aplica igualmente à nossa espécie).(DANOWSKI; CASTRO, 2014, p.95)

Com o primeiro trecho, identificamos na cultura ameríndia o início dos tempos como concretizado a partir da humanidade, e não anterior a ela. Interessante enxergar esta visão de que a partir da humanidade é que veio o mundo. Em um primeiro momento, nós ocidentais críticos podemos pensar que existe aí certo antropocentrismo. No entanto, só se pode conceituar “antropocentrismo” no seio de uma cultura que separa, cataloga e hierarquiza as espécies desde sua origem, seja pela evolução das espécies ou pelo criacionismo. Se tudo parte do mesmo, tudo é o mesmo. A humanidade seria a composição da vida, materializada em diferentes tipos de corpos. Não seria antropocentrismo pois não existiria um círculo com centros e beiras, espaços de categorias diferentes. Seria um corpo de geometria impensável pela cultura ocidental. Um corpo fluido, sem um início ou fim necessários, sem se sobreporem uns aos outros.Se a humanidade for vista enquanto esta composição da vida, enquanto a matéria de origem de tudo que é, tudo o que é será protegido enquanto vida. Que isso não se confunda com certo purismo. Os povos originários caçam, tiram outras vidas, mas o reconhecimento sobre a vida daquela caça é completamente diferente de nossa cultura que chega aos supermercados para comprar bifes devidamente higienizados e plastificados, sem nenhuma referência de que aquilo é, ou foi, um ser.E menos ainda com a sabedoria de que aquele ser também seria, para si,humano, como o é com o perspectivismo ameríndio, já que a partir da matriz de racionalidade destes povos originários,

Nós humanos (i.e. nós ameríndios) não vemos os animais como humanos, portanto. Eles não são humanos-para-nós; mas nós sabemos que eles são humanos-para-si. Sabemos igualmente que nós não somos humanos-para-eles, que eles nos vêem (sic) como bichos de caça, ou como feras predadoras, ou tribos inimigas poderosas (cuja “humanidade” meramente taxonômica é irrelevante, quando não ativamente negada), ou espíritos canibais, conforme a posição respectiva que nós e eles ocupamos na cadeia alimentar. Quando um índio interage com um existente de “outra espécie” – o que, repetimos, inclui os membros de outros coletivos que nós chamaríamos de “humanos” -, ele sabe que está tratando com uma entidade que é humana em seu próprio departamento. (DANOWSKI; CASTRO, 2014, p.96)

Ao se compreender na cultura ocidental a separação entre as espécies umas são afastadas das outras. Ao contrário, aosaber esses seres como sendo uma mesma matéria

humana, se promove a noção de natureza enquanto unidade, não fragmentada em seu seio. Se

homo sapiens – esta matéria humana, é valorizada a capacidade de identificação desta natureza como unidade. Isso também se fortalece com a compreensão de que a essência, a alma de todo ser, é igual, antropomorfa. No profundo, na alma, seriamos todos o mesmo, e assim se constrói uma sensibilidade e percepção maior na identificação e respeito a uma harmonia do todo.

Esta noção sobre os corpos do planeta, e sobre o princípio da existência, como visto, é completamente diferente entre as culturas aqui analisadas, e fortalece que, em 1500 ou hoje, a interação com o que chamamos de natureza seja completamente diferente de uma cultura para outra. A perspectiva a partir da qual se enxerga o mundo definirá como este será moldado. As formas de convivência, relacionamentos entre diferentes (ou não) espécies, as formas de produzir, comercializar, trocar, consumir, acabam sendo reflexos de uma cultura,com todas as suas conexões espaço-temporais carregadas. É assim que os escambos que aconteceram entre europeus e Tupis foram acontecimentos diferentes para cada perspectiva.

Cada parte neste escambo tinha dele uma leituradiferente: para os habitantes do lugar, a troca de presente permitiatecer laços de aliança. Para os europeus, a lógica em vigor visavaapenas a acumulação, traço que os habitantes originários julgavamridículo, segundo Jean de Léry:“Eis sumaria e verdadeiramente o discurso

que ouvi da boca de um pobreselvagem americano. Donde, esta nação, que estimamos tão bárbara, risecom bom humor daqueles que, arriscando a própria vida, atravessamo mar para ir buscar o pau-brasil para enriquecer.(DABAT, 2010,

p.50)

De um lado, a partir de sua matriz de racionalidade, os povos originários não conseguiam compreender os motivos que levariam os recém chegados a desbravarem o desconhecido, correrem riscos com doenças tropicais, perderem suas vidas, em troca de acúmulo de alguma matéria. Por outro, os europeus não concebiam como algum povo olha para tudo que é e não vê enquanto mercadoria, enquanto produto que, acumulado, lhe dará certo prestígio, certa riqueza. Os invasores enxergaramainteraçãodemais seres-povos

originários-ambiente, na construção do espaço geográfico, como sinal de fragilidade, e viram

aí uma oportunidade de fazer o que buscavam: acumular matéria e transformá-la em capital. Esta necessidade de expandir a lógica de seu sistema econômico para outros povosestá na essência do capitalismo histórico, na visão de Wallerstein, aqui citado por Figueiredo (2010).

Para Wallerstein, el capitalismo histórico es una totalidad, un sistema único, que logró articular y someter distintas “sociedades periféricas” del “nuevo mundo” a su lógica de acumulación de capital. Este trazo es utilizado por el autor para distinguirlo de sistemas socialesno capitalistas: “Lo que distingue el sistema social

histórico que estamos llamando de capitalismo histórico es elhecho de que éste [...] ha venido a ser utilizado conel objetivo o intención básica de suauto-expansión.” (WALLERSTEIN, 1985, p. 10, apud FIGUEIREDO, 2010, p.22)

Assim,

(...) el “descubrimiento” y la posterior colonización es parte delproceso de integración geopolítica y económica controlado por Europa, auspiciado com la principal finalidad de expandir suproceso de acumulación capitalista en escala mundial. (PRADO JUNIOR, 1970, apud FIGUEIREDO, 2010, p.22).

Naturalmente, o que está na essência de um sistema político-econômico continuaria se reproduzindo com ele. Então será que esta lógica, já presente no início da invasão europeia, ainda continuaria sendo reproduzida nos dias atuais? Sim. A lógica segue a mesma, seja no século XV, seja no XX ou XXI: expandir e impor o capitalismo ao mundo e fortalecer os países dominantes da economia nórdica enquanto definidores dos rumos a se seguir.A transformação que podemos falar, em relação à mudança de tempos, é de que hoje os norte-americanos devem ser adicionados enquanto ocidentais dominantes, e as nações dominantes europeias trocaram de posto entre si.

Com isso, em dias mais atuais ainda existe um processo colonial. Quando em seu discurso de posse, em 1949, o presidente eleito dos Estados Unidos, Harry Truman, introduziu ao mundo o termo subdesenvolvimento, ele estava atuando com esta lógica de expansão colonizadora sobre o mundo. Neste, Truman defende que os americanos precisam compartilhar seus avanços científicos e seu progresso industrial com as demais regiões, segundo ele, ‘subdesenvolvidas’. Estabelece, com tal discurso, a realidade urbano-industrial norte-americana (e europeia!) como desenvolvimento e objetivo necessário para os países que não se encontrassem nas mesmas condições.

Vários foram os programas de desenvolvimento dos países dominantes voltados adesenvolver os ditos subdesenvolvidos. Leia-se: vários foram os programas dos países dominantes para gerar dependência de outros países a si, lá em 1500 e agora também. Não irei aqui discorrer muito mais sobre estes, mas para não deixar quem lê sem nenhuma referência citoalguns poucos exemplos mais recentes: a revolução “verde”; o programa de cooperação técnica internacional entre Estados Unidos e os países latino americanos,conhecido como “Ponto IV”; o “Aliança para o Progresso”; o programa “Corpos da Paz”, que é muito bem apresentado no documentário “Em nome da América”,muitos outros, não querendo aqui me aprofundar.

A questão é que aconstante corrida pelo desenvolvimentoveio, mais uma vez, como sentido deproliferar o capitalismo, e também o modelo industrial, buscando influenciar

todas as áreas e temáticas do planeta, passando, frequentemente, por cima das realidades tradicionais dos povos locais, esmagando experiências e saberes seculares por eles construídos, como debatido no capítulo anterior.No Brasil, por exemplo, o período de governo de Juscelino Kubitschek, presidente entre 1956 e 1961, a partir da ótica do

desenvolvimento,atraiu fortemente o capital industrial estrangeiro para o país, gerando

grandes dívidas e dependência frente aos países dominantes. Com esta expansão do capitalismo pelo planeta, se consolidam também suas lógicas individualistas, competitivas, de exploração extrema dos bens naturais, e a compreensão de que quase tudo seria válido para se atingir o tão sonhado desenvolvimento. Este último seria então a construção da vida a partir da ótica capitalista urbano-industrial dos países nórdicos, dominantes na geopolítica mundial.

Nesta continuação que é o processo moderno da colonização os europeus ganham como fortíssimo “aliado” o trabalho dos norte-americanos para expandirem seu sistema pelo mundo. Ambos seguindo com a lógica inicial de superioridade sobre outros povos. É assim que vão conceber a humanidade através de uma suposta linha evolutiva, por cujas etapas todos teriam de passar de forma semelhante para construírem uma vida digna, para serem

desenvolvidos. Como se a vida fosse sempre construída linearmente em uma mesma direção, e

então alguns povos estariam mais para frente, enquanto outros estariam mais para trás desta linha evolutiva.É neste sentido que se olha, por exemplo, para os modos de vida dos povos originários quase que como um resquício do passado, e não como modo de vida presente construído por outros rumos. Assim,

A palavra [desenvolvimento] sempre tem um sentido de mudança favorável, de um passo do simples para o complexo, do inferior para o superior, do pior para o melhor. Indica que estamos progredindo porque estamos avançando segundo uma lei universal necessária e inevitável, e na direção de uma meta desejável. (...) Porém, para dois terços da população mundial, esse significado positivo da palavra “desenvolvimento” – profundamente enraizado dois séculos depois de sua construção social – é um lembrete daquilo que eles não são. Faz com que se lembrem de uma condição indesejável e indigna. Para escapar dessa condição, precisam escravizar-se a experiências e sonhos alheios. (ESTEVA, 2000, p.64)

Esta condição é perceptível ao senso comum, pode ser observada no cotidiano da vida. Ela faz com que uma ou um leitor de cultura ocidental, sem fazer uso de nenhum