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2 LÓGICA DIALÉTICA, EXPRESSÃO DA REALIDADE COMO

2.4 O CONCEITO COMPREENDIDO COMO CONTRAPOSIÇÃO

A realização do conceito significaria então o domínio universal exercido sobre a natureza pelo homem que possuísse uma organização social racional - um mundo que de fato se poderia imaginar como sendo a realização do conceito de todas as coisas.(MARCUSE, 2004, 145)

A contraposição histórica, objetividade–subjetividade, é compreensível sinteticamente como

conceito. A doutrina do conceito é compreendida como um leque entre uma concepção

ontológica de um idealismo absoluto e uma concepção histórica de abrangência universal. A subjetividade transpõe-se de negatividade isolada em si, anseio de autonomia para negatividade determinada, efetividade de

autonomia. A pretendida desvinculação do sujeito em relação à coisa em si, como determinação impossível ou como determinação projetada para um infinito de dízima periódica transforma-se em realização empírica reconhecível de liberdade,

em efetividade de alteração subjetivada.

A subjetividade deixa de ser anseio postergado, deixa de ser pesadelo de incapacitação para se transformar verdadeira realidade. “Atingimos o ponto em que a Lógica Objetiva se transforma em Lógica Subjetiva, ou, em que a subjetividade emerge como a

verdadeira forma da objetividade.”(MARCUSE, 2004, 140) Realidade só é compreendida adequadamente enquanto

compreendida como efetividade, como resultado sintético, como a verdade da essência e a verdade da existência. Marcuse resume a

análise de Hegel que permite compreender a subjetividade como síntese do processo de busca pelo fundamental do ser, ou como

diz ele, do ponto em que a Lógica Objetiva se transforma em Lógica Subjetiva. “A forma verdadeira da realidade deve ser concebida como sujeito. Liberdade requer autoconsciência e conhecimento da verdade. - Autoconsciência e conhecimento da verdade

são os fundamentos do sujeito. (MARCUSE, 2004, 140)

Conceito, forma verdadeira da realidade, é uma consecução do sujeito enquanto autoconsciência pura do verdadeiro. A subjetividade, enquanto princípio responsável pelo desenvolvimento autoconsciente do indivíduo, enquanto consistente de si, emerge como a verdadeira forma da objetividade. A Lógica Objetiva transformou-se em Lógica Subjetiva. O sujeito é a individualização do universal, do espírito de uma época histórica. O sujeito é capaz de compreender, de revelar o espírito universal presente nas instituições efetivando-o enquanto necessidade institucional. “Se chegarmos a compreender tal época, e a apreender o seu conceito, veremos que um princípio universal, através da ação autoconsciente

do indivíduo, se desenvolve nas instituições, fatos ou relações estabelecidos.”(MARCUSE, 2004, 140)

O Eu, enquanto pura autoconsciência do verdadeiro, é um atributo do conceito. “A forma na qual a verdade se mantém é o conceito. A liberdade não é, em última análise, um atributo do sujeito pensante como tal, mas da verdade que este sujeito sustenta e controla.” (MARCUSE, 2004, 140)

O conceito é mais atividade de compreensão do que forma lógica abstrata da realidade. O conceito é o elemento sintético culminante da lógica. Lógica como processo de compreensão que procurou no ser o fundamento, a coerência, a racionalidade e verificou que o ser em sua complexidade chega à essência como determinante de uma complexidade. O conceito é o ponto sintético entre o ser que se torna, e a complexidade conseguida por suas qualidades, a essência é o elemento que compreende os dois elementos anteriores numa forma sintética. Tanto o conceito como o sujeito só podem ser compreendidos enquanto síntese de processo, e enquanto elementos sintéticos, não podem exigir para si a característica de unicidade determinadora que recebeu o sujeito em sua versão transcendental. “A liberdade é, pois, um atributo do conceito; e o conceito é a forma verdadeira da realidade,

forma em que a essência do ser se realiza.” (MARCUSE, 2004, 140)

A universalidade do conceito é o princípio da totalidade concreta das diferenças particulares que pertençam a tal totalidade. O conceito não se reduz à descrição do que acontece mas é um conhecimento do que é verdadeiro nos acontecimentos. Para Marcuse, desenvolver as categorias da realidade é desenvolver as categorias da liberdade, porque se o conceito é atividade sintetizadora do sujeito, o conceito é a compreensão da realidade enquanto possibilidade e efetividade da liberdade. “A verdade não pode ser colhida entre os fatos enquanto o sujeito ainda não estiver neles

vivendo e, ao contrário, contra eles se colocar.” (MARCUSE, 2004, 141) Filosofia e pensar para Marcuse não se

completam pela descrição dos acontecimentos. Pensar é negatividade é compreender o verdadeiro, o outro da aparência dos acontecimentos. “O mundo dos fatos não é racional mas tem que ser trazido à razão, isto é, a uma forma na qual a realidade

corresponda efetivamente à verdade.” (MARCUSE, 2004, 141) O conceito é a compreensão, a verbalização, a abrangência

pela palavra, é síntese compreensiva porque apreende os elementos num conjunto adequado.

O conceito dialético, distingue-se da lei positivista que caracteriza o existente, como algo definitivo a partir de algo abstraído, abstraído de sua parte, uma parte considerada como o todo. “O conhecimento filosófico; porém, só é superior à experiência

e à ciência na medida em que seu conceito contém aquela relação à verdade que Hegel só admite nos conceitos dialéticos.”

(MARCUSE, 2004, 142) Conceito dialético é negação determinada. Negação enquanto superação dos fatos, até este ponto há muitos exemplos de tentativas filosóficas de propor alternativas ideais. No entanto a determinação da negação inclui um além da

negação enquanto proposta alternativa, esta proposta tem que ter a qualidade de determinidade, não abstrata, a determinação se

especifica quando a alteração dos fatos é reconhecida nos próprios fatos, sua alteração como uma necessidade do próprio fato, é dialética alternativa, mas materialista porque ligada a este material e não a uma transcendência alheia. O processo de abstração inclui as diversas formas e relações da realidade enquanto uma totalidade concreta de suas possíveis diferenciações. “O conceito não só contém todos os fatos de que se compõe a realidade, como também os processos em que estes fatos a si mesmos se desenvolvem e

dissolvem.” (MARCUSE, 2004, 142)

A interpretação histórica pode ser reconciliada com a tendência de tudo convergir no conceito. O método dialético apreende o princípio compreensivo do desenvolvimento efetivo, da história objetiva do próprio real. Os conceitos são reproduções do desenvolvimento objetivo de sua formação. “Nada pode ser aduzido de fora,. (por exemplo,

nenhum fato determinado). O desenvolvimento dialético não é a atividade externa do pensamento subjetivo mas a história objetiva do

próprio real.”(MARCUSE, 2004, 142) O transcendente, o alheio ao objeto histórico não faz parte de sua integridade. Sua

integridade é antagônica, no entanto a contradição já integralizada é síntese que inclui a determinação histórica. O conceito é uma totalidade integrada de determinação, de modo que é impossível e absurdo pensá-lo como verdade reduzida a juízos universais

abstratos. O conceito de capitalismo é nada menos que a totalidade do processo capitalístico, compreendido do ponto de vista do

"princípio" pelo qual ele progride.” (MARCUSE, 2004, 143) Compreender o conceito como a "totalidade negativa" garante a

revelação da estrutura e das contradições da realidade. Da síntese entre abstratividade do universal e determinidade da totalidade

concreta é que se constrói o conceito. As crises são estágios necessários da "autodiferenciação" do capitalismo, e o sistema revela seu

verdadeiro conteúdo através do ato negativo que é o colapso.”(MARCUSE, 2004, 143) A contradição, compreendida pela

negação, propicia ao conceito atingir a concretude do histórico. Cada momento particular contém como conteúdo próprio o todo, é a "autodiferenciação" do universal, da totalidade objetiva. O universal deixa de ser abstrato como sua exigência tética para tornar-se

concreto que inclui sua exigência antitética. O conceito apresenta uma totalidade objetiva na qual cada momento particular aparece

como a "autodiferenciação" do universal. (o princípio que governa a totalidade) e é, por conseguinte, ele mesmo universal.

(MARCUSE, 2004, 143) O conceito enquanto universal concreto é essa totalidade sintética, concreta. Totalidade histórica enquanto sintética e não histórico enquanto simples contingente sem compreensão de negatividade.

O conteúdo específico torna-se diretamente universal, pelo processo de todo sua existência concreta. “Aqui, a lógica dialética reproduz novamente a estrutura de uma forma histórica da realidade na qual o processo social dissolve, na dinâmica

econômica, cada esfera delimitada e estável de vida.” (MARCUSE, 2004, 144)

O conceito é a única forma adequada da verdade, pois suas determinações reproduzem movimentos específicos que se integram às mudanças do todo. Suas determinações não são expressas por sequências matemáticas, o conceito pela integração entre universal e singular sintetiza as determinações históricas contingenciais ao significado integrativo. Tal síntese conseguida pela negatividade não é conseguida por números e linhas, mas pela expressão de movimentos vivos. “O conceito, a única forma adequada da verdade, "só pode ser apreendido essencialmente pelo Espírito... É inútil tentar fixá-lo6 por meio de figuras espaciais e símbolos algébricos, visando ao sentido externo e ao tratamento mecânico não conceitual ou cálculo".(MARCUSE, 2004, p. 145)

O conceito representa o domínio universal do mundo pela razão, pelo homem enquanto organização social racional. A doutrina do conceito é uma doutrina completa se como universal tiver viva integração histórica. Marcuse adverte que a compreensão conceitual não pode realizar a substituição do histórico por uma construção independente do pensamento. Ele quer evitar que a filosofia se torne um jogo de concepções encerradas no absolutismo de regras e de ideias transcendentes ao concreto. “Esta tendência ainda pode ser conciliada com uma interpretação histórica, se considerarmos o conceito como representando a penetração

final do mundo pela razão.” (MARCUSE, 2004, 145) O conceito é síntese, representa o domínio universal do mundo, é uma

compreensão significativa. No entanto essa compreensão não é uma totalização qualquer, a partir de uma subjetividade abstrativa

qualquer. A compreensão é sintética, o conceito é produzido pelo homem enquanto integrador de uma organização social racional. Marcuse destaca que a concepção histórica que se mantém viva na filosofia de Hegel não pode ser superada por uma compreensão não

dialética. As concepções ontológicas de idealismo absoluto significaria a redução à unidade da ideia de valor apriórico, tornando-se

absolutamente uma e determinante do constructo pelo pensar e não pelo agir. O constructo conceitual significa sim o domínio universal exercido pelo homem da realidade da natureza e da cultura. No entanto esse domínio compreensivo e por extensão domínio da práxis humana é para ser exercido pelo homem enquanto organização social racional. A realização do conceito é realização histórica da compreensão obtida pela totalidade conceitual expressa por Marcuse pela organização social racional.