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O Conceito de Gênero e a tensão entre os eixos público e privado

ASPECTOS METODOLÓGICOS 2.1 A Escolha da Comunidade

1. SANTA RITA-PB: as entrelinhas do espaço urbano e da cidade nas narrativas dos sujeitos e das sujeitas

3.3 O Conceito de Gênero e a tensão entre os eixos público e privado

As questões de gênero aqui abordadas se baseiam na congruência em se reconhecer que o espaço urbano sofre as insurgências provocadas pelo paradigma masculino, daí a necessidade de se buscar compreender a acepção de gênero, traduzida como categoria útil na análise relacional, como descreveu Joan W. Scott (1989). Dentro dessa perspectiva de vulnerabilidade que atinge boa parte das mulheres, no âmbito doméstico e público, como se deve discutir o conceito de gênero? Os movimentos de mulheres e feministas que eclodiram nas décadas de 1970 e 1980 e que são diversos em suas perspectivas, reproduzem uma aproximação do conceito de gênero sob o prisma do espaço urbano para todos? Como discutir sobre a tensão existente no âmbito privado e público em relação à mulher?

Então, o conceito foi sendo desenvolvido e assimilado como categoria, consolidando-se como recurso de análise sociológica ou mesmo política, e não apenas enquanto categoria de estudos de gênero, superando a mera teoria de diferença entre as

voto, do trabalho assalariado, do acesso à educação e a todas as garantias previstas pela ‘cidadania moderna.’” (SORJ, 1992, p. 19).

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características biológicas e de identidade psicológica do indivíduo, como inicialmente surgiu, através dos estudos de Robert Stoller (1968)201 passando a ser usado, também,

como categoria de análise relacional, de denúncia do processo de opressão e desigualdade e, assim, se desenvolvendo com o objetivo de atender a realidades ainda não reconhecidas.

Nessa linha de reflexão, Joan W. Scott eleva a concepção de gênero, para além do caráter relacional e não essencialista até então tido como referência, reconhecendo-o como um dos princípios básicos de organização nas sociedades, ou seja, “O uso do ‘gênero’ coloca a ênfase sobre todo o sistema de relações que pode incluir o sexo, mas que não é diretamente determinado pelo sexo nem determina diretamente a sexualidade.” (SCOTT, 1989, p. 5). Portanto, o conceito de gênero concebido até então como uma categoria fundamentalmente simbólica, sob essa perspectiva, alcança também uma nova categoria material e estrutural.202

Sob outro prisma, Julieta Paredes revela que o conceito de gênero passa a se incorporar enquanto “categoria política relacional de denúncia” das relações de opressão e exploração calcadas no sistema patriarcal imposto contra as mulheres, então, ela alerta para o fato de que “(O uso da ideia de equidade de gênero) começa a tirar força política ao conceito de gênero” convertendo-o num conceito pós-moderno superficial e descritivo de papeis, na medida em que, “a denúncia de gênero ao se converter em equidade de gênero produz uma grande confusão teórica e uma desmobilização política das mulheres.” (PAREDES, 2008, p. 4-5).

Na verdade, a autora faz uma reflexão pautada na crítica sobre o sistema neoliberal que, segundo ela, ao promover os direitos humanos, o faz no sentido de premiar apenas mulheres, jovens, homossexuais, indígenas, incapacitados, ou quaisquer outros sujeitos que estejam na mesma classe social ou que comunguem do mesmo pensamento político

201 Robert Stoller, em 1968, introduziu em seu livro Sex and Gender, a palavra gênero para fazer uma

distinção em relação ao termo sexo, tão somente associado às condições biológicas. O livro trata de estudos psicanalíticos aplicados à transexualidade. Stoller defendeu a ideia de que o sentimento de ser mulher ou homem prepondera em relação às características anatômicas.

202 Segundo Scott (1989): “No seu uso mais recente, o “gênero” parece ter aparecido primeiro entre as

feministas americanas que queriam insistir na qualidade fundamentalmente social das distinções baseadas no sexo. A palavra indicava uma rejeição ao determinismo biológico implícito no uso de termos como “sexo” ou “diferença sexual.” O “gênero” sublinhava também o aspecto relacional das definições normativas de feminilidade. As que estavam mais preocupadas com o fato de que a produção dos estudos femininos centrava-se sobre as mulheres de forma muito estreita e isolada, utilizaram o termo “gênero” para introduzir uma noção relacional no nosso vocabulário analítico. Segundo esta opinião, as mulheres e os homens eram definidos em termos recíprocos e nenhuma compreensão de qualquer um poderia existir através de estudo inteiramente separado.” (SCOTT, 1989, p. 3). Disponível em: <http://www.dhnet.org.br/direitos/textos/generodh/gen_categoria.html>. Acesso em: 12 mar. 2019.

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neoliberal, e que a partir de suas adversidades, lhes sirvam econômica e politicamente sem se rebelar, porque o sistema neoliberal guarda sua visão desigual, classista, machista, racista, assim como o próprio liberalismo se revelou sob o ideário francês de “liberdade, igualdade e fraternidade”203 dirigido aos reconhecidamente burgueses cidadãos, sem que

tivesse qualquer intenção de fazer espargir os direitos sobre todos igualmente.204

(PAREDES, 2008, p. 3-4). Finalmente, Julieta Paredes coloca que:

Gostaríamos de comparar o valor político da categoria gênero com o de classe […] nunca haverá equidade (igualdade) de classe, porque as classes sociais se fundamentam, se originam na injustiça da exploração de uma classe pela outra […] a mesma coisa acontece com o gênero, nunca haverá equidade de gênero entendida ela como igualdade […] porque a luta consiste na superação do gênero como injustiça histórica (PAREDES, 2008, p. 5).

Sobre isso, Saffioti vem destacar que “na França, embora a revolução burguesa suprimisse o privilégio da masculinidade (1790), tornando a mulher igual ao homem no direito sucessório, o casamento subordinava a esposa e, consequentemente, seus bens, ao marido.” (SAFFIOTI, 1976, p. 106-107). De fato, mesmo com a expansão das liberdades humanas, esse processo atingiu timidamente a mulher, inclusive, independentemente da classe a que pertencia. Pelo contrário, a sua condição de mulher como sexo inferior, impôs-lhe aceitar sua condição de classe de forma diferenciada em relação ao homem. Como descreve Saffioti:

É a abolição dos privilégios masculinos que ela pretende. Todavia, a revolução foi dirigida pela burguesia em ascensão cujos interesses residiam, de um lado, na eliminação dos privilégios feudais e, de outro, na manutenção das regalias masculinas. Em outros termos, a palavra de ordem da revolução não era apenas burguesa; era burguesa e masculina. Frustram-se, pois, os esforços de Olympe de Gouges e ela encontra a morte no cadafalso. (SAFFIOTI, 1976, p. 107).

Aliás, constata-se que é a partir desse momento histórico, que as mulheres reconheceram que a construção de sua cidadania dependeria da dualidade opositiva entre

203 Na verdade, em relação a isso, é importante se mencionar a figura de Olimpe de Gouges, que imprimiu

um condão político às reivindicações femininas, no sentido de buscar para as mulheres os direitos que a sociedade conferia aos homens, já em 1789, quando redigiu a Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã, concebida como resposta e complemento à famosa Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que não incluía as mulheres. (SAFFIOTI, 1976, p. 106-107).

204 Aliás, no prefácio de seu livro Judith P. Butler antecipa essa preocupação, dizendo: “os debates

feministas contemporâneos sobre os significados do conceito de gênero levam repetidamente a uma certa sensação de problema, como se sua indeterminação pudesse culminar finalmente num fracasso do feminismo.” (BUTLER, 2003, p. 7).

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igualdade e diferença, que foi o traço marcante dos primeiros movimentos feministas deflagrados.205

Na Antropologia,206 a questão de gênero foi sendo compreendido a partir da

década de 1930, e se ancora no pressuposto de que a sua concepção se apoia na cultura da diversidade humana que é construída por particularidades culturais, então, através de pesquisas de diversos estudiosos da área, o conceito é mobilizado a partir da constatação de que, nas diversas partes do mundo, homens e mulheres são muito diferentes entre si, mas que as diferenças não estão amparadas nas diferenças biológicas. Por exemplo, através dos estudos de Margareth Mead (1935),207 em Papua-Nova Guiné, descobriu-se

que não existe correlação entre o corpo e a conduta social dos homens e mulheres. A antropóloga Mead, ao estudar as três tribos daquele país (Arapesh, Mundugumor,

Tchambuli), constatou que no primeiro grupo (Arapesh) homens e mulheres eram

amáveis entre si e muito gentis com suas crianças, apresentavam uma sociabilidade mais maternal, segundo a autora. No segundo grupo (Mundugumor), todos eram muito agressivos entre si, mas, nesses dois primeiros grupos, os papeis destinados a homens e mulheres eram iguais para ambos, não havia distinções. Já no terceiro grupo (Tchambuli), havia uma inversão dos papeis sexuais, em comparação ao modelo da cultura nas sociedades ocidentais, porque naquele grupo, os homens eram estimulados a serem mais gentis e maternais, inclusive, sendo incumbidos de se ocuparem das crianças quando nasciam, e as mulheres eram consideradas mais fortes, bravas e guerreiras.

Então, Mead comprovou, nesse estudo, que os “papeis sexuais” ou gênero, lido na época como “temperamento” não eram determinados por questões biológicas inscritas nos corpos, portanto, não poderiam ser considerados determinantes supostamente

205 Saffioti conta que: “O feminismo, todavia, não morre; silencia-se por quase três décadas para ressurgir

aliado ao socialismo utópico, estimulado inicialmente pelas idéias de Saint-Simon e, depois, por Fourier e Cabet. O jornal La Femme Libre, surgido em 1832, lança, em seu primeiro número, um apelo de inspiração saint-simoniana às mulheres, incitando-as a reivindicar seus direitos, aproveitando o momento histórico em que o proletariado reclamava sua libertação. Eugénie Niboyet, entusiasmada com a teoria de Fourier, funda, em Lyon, em 1833, Le Conseiller des Femmes.” (SAFFIOTI, 1976, p. 107).

206 A Antropologia Feminista tece uma crítica à noção de diferença cultural, que é característica da

Antropologia, entretanto, introduz uma noção de diferença que se complexifica e aparece na constituição de desigualdade e onde o gênero não é o único produtor de diferença, devendo, portanto, ser tomado no cruzamento com outros elementos em suas interseccionalidades como raça, etnia, geração e de classes. (BONETTI, 2011, p. 62).

207 No livro “Sexo e Temperamento em três sociedades primitivas” (4ª ed., 2000), Margareth Mead (1935)

investiga os papeis sexuais, que ela denomina “temperamento” como foi chamado na época, o termo “gênero” que ainda não era compreendido como uma categoria de análise, conforme Joan Scott (1989) colocou.

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naturais. Da mesma forma, Marilyn Strathern (2006),208 ao estudar os povos da

Melanésia, também, fez uma incursão nessa proposta de refletir e aprofundar a questão de gênero, constatando como aquele povo tem a capacidade de acionar, mobilizar e modificar seu gênero sempre a partir da interação com o outro, ou seja, a identidade ou subjetividade é fluida e todo indivíduo contem múltiplas identidades de gênero, como consequência dessas interações. Segundo ela, gênero se complexifica na medida em que ele é entendido como “um princípio pervasivo da organização social.” (STRATHERN, 1987, p. 278).209 Então, o conceito de gênero tal como proposto por Marilyn Strathern

(2006, p. 19), seria uma “categoria de diferenciação”, que tem como construtos de gênero, as formas masculino e feminino.

Na verdade, a compreensão do termo transcende a própria linguagem adotada institucionalmente, porque apenas traz uma representação ínfima daquilo que se almeja alcançar em termos de consideração e respeito ao outro. Judith Butler (2009, p. 12) vem problematizar a questão ao colocar que “a complexidade do conceito de gênero exige um conjunto interdisciplinar e pós-disciplinar de discursos, com vistas a resistir à domesticação acadêmica dos estudos sobre o gênero ou dos estudos sobre as mulheres e de radicalizar a noção de crítica feminista”, instigando uma reflexão ainda mais eloquente, a qual a autora defende sobre a fluidez de acepção dessas linguagens.

Neste sentido, Joan Scott (1989) entende que o gênero não pode ser pensado apenas no âmbito privado das relações familiares, porque, para além dessa esfera, o gênero tem que ser compreendido dentro de um sistema político, econômico e das estruturas de poder da sociedade, já que expressa um campo de disputas teóricas e políticas. Ela seguiu a mesma reflexão de Beauvoir (1941),210 que compreende que

gênero, deve ser pensado, também, como uma categoria que não só mede as diferenças

208 Marilyn Strathern, no livro “O Gênero da Dádiva” (2006) discute que a concepção de gênero não se

enquadra nas dicotomias ocidentais, mas como meio principal, através do qual são construídas relações sociais orientadas por outro modo de pensamento, Na verdade, as identidades de gênero na Melanésia podem ser múltiplas e dependem das circunstâncias, da forma assumida com aqueles com quem se está interagindo. Conforme ela mesma coloca: “por conseguinte, o gênero de uma pessoa pode ser imaginado como dualmente ou multiplamente composto e, nesse estado andrógino, homens e mulheres estão inativos, em seus relacionamentos recíprocos, as pessoas são concebidas alternadamente como num estado de mesmo sexo ou de sexo cruzado. Elas, portanto, corporificam ou objetificam relações sociais, revelando-as seja numa forma ou na outra.” (STRATHERN, 2006, p. 140).

209 Tal qual passa a ser tomado pela Antropologia Feminista, como objeto complexificado e pervasivo. 210 Simone de Beauvoir (1941), de quem é a frase célebre “Não se nasce mulher, torna-se mulher”, foi uma

grande inspiradora nas discussões sobre as desigualdades entre homens e mulheres, a partir de 1941, quando no seu livro “O Segundo Sexo” ela questionou os motivos pelos quais nos sistemas de relação de poder das sociedades ocidentais modernas, as mulheres permaneciam em posição de inferioridade. Ela argumentou que a determinação natural, ou seja, o sexo biológico, não servia para explicar as diferenças ou as desigualdades de condutas entre femininos e masculinos.

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biológicas, mas as relações sociais historicamente construídas. Assim, como Scott diz: “O núcleo essencial da definição baseia-se na conexão integral entre duas proposições: o gênero é um elemento constitutivo de relações sociais baseado nas diferenças percebidas entre os sexos, e o gênero é uma forma primeira de significar as relações de poder. (SCOTT, 1989, p. 21).

Aliás, a tensão aqui discutida tanto aloja a ideia de escalonamento de poder, entre a submissão e a dominação, que carregam a marca de “padrões legitimados socialmente importantes na definição de identidades e condutas” (DEBERT e GREGORI, 2008, p. 178) e exigidos no cumprimento de papeis, como também, representa uma desarticulação entre o discurso e a prática, principalmente, em um cenário em que os organismos internacionais e as organizações civilmente organizadas passaram a pleitear um empenho maior no desenvolvimento de políticas públicas em favor de mulheres nos Estados. Não é de se surpreender, entretanto, que muitos documentos ratificados no âmbito dos países, não surtiram efeitos na implementação de políticas eficientes não só por falta de mecanismos de fiscalização e sanção, como também, o tímido esforço de cada Estado no enfrentamento de condições e obstáculos, por longo tempo inquebrantáveis, de estrutura de dominação.211

O fato é que esses estudos e outros, permitem assimilar que a concepção de gênero passa a representar uma categoria de análise e que se respalda na importância do movimento de todos nesse diálogo entre a questão de gênero e as políticas públicas, mas não só pela sua incorporação nos documentos produzidos nas conferências, que puderam traduzir algumas demandas da sociedade civil, como, também, em vista daquilo que passa a ser incorporado internamente no país, no diálogo com os outros Estados, e, finalmente, que se consolida através da implementação da política pública. Neste momento, a participação social, através das organizações da sociedade civil, tem papel fundamental na implementação da política pública, assim como na construção normativa necessária para se coibir as digressões provocadas pela insegurança jurídica e social em cada seara.

Consta, segundo Machado, que a absorção do conceito de gênero foi alvo de muito conflito no âmbito das conferências preparatórias de Beijing (1995), como também, da IV Conferência Internacional da Mulher (IV CMM), pelo que a autora colocou que

211 Por exemplo, somente em 1999, o Protocolo Opcional à CEDAW reconheceu a competência de um

Comitê, para atuar como mecanismo de sanção, responsável por receber e apreciar participações que denunciassem situações de violação de direitos humanos, esse Protocolo Facultativo da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW), foi ratificado pelo governo brasileiro em junho de 2002. (MONTAÑO, 2003, p. 53).

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diversos países e organizações não-governamentais contestaram a linguagem adotada pelas Nações Unidas, porque o conceito “é gerado a partir da desconstrução das ideias naturalizadas de mulher e homem, chegando-se assim a focalizar a sua construção

cultural e social” (sic) (MACHADO, 1995, p. 416), fato que, segunda a autora, provocou uma polarização dos campos na compreensão do termo, levando a um impasse que representou um dilema sobre a defesa dos direitos das mulheres, principalmente, no que tange ao reconhecimento do direito à pluralidade de orientações sexuais e à defesa pela descriminalização do aborto.

Por outro lado, todo o esforço internacional em contribuir neste cenário, contou com outro marco legal, que foi a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, que ocorreu em Belém do Pará, em 1994, no mesmo ano em que a CEDAW (1979) foi ratificada no Brasil sem reservas,212

demonstrando como a trajetória no sentido de se coibir a violência de gênero, no Brasil, foi tardia e impulsionada pela pressão internacional, principalmente, em virtude da responsabilização do Estado brasileiro por negligência, omissão e tolerância em relação à violência doméstica contra as mulheres, particularmente, em 2001, através do Informe nº 54 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos.213

Por conseguinte, a edição de políticas macroeconômicas integrativas que deem realce às prerrogativas femininas e combatam as estatísticas evidenciadas através do Relatório sobre a Situação da População Mundial da Organização das Nações Unidas (ONU, 2009), da exposição de motivos do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (2013/2015), e que se perpetua nos dias atuais, como evidencia o Anuário Estatístico da CEPAL 2018 sobre os indicadores sociodemográficos, econômicos e ambientais da

212 A CEDAW foi adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 18/12/1979, e entrou em vigor

em 03/09/1981. É considerada a carta de direitos humanos das mulheres com força de lei no marco legal brasileiro sendo assinada pelo Brasil, com reservas, em 31/03/1981 e ratificada, com reservas, em 01/02/1984, mas só entrou em vigor em nosso país em 02/03/1984. Em 22/06/1994 foi ratificada, sem reservas. Texto publicado no Diário do Congresso Nacional em 23/06/1994. Disponível em: <http://www.onumulheres.org.br/wp-content/uploads/2013/03/convencao_cedaw1.pdf>. Acesso em: 11 mar. 2019.

213 O Estado brasileiro precisou se empenhar em implementar uma legislação que coibisse a violência

doméstica contra as mulheres, principalmente, em função do descumprimento aos termos da Convenção de Belém do Pará e da Convenção Americana de Direitos Humanos. A trajetória, entretanto, foi longa e só se consolidou em 2006, através da Lei nº 11.340/2006, conhecida como lei Maria da Penha, que passou a tratar com mais rigor a punição contra as agressões contra as mulheres. O nome da lei, inclusive, teve inspiração no caso emblemático de agressões sofridas pela farmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, que conseguiu junto à Comissão dos Direitos Humanos da OEA, através de uma petição encaminhada pelos Centro para a Justiça e o Direito Internacional (CEJIL-Brasil) e o Comitê Latino-Americano do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM-Brasil) a condenação do estado brasileiro, assim como estimulou a normatização do ordenamento pátrio. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11340.htm>. Acesso em: 25 mar. 2019.

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América Latina e do Caribe, publicado, recentemente, em 2019, são importantes, no sentido de promoverem a conexão de políticas em favor da mulher, inclusive, no contexto habitacional, comprovando, também, a necessidade de implementação de políticas públicas menos fragmentadas e que incorporem o debate de gênero em todas as suas perspectivas.

Neste sentido, é significativo pensar na importância que a moradia e a cidade representam na vida cotidiana das mulheres, inclusive, porque a violência contra a mulher persiste no âmbito doméstico e para além dele, sobretudo, porque a configuração das cidades não incorpora as necessidades femininas, acentuando-se as tensões entre os espaços público e privado para a mulher. Destarte, lançar políticas públicas que busquem a superação de uma realidade dentro desse contexto, marcado por profundas desigualdades, sobretudo, no que diz respeito às relações de gênero, é salutar, inclusive, no que tange à questão da política de titularidade residencial feminina, que pode ser elencado como um resultado da busca pela efetivação de ações que tenham o condão de suplantar problemas envolvendo o déficit habitacional, principalmente, para mulheres que compõem famílias de baixa renda.

Com uma espécie de galhardia, Dona Sílvia comenta que: “a maioria das pessoas

aqui são trabalhadoras, saem pra trabalhar e voltam pra dormir.” Interessante

manifestação da moradora do bairro Marcus Moura que, por sua vez, exerce suas atividades no bairro mesmo, com a fabricação e venda de pastéis pelas ruas da comunidade e observa o movimento das ruas de onde mora, desde cedo do dia, e tal narrativa abre a reflexão sobre o que Harvey adverte ao mencionar que Lefebvre, já na

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