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2.5 As centrais de atendimento

2.5.1 O controle nas centrais de atendimento

Sobre o controle nas centrais de atendimento, Fernie e Metcalf (1998, p. 2) afirmaram: “‘a tirania da linha de montagem’ é um piquenique escolar de domingo comparado com o controle que a gerência pode exercer na telefonia computadorizada”. A partir da revisão da literatura, identificamos sete possíveis fontes de controle nas centrais: espaço físico, padronização do serviço (script e tom de voz), dispositivos de vigilância eletrônica, gerência, normas e regras, consumidores e os membros da própria equipe. Nos próximos parágrafos, revisaremos cada uma destas fontes de controle. A figura 7 ilustra as sete fontes de controles exercendo influência sob o operador – a figura foi elaborada pelo autor desta pesquisa com base nas pesquisas descritas abaixo.

Figura 7 – Fontes de controle ao trabalho do operador de teleatendimento

Fonte: Dados da pesquisa, 2015.

Operador de teleatendimento Espaço físico Padronização do serviço Vigilância eletrônica Gerência Normas e regras Consumidores Membros da equipe

Segundo Ricci (2010), o espaço físico das centrais de atendimento é organizado para favorecer a visualização dos operadores e evitar o surgimento de resistências coletivas – sendo por isso um elemento de controle. Os poucos espaços privativos, a ausência de paredes e a proximidade entre as mesas dos supervisores e os postos dos operadores, permite que a gerência veja, o tempo todo, o que os operadores estão fazendo. A sensação constante de exposição visa criar um estágio de dominação em que trabalhador se autodiscipline – conforme sugerido pelo modelo panóptico (FOUCAULT, 2007). As divisórias que separam os postos de trabalho dos operadores também constitui outro elemento de controle das centrais. Segundo Ricci (2010), a divisória dificulta o contato pessoal e o estabelecimento de laços de amizade entre os trabalhadores. Por isso, a autora afirma que o espaço “enfraquece a criação de sistemas de solidariedade e de defesa coletiva” (p. 78).

A padronização do serviço (através de scripts pré-determinados e treinamentos) é a segunda fonte de controle identificada na literatura. De acordo com Vilela e Assunção (2004), o script define as frases que devem ser ditas no início e no final de cada ligação. O operador abre mão do uso da sua própria linguagem para garantir que as metas da organização sejam atingidas (TONET JÚNIOR, 2007). O objetivo da padronização é impedir manifestações emocionais e assegurar que as respostas dos operadores sejam claras e objetivas (SILVA, 2004; VILELA; ASSUNÇÃO, 2004; TONET JÚNIOR, 2007). Na visão da organização, o atendimento ao consumidor deve ser realizado no menor tempo possível (RICCI, 2010).

A terceira fonte de controle identificada na literatura foi o uso de dispositivos de vigilância eletrônica. Nas centrais de atendimento, a tecnologia é tanto um instrumento de trabalho quanto um instrumento de dominação dos operadores. Segundo Azevedo e Caldas (2005), a TI aumentou o nível de controle através da criação de novos parâmetros de avaliação, como gravação, relatórios, tempo médio de atendimento, nota de atendimento, monitoramento aleatório. Em particular, as ligações telefônicas e os dados dos computadores são gravados e contabilizados para premiar ou melhorar o desempenho dos operadores (BALL; MARGULIS, 2011). Dentre os principais aspectos monitorados pelos sistemas de vigilância, Ball e Margulis (2011, p. 114) citam: tempo logado no sistema, tempo disponível para atendimento, número de chamadas atendidas e perdidas e duração das ligações.

É importante ressaltar que a entrada em vigor do Decreto nº 6.523, de 31 de julho de 2008 tornou obrigatória a manutenção da gravação das chamadas pelas empresas que prestam serviços de atendimento telefônico. Segundo o artigo 3º do capítulo IV do Decreto, “é obrigatória a manutenção da gravação das chamadas efetuadas para o SAC, pelo prazo mínimo de noventa dias, durante o qual o consumidor poderá requerer acesso ao seu

conteúdo” (PLANALTO, 2015). Segundo a reportagem do portal Callcenter (2011), a medida visa garantir ao consumidor o direito de defesa, caso se sinta lesado.

A quarta fonte de controle identificado na literatura é a gerência. No dia a dia de trabalho, monitores, coordenadores, supervisores e gerentes acompanham a atuação dos operadores visualmente e através das métricas geradas pelas ferramentas de gestão (VENCO, 2009). Segundo Braga (2006, p. 139-140), o número elevado de supervisores “explica-se pela necessidade de controlar ao máximo os trabalhadores, impedindo que relaxem, mas, sobretudo, abandonem o fluxo informacional”. Também é papel da gerência garantir que os operadores estão cumprindo com as normas e regras da organização (quinta fonte de controle identificada).

A sexta fonte de controle identificada na literatura foi o consumidor. Durante a jornada de trabalho, um operador se depara com várias demandas diferentes de clientes – que incluem casos de pressão e desrespeito (VENCO, 2009). Para solucionar estas demandas, muitas vezes o operador precisa descumprir com a prescrição de “atendimento rápido” estabelecida pela gerência. Segundo Korzcynski et al. (2000), nestes casos, o controle deixa de servir aos interesses da organização e passa a servir aos interesses do consumidor. Para o autor, “esse conceito de controle tem função importante para a elevação do consumidor como uma figura de autoridade e identidade” (p. 671).

A sétima fonte de controle identificado na literatura foi o monitoramento pelos próprios membros do time. Como, muitas vezes, o desempenho (comissionamento) da equipe depende da atuação de cada operador, os próprios trabalhadores passam a fiscalizar o trabalho uns dos outros (RICCI, 2010). Ellway (2013), por exemplo, fala sobre uma iniciativa nova chamada “Making it Personal”, onde os supervisores são encorajados a monitorar o trabalho de seus pares através de um sistema da informação. Segundo Sewell (1998), as equipes de trabalho ajudam a complementar as formas de controle quando estabelecem suas próprias sanções e recompensas.

O forte controle da conduta dos operadores, a padronização do “processo produtivo”, a limitação da subjetividade, as métricas de produtividade, a fragmentação entre a concepção e a execução do trabalho e a desqualificação da mão de obra (como dissemos, em geral, exige baixa escolaridade e não exige experiência prévia) levaram alguns autores a associarem o setor de telesserviços ao modelo da administração científica (FERNIE; METCALF, 1998; TAYLOR; BAIN, 1999; VILELA; ASSUNÇÃO, 2004; BRAGA, 2006; ROSENFIELD, 2009; VENCO, 2009). Taylor e Bain (1999, p. 109), por exemplo, fala em “Taylorização do

trabalho de colarinho branco”. Para eles, os call centers superam todos os lugares onde o controle intensivo foi investigado.

Na literatura nacional identificamos dois estudos empíricos que investigaram as ferramentas de controle utilizadas pelos call centers brasileiros (VILELA; ASSUNÇÃO, 2004; RICCI, 2010). Vilela e Assunção (2004) investigaram as práticas de controle de uma empresa de teleatendimento denunciada por adoecimento associado ao trabalho. Já Ricci (2010) investigou uma empresa de teleatendimento de cobrança. Todas as autoras realizaram triangulação entre observação participante, entrevistas e análise documental. Vilela e Assunção (2004) identificaram quatro classes de controle – ligações telefônicas, conteúdo, comportamento, volume de ligações e resultados –, enquanto que Ricci (2010) identificou que o controle sob os operadores de teleatendimento pode ser exercido pela empresa, clientes e estrutura da organização.

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Finalizada a revisão da literatura, neste capítulo apresentaremos os procedimentos metodológicos executados para atingir os objetivos da pesquisa. Para facilitar a leitura e a compreensão, bem como, organizar as informações, este capítulo foi dividido em cinco tópicos: caracterização da pesquisa, contexto e sujeitos da pesquisa, procedimentos metodológicos para pesquisa bibliográfica, instrumento e coleta de dados e processos de análise e tratamento de dados.