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4 GESTÃO DO CONHECIMENTO E CURRÍCULO

4.2 O CURRICULO

Interessante buscar as raízes das coisas para que se contemple e compreenda como se chegou ao entendimento acerca de tais coisas contemporaneamente. Neste sentido, o primeiro currículo talvez tenha sido idealizado pelo homem primitivo, quando, na Idade da Pedra durante a noite, o ser humano parava para admirar aquele enorme círculo branco no céu e alguns pontos brilhantes em sua volta e se questionavam “o que será isso? Para que é que serve?”

Esse vislumbre passou a fazer sentido quando a humanidade aprendeu a se guiar pelas estrelas. O ponto principal desta pequena história é o fato do ser humano ter se inquietado e se questionado a ponto de buscar um conhecimento que fizesse sentido para ele. A bola branca passou a ser conhecida como lua e deixou de ser uma simples esfera no meio do infinito azul escuro da abóboda celeste, para se tornar um importante guia, e, em algumas civilizações, ganhou até status de deus.

Com a lua e as estrelas, o homem aprendeu a se guiar durante a noite, e nominou várias delas. Em suma, o homem construiu suposições, conceitos, aprendeu com ela,

O currículo não é um conceito, mas uma construção cultural. Isto é, não se trata de um conceito abstrato que tenha algum tipo de existência fora e previamente à experiência humana. É, antes, um modo de organizar uma série de práticas educativas. (GRUNDY, 1987, p. 5)

Vários são os “curriculistas” que se debruçam sobre o conceito de currículo e debatem sobre o mesmo. Entre estes, destaca-se Gimeno Sacristán (1998) que salienta que o conceito de currículo é bastante elástico. Ele poderia ser caracterizado como impreciso, porque, pode significar coisas distintas, “segundo o enfoque que o desenvolva, mas a polissemia também indica riqueza, neste caso porque, estando em fase de elaboração conceitual, oferece perspectivas diferentes sobre a realidade do ensino”. (SACRISTÁN; PÉREZ GÓMEZ, 1998, p. 126)

O currículo deve considerar a cultura, o cotidiano e o contexto social em que vivem os alunos. Como base para a constituição de tal, comprova-se que os conteúdos e as avaliações não podem ser valorizados como um fim em si mesmos, assim como a intenção de produzir o conhecimento na escola deve estar intimamente relacionada com a possibilidade de consentir a esses alunos uma maior compreensão da realidade em que estão inseridos.

É difícil ordenar num esquema e num único discurso coerente todas as funções e formas que parcialmente o currículo adota, segundo as tradições de cada sistema educativo, de cada nível ou modalidade escolar, de cada orientação filosófica, social, pedagógica, pois são múltiplas e contraditórias as tradições que se sucederam e se misturaram nos fenômenos educativos. (SACRISTÁN, 1998, p. 15)

Faz-se imprescindível, portanto, valorizar a cultura e o contexto social de todos aqueles que coexistem no espaço escolar quando da construção do currículo, pois apenas desse modo se pode compreender a existência de distintas culturas e a necessidade de se administrar as relações entre os diferentes, não tolerando que a cultura dominante se sobreponha às demais,

principalmente se estas ainda são marginalizadas. As histórias de vida, as ideias e os ideais de todos os envolvidos no processo de ensino e de aprendizagem precisam ser levadas em conta. (AUSUBEL, 1968).

O currículo é a aula, o professor, o planejamento político pedagógico, o conteúdo, a metodologia, a didática, as experiências (dos alunos e dos professores), a comunidade,

é um práxis antes um objeto estático emanado de um modelo coerente de pensar a educação ou as aprendizagens necessárias das crianças e dos jovens, que tampouco se esgota na parte explicita do projeto de socialização cultural nas escolas. (SACRISTÁN, 1998, p. 15).

Outro curriculista, Michel Apple (1989) adverte que o currículo não é neutro e nem aleatório e que, para se compreender as causas pelas quais determinados conhecimentos fazem parte do plano da escola e representam os interesses de determinados grupos, faz-se imprescindível que se saiba quais são seus interesses sociais, observando que estes, frequentemente, guiaram a seleção e organização do currículo. Para o autor, o poder e a cultura estão dialeticamente entrelaçados e

os conhecimentos formal e informal ensinados nas escolas, os procedimentos de avaliação, etc., precisam ser analisados em conexão com outros aspectos, ou não perceberemos boa parte de sua real significação. Essas práticas cotidianas da escola estão ligadas a estruturas econômicas, sociais e ideologias que se encontram fora dos prédios escolares. (APPLE, 1989, p. 105).

Faz-se necessário compreender que o currículo não está presente apenas nas escolas, pois tudo o que propicia a aprendizagem é currículo, porém “relaciona-se com a instrumentalização concreta que faz da escola um determinado sistema social, pois é através dele que lhe dota de conteúdo” (SACRISTÁN, 1998, p. 15), é por meio do entendimento que se tem de currículo que se efetivam propostas na educação.

Nas escolas ele se faz presente também nas disciplinas e por meio delas pretende-se que se possa dar conta do que os sujeitos devem saber, para que intervenham e atuem no contexto em que vivem. Porém, a aula organizada pelo

professor deve ir muito além da transferência de conteúdos ou do que Paulo Freire (1996)17 concebe como educação bancária18. O conteúdo deve ser entendido como algo a ser compartilhado pelo professor e construído junto com os alunos, além de estar condizente com a realidade em que atuam. Isso tudo, para que haja uma aprendizagem em que o sujeito compreenda aquele tópico estudado em aula presente em sua realidade, e, dessa forma, que tais conteúdos podem contribuir com o seu cotidiano.

Cabe aqui observar a comparação que Apple estabelece entre a escola e uma “caixa preta” (1989, p. 61). Ele aborda que economistas, sociólogos e historiadores veem a escola como uma caixa preta em que se mede, por meio das avaliações, a forma como os alunos entram na instituição (o que o autor chama input) e como esses se comportam durante o processo de escolarização, ou ainda, como saem dela e entram para o mundo do trabalho (output, para o autor), mas a escola não deve ser encarada apenas sob essa perspectiva, grandes mudanças societárias passam por lá, “o sistema educacional - exatamente por causa de sua localização no interior de uma trama mais ampla de relações sociais – pode constituir um importante terreno no qual ações significativas podem ser desenvolvidas” (APPLE, 1989, p. 27).

Essa “caixa preta” idealizada pelos formuladores de políticas públicas educacionais consiste em um discurso ético elaborado por pessoas que não estão imersas ao ambiente ao qual estão emitindo juízos, e com isso consideram apenas realidades utópicas (DUSSEL, 2002) .

O currículo não pode ser considerado apenas uma legitimação das práticas vigentes e nem um esclarecedor dos pressupostos e os significados dessas práticas. Embora ele possa parecer ao mesmo tempo tudo, e ao mesmo tempo nada, “não devemos esquecer que o currículo não é uma realidade abstrata a margem do sistema educativo em que se desenvolve e para o qual se planeja” (SACRISTÁN, 1998, p. 15), ele consiste na “concretização das funções da própria escola e a forma particular de enfoca-las num momento histórico e social” (1998, p. 15).

17 FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários a prática educativa. São

Paulo: Paz e Terra. 1996

18 Termo cunhado por Paulo Freire remetendo ao processo de ensino e de aprendizagem em

Em suma,

faz parte, na realidade, de múltiplos tipos de práticas que não podem reduzir-se unicamente à pratica pedagógica de ensino; ações que são de ordem política, administrativa, de supervisão, de produção de meios, de criação intelectual, de avaliação, etc., e que, enquanto são subsistemas em parte autônomos e em partes interdependentes, geram forças diversas que incidem na ação pedagógica. (SACRISTÁN, 1998, p. 22).

O currículo deve ser encarado como uma prática emancipatória e de empoderamento e não como um solidificador de hegemonias. Devido a elasticidade do termo o presente trabalho precisa tomar um recorte do mesmo, de forma a atender os objetivos expostos. E, portanto, aqui, entender-se-á o currículo como as competências e habilidades que os alunos devem aprender, a realidade em que se esses aprendentes se inserem e também a prática pedagógica. As matrizes de referência do MEC são o norte no que tange a habilidades e competências, e a pesquisa realizada corrobora ao entendimento do pesquisado sobre a realidade ao qual alunos e professores estão inseridos.

Por realidade aqui, entendam-se os hábitos estudantis dos alunos e sua relação com o computador e a tecnologia, seja para estudar ou para se divertir, sendo a proposta do presente trabalho oferecer algo aos alunos em que eles possam coadunar essas duas ações: aprendizagem e imersão no ambiente digital.

Com relação a prática pedagógica, pressupõe-se que o conteúdo idealizado na linguagem proposta (a hipermídia) irá inovar no quesito aprendizagem, em que os alunos não precisarão sair do ambiente ao qual estão imersos cotidianamente (o digital), para que possam aprender.

4.3 ESTABELECENDO AS RELAÇÕES ENTRE GESTÃO DO