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Como demonstrado no segundo capítulo, a Lei Maria da Penha trouxe uma complementação ao ordenamento jurídico, não houve por parte do legislador novos tipos penais, mas uma série de procedimentos, medidas e outros aspectos aos crimes já existentes em nossa legislação.

Dispõem Machado e Grossi ao falarem da Lei Maria da Penha (2012, p. 13):

[...] cada espécie de violência relevada no dispositivo deve se enquadrar em algum injusto penal já existente, tendo a nova lei importância meramente conceitual e restrita ao espaço jurídico de seus próprios artigos. Abstrai-se, pois, uma aceitação passiva dessa “nova” forma de designação violenta.

Em especial, a Lei Maria da Penha cuidou de conceituar a violência doméstica e familiar contra a mulher, no artigo 5º, como “qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial” (BRASIL, LMP, 2020 Grifo nosso), bem como as formas de violência que se encontram previstas no art. 7º da Lei. Dessa forma, a violência psicológica foi colocada como uma das formas de violência doméstica e familiar contra a mulher.

Ademais, Nucci (2014, 627), ao falar sobre o crime de lesão corporal, afirma que:

Para a configuração do tipo é preciso que a vítima sofra algum dano ao seu corpo, alterando-se interna ou externamente, podendo, ainda, abranger qualquer modificação prejudicial à sua saúde, transfigurando-se qualquer função orgânica ou causando-lhe abalos psíquicos comprometedores (NUCCI, 2014, p. 627, grifo nosso)

Sendo assim, uma vez praticada a violência psicológica e consequentemente obtendo o dano psíquico, estamos diante de uma lesão à saúde psicológica da vítima. Tal

estado está previsto no próprio art. 129 do Código Penal que define a lesão corporal como uma ofensa a integridade corporal ou a saúde de outrem.

É através do dano psíquico que podemos caracterizar a gravidade da lesão corporal prevista entre os parágrafos 1º a 3º do art. 129 do Código Penal. Dessa forma, tendo a vítima apresentado os sintomas descritos de Transtorno de Estresse Pós Traumático (TEPT) (parâmetro normalmente utilizado), poderá um profissional competente avaliar a gravidade da do dano sofrido, de forma que melhor se enquadre nas modalidades descritas no artigo do crime de lesão corporal.

4.2.1 Relação de causalidade entre o dano psíquico e a conduta do agente

A violência psicológica se destaca por não deixar marcas visíveis em suas vítimas, dessa forma, conseguir comprovar o dano sofrido, muitas vezes pode parecer desafio, porém, uma vez identificado os sintomas estressores por um profissional capacitado, restará a identificação da relação de causalidade que liga o efeito à causa.

Dessa forma, vale observarmos o art. 13 do Código Penal brasileiro, que dispõe: “O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.” (BRASIL, Código Penal, 2020).

Nesse sentido, Nucci (2014, p. 124) nos explica que a relação de causalidade a que o artigo se refere, nada mais é que o vínculo estabelecido entre a conduta do agente e o resultado por ele gerado, com relevância suficiente para formar o fato típico.

Sendo assim, o agente que ao dispor da violência psicológica descrita no art. 7º inciso II da Lei nº 11.340/06, por meio de qualquer conduta que venha a causar na vítima um relevante dano psíquico, afetando a saúde tutelada pelo art. 129 caput do Código Penal, estará violando este dispositivo e consequentemente suscetível as penas a ele cominadas.

4.2.2 Da gravidade do dano psíquico

Quanto a gravidade do dano psíquico, esta deverá ser diagnosticada por um profissional competente, sendo este diagnóstico a base para o devido laudo pericial. Dessa forma, uma entender o tamanho da intensidade do dano psíquico é extremamente relevante,

uma vez que resulta em implicações no devido processo criminal, exigindo-se uma classificação do dano, sendo este leve, grave ou gravíssimo.

Dessa forma, vale lembrar que o conceito de lesão corporal leve encontra-se previsto no próprio caput do art. 129 do Código Penal, neste caso, bastando que o dano cause qualquer modificação à saúde, resultando um abalo psíquico à vítima.

Quanto à possibilidade da qualificação em lesão corporal grave, prevista no parágrafo primeiro do referido artigo, estará configurado caso o dano psíquico venha a resultar em:

1. incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias (inciso I); 2. perigo de vida (inciso II);

3. debilidade permanente de membro, sentido ou função (inciso III); 4. aceleração de parto (inciso IV).

Já a lesão corporal gravíssima (parágrafo 2º) decorrente do dano psicológico, estará configurada uma vez que resultar em:

1. Incapacidade permanente para o trabalho (inciso I): 2. enfermidade incurável (inciso II);

3. perda ou inutilização do membro, sentido ou função (inciso III); 4. deformidade permanente (inciso IV);

5. aborto (inciso V)

De acordo com Ramos (2019, p. 123-124), quanto a deformidade permanente prevista no inciso IV:

É difícil considerar que um dano psíquico possa redundar numa deformidade, tida como toda a alteração capaz de reduzir, de forma acentuada, a estética individual. Mesmo assim, deve-se entender deformidade permanente como a perda do aspecto habitual. Esse dano é antes de tudo um dano moral. Suas razões são sociais e morais em razão de sua forma visível e deprimente. São características agravantes: a localização, a extensão e os aspecto. Em questões de direito público a profissão, o sexo e a profissão da vítima têm um sentido relativo.

Dessa forma, uma vez que constatado os sintomas e consequentemente os resultados é que será possível enquadrar a conduta do agente nas tipificações do caput, parágrafo 1º ou parágrafo 2º do art. 129 do Código Penal.

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