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O diálogo na teoria da ação comunicativa de Habermas

O processo dialógico educativo necessita da comunicação e a teoria da ação comunicativa de Jürgen Habermas é a referência deste estudo. Para Habermas as palavras constroem o mundo, porque geram ações. Sociedades inteiras são construídas através das palavras e são também assim destruídas, constituindo uma dinâmica constante de criar e recriar (REBLIN, 2010). Pela palavra as pessoas se conhecem, com ela podemos ter o consenso de ideias, também é com a palavra que os conflitos são gerados, mas de qualquer forma, é com base na interação linguística e no diálogo que Habermas constrói sua teoria.

Habermas é alemão, nasceu em 1929, se graduou em filosofia e sociologia. Durante a Segunda Guerra Mundial fez duras críticas ao regime nazista. A teoria da ação comunicativa, uma das suas muitas publicações, foi escrita em 1981.

Um dos principais objetivos da teoria da ação comunicativa é contrapor à realidade racional instrumentalista, o que ocorre em muitos processos educativos ainda vigentes. Longe de desconsiderar o conhecimento racional, Habermas (2012) contextualiza a razão em processo dialógico direcionado para a integração social. Habermas identificou que a razão instrumental sozinha não seria suficiente para explicar a humanidade e a sociedade moderna. Com base em seus estudos, pôde concluir que faltavam as questões de interação envolvendo a comunicação

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com Habermas (2012), pode ser muito positivo, se dentro do processo dialógico as propostas argumentativas proporcionarem consenso. Portanto, Habermas propõe a construção de realidades através do exercício argumentativo, ou seja, um processo dialógico entre sujeitos que interagem entre si. O processo apresentado pelo autor é permeado pela razão, não uma razão instrumentalista, mas uma ração argumentativa. E esse é princípio básico do diálogo.

A teoria da ação comunicativa pressupõe entendimento e consenso entre sujeitos que buscam um interesse comum e em muitos aspectos o consenso gira em torno de um espaço melhor para convivência. Em sua teoria, Habermas busca explicar a construção social que leva o homem ao desenvolvimento, e define a sociedade como algo em construção, pois o consenso é temporário; quando a sociedade muda, novos entendimentos serão necessários.

Habermas (2012) indica que as diferenças existentes entre os sujeitos são claramente apresentadas durante os processos comunicativo, isso quer dizer que as intenções são claras; não existe neste processo coerção ou imposição de ideias e valores, os sujeitos interagem por consenso. Uma boa comunicação necessita de uma boa compreensão; quem se propõe a ouvir quer entender o que está sendo dito e vice-versa.

Ao mergulhar na proposta de uma nova forma de racionalizar o mundo, identificamos em Habermas (2012) a construção de um novo espaço para o diálogo, que o autor denomina de mundo vida. O mundo vida é espaço para comunicar, interagir, integrar, agir, mudar etc. De acordo com o autor, o mundo vida se constitui de história, juntamente com um aglomerado de experiências individuais e coletivas

É no mundo vida que os diálogos podem ser evidenciados juntamente com os sentidos e as interações entre indivíduos. O mundo vida proporciona à ação comunicativa instrumentos necessários para os processos educacionais legitimando a importância do sentido na construção do conhecimento, diferentemente dos processos educacionais que supervalorizam a razão instrumental (HABERMAS, 2012).

Parece, portanto, oportuno dizer que a teoria de Habermas também aborda os conflitos que a falta de comunicação causa e também trata dos problemas que a falta de compreensão, entre as pessoas que estão tentando dialogar, pode acarretar.

Essas são as questões controversas da comunicação, que de forma mais objetiva é a falta do diálogo. De acordo com Habermas (2012), a compreensão do que que está sendo colocado em debate por meio dialógico, só é possível mediante o conhecimento da razão do que está sendo discutido, e se não existe esse conhecimento, não existe a compreensão e por isso não se chega a um consenso

Partindo da ideia de que as ações geradas pelos processos comunicativos dependem diretamente do consenso, nenhuma mudança vai acontecer se o entendimento coletivo não existir. De acordo com Habermas (2012), a linguagem deve se expressada de uma forma clara, objetiva, tem que garantir a compreensão das pessoas envolvidas, ou seja, dos indivíduos que estão propondo o processo comunicativo consciente por meio do diálogo.

Além disso, é preciso considerar que cada ação gerada também é fruto de uma proposta, e como estamos falando de uma perspectiva educacional, dentro da ação comunicativa modelada pelo autor, é importante que o professor tenha como relevante os três contextos que compõem o mundo vida dos alunos, que, segundo Habermas (2012), são: sociedade, cultura e personalidade, conforme representado a seguir.

Figura 1 – Mundo Vida.

cultura

sociedade

personalidade

Fonte: elaboração da autora com base em Reblin (2010).

Observando a figura 1, é possível entender que a interação desses contextos é constante. Os sujeitos envolvidos nesses processos podem dialogar de forma

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permanente. Sendo assim, a perspectiva educacional, com base nesta realidade, pode planejar uma construção interdisciplinar, até porque, como caracteriza Habermas (2012), a ação comunicativa se fundamenta em métodos cooperativos, orientados pelo diálogo, integrando cultura, personalidade e sociedade.

A teoria que Habermas desenvolveu apresenta a possibilidade do uso racional do diálogo orientado para uma aprendizagem contextualizada, realmente significativa e, consequentemente, a reprodução de um mundo vida mais real. Sua teoria permite uma concepção mais democrática de ensino, não abandonando a racionalidade, reorganizando-o de tal modo que inclui o processo de reflexão, não concebendo o sujeito como mero reprodutor de conceitos, mas um participante e coadjuvante da produção de novos saberes e conhecimentos.

Efetivamente, podemos dizer que está no resultado da ação o grande diferencial de um diálogo positivo ou não. E voltamos ao problema educativo a partir deste ponto. Tem-se um diálogo gerador de uma ação baseada no consenso, desde que considere o processo educativo dentro do mundo vida integralizado, contextualizado historicamente, abrindo a oportunidade para novos mundos e sociedades fazerem parte dessa estrutura.

Método

Com o objetivo de refletir sobre a importância do diálogo numa perspectiva educacional mobilizando o conhecimento interdisciplinar, foi realizada uma pesquisa qualitativa com professores de nível superior, sendo os dados coletados aplicando-se a técnica de grupo focal e análise de discurso.

Considerando esse objetivo, mostrou-se adequada à pesquisa a estratégia qualitativa. De acordo com Vasconcelos (2010, p. 234):

Na pesquisa qualitativa, o objeto de estudo situa-se em seu espa- ço natural, não sofrendo alterações por parte do pesquisador que o interpreta utilizando insumos adquiridos por intermédio desses instrumentos. Trata-se de utilizar materiais que possibilitem des- crever o dia a dia de indivíduos, em seus problemas e significações, considerando experiências pessoais e histórias de vida, bem como entrevistas e artefatos envolvidos na cultura.

É qualitativa, também por se tratar de uma pesquisa na área de educação que envolve seres humanos e suas relações. Essa modalidade é indicada por Vasconcelos (2010, p. 239) porque “ela se aproxima do fenômeno da educação, fundamentalmente, devido ao fato de que a educação busca conhecer o mundo e os seres humanos em suas relações”.

Quanto à técnica de pesquisa, foi aplicado o grupo focal, que é uma técnica que fomenta o debate e gera ideias, contribuindo de forma efetiva para o trabalho, conforme Aschidamini e Saupe (2004). A referida técnica também atende ao objetivo proposto pela pequisa, pois, conforme Cruz Neto, Moreira e Sucena (2002, p. 5), o grupo focal é

Uma técnica de Pesquisa, na qual o Pesquisador reúne, num mes- mo local e durante um certo período, uma determinada quantidade de pessoas que fazem parte do público-alvo de suas investigações, tendo como objetivo coletar, a partir do diálogo e do debate com e entre eles, informações acerca de um tema específico.

Para a presente pesquisa participaram do grupo focal seis professores do Curso de Administração, de uma instituição de ensino superior privada, em Brasília (DF), e se reuniram no dia 1º de julho de 2017, com a duração de 110 minutos.

Os professores participantes ministram mais de uma disciplina e atuam em mais de um curso na própria instituição. Inicialmente foi apresentado o objetivo do encontro com os detalhes necessários ao entendimento, e então cada participante teve a oportunidade de expor sua opinião. Seguiu-se um roteiro semiestruturado com quatro questões-chave, conforme segue abaixo:

Quadro 1 – Questões norteadoras do grupo focal

N QUESTÕES

1 O diálogo como parte do processo de ensino e aprendizagem em sala de aula.

2 Diálogo entre os professores das diversas disciplinas do curso.

3 Existência de trabalho colaborativo interdisciplinar no curso.

4 Sugestões para fomentar processos dialógicos.

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Com a análise do discurso dos professores que participaram da pesquisa, observa-se padrões de ideias e comportamentos relativos ao tema, desta forma tendo narrativas do diálogo em seu aspecto relacional, nas relações do professor com os alunos e nos espaços comuns para as conversações e possíveis trocas de experiências e, por fim, na possibilidade de um diálogo entre disciplinas.