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morais, crenças, mitos, etc [ ]”.É o conhecimento acessível à maioria dos indivíduos e de

4 FUNDAMENTAÇÃO METODOLÓGICA

4.2 O Discurso do Sujeito Coletivo (DSC)

O homem é um ser que para e ao se construir socialmente, se utiliza, fundamentalmente, da linguagem discursiva. É através da discursividade que revela seu mundo subjetivo e a objetividade que percebe do mundo que o cerca. (BERGER; LUCKMANN, 2003).

O discurso linguístico pode ser manifestado e conhecido pela oralidade e/ou pela escrita. Elias (1993, 1994a, 1994b) mostrou que o processo histórico-social, vivenciado pelo homem, é construído à base da comunicação. Através dela ele estabelece e aprimora as trocas com os demais com quem interage. Essa interatividade levou e continua levando o homem a alterar comportamentos durante o processo civilizador. Nele as regras de conduta, relacionadas às suas sobrevivências (física, moral, intelectual e outras), foram sendo e são estabelecidas, pensadas e modificadas, à medida que a humanidade segue por diferentes tempos e espaços.

Se a sociedade avançou, no sentido de ter chegado à atualidade com todas as transformações ocasionadas pelos que nela viveram/vivem, foi porque os discursos desses sujeitos foram, de alguma maneira, socializados. Nesse processo socializador, em menor ou maior grau, os sujeitos sempre estiveram interagindo, e essa interação deu-se/dá-se pela discursividade do conhecimento do senso comum e do conhecimento reificado.

A sociedade é composta por discursos individuais os quais compõem um grande coletivo discursivo heterogêneo. É por meio das pesquisas sociais qualitativas que se pode ter acesso ao pensamento natural de um grupo de indivíduos e agrupar os discursos semelhantes.

Utilizando-se da técnica do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC), é possível conhecer o pensamento tanto de um grupo pequeno quanto de um grupo maior. (LEFÈVRE; LEFÈVRE, 2005a, 2005b).

Lefèvre e Lefèvre (2005b) entendem que as pesquisas sociais estão mais próximas do “professar” (vertente qualitativa) do que do “ter” (vertente quantitativa). Os autores afirmam que, sem se estabelecer essas distinções, os resultados das pesquisas qualitativas ficam comprometidos. Daí, portanto a necessidade de se fazer com que os dados sejam coletados por meio de perguntas abertas, evitando-se, com isso, que o pensamento do sujeito fique cerceado à simples opção de escolha de alternativa de resposta. (LEFÈVRE; LEFÈVRE, 2005b).

Complementam os autores que

O modo tradicional de ver as coisas desconsidera a característica especificamente qualitativa do pensamento coletivo na medida em que parte do suposto de um determinado indivíduo tem um pensamento [...] ou representação [...] assim como tem um peso e uma altura. (LEFÈVRE; LEFÈVRE, 2005b, p. 13, grifo dos autores).

Lefèvre e Lefèvre (2005b, p. 15) defendem, ainda, que o acesso mais próximo do verdadeiro, no sentido da essência do pensamento do indivíduo, sobre determinado tema, só será possível quando o pesquisador social se utilizar de perguntas abertas. É desse artifício que os indivíduos poderão se expressar “mais ou menos livremente, ou seja, que [...] [produzirão] discursos.” Dizem esses autores (2005b, p. 15) que “A questão fechada não enseja a expressão de um pensamento, mas a expressão de uma adesão (forçada) a um pensamento preexistente.”

Sobre a essencialidade do discurso, Lefèvre e Lefèvre (2005b, p. 31) conjeturam que “[...] conjuntos de discursos obtidos clandestinamente [...] são mais fiéis à realidade do que os obtidos em entrevistas voluntárias”, embora, lembram os autores, que ações relacionadas a tal entendimento seriam claramente antiéticas.

Mas o que é, afinal, o DSC e como agrupar esses pensamentos semelhantes?

Para Lefèvre e Lefèvre (2005a), o DSC é uma maneira peculiar de representar

[...] de modo rigoroso, o pensamento de uma coletividade, o que se faz mediante uma série de operações sobre os depoimentos, que culmina em discursos-síntese que reúnem respostas de diferentes indivíduos, com conteúdos discursivos de sentido semelhante. (LEFÈVRE; LEFÈVRE, 2005a, p. 25).

Para fazer uso dessa técnica, são utilizadas quatro figuras metodológicas (LEFÈVRE; LEFÈVRE, 2005b; ALMEIDA, 2005). Posteriormente, Lefèvre e Lefèvre (2005a) preferiram denominá-las de operadores/operações; são elas Expressões-Chave (E-Ch); Ideias Centrais (IC); Ancoragem (Ac); e Discursos do Sujeito Coletivo (DSC).

Dessas figuras foram utilizadas no presente estudo as E-Ch, IC e os DSC. As E-Ch são partes selecionadas dos discursos que melhor representam os seus conteúdos, ou, como dizem Lefèvre e Lefèvre (2005b, p. 17), “a essência do depoimento”. As IC são expressões que melhor descrevem os sentidos semelhantes ou complementares dos depoimentos, tanto isoladamente quanto no conjunto de respostas.

Segundo Lefèvre e Lefèvre (2005b), as IC

podem ser resgatadas através de descrições diretas do sentido do depoimento, revelando o que foi dito ou através de descrições indiretas ou mediatas, que revelam o tema do depoimento ou sobre o que o sujeito enunciador está falando. (LEFÈVRE; LEFÈVRE, 2005b, p. 17, grifo dos autores).

Conforme Lefèvre e Lefèvre (2005a, p. 22), os DSC são resultados da “reunião das E-Ch presentes nos depoimentos, que têm IC [...] de sentido semelhante ou complementar”. Segundo esses autores não há depoimento sem IC; é ela que dá sentido ao depoimento.

Quanto ao DSC, propriamente dito, afirmam Sales, Souza e John (2007) que ele é

o estágio final, ou síntese que deriva das etapas de extração das idéias-centrais e expressões-chave, representando o conjunto nuclear dos discursos. [...] a representação que, sobre um dado tema ou questão, todo o grupo dos falantes manifesta. (SALES; SOUZA; JOHN, 2007, p. 133).

Baseada em Lefèvre e Lefèvre (2005b), pode-se dizer que o DSC não é a soma de pensamentos ou discursos iguais de sujeitos diferentes, mas a junção de discursos/pensamentos semelhantes que determinados indivíduos expressam sobre algo que experimentam no cotidiano de determinado contexto.

A pesquisa social volta-se para as abordagens qualitativas, embora, com elas, alguns aspectos quantitativos sempre estarão implicados, como, por exemplo, o quantitativo de sujeitos estudados, sexo, idade desses sujeitos, etc. (LEFÈVRE; LEFÈVRE, 2005a).

Para Moscovici (2004), são as representações que constituem a realidade, ou as múltiplas realidades, como dizem Berger e Luckmann (2003). O mundo constituído por diferentes realidades, quando visto de certa distância, acaba por ocultá-las, assim como as suas singularidades. Com a Representação Social é possível perceber que não há uma homogeneidade coletiva, mas heterogeneidades formando um todo social. Portanto, conforme Moscovici (2004), é preciso conhecer as representações que formam essas realidades.

Para Souza (2008, p. 205, grifo nosso), a Teoria das Representações Sociais (TRS) possui duas abordagens teóricas: uma

processualista e outra estruturalista. A primeira com ênfase no estudo

das relações entre os indivíduos, e a segunda, no estudo experimental da cognição. Este estudo encontra âncora na abordagem processualista.