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PARTE 1 – DIMENSÃO POLÍTICA

2.6 O discurso e incentivo dos organismos multinacionais, em especial do Banco

educacionais

E os organismos multilaterais, que relação possuem com a temática desta tese? Em primeiro lugar foram eles que recomendaram as reformas que redefiniram o papel do Estado, bem como as concepções que influenciaram as políticas educacionais brasileiras. Grande parte das diretrizes e orientações foram gestadas nas grandes conferências mundiais de educação, a saber, Jomtien, na Tailândia, em 1990 (UNESCO, 1990), o Fórum de Dakar, Senegal (UNESCO, 2000) e o Fórum de Incheon (UNESCO, 2015), na Coréia do Sul.

Especificamente falando sobre as parcerias público-privadas, um documento construído pelo Banco Mundial orienta os países acerca da construção das políticas educacionais. As orientações estão expressas em publicação apenas na língua inglesa, com o título original The Role and Impact of Public-Private Partnerships in Education

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Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura; em inglês: United Nations

“O papel e os impactos das Parcerias Público Privadas na Educação” (PPPE). No que se refere ao documento “Professores excelentes: como melhorar a aprendizagem dos estudantes da América Central e Caribe”, ele será utilizado no Capítulo 4, quando analisaremos que a construção da relação público-privada na educação tem como um dos motivos a pouca qualidade da atuação docente.

No que interessa a este estudo, as reflexões que seguem apresentam as orientações dos organismos multilaterais sobre a organização da educação na sua relação com o setor privado. Nos documentos transnacionais anteriormente citados, procuramos compreender as orientações aos países signatários acerca da construção das políticas educacionais brasileiras, no que diz respeito à relação público-privada. Considerando que nosso olhar se restringe ao conteúdo da conferência, dos fóruns e do documento PPPE, faremos algumas considerações gerais iniciais sobre os organismos multilaterais para depois adentrarmos na matéria específica das políticas, com ênfase na atuação do Banco como principal financiador e propositor das políticas educacionais, também quando se trata da relação público-privada.

Há sintonia entre as políticas dos organismos multilaterais, especialmente o Banco Mundial, com as formas privativas pelas quais vem sendo enquadrada a educação. Dale (2010), ao referir-se às mudanças promovidas na educação sob o ordenamento neoliberal e a criação de desafios novos e distintos, destaca que houve um fluxo muito grande de documentos de organizações internacionais que enfatiza a necessidade dessas mudanças, a exemplo do ensino para a aprendizagem, dos conteúdos para as competências e a necessidade de aprendizagem ao longo de toda a vida. Assim “a educação tal como ofertada e praticada sob as condições da modernidade não é suficiente para as exigências do presente e deve ser radicalmente reformada”. (DALE, 2010, p. 1117).

Segundo Neves e Pronko (2008, p. 92), o importante papel de organização das relações internacionais capitalistas contemporâneas “faz das Nações Unidas, e demais organismos internacionais a ela vinculados, referência obrigatória para o estudo do desenvolvimento das políticas públicas em cada formação social capitalista na atualidade”.

O Grupo Banco Mundial impõe significativo poder sobre as nações do mundo e, juntamente com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), são condutores econômicos e político-ideológicos do capitalismo latino-americano. (NEVES; PRONKO, 2008). Leher (1999, p. 19) o chama de “ministério mundial da educação dos países periféricos”. No entanto, como o BM chegou a possuir tamanha influência?

Nações Unidas (ONU)69, a qual age utilizando-se do poder político de suas agências especializadas a exemplo FMI e do BM. Este último é constituído pelo Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), pela Associação para o Desenvolvimento Educacional (IDA) e também pela Corporação Financeira Internacional (IFC). Faz parte ainda do grupo Centro Internacional para a Resolução de Disputas de Investimento (ICSID) e a Agência de Garantia de Investimentos Multilaterais (MIGA). (NEVES; PRONKO, 2008).

A ONU, por sua vez, tem sua evolução histórica determinada durante quase 50 anos pela rivalidade entre os dois grandes blocos econômicos-políticos – o capitalista e o socialista –, situação que perdurou até a dissolução da União Soviética, no início dos anos de 1990. “Desde então as Nações Unidas têm orquestrado o destino de seus 192 Estados nacionais associados, ditando o percurso a ser trilhado pelo capital nesta sua nova fase de financeirização internacional [...]”. (NEVES; PRONKO, 2008, p. 93). O grupo que detém o maior domínio acerca das decisões é o dos Estados Unidos da América (EUA), cujo papel político e poderio financeiro advêm de suas agências especializadas. O foco e a concepção das diretrizes adotadas pelos países que buscam auxílio nessas agências são decididos a partir das condicionalidades impostas à concessão de empréstimos. (NEVES; PRONKO, 2008).

Acontecimentos como a revolução cubana, derrota norte-americana na guerra do Vietnã, as primeiras manifestações de crise do capitalismo nos anos de 1970, colocaram à prova a hegemonia dos EUA, e isso fez com que o país adotasse medidas que, mesmo indiretas, pudessem manter sua hegemonia. Contando com o auxílio dos organismos multilaterais, uma estratégia adotada pelos EUA foi nomear seu Secretário de Defesa como presidente do Banco Mundial (1968-1981). A partir de então, a dupla BM e FMI passou a ser a protagonista na manutenção e consolidação das relações sociais capitalistas em todo o mundo. (NEVES; PRONKO, 2008).

No Brasil, os dois primeiros empréstimos ao Ministério da Educação ocorreram na década de 1970, momento em que o Banco Mundial propunha modelo educativo desenvolvimentista sob a ótica do capital humano70. Dessa forma, os empréstimos deveriam

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A ONU foi criada para substituir a Sociedade das Nações em 1942, em Washington. É formada por seis órgãos principais (o principal é o Conselho de Segurança) e diversas agências especializadas como a Unesco e o FMI.

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A Teoria do Capital Humano foi elaborada no pós-II Guerra Mundial e suas teses foram fortemente consideradas entre os anos de 1950-1980. (MARI, 2014). “As condições dos avanços técnicos nesse período introduziram reavaliação nas atividades e na produção do trabalho em seus diversos ramos”. (MARI, 2014, p. 89). As inovações tecnológicas permitiram que a indústria criasse novos métodos organizacionais e de trabalho de modo a responder às exigências do mercado. Essa teoria promoveu a abertura para atuação nas empresas de profissionais da área das ciências sociais, passando a contribuir para o aumento da produtividade e do lucro. Desse modo, há uma aproximação entre educação e negócios. A formulação teórica dessa teoria se deve à

ensino agrícola e industrial. (FONSECA, 1997).

Contudo, na metade da década de 1970, com Robert McNamara na presidência do BM, as orientações foram deslocadas, sendo que a prioridade dos financiamentos destinava-se às modalidades menos custosas. “Para tanto, foram previstas ações educativas em zonas rurais e em periferias urbanas, conhecidas como educação para a pobreza e para a geração imediata de renda”. (FONSECA, 1997, p. 51). Nesse caso, a ênfase estava no ensino primário e, mesmo que no Brasil os projetos de educação primária tenham sido desenvolvidos nos anos 1980, os estudos do MEC com o BIRD para a implantação dessa nova política se iniciaram em 1975. Entre os anos de 1983 e 1990, o BIRD financiou mais um acordo para a educação, dando continuidade ao primeiro. (FONSECA, 1997).

O poderio financeiro do BM na gestão de NcNamara possibilitou que a instituição se tornasse o maior centro mundial de informações a respeito do desenvolvimento, passando a ter controle sobre os países tomadores de empréstimos por meio da transformação dos projetos em programas, mais complexos e também mais abrangentes, e tornando as condicionalidades mais rígidas. (LEHER, 1999).

A crise que se instalou nos países periféricos coadunou-se com a intenção dos organismos multilaterais. Soares (1998) observa que a situação de extrema vulnerabilidade dos países endividados os levou a contar com empréstimos dos bancos multilaterais, visto que os privados interromperam seus empréstimos após a moratória mexicana. A fragilidade financeira dos países em crise possibilitou que o BM impusesse uma série de condicionalidades para empréstimos.

Mediante essas condicionalidades, o Banco Mundial (tal como o FMI) passou a intervir diretamente na formulação da política interna e a influenciar a própria legislação dos países. Assim, a partir dos anos 80 [...] o Banco Mundial passou a exercer amplo controle sobre o conjunto das políticas domésticas, sendo peça-chave no processo de reestruturação desses países. (SOARES, 1998, p. 21).

A principal ideologia do BM buscava em uma nova doutrina fundamentada no binômio pobreza-segurança os aspectos a serem observados nas reformas (NEVES; PRONKO, 2008), cujo fim era o alívio da pobreza. As reformas assumidas pelos países

Theodor Schutz (1961), cuja tese central “consiste no investimento que o indivíduo faz em si mesmo com o objetivo de obter rendimentos futuros”. (MARI, 2014, p. 90). Mas a formação do trabalhador deve ser de responsabilidade do Estado. A teoria do capital humano perdeu força e, em 1990, sob novo contexto, ganha uma nova versão, chamada de sociedade do conhecimento. Tanto uma quanto a outra produzem um discurso educacional para a privatização e consenso social. (MARI, 2014).

de abertura ao comércio exterior. Essas políticas, segundo Soares (1998), que atendem aos propósitos do capital internacional, foram batizadas no final dos anos de 1980 por “Consenso de Washington”.

As reformas passaram a se vincular às metas de ajustes estruturais com vistas a preparar seus países-membros para a participação cada vez mais orgânica no mundo em transformação. As reformas propostas no período não aliviaram os níveis de pobreza dos países-membros; ao contrário, houve aumento das desigualdades especialmente nos países de capitalismo dependente. Assim, a dupla BM e FMI, ao final dos anos 1990, deu início a uma nova etapa do processo atual de reestruturação capitalista, propondo a reforma da aparelhagem do Estado e da estrutura dinâmica da sociedade civil.

Como afirmamos anteriormente, nos anos de 1990, a sociedade civil é depositária de uma série de organizações sociais, as quais começam a atuar fortemente nas políticas sociais como parceiros do setor público.

O alívio da pobreza passa a ter um novo jargão – “alívio da pobreza e coesão social”, ou seja, é preciso crescer com justiça social. Essa formulação, própria do neoliberalismo da Terceira Via, tinha a intenção de atenuar as profundas desigualdades sociais. A nova formulação ideológica do período, a fim de moldar o desenvolvimento no século XXI, passou a ser chamado de sociedade do conhecimento. A disseminação dessa nova concepção tem apoio da Unesco71 e da Organização Internacional do Trabalho (OIT), sendo a primeira a principal disseminadora. (NEVES; PRONKO, 2008).

É mister destacar que a centralidade adquirida pela educação no discurso e na prática do BM é recente. Em que pese ter havido influência do órgão na determinação das diretrizes educacionais nos países-membros nos anos de 1960, as prioridades do Banco com foco na educação datam de uma década depois, quando McNamara assume a presidência. “Ao invés de instrumento de preparação de mão-de-obra especializada para o desenvolvimento, a educação escolar passa a ser vista como arma imprescindível no combate à pobreza” (NEVES; PRONKO, 2008, p. 98). Daí porque a ideia de que, para o BM, a principal propriedade do pobre é o trabalho, pois tendo em vista esse “bem”, o incremento na oferta e qualidade da educação representa um mecanismo-chave para a redução das desigualdades e

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A Unesco, instituída em 1945, com a finalidade de criar a paz na mente dos homens, vem funcionando, como um laboratório de ideias e promove a cooperação internacional entre seus associados nas áreas de educação, ciências, cultura e comunicação. (NEVES; PRONKO, 2008). Tem sido designada pelo Banco Mundial como órgão que organiza as Conferências de Educação.

1980 a 1990, ou seja,

A educação escolar das massas trabalhadoras e a sua formação técnico profissional passam a se constituir em diretriz política fundamental na materialização, em nível setorial, da doutrina que elege o binômio pobreza- segurança como princípio norteador da manutenção da paz no universo capitalista contemporâneo. (NEVES; PRONKO, 2008, p. 98).

A partir de 1990, o BM se destacou pela sua atuação na organização da Conferência Mundial de Educação para Todos e, em 1993, a Conferência de Nova Delhi deu continuidade ao debate sobre a proposta de educação para todos, iniciada em Jomtien. (CANAN, 2016). A autora verifica, com olhar cuidadoso, que o Banco deseja um tipo de educação que atenda o mercado e que tem como fim último o desenvolvimento econômico. O Banco protagoniza as políticas educacionais de seus países membros, sendo que

[...] suas propostas estão inseridas num contexto mais amplo, que implica as políticas globais e neoliberais implementadas para assegurar o domínio econômico a partir do qual tudo pode acontecer. O Banco Mundial se coloca nesse espaço de redentor dos países desfavorecidos economicamente, promovendo o financiamento [...] da educação e impondo as condições que julgar mais pertinentes para liberação dos mesmos. (CANAN, 2016, p. 71).

A educação, partir dos anos 2000, até então guiada pela orientação de formação para um mundo em transformação, é impactada pelo surgimento de uma segunda onda de difusão tecnológica com orientação para a sociedade do conhecimento. Sobressaem orientações quanto à necessidade de diminuir os gastos públicos e promover a maior participação do setor privado, especialmente no nível superior. (NEVES; PRONKO, 2008).

De forma geral, as orientações dos organismos multilaterais acabaram por determinar a formulação e condução das políticas educacionais dos países-membros, no sentido da eficiência (menor custo) e da governança (participação). Parece que nos acostumamos com o discurso e, muitas das vezes, não conseguimos entender ou ao menos lembrar que o percurso histórico do desenvolvimento educacional brasileiro, a partir da segunda metade do século XX, reflete essas orientações. Os anos de 1990 marcam com maior significado a presença do ideário dos organismos multilaterais, que atendendo às demandas do setor produtivo provocou mudanças substanciais na nossa educação72.

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Para Leher (1999, p. 24), a crise de 1982, tornou os países latino-americanos extremamente dependentes de empréstimos do BM e do FMI. “A condicionalidade do Banco, não se restringia mais a indicadores macroeconômicos, como a balança de pagamentos, mas principalmente ao hoje famoso “ajuste estrutural” [...] O setor privado deveria ser o motor do crescimento com o governo desempenhando um papel de apoio a ele”.

do Aparelho do Estado, mas a concepção educativa contribuiu para solidificar novos conceitos nos processos educacionais, especialmente pelo controle avaliativo, definindo um conjunto de conceitos e indicadores pontuais que medem a qualidade na educação. Para Teodoro (2015), a avaliação ocupa lugar central na agenda global, baseada na comparação e, sobretudo, na competição de performances dos sistemas educativos.

Concordamos com a análise do autor, quando adverte que mais do que formar rankings, a avaliação tem uma questão central, ou seja, “o fato de esse tipo de comparação se tornar uma arma muito poderosa para quem controla os significados do que é comparado”. (TEODORO, 2015, p. 867).

Para Evangelista e Shiroma (2006), o discurso dos organismos internacionais no início dos anos de 1990 girava em torno de conceitos como produtividade, qualidade, competitividade, eficiência e eficácia, mas ao final da década esse discurso economicista cedeu lugar para uma face mais humana, voltada a entender os problemas da sociedade atual. Assim, os conceitos como justiça, equidade, coesão social, inclusão vão se construindo entre os indivíduos em laços de solidariedade.

Nesse sentido, o conceito de pobreza, que anteriormente estava vinculado unicamente às questões econômicas, agora se aproxima da ideia de oportunidade, de autonomia e de segurança. Assim, “pobre é aquele que não tem, ou tem poucas ‘oportunidades’ econômicas; que não tem, ou tem pouca ‘autonomia’ no que tange às barreiras sociais derivadas de sua condição de sexo, etnia, raça e status social”. (BANCO MUNDIAL, 2000/2001, p. 3373 apud EVANGELISTA; SHIROMA, 2006, p. 48).

As “questões como raça e gênero, no capitalismo, são consideradas bens extraeconômicos”. (WOOD, 2011, p. 229). As reflexões de Wood (2011) permitem que entendamos o papel ocupado por essa categorização que divide a classe trabalhadora e esconde as realidades estruturais do sistema capitalista. Assim, quando os pobres, ou melhor,

[...] quando os setores menos privilegiados da classe trabalhadora coincidem com as identidades extraeconômicas como gênero ou raça, como acontece com frequência, pode parecer que a culpa pela existência de tais setores é de causas outras que não a lógica necessária do sistema capitalista. (WOOD, 2011, p. 229).

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BANCO MUNDIAL. Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial. 2000/2001. Washington, DC: Banco Mundial. Disponível em: http://www.worlbank.org/povety/wdrpoverty/report/poroverv.pdf. Acesso em: 10 jun. 2004.

estruturas, pois para ele a exploração independe de diferenças raciais ou sexuais.

Na verdade o capitalismo tem uma tendência positiva de solapar essas diferenças e a diluir identidades como gênero ou raça, pois o capital luta para absorver as pessoas no mercado de trabalho e para reduzi-las a unidades intercambiáveis de trabalho, privadas de toda identidade específica. (WOOD, 2011, p. 229).

Desse modo, são inibidas as formas de contradição entre capital e trabalho. Esse entendimento, inclusive explicitamente exposto pelos empresários industriais no Brasil em 1993, faz parecer que as desigualdades sociais são resultado das relações de gênero e de etnia e não mais da exploração de uma classe sobre a outra. Para Melo (2009, p. 897), a ênfase na formação genérica e pautada na subjetividade torna possível perceber o perfil do trabalhador que se desejava formar: “um trabalhador que não se compromete como elemento de classe, mas apenas consigo mesmo e com a empresa”.

Considerando, portanto, as concepções dos organismos multilaterais e a forma como no Brasil muitos desses conceitos aparecem expressos por interessados pela educação74, podemos entender que o projeto educacional que se deseja para a classe trabalhadora se configure como uma forma moderada de estar no mundo e de se relacionar de forma pacífica, sem conflitos com as relações de exploração e precarização do trabalho a que o trabalhador está submetido.

Ainda no que diz respeito à pobreza, a alteração no seu conceito, antes lastreada em aspectos econômicos, agora é vista como um ponto de vista econômico, social e cultural, na perspectiva da carência, ou seja, houve um deslocamento das características que compõem o conceito de pobreza, para a perspectiva da responsabilização e individualização humana. (EVANGELISTA; SHIROMA, 2006).

Se, por décadas, a receita que combinou educação e crescimento econômico não foi eficaz para sanar problemas sociais, foi necessário alterar o conceito de pobreza para atribuir a cada indivíduo a capacidade de resolver seus próprios problemas numa perspectiva mais ampla que não apenas a econômica. Dar o mínimo aos pobres por meio de reformas educacionais paliativas se caracteriza como uma alternativa para resolver os conflitos sociais e garantir a segurança e a paz mundial. As diretrizes desses organismos perpassam as fronteiras e tornam-se verdadeiras agências transnacionais reguladoras.

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Os empresários da indústria, desejosos por colaborar com a educação brasileira, compreendiam que a necessária formação do trabalhador estava pautada em elementos flexíveis e aliados à dinâmica do mercado de trabalho, sem, no entanto, ultrapassar a formação para o trabalho simples.

dos acordos? A parceria com o setor privado sempre esteve atrelada às conferências e aos fóruns educacionais como condição de implementação.

A Conferência de Jomtien, também conhecida como Conferência Geral da Unesco, inaugura a chamada “Educação para Todos” (EPT), ou seja, a educação deve estar disponível para todos. Foi aprovada por representantes de mais de 100 países e organizações não governamentais, cujo compromisso maior foi com o desenvolvimento da meta da educação primária.

É importante lembrar que, após a realização dessa Conferência, em 1991, foi organizada uma comissão, presidida por Jacques Delors e composta por 14 personalidades de setores acadêmico-políticos. O documento “Educação: um tesouro a descobrir. Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI” (UNESCO, 1998) é o resultado do trabalho da comissão, que tinha, dentre os membros, quatro do BM, mas não havia nenhuma representação brasileira, quer fosse na composição da comissão ou nos conselhos extraordinários e/ou pessoas consultadas, que totalizaram 109. (RABELO; MENDES SEGUNDO; JIMENEZ, 2009).

As análises sobre Jomtien, que seguem nesta tese, são realizadas a partir desse documento (UNESCO, 1998).

Em relação ao conteúdo no qual estamos diretamente interessados, ou seja, em que medida os documentos que foram construídos nos anos 1990 orientam os países às parcerias, encontramos no de Jomtien dicas importantes para “levar a bom termo as reformas educacionais”. (UNESCO, 1998, p. 25). Desse modo, três atores seriam os responsáveis pelo sucesso de tal intento: 1. a comunidade escolar (professores, pais, direção); 2. as autoridades constituídas; 3. a comunidade internacional.

A participação do setor privado aparece como uma responsabilidade das autoridades constituídas, pois é delas a atribuição de apresentar opções claras para a negociação com todos os interessados “de uma política pública que [...] apresente as diretrizes, estabeleça os fundamentos e as coordenadas do sistema, além de garantir sua regulação, mediante as necessárias adaptações”. (UNESCO, 1998, p. 28).

Essas diretrizes requerem o estabelecimento de políticas, as quais incidem em necessidades financeiras. E como a educação é um bem coletivo, se torna “possível combinar os recursos financeiros do setor público e privado, de acordo com diferentes fórmulas que levem em consideração as tradições de cada país, seu estágio de desenvolvimento, os estilos