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CAPÍTULO XII ETAPAS DA ATIVIDADE PROBATÓRIA

17.6 O princípio da proporcionalidade e a teoria das provas.

17.7.2 interceptações e gravações

17.7.2.5 O empréstimo e valoração da prova ilícita

Tema intimamente relacionado à questão do contraditório na produção das provas diz respeito à chamada prova emprestada. Como apoio nas palavras de Jeremias Bentham, por prova emprestada deve-se entender aquela que é colhida em um processo e, depois, transportada documentalmente para outro, com a finalidade de, neste, produzir efeitos177.

Como as provas em geral, também a chamada prova emprestada submete- se aos princípios constitucionais que regem a matéria, por isso mesmo, ponderam os professores Grinover, Scarance e Gomes Filho;

o primeiro requisito constitucional de admissibilidade da prova emprestada é o de ter sido produzida em processo formado entre as mesmas partes ou, ao menos, em processo em que tenha figurado como parte aquele contra quem se pretende fazer valer a prova. Isso porque o princípio constitucional do contraditório exige que a prova emprestada somente possa ter valia se produzida, no primeiro processo, perante quem suportará seus efeitos no segundo, com a possibilidade de ter contado, naquele, com todos os meios possíveis de contrariá-la. Em hipótese alguma poderá a prova emprestada gerar efeitos contra quem não tenha participado da prova no processo originário 178.

177

Tratado de las pruebas judiciales. Tratado de los sofismas político. obras selectas, tomo I

É idêntica a posição da jurisprudência:

(...)

III. Prova emprestada e garantia do contraditório. A garantia constitucional do contraditório ao lado, quando for o caso, do princípio do juiz natural é o obstáculo mais freqüentemente oponível à admissão e à valoração da prova emprestada de outro processo, no qual pelo menos, não tenha sido parte aquele contra quem se pretenda fazê-la valer; por isso mesmo, no entanto, a circunstância de provir a prova de procedimento a que estranho a parte contra a qual se pretende utilizá-lo só tem relevo, se se cuida de prova que não fora o seu traslado para o processo nele se devesse produzir no curso da instrução contraditória, com a presença e a intervenção das partes.... (STF, RE 328.238-MG, 1ªº T. , rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 17.10.2003, p. 508).

Havendo indícios de que a produção de provas não foi realizada sob a presidência do Juiz do processo, em ato do qual não participaram as partes, com patente inobservância do devido processo legal e do contraditório, a prova emprestada deve ser qualificada como ilícita, desprovida de qualquer eficácia, eivada de nulidade absoluta, insusceptível de ser sanada por força da preclusão (STJ REsp Rel. Min. Vicente Leal RT 743/589).

Novo questionamento deve ser feito no campo da prova emprestada, qual seja: é válida a prova emprestada, isto é, aquela extraída de um processo penal ou de instrução criminal e depois transportada para servir de prova em processo do trabalho ?

Por sua própria redação, o inciso XII do artigo 5º da Constituição Federal diz que "é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal". Essa disposição constitucional levou a erro a quase unanimidade dos constitucionalistas e penalistas brasileiros, que entendiam que o citado inciso XII contemplava 4 (quatro) hipóteses de inviolabilidade, a saber: a) da correspondência; b) das comunicações telegráficas; c) de dados e d) das comunicações telefônicas e apenas no último caso (comunicações telefônicas) a inviolabilidade não seria absoluta, e sim relativa, dependendo, todavia, de lei que ainda não existia, antes de l996, disciplinando os casos e formas em que se daria a quebra, por ordem judicial.

O Min. Marco Aurélio, do STF, na petição nº 577, em 25.03.92, foi quem demonstrou o verdadeiramente sentido e alcance do inciso XII do art. 5º da CF/88, ao dizer que, na verdade, contempla apenas dois (2) casos, divididos cada um, em duas situações, e não quatro (4), a saber: lº) sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas; 2º) dados e comunicações telefônicas. A lª hipótese (sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas) é absolutamente inviolável, vale dizer, nenhuma lei antiga ou nova, poderá admitir violação nas referidas matérias. Já na 2ª hipótese que engloba o sigilo de dados e de comunicações telefônicas, a inviolabilidade é relativa. É que, em relação às comunicações telefônicas, a própria Constituição previa a possibilidade de permitir a produção de prova: instruir ação penal ou inquérito policial, desde antes de ser produzida (ou colhida) era indispensável a autorização pelo juiz da vara penal competente. A partir da Lei 9.296/96, segundo Nelson Nery Junior, a Constituição Federal assegura ser possível o Juízo Cível valer-se da chamada prova emprestada da ação penal, desde que a parte contra quem se vai produzir a prova obtida através de escuta, seja a mesma em ambas as esferas e se observe o princípio do contraditório, em respeito à unidade da jurisdição 179.

Nossa posição é idêntica à do professor Nelson Nery de ser possível o juiz do trabalhista deferir/determinar que no processo do trabalho possa ser utilizada, como prova emprestada, o material colhido em ação penal ou investigação criminal, desde que a prova obtida por meio de escuta telefônica autorizada pelo juiz da vara criminal competente, pois neste caso a prova colhida no juízo criminal é lícita, desde o momento em que foi editada a lei ordinária assim prevendo. É evidente que deve ser preenchido outro requisito para o uso da prova emprestada: o do contraditório. De forma que o resultado da escuta telefônica autorizada pelo juiz criminal seja produzida contra quem participou do diálogo que foi gravado.

Em sentido contrário, é a posição Greco Filho, para quem a prova emprestada só será válida para a execução civil da sentença penal condenatória com o fim de reparação do dano, na medida em que não mais se discute ou se examina a prova colhida por meio de interceptação180.

179

Princípios do processo civil na constituição federal, 3a.edição, pp. l59 e l60.

Para Vicente Cernicchiaro

"Toda investigação de prova, obrigatoriamente, passa, insista-se, pelo crivo do contraditório. Em conseqüência, a parte precisa ser cientificada da indicação, produção e autorizada a assistir a coleta. Só assim, ter-se-á o princípio realizado substancialmente. Além disso, a parte pode participar dessa atividade, sendo-lhe consentida, por exemplo, reinquirir testemunhas, acompanhar diligências, sugerir quesitos para a perícia. A prova, portanto, é regulada pelo Direito, que, no dizer de Franco Cordeiro, fixa as condições de admissibilidade e o modo de formação. A prova recolhida em um processo não pode, como tal, ser utilizada em outro. Um processo não transfere (empresta) a prova para outro... A prova emprestada, portanto, é apenas um fato, suscetível de ser objeto de prova. A distinção não é meramente acadêmica. Como toda prova urge passar pelo contraditório; a parte tem direito à produção secundum ius. Efeito prático: se assim não ocorrer, cumpre ser repelida, sob pena de invalidade: contrasta com o devido processo legal... O leigo, tantas vezes, não compreende as normas jurídicas. Tem-na como excessivamente formalista, dificultando a conclusão do processo. Assim o é por não perceber que atrás de um dispositivo legal (notadamente constitucional - sentido restrito) está presente um valor, penosamente conquistado no passar dos séculos. Em poucas palavras: empresta-se o fato. A prova, não. Há de ser colhida conforme o ritual jurídico para determinado processo"181.

O STF e o STJ posicionaram-se no sentido de que, quando não sabatinada pelas mesmas partes, portanto, com observância do contraditório e ampla defesa, deve ser considerada em caráter adminicular (STF, HC 72295, Rel. Min. Octávio Gallotti, DJ 27.l0.95, p.36332, Ementário vol. 0l806-02, p. 25l) e pode ensejar condenação quando não for a única prova colhida (STF HC 7707, julgado em 07.ll.l989, DJU de l4.08.92, p. l2.225, ementário vol. l670-0l, p. l78, Rel. Min. Celso de Mello). A contrário senso, pode ensejar condenação quando foi (a prova emprestada) submetida ao crivo do contraditório e ampla defesa, pelas mesmas partes (STJ, RESP n.94798, DJU 07.04.96, p. 11.182, relator Min. Vicente Leal).

Esse critério de valoração da prova, largamente usado na Alemanha e nos Estados Unidos da América, como nos ensinaram as várias lições transcritas no presente e modesto trabalho, é o mais eficaz e eficiente porque faz justiça verdadeira ao caso concreto.

181

CAPÍTULO XVIII

PROVAS ATÍPICAS

18.1 Considerações iniciais

O sistema jurídico brasileiro orienta-se pela atipicidade dos meios de prova, pois o rol contido no art. 212 do Código Civil não é taxativo, como também são enunciativos os meios de provas tipificados nos arts. 342 a 443 do Código de Processo Civil. Estão tipificados nessas duas codificações como meios de prova: a confissão, a prova documental, a prova testemunhal, a prova pericial e a inspeção judicial.

E, para alguns, ainda as presunções e os indícios, que na nossa visão não são meios de prova e sim métodos indutivos de raciocínio.

O anteprojeto do Código Brasileiro de Processos Coletivos, elaborado pelos membros do Instituto Brasileiro de Processos Coletivos, encaminhado ao Ministério da Justiça, prevê no caput de seu art. 10 outro meio de prova: a prova por estatística ou amostragem.

Mesmo primando pela atipicidade dos meios de prova, não há dúvida alguma de que quando se fala em prova atípica vem à mente sempre o questionamento: o que é prova atípica?

Entende-se por provas atípicas, todas aquelas que não estão nominadas na CLT, no Código Civil, no Código de Processo Civil e nas leis complementares. Cândido Rangel Dinamarco esclarece, com pena de mestre, que além dos meios de prova típicos, que são os elencados e disciplinados em lei, outros podem ser admitidos no processo civil, posto que não elencados nem disciplinados por lei alguma, desde que moralmente legítimos182.

Vê-se, assim, que a primeira exigência imposta à admissão da prova atípica está na sua moralidade. A moralidade da prova está direcionada ao seu conteúdo ético, de forma que todo meio de prova que violar preceitos éticos é amoral, portanto ilegal.