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O instrumento de recolha de dados

No documento A Matemática na Imprensa Portuguesa (páginas 99-103)

2.3 Descric¸˜ao geral da investigac¸˜ao

3.1.4 O instrumento de recolha de dados

A recolha dos dados fez-se com base numa grelha de codificac¸˜ao previamente constru´ıda, optando-se assim por uma abordagem dedutiva (Macnamara, 2005). Tomou-se esta decis˜ao com o objetivo de tornar o instrumento de recolha de dados mais eficiente `a partida, uma vez que o conte´udo da grelha sensibiliza o investigador para o tipo de informac¸˜ao relevante. No caso dos erros l´ogico-matem´aticos isto tamb´em se revela de grande utilidade, dada a amplitude do conceito de erro.

A estrutura das categorias do instrumento de recolha de dados e as opc¸˜oes alternativas de classificac¸˜ao mas mesmas decorreram do cruzamento de informac¸˜ao resultante da consulta de literatura (Quivy & Campenhoudt, 1992; Azevedo, 2007; Maier, 2000) e de ajustes efetuados na fase de teste do instrumento.

Desenvolveu-se uma grelha e respetivo manual de codificac¸˜ao (dispon´ıveis no anexo A, a partir da p´agina 209) com base dos diferentes tipos de informac¸˜ao que se pretendiam extrair do artigo, designadamente a sua estrutura, o conte´udo e a informac¸˜ao l´ogico-matem´atica nele contida. A estrutura do artigo permite caracterizar os artigos ao n´ıvel da sua localizac¸˜ao, relevˆancia no jornal e elementos de forma. Para o estudo da localizac¸˜ao utilizaram-se as categorias de “dia de publicac¸˜ao”, “nome do jornal”, “pertenc¸a a suplemento”, “secc¸˜ao”, “data de publicac¸˜ao do artigo” e “paridade da p´agina”. Para al´em da localizac¸˜ao no jornal, a categoria “secc¸˜ao” permite ainda compreender se a informac¸˜ao l´ogico-matem´atica num jornal ´e preferencialmente usada nalguma ´area, ou se, contrariamente, n˜ao existem ´areas `as quais se possa associar um maior recurso `a informac¸˜ao l´ogico-matem´atica para prop´ositos de comunicac¸˜ao jornal´ıstica. `A semelhanc¸a do que ocorre com a categoria “secc¸˜ao”, tamb´em a categoria “paridade da p´agina” d´a uma contribuic¸˜ao maior do que a simples localizac¸˜ao no jornal. De facto, Damasceno (2013, pp. 30–31) salienta que, de uma forma geral, o leitor foca mais a sua atenc¸˜ao nas p´aginas ´ımpares e, portanto, uma p´agina ´ımpar ´e mais relevante do que uma que seja par.

As categorias “tamanho do artigo”, “chamada `a primeira p´agina” e “existˆencia de grafismo”5

utilizaram-se para compreender a relevˆancia dada a artigos com informac¸˜ao l´ogico-matem´atica

no jornal e, por sua vez, o “tamanho do artigo” e a “existˆencia de grafismo” fornecem indicac¸˜ao sobre a importˆancia do artigo na p´agina. J´a a “chamada `a primeira p´agina” remete para a importˆancia do artigo no jornal como um todo.

Ao n´ıvel do conte´udo, classificam-se os artigos quanto ao “car´ater geogr´afico”, ao “g´enero jornal´ıstico”, ao “autor”, `a “existˆencia de tecnicismos”, `a “fonte de informac¸˜ao principal” e ao “tom do artigo”. O “car´ater geogr´afico” permite avaliar se a informac¸˜ao l´ogico-matem´atica ´e mais utilizada na comunicac¸˜ao de temas globais ou antes na comunicac¸˜ao de temas nacionais ou locais. A classificac¸˜ao quanto ao “g´enero jornal´ıstico” permite relacionar o uso de informac¸˜ao matem´atica com o maior ou menor aprofundamento da hist´oria reportada e tamb´em um maior ou menor investimento de recursos do jornal. Por sua vez, a identificac¸˜ao do “autor” permite distinguir artigos que s˜ao da autoria de agˆencias daqueles que n˜ao o s˜ao, bem como fornecer indicac¸˜ao sobre quais os jornalistas que mais escrevem para uma determinada secc¸˜ao. A “existˆencia de tecnicismos”6 tem como finalidade ajudar a compreender se as not´ıcias com

informac¸˜ao l´ogico-matem´atica contˆem, na sua generalidade, vocabul´ario t´ecnico e s˜ao, portanto, de leitura mais complexa e exigente. No que se refere `a categoria “fonte de informac¸˜ao”, esta ´e ´util para compreender se as fontes utilizadas nos artigos s˜ao geralmente cred´ıveis. Isto porque, como Jorge Sousa refere, “a credibilidade e a autoridade de uma fonte andam lado a lado” (Sousa, 2001, p. 72) e, por isso, atribui-se maior credibilidade a artigos de uma fonte oficial do que `aqueles de fontes n˜ao oficiais, por exemplo.

Considerou-se ainda importante incluir a categoria “tom do artigo”, na qual se classificam os artigos em sensacionalistas ou factuais. Esta permite tirar conclus˜oes acerca do valor da not´ıcia. Especificamente, e segundo Azevedo (2007), recorre-se ao sensacionalismo para aumentar este valor.

Classificaram-se ainda os artigos quanto `a existˆencia de representac¸˜ao gr´afica, por constituir uma forma de apresentac¸˜ao do conte´udo matem´atico e porque a presenc¸a de um gr´afico sugere que a informac¸˜ao matem´atica ´e relevante na not´ıcia.

Note-se que as categorias “existˆencia de grafismo” (no ˆambito da estrutura do artigo) e “existˆencia de representac¸˜ao gr´afica” n˜ao s˜ao disjuntas, pois a segunda est´a inclu´ıda na primeira. No entanto, dado o particular interesse das representac¸˜oes gr´aficas no ˆambito deste estudo, considerou-se necess´ario violar o princ´ıpio de disjunc¸˜ao das categorias neste caso espec´ıfico, um facto que se toma em considerac¸˜ao na apresentac¸˜ao dos resultados.

Classificou-se ainda cada artigo quanto `a “importˆancia da informac¸˜ao l´ogico-matem´atica” na narrativa. Esta categoria que permite perceber se a informac¸˜ao de cariz l´ogico-matem´atico assume um papel fundamental ou secund´ario na comunicac¸˜ao da hist´oria do artigo e tamb´em compreender a importˆancia que os jornalistas atribuem `a matem´atica na produc¸˜ao de artigos

6Por tecnicismo entende-se qualquer palavra que tem um significado espec´ıfico no contexto da not´ıcia: ou por

se aplicar ao dito contexto, ou por, no contexto da not´ıcia, adquirir um significado diferente ao que normalmente teria (ex: a palavra “Bruxelas” referir-se ao Parlamento Europeu e n˜ao ao pa´ıs em si).

noticiosos. Por ´ultimo, a informac¸˜ao do artigo foi classificada quanto ao tipo(s) de erro(s) l´ogico-matem´atico(s), nos casos em que estes existem.

Para a classificac¸˜ao destes erros criaram-se duas macrocategorias: “objetividade do erro” e “natureza l´ogico-matem´atica do erro”, que se dividiram ainda em categorias e subcategorias. A macrocategoria “objetividade do erro” permite discernir se o erro se deve a um mau uso t´ecnico da matem´atica (erro objetivo) ou se, por outro lado, ´e consequˆencia de um julgamento do jornalista, que se revela por meio de omiss˜ao de informac¸˜ao ou distorc¸˜ao na interpretac¸˜ao da informac¸˜ao l´ogico-matem´atica (erro subjetivo). A classificac¸˜ao dos erros quanto `a objetividade permite estabelecer comparac¸˜ao (embora condicionada `as diferenc¸as metodol´ogicas) com os resultados obtidos por Maier (2000) no ˆambito de um estudo que se realizou sobre os erros matem´aticos nas not´ıcias de um jornal americano, uma vez que o autor tamb´em usa esta classificac¸˜ao de erros.

Foi ainda criada a macrocategoria “natureza l´ogico-matem´atica do erro” com o objetivo de classificar os erros quanto `a ´area t´ecnica em que se inseriam. Assim, decidiu-se classificar os erros em num´ericos, estat´ısticos, gr´aficos e l´ogicos (definic¸˜oes dispon´ıveis na tabela 3.1.6). Importa notar que a disjunc¸˜ao entre estas categorias n˜ao ´e totalmente clara. Esta foi uma dificuldade com que os investigadores se depararam e que conduziu `a necessidade de dividir os erros em subcategorias e dentro delas apresentar erros concretos, com o objetivo de evitar a repetic¸˜ao da classificac¸˜ao do mesmo erro.

Com base nas macrocategorias usadas para classificar os erros criou-se uma lista de exemplos (subcategorias) partindo do trabalho de v´arios autores tais como Paulos (1997), Cohn e Cope (2001), Blastland (2008), Best (2001) e Dewdney (1993).

Categoria do erro quanto `a objetividade

Categoria do erro quanto `a natureza l ´ogico-matem´atica E. Num´erico

– Erro em operac¸˜oes aritm´eticas

– Operac¸˜oes aritm´eticas com quantidades em diferentes unidades de medida (sem fazer a reduc¸˜ao necess´aria)

– Comparac¸˜ao direta de valores de natureza diferente

E. Objetivo – Erro nas relac¸˜oes de ordem em frac¸˜oes ou intervalos de valores – Erros de arredondamento

– Confus˜ao entre as noc¸˜oes de ponto percentual e de percentagem – Confus˜ao entre variac¸˜ao de taxa de PIB e variac¸˜ao do PIB – Min´ucia da precis˜ao desadequada ao contexto

– N´umeros que n˜ao fazem sentido (num contexto), isto ´e, que n˜ao podem estar certos

– Omiss˜ao de parcelas em operac¸˜oes b´asicas

E. Subjetivo – Uso de n´umeros exclusivamente em valor absoluto para caracterizar uma situac¸˜ao, quando o valor da frequˆencia relativa seria essencial para compreender o significado ou uso de percentagem mas n˜ao do valor absoluto

– Uso “cru” de n´umeros E. Estat´ıstico

– Uso de termos julgando que remetem para valores pontuais quando na verdade remetem para valores m´edios

E. Objetivo – Margem de erro mal usada, por exemplo em contexto de sondagens – Valores de vari´aveis em conjuntos desadequados (ou unidades desade- quadas)

E. Subjetivo – Omiss˜ao do grau de confianc¸a ou margem de erro associados ao resultado de sondagens ou estudos

– Omiss˜ao de valores m´edios, m´aximos ou m´ınimos

– N˜ao ´e dada informac¸˜ao sobre parˆametros necess´arios `a definic¸˜ao do m´etodo de amostragem usado e da populac¸˜ao em causa

– Desprezo de vari´aveis pertinentes no contexto em causa E. Gr´afico

– N˜ao se respeita a uniformidade ou proporcionalidade em escalas, sejam elas lineares ou em ´areas

E. Objetivo – Intervalo de valores considerada distorce a percec¸˜ao da real variac¸˜ao das vari´aveis

– Uso de valores de referˆencia diferentes (intervalos de tempo, por exemplo) para comparar desempenhos

– Falta de articulac¸˜ao entre o texto e o gr´afico/infografia E. Subjetivo – Inconsistˆencia entre o texto e o gr´afico/infografia

– Omiss˜ao de classificac¸˜ao das unidades – Omiss˜ao de escalas

E. L ´ogico

– Apelo indevido `a autoridade

E. Objetivo – Confus˜ao entre correlac¸˜ao e causalidade

– Generalizac¸˜ao apressada de um racioc´ınio, com base apenas no estudo de alguns casos

Categoria do Erro Definic¸˜ao

Num´erico Erros em medidas, grandezas, proporc¸˜oes, aritm´etica, devido a omiss˜ao de significado, incorrec¸˜ao factual ou distorc¸˜ao

Estat´ıstico Erros em conceitos estat´ısticos (ex: grau de confianc¸a, amostra, probabilidade) devido a omiss˜oes, distorc¸˜oes ou informac¸˜ao incorreta Gr´afico Erros na construc¸˜ao de gr´aficos, devido a omiss˜oes, distorc¸˜oes ou

informac¸˜ao incorreta

L ´ogico Erros na construc¸˜ao de argumentos, fal´acias de racioc´ınio

Tabela 3.1.6:Definic¸˜ao dos erros categorizados quanto `a sua natureza matem´atica.

Ap´os a an´alise das not´ıcias verificou-se que todos os erros identificados nos jornais estavam contemplados na grelha. Al´em disso, a grelha continha exemplos de erros que n˜ao foram encontrados nas not´ıcias analisadas. Esses exemplos, descritos no manual de codificac¸˜ao (anexo A, a partir da p´agina 209), s˜ao os seguintes:

1. Confus˜ao entre probabilidade e probabilidade condicionada.

2. Operac¸˜ao com quantidades em diferentes unidades de medida sem fazer a convers˜ao necess´aria.

3. “Percentage-pumping”.

4. Falta de conex˜ao entre a hist´oria da not´ıcia e o gr´afico ou infografia. 5. Apelo indevido `a autoridade.

6. Fal´acia do jogador.

No documento A Matemática na Imprensa Portuguesa (páginas 99-103)