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O movimento da pesquisa: considerações metodológicas e o lócus da pesquisa

Nossa imersão no campo de pesquisa partiu de um interesse em compreender o modo como a rede de atenção vem sendo acionada por adolescentes em medida socioeducativa de Liberdade Assistida. Partindo do pressuposto de que o exercício da cidadania desses adolescentes está diretamente relacionado aos modos como acionam e se relacionam com os serviços de atenção, e como estes agenciam seus recursos em um território, propusemos como orientação metodológica realizar encontros com um grupo de adolescentes em medida de Liberdade Assistida, durante um ano (entre os meses de janeiro a dezembro de 2010).

Nesses encontros, o objetivo seria identificar e compreender, a partir de suas trajetórias e de seus espaços de sociabilidade, alguns aspectos sobre a relação entre adolescentes e os serviços e as características desse exercício de cidadania. Identificar suas trajetórias nos permitiria compreender os pontos nodais que tramam suas redes no território: as linhas de força mais tênues e incipientes que ligam os serviços, as potencialidades e limites que dão espaço ao exercício da cidadania.

(QFRQWUDPRV QR DUWLJR LQWLWXODGR ³0DQLF{PLR HP FLUFXLWR RV SHUFXUVRV GRV MRYHQV H D LQWHUQDomR SVLTXLiWULFD´ HODERUDGR SRU 6FLVOHVNL HW DO  , uma experiência metodológica interessante no mapeamento da rede de atenção de um município do estado do Rio Grande do Sul. Com o nome Oficinas de Trajetórias, as autoras propuseram aos adolescentes internados em um hospital psiquiátrico a realização de oficinas onde, a partir de questões disparadoras, os participantes eram convidados a traçar graficamente em um mapa suas trajetórias na rede de serviços até a chegada no hospital.

Também o trabalho de Dalmolin (2006), ³Esperança Equilibrista: cartografias GH VXMHLWRV HP VRIULPHQWR SVtTXLFR´ direcionado pela orientação cartográfica, propiciou-nos reflexões metodológicas:

a cartografia é entendida para além do mapeamento de um território geográfico estático. É um desenho que acompanha as mudanças e

os sentidos produzidos por determinada situação de vida nos territórios, que são também psicossociais. Assim, a cartografia busca captar os universos traçados pelos modos de vida, pelo desejR SHORV µGHVPDQFKDPHQWRV¶ GH FHUWRV PXQGRV TXH YmR VH tornando obsoletos, ou que fogem das suas possibilidades concretas pela situação vivida, pela desterritorialização, e que correspondem a diferentes formas de inserção social e cultural (p. 103).

Dalmolin (2006) entende que as tramas singulares, construídas a partir da inserção em distintas redes sociais, afetivas e institucionais, possibilitam ao sujeito diferentes modos de circulação. Em suas palavras:

as trajetórias dos protagonistas como escolhas construídas e conquistadas no entrelaçamento das dimensões individuais e sociais, as quais indicam que certas circunstâncias (pessoas, situações, lembranças), trazem-lhes suporte para se apropriarem dos espaços, interagirem com pessoas, produzirem situações desejadas, retornarem a lugares que lhes dão/ou onde esperam ter apoio, acolhimento e autonomia (p. 114).

Essa perspectiva, dialogando com Guatarri e Rolnik (1996), se apoia no trinômio territorialização-desterritorialização-reterritorialização. Para os autores, um território só existe mediante agenciamentos e quando lhe é conferida alguma expressividade, constituindo-se, portanto, em território vivo, sujeito a desterritorializações e reterritorializações constantes, a partir de movimentos de apropriação e afastamento dos agenciamentos em que estão circunscritos.

Tomando essas noções como principais nortes metodológicos, fomos até um serviço de medida socioeducativa em meio aberto da cidade de São Paulo, onde tínhamos um contato prévio por motivo de o próprio pesquisador já ter composto o quadro profissional da instituição na função de orientador socioeducativo. Solicitamos o apoio da equipe de técnica do serviço para nos indicar adolescentes que estavam iniciando suas medidas, a fim de podermos acompanhá-los ao longo de, pelo menos, seis meses (tempo mínimo da medida de Liberdade Assistida).

Na conversa com a equipe técnica, fomos percebendo alguns desafios para a realização desses encontros. Primeiro, como não tínhamos vinculo com esses adolescentes, pensamos em iniciar nossa pesquisa utilizando o próprio espaço do serviço, mesmo que temporariamente. Também teríamos que definir se os encontros aconteceriam no período da manhã ou da tarde ± optamos pelo período da tarde, em que o maior número de atendimentos facilitaria um horário comum. Depois, foi preciso escolher o dia da semana e o horário, levando em consideração os períodos em que já se realizavam outras atividades, tais como as oficinas de teatro, percussão e capoeira. Enfim, anotamos os horários em que os adolescentes em início de medida estariam no serviço para atendimento para convidá-los a participar da pesquisa.

Vale explicitar que nosso projeto de pesquisa, naquele momento, já havia sido aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisas da Universidade ± que o registrou na Comissão Nacional de Ética em Pesquisa [CONEP], segundo dispõem as diretrizes do Ministério da Saúde ± Conselho Nacional de Saúde ± Resolução nº 196, de 10/10/1996 ± ³'LUHWUL]HVHQRUPDVUHJXODPHQWDGRUDVGHSHVTXLVDVHQYROYHQGRVHUHV huPDQRV´O parecer do Comitê de Ética em Pesquisa da PUC encontra-se no Anexo I.

Um elemento importante para a avaliação ética é o termo de consentimento informado (Anexo II), a ser assinado por todos os participantes da pesquisa, incluindo os adolescentes, seus familiares e os técnicos do serviço. No caso dos adolescentes, elaboramos um termo de consentimento que pressupunha o seu consentimento e o de algum responsável, uma vez que eles não haviam completado 18 anos de idade ± como exigem DV ³'LUHWUL]HV H normas regulamentadoras de SHVTXLVDHQYROYHQGRVHUHVKXPDQRV´.

Em uma pesquisa que problematiza a questão da responsabilização e da tensão no campo das ilegalidades, exigir tal protocolo aos adolescentes parece no mínimo irônico, quando não os consideramos capazes nem mesmo de decidir sua participação em uma pesquisa. Consideramos que uma situação de pesquisa orientada por princípios éticos deve antes de tudo prever um lugar dialógico a seus participantes, que devem participar da execução da pesquisa, sabendo de seus pressupostos, seus procedimentos metodológicos, suas intenções. Assim, consideramos que os adolescentes podem reconhecer e exigir os direitos oferecidos (garantia de

anonimato, revelação velada, desistência), podem compreender os objetivos e procedimentos explanados, assim como consentir sobre a utilização de seus dados, em uma aposta que os posiciona como cidadãos, imputando-lhes a credibilidade necessária para considerá-los sujeitos de direitos.

Tais reflexões precisam ganhar em consistência no campo da pesquisa social para tencionar as reflexões do CONEP sobre as peculiaridades e implicações éticas de suas normas sobre o fazer de pesquisadores das ciências humanas e sociais. Contudo, como não temos respaldo para esse tipo de enfrentamento, decidimos manter essa decisão, mas deixar que os adolescentes apresentassem a pesquisa a seus responsáveis, caso desejassem. Desse modo, os adolescentes que aceitassem participar da pesquisa deveriam assinar o documento e levá-lo para casa, onde eles mesmos apresentariam a pesquisa para um responsável e, em caso de consentimento, pediriam também sua assinatura e seu número de identificação (RG). Tal termo foi apresentado no primeiro encontro com os participantes, quando foram discutidos os objetivos da pesquisa, sua metodologia e o termo de compromisso ético. O primeiro contato entre o pesquisador e os participantes foi marcado por tal acordo de colaboração e transparência, como sugerido por Spink e Menegon (2000).

Foi destacado que este acordo inicial poderia ser revisto a qualquer instante, sendo garantida a possibilidade de desistência dos participantes a qualquer momento do processo investigativo. Como é um contrato que exige uma relação de confiança, foi oferecido o direito da não-resposta, ou revelação velada (que não pode ser registrada). Foram solicitadas também autorizações para o registro em diário de campo, garantindo o anonimato dos participantes. Este acordo está registrado em um termo escrito, no qual está explanado o compromisso ético da pesquisa, assinado por todos os participantes da pesquisa, inclusive o pesquisador.

Durante três semanas tentamos organizar um grupo com número razoável de participantes (uma média de oito), mas tivemos dificuldade por não conseguir encontrar um horário em comum entre os participantes, inclusive porque não necessariamente chegavam no horário marcado para os atendimentos. Chegamos a tentar realizar três encontros, mas nenhum conseguiu atingir mais do que três participantes, e ainda assim, cada um chegando em horário aproximado.

Notamos que a quase totalidade dos atendimentos eram realizados individualmente. Embora as oficinas socioeducativas reunissem alguns adolescentes, as atividades coletivas estavam restritas às oficinas e passeios mensais. Nessas primeiras semanas freqüentamos o serviço quase que diariamente, e pudemos observar a quase constante permanência da equipe nas dependências do serviço. Conversando com a equipe, soubemos que o número de adolescentes atendidos pelo serviço estava aumentando, mantendo a equipe sobrecarregada. Com o aumento de atendimentos, aumentava também o número de relatórios a serem encaminhados para o Departamento de Execução da Infância e Juventude [DEIJ]. Era comum chegarmos ao serviço e metade da equipe estar elaborando relatórios.

Mas ao mesmo tempo em que nos empenhávamos em construir um espaço de diálogo coletivo entre os adolescentes, fomos nos colocando algumas questões. Em uma conversa com alguns adolescentes, foi possível perceber que seria importante exercitar, assim como a experiência de Diógenes (2008), um olhar nômade em relação à dinâmica juvenil, como esforço de investigação. Em um contexto como aquele, a constituição de um grupo requereria um esforço tamanho que inclusive nos fez pensar se essa tentativa de construir uma regularidade sistemática de encontros não fundiria nossa estratégia de pesquisa à própria execução da medida.

AVVLP WRPDPRV FRPR KRUL]RQWH XPD HVWUDWpJLD PHWRGROyJLFD ³QmR-IL[LVWD´ capaz de dar conta de um movimento, uma mutação (Diógenes, 2008). Movidos por XP HVWLOR GH WUDEDOKR PDLV ³LWLQHUDQWH´ RSWDPRV SRU FRQYLGDU DOJXQV DGROHVFHQWHV para uma caminhada pelo bairro, afim de que pudéssemos conhecer alguns de seus espaços de sociabilidade. Esse movimento, também foi caracterizado pela aposta em conversas nos espaços comuns do serviço, tais como a sala de espera, a cozinha, o corredor de entrada da casa, enfim, todos os lugares onde se reuniam alguns adolescentes, tanto os que estavam em medida quanto os que estavam acompanhando-os.

Vale mencionar também que a proposta inicial de acompanhar adolescentes em início de medida estava nos restringindo possibilidades. Assim, acompanhar adolescentes que estivessem em qualquer período da medida nos facilitaria uma imersão nos territórios dos jovens, coadunando com a perspectiva de Barros e Kastrup (2009), de que na pesquisa de campo o pesquisador se mantém em contato

direto com as pessoas e seus territórios existenciais, inclusive em territórios que, a princípio, o pesquisador não habita.

Foi assim que passamos a procurar os adolescentes em seus próprios espaços de sociabilidade. De acordo com o interesse de cada adolescente, agendávamos um encontro e local e horário de sua preferência. Todavia, outros obstáculos se fizeram notar: quase todos os encontros marcados não se concretizaram, a não ser aqueles marcados na própria residência dos adolescentes. Provavelmente a falta de vínculo tenha sido um fator preponderante. Vale registrar que sempre que convidávamos o adolescente para participar da pesquisa pairava no ar um tom de desconfiança. Refletindo sobre isso, percebemos que quase todos os discursos dos adolescentes que conseguimos acompanhar eram marcados pela preocupação de deixar claro que já não estavam mais envolvidos com o cometimento de atos infracionais.

Foi em meio a situações como essas que nos chamou a atenção um dia em que chegamos à casa de um adolescente e fomos apresentados aos seus familiares como sendo do serviço de medida. Embora ressaltássemos que nossa intervenção fazia parte de uma pesquisa, inclusive por firmarmos o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, presenciamos essa cena mais de uma vez.

Essa relação um pouco truncada nos fez optar por acompanhar algumas das atividades culturais oferecidas pelo serviço, na tentativa de construir um vínculo maior com os adolescentes e, inclusive, participar de um momento de sociabilidade comum. Acompanhamos alguns encontros em contexto de oficina e de passeios a equipamentos de esporte, lazer e cultura da cidade. Com relação às oficinas, constatamos que, embora o serviço oferecesse oficinas de capoeira, teatro e percussão, efetivamente, contava com pouca participação, dando a entender que não havia muito interesse por parte dos adolescentes. E realmente, em conversa com a equipe, ficamos sabendo da realização de uma oficina de grafite, poucos meses antes, que contou com uma participação considerável e que fora proposta pelos próprios adolescentes.

Em determinado dia, enquanto aguardávamos o horário de início de uma das oficinas, acompanhamos a movimentação da equipe do serviço em torno do caso de um adolescente dito dependente de crack que estava com determinação judicial para

ser internado em uma enfermaria de desintoxicação de um Hospital Estadual ± internação compulsória, por mandado judicial. Movidos por essa discussão, procuramos conhecer melhor sobre esse caso e sobre outros casos que pudessem nos falar sobre a perspectiva de trabalho da equipe do serviço e do modo de funcionamento da rede de atenção. Foi então que nos chamou a atenção o caso de um adolescente envolvido com o tráfico de drogas que, pela terceira vez, cumpria a medida de Liberdade Assistida e que, de acordo com o técnico responsável, não apresentava interesse em participar de praticamente nenhuma atividade oferecida pelo serviço. A aposta de pesquisa a partir desses casos se deu por estes funcionaram como analisadores5 do serviço.

Nosso campo de pesquisa, como se pôde ver, foi atravessado por estratégias distintas e por perspectivas distintas também, mas que, de todo modo, permitiu uma aproximação de elementos importantes que se relacionam com nossa proposta inicial de compreender a relação dos adolescentes com os serviços acionados e o modo de funcionamento desses serviços frente ao exercício de cidadania desses adolescentes. Nossa análise, portanto, foi realizada a partir deste corpo de dados heterogêneo e está intrinsecamente relacionada com este percurso peculiar de pesquisa. Não foi realizada exatamente uma cartografia dos territórios existenciais nem das trajetórias dos adolescentes, mas pudemos seguir um movimento de pesquisa que nos ofereceu elementos para compreender as intervenções e efeitos da medida em sua relação com os adolescentes.

I ± Lócus da pesquisa

Nosso lócus de pesquisa está situado no município de São Paulo, em uma área avaliada pelo Sistema Intraurbano de Monitoramento dos Direitos Humanos [SIM- DH] (CMDH-SP, 2006), que a considera exercendo uma boa garantia de direitos humanos a seus moradores. A partir de um critério de classificação que vai de alta garantia à precária garantia (alta, boa, média, baixa e precária garantia), esse índice é

5 Analisador no sentido da análise institucional: como acontecimento condensador de forças sócio-

políticas até então dispersas, facultando, em conseqüência, a reconstituição analítica de determinadas situações, a desconstrução de determinadas naturalizações e a convocação da potência de produção de realidades alternativas e/ou alterativas (Lourau, 2004; Barros, Leitão & Rodrigues, 1992).

composto de uma avaliação das seguintes dimensões: Socioeconômica, Violência, Criança e Adolescente, Mulher e Negro.

Na dimensão ³6ocioeconômica´: em torno de 8% da população sobrevivem com renda familiar de até meio salário mínimo per capta (boa garantia); em torno de 2,5% da população de 15 anos ou mais são analfabetos (alta garantia); em torno de 93% dos domicílios têm rede de esgoto (boa garantia); em torno de 16% da população residem em domicílios com mais de três moradores por dormitório (média garantia); em torno de 9% da população o responsável pelo domicílio tem menos de quatro anos de estudo (boa garantia); a taxa de desemprego média da população economicamente ativa está em torno de 12% (boa garantia); em torno de 20% da população residem em favelas (baixa garantia).

Na dimensão ³9LROrQFLD´ destacam-se: a taxa em torno de 71 homicídios de homens com idade entre 15 e 29 anos por cem mil habitantes (média garantia); a taxa em torno de 5,5% do total de mortes por ação policial em relação ao total da cidade (precária garantia).

Na dimensão ³Criança e AGROHVFHQWH´GHVWDFD-se: a taxa em torno de 8,5% de alunos com dois anos ou mais de defasagem idade/série no Ensino Fundamental (média garantia); a taxa em torno de 13,5% de alunos com dois anos ou mais de defasagem idade/série no Ensino Médio (alta garantia); a taxa em torno de 520 adolescente por cem mil habitantes em cumprimento de medida socioeducativa (faixa etária de 14 a 18 anos) (média garantia).

1D GLPHQVmR ³MXOKHU´, destacamos: a taxa de que aproximadamente o rendimento médio masculino é 1,30 vezes superior ao feminino (baixa garantia); a taxa de aproximadamente 5,5% dos nascidos vivos têm mães com idade até 17 anos (baixa garantia); a taxa de aproximadamente 2,60 internações de mulheres por agressão a cada cem mil habitantes (alta garantia).

1DGLPHQVmR³1HJUR´, destacam-se: a taxa do rendimento médio de não negros é em torno de 2,40 vezes superior ao de negros (baixa garantia); a taxa do desemprego de negros é em torno de 1,40 vezes superior ao de não negros (baixa garantia); a taxa de pré-natal insuficiente de negros é em torno de 2,10 vezes superior

à taxa de não negros (precária garantia); a taxa de gravidez precoce de mulheres negras é em torno de 1,95 vezes superior ao de mulheres não negras (baixa garantia); a taxa de homicídios de negros com idade entre 15 e 29 anos é em torno de 1,65 vezes superior a de não negros (boa garantia).

1R JHUDO D GLPHQVmR ³6RFLRHFRQ{PLFD´ p considerada de boa garantia, a GLPHQVmR ³9LROrQFLD´ p FRQVLGHUDGD GH PpGLD JDUDQWLD D GLPHQVmR ³&ULDQoD H $GROHVFHQWH´pFRQVLGHUDGDGHDOWDJDUDQWLDDGLPHQVmR³0XOKHU´pFRQVLGHUDGDGH DOWDJDUDQWLDHDGLPHQVmR³1HJUR´pFRQVLGHUDGDGHEDL[DJDUDQWLD.

Vale mencionar que o SIM-DH faz uma análise da subprefeitura como um todo6. Se acompanharmos os indicadores do Índice Paulista de Vulnerabilidade Social [IPVS] (SEADE, 2000), no ano 2000, quase metade da população da subprefeitura de abrangência do serviço foco dessa pesquisa foi considerada em situação de vulnerabilidade social muito baixa. Todavia, olhando o mapa da subprefeitura, é possível identificar que a região em que a maioria dos adolescentes atendidos pelo serviço pesquisado reside é uma área predominantemente de favela, caracterizada por índices entre 4 e 6 de vulnerabilidade social (em uma escala de 1 a 6, sendo 1 nenhuma vulnerabilidade e 6 muito alta vulnerabilidade).

Esses dados, ao nosso entender, expõem a necessidade de considerar o grau de desigualdade social existente na subprefeitura e também a necessidade de se procurar conhecer alguns indicadores mais próximos da realidade vivenciada por adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto que residem nessa região.

Embora não tenhamos identificado dados estatísticos mais específicos sobre a região e o serviço de medida socioeducativa não tenha dados sistematizados sobre a população atendida, conseguimos algumas aproximações da realidade da região em diálogo com a equipe socioeducativa. Segundo relatório contendo a declaração mensal de dados de execução, elaborado pelo serviço mensalmente para a

6 O município de São Paulo é subdividido em 31 subprefeituras. De modo geral, essas subprefeituras têm o papel de receber pedidos e reclamações da população, solucionar os problemas apontados; preocupam-se com a educação, saúde e cultura de cada região, tentando sempre promover atividades para a população. Além disso, elas cuidam da manutenção do sistema viário, da rede de drenagem, limpeza urbana, vigilância sanitária e epidemiológica.

Coordenadoria do Observatório de Políticas Sociais da Prefeitura de São Paulo7, o serviço atende, quase em sua totalidade, adolescentes membros de famílias de baixa renda familiar e que, geralmente, residem nas favelas dos bairros, ou ainda, em suas adjacências. Em conversas com o coordenador do serviço, disseram-nos que poucos foram os casos de adolescentes de famílias mais abastadas economicamente que foram atendidos pelo serviço. Acreditam que, em casos como esses, as famílias se responsabilizam em dar suporte psicológico, educacional etc. para os adolescentes, que acabam por não receber medidas como a de Liberdade Assistida. Quanto ao tipo de ato infracional cometido, a grande maioria dos adolescentes atendidos pelo serviço recebeu a medida por motivo de furto, roubo e/ou tráfico de drogas.

Mesmo que panoramicamente, apresentaremos um comparativo sobre algumas informações que conseguimos coletar a partir de dois relatórios mensais de atividades. Embora nossa pesquisa de campo tenha se iniciado no início de 2010, durante quase todo o ano a equipe profissional desenvolveu suas atividades sobrecarregada com o número de adolescentes inscritos no serviço. A equipe, que até