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Já foi salientado que embora segurança pública seja, em princípio, atribuição constitucional dos Estados, o Município pode e deve desenvolver ações preventivas e até repressivas de violências e criminalidade, para além da atribuição conferida de instituir Guardas Civis Municipais, algumas até armadas.

Com efeito, os diversos estudos já mencionados enfatizam a necessidade de atuação intersetorial e até interinstitucional entre os sistemas de defesa social, justiça criminal, direitos sociais básicos, com participação comunitária.

O município é responsável por promoção de educação, saúde, assistência social e outras prestações públicas, o que justificou sua participação no CISP não apenas através do Prefeito ou um representante local, mas com o efetivo engajamento de várias instituições, como conselho tutelar, superintendência de trânsito, centros de referência da mulher, de assistência social (CRAS), especializado de assistência social (CREAS), secretarias de educação, saúde, guarda municipal, entre outros órgãos.

Diversos municípios, visando articular e integrar ações, passaram a elaborar planos municipais de prevenção de violência, uma das metas atuais dos CISP´s Regionais. Ribeiro e Patrício (2008) analisaram a Política Municipal de Barra Mansa, destacando a implementação das seguintes ações: reestruturação da secretaria municipal de ordem pública; criação do Gabinete Integrado de Segurança Pública; criação de fóruns locais (bairros e localidades) de prevenção à violência; reestruturação do Conselho Comunitário de Segurança Pública; realização de cursos, criação de sistemas de informação e construção do plano de carreiras da Guarda Municipal; construção de um programa de redução e prevenção à violência doméstica e de gênero e construção de um projeto de prevenção à violência juvenil.

Gärtner (2008) destaca que a gestão, o planejamento urbano e o gerenciamento integrado de espaços públicos possuem papel decisivo para melhorar a segurança nas cidades e têm que ser reconhecidos, pois trata-se de importantes ferramentas para integração social, desenvolvimento de uma observação informal e apoio a estratégias de prevenção de vários tipos, tais como recreação, cultura, arte e participação civil. Defende que o planejamento urbano deve incluir a temática da segurança, sobretudo as necessidades da população menos privilegiada e vulnerável, como crianças e jovens, muitas vezes as vítimas e os perpetradores

principais da violência, e preocupações de gênero. Considera que a ênfase deve ser na dimensão social de espaços públicos e direciona-se a fatores que aumentem a sensação de segurança nestes espaços, através de estratégias para prevenção do crime e da violência, combinando respostas situacionais, sociais e institucionais para melhorar a qualidade de vida. Finaliza corroborando a tese de que todas as estratégias devem incorporar processos multidisciplinares e interinstitucionais, cujos atores incluem as forças da lei, urbanistas e arquitetos, autoridades municipais, membros de conselhos locais e de comunidades, educadores e demais organismos e pessoas que trabalham no desenho de espaços públicos.

Kahn e Zanetic (2005) defendem um maior protagonismo do poder público municipal na temática da segurança pública. Critica a centralidade estadual, em razão da “erosão da atuação do governo, provocada pelas iniciativas comunitárias de autodefesa, pela expansão das atividades da indústria da segurança e pela crescente participação do governo Federal e dos municípios no tema da segurança pública”. Aponta como causas desta erosão da atuação do governo estadual sobre a segurança estão o aumento do crime, do sentimento de insegurança e o reconhecimento de que o poder público estadual não pode sozinho atender a todas às necessidades específicas de segurança demandadas pela sociedade. Pontua que, embora a Constituição Federal coloque os Estados como os principais responsáveis pela gestão da segurança, cabendo ao governo municipal diminuta parcela desta responsabilidade. O estudo mostra que os municípios têm em suas mãos instrumentos extremamente importantes para colaborar com a questão da segurança, como criação de novas guardas municipais, agora com funções que extrapolam na prática a proteção do patrimônio da cidade; elaboração de Planos Municipais de Direitos Humanos e Segurança Pública; criação, incentivo e divulgação de Disque-Denúncia; adoção leis para restringir o uso de bebidas alcoólicas. Diversas pesquisas de opinião pública revelariam que a criminalidade, ao lado do desemprego, são os maiores preocupações do eleitorado e os prefeitos não poderiam ficar alheios ao problema, daí as iniciativas citadas e muitas outras. Por fim, o artigo destaca que uma efetiva prevenção ao crime deveria ser baseada em projetos que têm as seguintes características: um diagnóstico preciso que determine os desafios, fatores de risco e recursos da comunidade; um plano de ação que estabeleça prioridades, identifique programas que podem ser modelos úteis e defina objetivos de curto e longo prazo; um processo de implementação rigoroso que inclua o treinamento e coordenação dos parceiros envolvidos; avaliações que forneçam retornos tanto sobre os processos quanto sobre os resultados obtidos; uma coalizão de atores-chave com lideranças fortes e staff de apoio administrativo; uma

estratégia de comunicações que pode mobilizar profissionais e cidadãos e é sensível à idade, gênero e diferenças culturais.

Marchiori (2011) mostra a experiência de Diadema/SP, que apresentava índices altíssimos de homicídios em 1999 - 389 homicídios para uma população estimada de 350.786 habitantes, uma taxa de 110,89/100.000 , mas que com esforços da população e poder público, sobretudo municipal, conseguiram reduzir esses índices. O estudo aponta como possíveis fatores para o êxito da redução das mortes violentas a democratização das relações entre Estado e sociedade civil, que produziu uma sensação de participação nos processos decisórios e a pulverização da responsabilidade do tratamento do crime trouxe o dever; elaboração de plano de segurança pelos próprios conselhos comunitários; elaboração da Lei de Fechamento de Bares – a maioria dos homicídios ocorria nestes locais, tarde da noite; elaboração de um Plano Integrado de Segurança Pública.

O Governo Federal, verificando a necessidade de uma maior atuação dos municípios na prevenção da violência, elaborou, através da Secretaria de Direitos Humanos do Ministério da Justiça e em parceria com o UNICEF, a ONG Observatório de Favelas e o Laboratório de Análise da Violência da UERJ o “Guia Municipal de Prevenção da Violência Letal contra Adolescentes e Jovens” (BRASIL, 2012). Este documento prevê sete etapas:

1) criação da “arquitetura institucional”, com um comitê gestor, responsável pela realização de todas as etapas do processo;

2) estratégias de sensibilização dos atores estratégicos;

3) capacitação e formação dos agentes responsáveis pela formulação e execução do plano;

4) elaboração de diagnóstico das mortes violentas de jovens e adolescentes, buscando os diversos fatores que interferem no fenômeno;

5) divulgação do diagnóstico entre os atores estratégicos e criação da Comissão de Prevenção da Violência Letal contra Jovens e Adolescentes, visando incluir a sociedade civil na discussão e elaboração dos estudos e plano;

6) instituição de mecanismos de consulta social de prioridades e políticas aplicáveis, como audiências públicas, reuniões nas comunidades com maiores índices de violência e pesquisas de opinião;

7) elaboração do plano municipal de prevenção de violência letal de jovens e adultos. O documento deixa claro a necessidade de união de esforços dos diversos entes, mas destaca a necessidade de articulação dos órgãos de defesa social e justiça criminal com o

município, bem assim o apoio da universidade e a necessidade de participação comunitária na elaboração de políticas públicas de prevenção de violência.

Santos (2010) analisou a implantação do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) em cinco municípios baianos e cinco pernambucanos, e constatou que as relações estabelecidas pelo Governo Federal com as municipalidades nacionais no âmbito da execução do SUSP não são homogêneas, pois a União pode atuar de forma passiva, apenas analisando as demandas dos governos locais e sugerindo adequações aos critérios do SUSP, ou de forma mais ativa promovendo espaços de discussão sobre as políticas de prevenção, disponibilizando técnicos para esclarecimento de dúvidas e orientações para a elaboração de projetos e/ou mesmo propondo intervenções locais. Os processos de implementação do SUSP em municípios da Bahia e de Pernambuco perpassam, essencialmente, pelo estabelecimento de uma relação intergovernamental (União-Municípios) verticalizada, na qual a interferência direta da União é tão relevante quanto a disponibilização de recursos financeiros e materiais. Prossegue o estudo, sinalizando que os convênios firmados para a implantação do SUSP nos municípios transcorrerem para um processo de modernização dos órgãos municipais existentes mais direcionados às questões infraestruturais e técnicas do que institucional e que a formulação e implementação de políticas preventivas demandam uma revisão dos legados e padrões de relações constituídos entre Prefeituras e Burocracias militares para o desempenho da segurança pública em nível local. Outrossim, uma maior complexidade das políticas locais e das relações intergovernamentais no nível horizontal parece interferir substancialmente para a existência de comportamentos e estágios diferenciados nos processos de implementação da política.