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O Período BNH: início, ápice e extinção (1964 – 1985)

Mapa 8 – Aracaju: Mapa Síntese das Políticas de HIS em Aracaju

1.2 O Período BNH: início, ápice e extinção (1964 – 1985)

FASE V – Período Militar (1964 – 1985)

Taschner (1997) evidencia que no início deste período, o Brasil vivenciava uma crise econômica, logo, inicialmente, os militares concentraram-se em conter a crise e a inflação, promovendo ações de características desenvolvimentistas: “contenção salarial, incentivo à economia urbana e industrial; associação de indústrias às empresas internacionais; estímulo á produção de bens e serviços destinados às camadas de alta renda”, o que incentivou a internacionalização da economia brasileira, a concentração de renda e a aceleração da urbanização.

Segundo Silva e Barbosa (2005), é findado o período de ações populistas por parte do Estado, que passou a ser autoritarista e conduzido pelos interesses dos setores econômicos dominantes. Essa fase é também caracterizada pelo controle que o Estado exercia sob as camadas populares.

Segundo Maricato (1998), inicia-se uma fase de forte intervenção estatal no tocante à habitação e ao espaço urbano, por meio da criação de órgãos e mecanismos voltados especificamente para a questão habitacional: o Sistema Financeiro da Habitação (SFH), e do seu agente central regulador, o Banco Nacional da Habitação (BNH).

Segundo Souza (2000) o BNH foi criado com a função de ser o órgão, em âmbito federal, que orienta, disciplina e controla os Sistemas Financeiros da Habitação e do Saneamento, objetivando a construção e aquisição da casa própria principalmente para a população de baixa renda, excluída dos trâmites do mercado.

De acordo com o caderno 4 da Política Nacional de Habitação, publicado pelo Ministério das Cidades em 2005, o modelo de política habitacional adotado neste período tem como principal feito a criação do BNH. Esta fase se tornou um marco nas políticas públicas do Brasil, uma vez que apresentou várias modificações na estrutura institucional e na concepção dominante de política habitacional - características que influenciam a produção habitacional até os dias de hoje.

A primeira importante característica foi a criação de um sistema financeiro de captação de recursos, – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), que juntos conseguiram carear um montante significativo para produção habitacional. A segunda foi a criação de um conjunto de programas que direcionavam as ações dos órgãos executivos. A terceira foi a criação de uma agenda a nível regional de redistribuição dos recursos, que funcionava de acordo com critérios definidos a nível nacional. E por ultimo a criação de agências a nível estadual, que, porém, agiam de acordo com as diretrizes e recursos estabelecidos pelo órgão central.

A produção da habitação para as classes mais abastadas era intermediada por bancos privados - estes negociavam diretamente com as incorporadoras. Já no caso das famílias de baixa renda existia a necessidade da intervenção do poder público, para que a aquisição deste bem fosse possível. Dessa forma, o sistema SFH/BNH funcionava através de órgãos públicos, no âmbito estadual, como as Companhias de Habitação (COHABs), que eram responsáveis desde a construção até a entrega da habitação às famílias selecionadas, com renda entre 01 e 05 salários mínimos. As famílias com renda um pouco maior (05 a 10 salários) eram atendidas por meio dos Institutos de Orientação às Cooperativas Habitacionais (INOCOOPs), que construíam casas e/ou apartamentos por meio de empreiteiras. (CAMPOS, 2006).

Anteriormente ao golpe militar, discutia-se um modelo de financiamento do desenvolvimento urbano, que tinha a intenção de produzir Planos Diretores com a função de ordenar o território. O “modelo proposto o BNH estaria vinculado ao Serviço Federal de Habitação e Urbanismo (SERFHAU), este encarregado de definir o marco regulatório e financiar a elaboração dos Planos Diretores municipais com recursos do próprio banco, através do Fundo de Financiamento ao Planejamento”. Esta primeira tentativa de descentralização política fazia parte das propostas expostas no Seminário Nacional de Habitação e Reforma Urbana, realizado em 1963, porém o cenário político foi modificado radicalmente em 1964, com o golpe militar. (ROLNIK e CYMBALISTA, 1999).

Os autores acrescentam que o modelo proposto de instauração de uma política de desenvolvimento local ia de encontro a todo o sistema de planejamento e execução

orçamentária montado no país, que visava a concentração de recursos nas mãos do governo federal. Dessa forma, em 1974, o SERFHAU é extinto, acabando junto com ele qualquer intenção de planejamento na área do desenvolvimento urbano. Este planejamento foi feito de forma setorial, por meio do Plano Nacional de Habitação Popular (PLANHAP) e Plano Nacional de Saneamento (PLANASA). Estes planos foram os principais interventores do sistema regido pelo BNH, porém eram compostos apenas de metas quantitativas na produção de habitação e saneamento.

A combinação perversa de uma gestão local frágil, de uma enorme concentração de recursos em um Banco cuja atuação foi estruturada por uma visão setorial e cuja implantação estava sob a responsabilidade dos agentes intermediários, transformou a elaboração de Planos de Desenvolvimento Urbano em meros documentos acessórios de justificação de investimentos setoriais, paralelos e externos à própria gestão local, definidos e negociados em esferas e circuitos que pouco ou nada tinham a ver com estas. (ROLNIK e CYMBALISTA, 1999, p. 5).

Assim como as ações paternalistas do período populista tinham seus interesses políticos e econômicos, existia também, um objetivo econômico por trás da criação do SFH/BNH, uma vez que a indústria da construção civil gerava inúmeros empregos, ou seja, a política de produção da habitação popular, da realização do “sonho da casa própria”, foi uma estratégia que visava oferecer emprego à população e conter os conflitos de classes e a concentração de renda. Além disso movimentava a economia gerando lucros ao setor construtivo e imobiliário. (TASCHNER, 1997)

Souza (2000) afirma que até o final dos anos 70, o sistema BNH/SFH deu ênfase à produção de novas unidades em conjuntos habitacionais de casas e apartamentos na periferia. Porém o aumento das ocupações irregulares e das favelas, levou a uma mudança de pensamento, assumindo esses espaços não mais como um problema a ser removido, mas como uma solução a grave crise habitacional que vinha sendo vivenciada. Dessa forma, a partir de 1980 os recursos do BNH/SFH foram incrementados, a fim de que fossem financiadas obras de melhorias em áreas anteriormente ocupadas informalmente. Ampliavam- se, assim, as redes de infraestrutura urbana básica nas grandes cidades: água; energia; sistema viário.

Os anos 70 também foram marcados pelo aumento das aglomerações urbanas, regiões metropolitanas que absorveram grande parte do contingente populacional migrante e que vivenciam até os dias de hoje as consequências desse crescimento acelerado, como por exemplo: o aumento da violência; a falta de moradia digna, entre outros serviços públicos, para todos, etc. (TASCHNER, 1997).

Veras e Bonduki (1986) dividem a história de 22 anos do BNH em diferentes fases. A primeira fase (1964 – 1967) diz respeito a sua implantação e estruturação. Na segunda fase (1967 – 1971), este se caracterizou como banco de primeira linha. Sendo assim, aumentaram suas funções e ele passou a ser responsável, também, por intervenções no desenvolvimento urbano e saneamento. Na terceira fase (1971 – 1979), o BNH foi reestruturado e voltou a ser um banco de segunda linha, que apenas repassava os recursos aos agentes. Na quarta fase (1979 – 1983) se iniciou uma tentativa de popularização desta política, utilizando-se de modelos mais flexíveis de financiamento. A quinta fase (1983 – 1986) se trata da descapitalização e por fim extinção do BNH.

Souza (2000) afirma que os altos subsídios impostos pela inflação e a inadimplência crescente - em 1974, nas COHABs, 67% dos mutuários estavam com as prestações atrasadas, em 1984 havia mais de 350 mil mutuários inadimplentes, 454 mil unidades disponíveis, sendo mais de 250 mil não comercializadas. (TASCHNER, 1997) - foram fatores que culminaram na descapitalização e consequente extinção do BNH. Além disso, o retraimento do sistema de financiamento público também contribuiu.

Extinto em agosto de 1986, as atribuições do BNH foram transferidas para a Caixa Econômica Federal, permanecendo a área de habitação, no entanto, vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente (MDU), cuja competência abrangia as políticas habitacionais, de saneamento básico, de desenvolvimento urbano e do meio ambiente, enquanto, a Caixa estava vinculada ao Ministério da Fazenda. (Ministério das Cidades, 2005).

Durante o seu tempo de funcionamento (1964 – 1986) a política administrada com recursos do BNH, financiou um grande número de unidades habitacionais: 4,5 milhões, que corresponde a 24% do aumento de moradias no Brasil, porém “o SFH não conseguiu resolver a crise habitacional brasileira.” (TASCHNER, 1997, p. 18). Desse total de novas unidades produzidas, apenas 33,5% foram destinadas para a população de baixa renda. Apenas 250 mil unidades foram produzidas em programas alternativos destinados a população com renda de 1 a 3 salários mínimos. Além disso, em nenhum momento essa política visou atender a parcela da população desprovida de renda mínima. (AZEVEDO, 1996).

Taschner (1997) afirma, ainda, que a necessidade de movimentação da economia, geração de emprego, etc., dependiam da produção de novas unidades habitacionais. Com isso conclui-se que foi gerado um número de novas unidades maior do que a demanda poderia pagar para adquiri-las.

Além disso, Souza (1996) discute a qualidade da habitação que estava sendo produzida, uma vez que eram produzidos conjuntos habitacionais financiados pelo BNH, sem

relação com o entorno, numa localização periférica, sem haver uma preocupação com a qualidade do projeto, ou até mesmo com o meio ambiente. Segundo a autora, isso se deu por conta da negação à participação comunitária durante o processo, sendo dada preferência ao modelo de gestão centralizada por empreiteiras, que entregavam as moradias prontas.

Esse modelo de política habitacional, baseado no financiamento ao produtor – e não ao usuário final – e no equilíbrio financeiro do sistema, excluiu parcelas consideráveis da demanda, que não dispunham de renda mínima (ou mesmo de comprovação de renda) para ter acesso ao programa. Por outro lado, deixou de atender – ou fez de modo extremamente limitado – os cidadãos ou associações organizados, que querem promover, eles mesmos, a custos mais baixos, produção de sua moradia, necessitando apenas de financiamento governamental. (SOUZA, 1996, p. 21).

Maricato (1998) afirma que um dos aspectos mais negativos da produção habitacional encabeçada pelo sistema SFH/BNH foi a falta de interligação com ações que visassem o desenvolvimento urbano. A maior parte dos conjuntos habitacionais construídos nesta época trouxeram mais problemas do que soluções para o desenvolvimento urbano local, uma vez que estes eram construídos em áreas distantes e desarticuladas das áreas já urbanizadas, impactando o ambiente natural e construído, além de exilar seus moradores.