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Como antes mencionado, O Programa Melhoria da Educação no Município (PMEM) surgiu como parceria entre o CENPEC, a UNDIME, o UNICEF e a Fundação Itaú Social, visando apoiar os Municípios na formação de equipes, para liderar o desenvolvimento de propostas educacionais adequadas às necessidades locais e centradas nos alunos. Isto quando, a partir do ano de 199834, a política nacional de educação passou a induzir à municipalização do ensino fundamental, fazendo surgir uma necessidade de apoio às equipes técnicas municipais. Diante desse quadro, as quatro instituições se uniram, sendo que a Fundação Itaú Social e o UNICEF contribuíram com o financiamento; a UNDIME, com a infra-estrutura logística e a mobilização dos municípios e o CENPEC responsabilizou-se pela realização, acompanhamento e avaliação do Programa nos municípios, cujo objetivo proclamado é o fortalecimento dos gestores municipais na formulação e na gestão de políticas públicas educacionais, de forma participativa, tendo por objetivo o ingresso, a permanência, o progresso e o sucesso na aprendizagem de todas as crianças e adolescentes de seus municípios.

Ainda conforme o proclamado, temos a afirmação que:

Em última instância, o Programa busca contribuir para a formação de gestores locais que articulem ações coletivas, “que façam com que as coisas aconteçam”, mobilizando os envolvidos com educação na consecução de metas compartilhadas e efetivando a formação de comunidades educativas comprometidas com a qualidade da educação nos municípios. Enfim, espera- se que novos padrões de comportamento político sejam estabelecidos, tendo por pilares a transparência, o controle social, a ética e a participação.

Tal como exemplificam esses contextos discursivos, o PMEM se caracteriza, em suas intenções proclamadas, pela enunciação de ações voltadas para a democratização da educação e da sociedade. De princípio, essas práticas poderiam ser tomadas como exemplificativas do papel do CEPEC como uma ONG que estaria se inserindo na prática de alargamento do espaço público, a partir dos seus vínculos com o poder municipal. Essa nossa

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percepção pode ser reforçada por contextos discursivos que justificam a metodologia de implementação do Programa:

Dentro de uma visão de educação para o desenvolvimento integral do ser humano, entende-se que as propostas educativas voltadas às crianças e adolescentes necessitam ligação com a comunidade, não podendo ser impostas de forma descontextualizada. Requerem, portanto, consenso e articulação entre Estado e sociedade civil na formulação de políticas públicas orientadas à proteção de crianças e adolescentes para que ingressem e permaneçam na escola com qualidade de aprendizagem, indicando um novo modo de fazer política pública em nosso país.

De modo mais específico, no site do CENPEC, o PMEM é descrito da seguinte maneira:

Trata-se de um programa de formação de educadores e lideranças ligadas à educação, que estimula a articulação dos diferentes setores da comunidade para o desenvolvimento de propostas educacionais, tendo como foco a educação de todas as crianças no município.

O caráter inovador do programa está em promover articulações entre as diferentes dimensões da questão educacional, no âmbito dos municípios e das instituições que atuam com crianças e adolescentes.

O programa cria espaços de discussão e reflexão que possibilitam aos participantes elaborar uma Avaliação Diagnóstica e um Plano de Ação para enfrentar os problemas apontados pelas comunidades locais. Esses instrumentos de avaliação e ação estão contidos no "Kit Melhoria da Educação no Município: Um Trabalho Coletivo".

Seu objetivo específico, também explicitado no site da Instituição (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária, 2004), consiste em contribuir com os agentes municipais governamentais e não-governamentais, ligados à educação, na construção de proposta educativa que favoreça o sucesso escolar dos alunos de escolas públicas municipais.

Nesse sentido, seu pressuposto, pela mesma fonte, considera que o município é o local privilegiado para a disseminação da cidadania, entendendo que nas cidades é possível viabilizar o encontro entre as pessoas (técnicos das secretarias de Educação, diretores e coordenadores pedagógicos de escolas) e as instituições (ONG, Conselhos Tutelares e dos

Direitos das Crianças e dos Adolescentes, sindicatos e universidades), em favor da consolidação do direito das crianças e dos jovens à educação de qualidade. Esse pressuposto é indicativo da defesa da importância dos espaços locais no processo de democratização substantiva da sociedade. Entretanto, como já comentamos anteriormente, a defesa da descentralização, da municipalização e do localismo constitui proposta de mais de um projeto de sociedade e, portanto, necessariamente o que se tem em vista pode não ser a busca de um projeto emancipatório.

Por outra parte, conforme enunciado, as ações que norteiam o Programa consistem em mobilizar, envolver e articular diferentes segmentos do processo educativo, conjugando esforços e estabelecendo parcerias, para fortalecer os municípios no enfrentamento dos complexos problemas dos sistemas públicos de ensino. Nele, os principais conteúdos trabalhados constituem a gestão democrática do ensino; a construção do projeto educativo do município, bem como a elaboração participativa de um plano de ação educativa, tudo isto com base nos três princípios básicos em que o mesmo se apoiava, quais sejam:

Contextualização

• garantia da multiplicidade de olhares sobre a realidade do município;

• consideração ao espaço, ao tempo e aos saberes das pessoas sobre a singularidade da vida social, econômica, cultural e educacional da cidade onde moram;

• investigação da situação de atendimento aos direitos das crianças e adolescentes do município.

Participação e Articulação

• estabelecimento de relações dialógicas que suscitem o debate e a reflexão entre os diferentes sujeitos e instituições responsáveis pela ação educativa do município; • constituição e consolidação de um grupo voltado ao reconhecimento e à defesa dos

direitos da criança e do adolescente tendo a educação como foco;

Aprendizagem contínua

• organização de condições que possibilitem o desenvolvimento de ações coletivas contínuas de análise e intervenção na educação das crianças e adolescentes do município;

• criação conjunta de estratégias de busca de alternativas para superar as necessidades identificadas;

• reconhecimento da formação dos gestores como processo de aprendizagem contínuo e coletivo;

• compreensão do planejamento como processo que busque, simultaneamente, a singularidade e a interface entre as políticas públicas.

De acordo com dados do Relatório de Avaliação do CENPEC, publicado em agosto de 2004 (atualizado em 2007), no que concerne ao quantitativo de municípios em que o PMEM foi implantado, pudemos observar um crescimento da ordem de mais de 300%, entre 1999 e 2004, enquanto o quantitativo de estados federados participantes cresceu cerca de 30,0%. São dados que sugerem uma aceitação significativa por parte dos municípios do Programa desenvolvido pela ONG em foco (quadro 1).

Quadro 1 - Quantidade de Municípios e Estados em que atua o Programa Melhoria da Educação no Município e Número de Educadores Envolvidos – Brasil, 1999, 2003 e 2004.

Ano N.º Municípios Estados Educadores envolvidos

1999* 210 13 676

2003* 886 17 2.876

2004** 1.037 17 3402***

Fontes: * Relatório de Avaliação – CENPEC, agosto/2004

** Os municípios em busca da melhoria na educação. São Paulo: CENPEC, 2005 *** Dado atualizado em 09.2.2007, cf.

http://www.CENPEC.org.br/modules/xt_conteudo/index.php?id=11.

3.2 Aspectos Metodológicos do Programa

A metodologia que vem sendo desenvolvida no Programa utiliza-se de encontros de formação, abrangendo 64 horas de atividades presenciais, com uso de materiais produzidos pelo CENPEC (Coleção Raízes & Asas, Educação & Participação, Guia de Ações Complementares à Escola etc.) e de assessoria à distância, com dez horas de formação por município, como apoio aos educadores no desenvolvimento de seus projetos.

No site do CENPEC35, vemos que, durante o Programa, são trabalhados os seguintes temas: diagnóstico e planejamento participativo; projeto educativo; gestão democrática; formação continuada de educadores; processos de ensino, aprendizagem e avaliação; gestão de dificuldades de aprendizagem; gestão de resultados educacionais e articulação da escola, família e comunidade.

O Programa Melhoria da Educação no Município pretende fortalecer os municípios na construção de uma proposta educativa, que favoreça sucesso aos alunos das escolas públicas. Para tanto, promove encontros de formação envolvendo diferentes segmentos do processo educativo: Técnicos das Secretarias Municipais de Educação, Diretores de Escola, Coordenadores Pedagógicos, Representantes de ONGs, dos Conselhos Tutelares, dos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente, e das Pastorais do Menor, dos Sindicatos, das Universidades (CENPEC, 2004).

Consta ainda que esse espaço, que se propõe de discussão, de reflexão e de fundamentação teórica, pretende instrumentalizar educadores, gestores e comunidade educacional mais ampla, de forma a que se desdobrem ações que avancem na direção da melhoria da educação, ao

elaborar, de forma participativa, uma avaliação diagnóstica da realidade e um plano de ação educativa visando a equacionar os problemas priorizados em cada uma das localidades (CENPEC, 2003).

Foi a partir dessa concepção do Programa que voltamos nossos esforços para apreender os significados presentes na ação proposta pela Coleção para Gestores, lançada em 2003. Segundo esse material,

as avaliações indicam que os participantes aprovam a metodologia utilizada, valorizam a troca de experiências e as ações conjuntas que ela propicia e, o que é mais importante, estão colocando em prática as idéias sugeridas pelo Programa (CENPEC, 2003, p. 13).

Dentre essas idéias, pudemos identificar, na documentação, o diagnóstico da realidade como necessidade básica de balizar a programação de ações; maior precisão na escolha dos problemas mais prementes; o trabalho coletivo que vem se desenvolvendo nas

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equipes das secretarias e escolas; alianças e cooperações entre o setor público e outras instituições que trabalham com crianças e adolescentes; grande envolvimento das famílias nos projetos e maior compreensão da complexidade de fatores envolvidos no fracasso dos alunos (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária, 2003, n. 1, p. 15).

No esforço de consolidar a metodologia que adota, o CENPEC detalha o processo de pesquisa-ação que abraça:

Neste fascículo, você iniciará, com o diagnóstico, o instigante percurso rumo à elaboração coletiva do Plano de Ação Educativa da cidade (veja fascículo 3), por meio do qual problemas considerados graves poderão ser superados ou amenizados em um ano graças ao trabalho coletivo de escolas, ONGs, secretarias e outros parceiros. Os avanços alcançados estimularão as pessoas a continuarem o processo de melhoria que não tem fim, identificando e solucionando novos problemas e, ao mesmo tempo, construindo a educação como direito social de cidadania para todos (CENPEC, 2003, p. 5).

Por pesquisa-ação, define-se, nessa publicação, um “sistema de discussão, investigação e análise”, no qual os pesquisadores tomam parte do processo, as teorias não existem aprioristicamente, mas a partir do contato com o real e este se descreve por meio do processo em que “uma comunidade” desenvolve suas teorias e soluções sobre si mesma (CENPEC, 2003, n. 2, p. 13).

No n.1 da Coleção, o “caminho” “indicado” é referido como o resultado de um aperfeiçoamento do trabalho desenvolvido pelo CENPEC, entre 1999 e 2003, “sistematizando concepções, processos e estratégias”,

no qual educadores de setores governamentais e de instituições da sociedade civil recebem subsídios para que desenvolvam projetos educacionais no município (...), favorecendo a inclusão educacional de todas as crianças e jovens e o desenvolvimento, nos participantes, de uma atitude investigativa contínua voltada para a ação transformadora (CENPEC, 2003, p. 10).

Já referimos que o Programa utilizou estratégias diversificadas, para desenvolver seus propósitos, como formação presencial e apoio à distância, mas nossa preocupação centrou-se mais no acompanhamento das condições de produção desse processo. Desse modo, buscamos elementos explicativos que proporcionassem elucidar o fio condutor teórico que embasava a fundamentação, no material utilizado pelo CENPEC, para os trabalhos com as

equipes locais. Isso foi realizado por meio da análise temática e do chamamento dos autores ali utilizados, relacionados ao tema do nosso trabalho. Para tanto, voltaremos a essa questão no âmbito das análises.

O material básico do Programa consiste na Coleção Melhoria da Educação no Município: um trabalho coletivo, destinado a gestores educacionais, “que contempla um ideário compartilhado pelos parceiros, Fundação Itaú Social, UNICEF, UNDIME e CENPEC, e respaldado pela literatura educacional” (CENPEC, 2003, n. 1, p. 5) O material é composto por quatro fascículos, quais sejam:

a) As cidades e o programa Melhoria da Educação no Município (n.1), que se propõe a ser:

um convite para a reflexão sobre a potencialidade educadora da cidade e para a difusão da idéia de que ser cidadão é ‘ter direto a direitos’. [...] Neste fascículo será possível, também, você entrar em contato com um glossário que contém o significado dos principais conceitos que iluminam a nossa prática (CENPEC, 2003, p. 19).

Como vemos, há nesse fascículo uma tentativa de síntese da fundamentação que orienta o programa. Daí, nossa intenção de centrar esforços no sentido de utilizá-lo para análise de discurso, como recorte da prática discursiva do CENPEC.

b) Diagnóstico educacional: uma direção para a ação educativa (n.2), que convida o gestor a construir coletivamente com alunos, pais, professores, funcionários, educadores sociais, representantes locais e quem mais quiser participar as ‘intenções educativas’ ou ‘como desejariam que fosse’ a educação na cidade. [e] [...] elaborar um diagnóstico educacional da cidade, buscando identificar os obstáculos e suas causas à realização das intenções educativas... (CENPEC, 2003, p. 19)

c) Plano de Ação Educativa articula esforços e concretiza propostas (n. 3): trata da elaboração e implementação de um plano de ação educativa, com base no diagnóstico da educação da cidade, expressa pelos diversos atores e gestores do município. (...) desdobra-se em projetos específicos, desenvolvidos no âmbito de cada secretaria, escola, ONG ou entidade envolvida. (CENPEC, 2003, p. 20)

(...) é a conclusão, mas não o fim, uma vez que o tema nele tratado, a avaliação, não tem um fim em si mesmo: com os ajustes dos prazos, dos objetivos e dos resultados esperados durante o processo, todo esse trabalho é um novo ponto de partida para intervenções educacionais na cidade... (CENPEC, 2003, p. 20)

• Um encarte, intitulado Diagnóstico e Plano de Ação Educativa: uma proposta de trabalho coletivo.

uma proposta de instrumento de diagnóstico para um plano de ação educativa, que constitui uma sugestão de trabalho aos gestores. (p. 21). • E um vídeo de experiências, realizadas com base nos princípios e idéias do

Programa.

vídeo que completa a coleção e conta em imagens quatro experiências realizadas em municípios brasileiros participantes do Programa (p. 21). É sobre parte substancial dessa produção básica, utilizada pelo PMEM, que focamos nossa análise, bem como de material colhido nas entrevistas e nos encontros promovidos pelo Programa na Paraíba. Igualmente recorremos a Planos e Diagnósticos construídos em alguns dos municípios participantes, para análise e sistematização. E, de forma complementar, trabalhamos a metáfora Desafio, uma cidade imaginária que porta elementos significativos das orientações político-ideológicas norteadoras das ações que, por sua vez, serve de parâmetro relacional para a experiência real vivenciada dentro do Programa pela cidade de Esperança, pertencente ao estado da Paraíba.