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3. Diagnóstico ao inventário e à documentação de coleções arqueológicas do Museu

3.3. Análise de dois trabalhos de inventário

3.3.1. O sítio arqueológico da Fraga (Marco de Canaveses)

O sítio arqueológico da Fraga (código de sítio 374), deve a sua exploração ao primeiro diretor do atual MNA, situando-se a data de exploração nos primeiros 10 anos de existência do museu, momento em que este procurava cimentar a sua posição e constituir as suas coleções, sendo que para tal “Leite de Vasconcellos reuniu as poucas colecções públicas existentes e promoveu a aquisição de algumas privadas, mas sobretudo, empreendeu um extenso programa de recolha de materiais por escavação” (Fabião, Dias e Cunha, 2008, p. 11), onde este caso se insere.

Explorado em 1902 e 1903, em duas campanhas sucessivas, sob a direção de Júlio César Garcia e José de Almeida Carvalhais, e posteriormente por Bernardo de Sá e, novamente, José de Almeida Carvalhais, este sítio revelou “30 sepulturas de características análogas, 23 em 1902 e 7 em 1903” (Fabião, Dias e Cunha, 2008, p. 13). Apesar de muito bem documentada – não só em termos de paisagem, circunstância da escavação, encontrando-se ainda disponíveis relatórios da escavação, bem como outros apontamentos e registos, inclusive fotográficos –, alguma desta informação suscitou dúvidas por esta necrópole ter sido explorada ao mesmo tempo que uma outra, a necrópole da Tapada de Eiroses, cuja localização se encontra bastante próxima e que foi também depositada, pela mesma altura, no MNA. Devido à proximidade, JLV parece ter as duas como “as necrópoles da Feira Nova” (Dias, 2006, p. 27), levantando o problema da correta “identificação e relocalização desta necrópole, bem como à percepção do conjunto de materiais em depósito no M.N.A.” (Dias, 2006, p. 29) e atribuição correta de proveniência a este espólio.

Para a reconstituição do conjunto funerário, a autora contou com material de apoio solicitado ao SIC e ao SD, nomeadamente ao AHMNA onde se verificou “existir importante conjunto documental relativo à necrópole da Fraga no Legado de José Leite de Vasconcelos” (Dias, 2006, p. 30) constituído por:

• Dois relatórios de escavação das “duas únicas campanhas referenciadas e levadas a cabo pelo pessoal do Museu” (Dias, 2006, p. 30);

• Apontamentos dispersos “certamente escritos e coligidos por J.L.V.” (Dias, 2006, p. 30);

• Quatro fotografias de sepulturas.

Porém, verificou-se algum desfasamento entre o enunciado nos relatórios e o registado nos verbetes de inventário, pelo que

a maioria dos objectos dos contextos funerários referidos nos relatórios de campanha não têm associação directa nem correspondência com as peças em depósito. Sob o ponto de vista quantitativo, percebemos que o acervo em depósito é mais reduzido do que aquele enumerado no acervo documental (Dias, 2006, p. 54).

Assim, foram contabilizadas 93 peças nos relatórios e 91 em depósito no MNA, das quais 68 em contexto funerário conhecido e 23 com proveniência desconhecida. O conjunto é constituído por 88 peças de cerâmica, 3 objetos metálicos, para além de “amostras de terra, restos osteológicos e carvões da sepultura 6 (?)” (Dias, 2006, p. 55), fragmentos de granito (esteios) e outro conjunto residual de ossos queimados sem sepultura, todos estes sem número de inventário.

A autora menciona ainda que as peças se encontravam marcadas, “enquadrando-se aproximadamente na série entre 16 400 e 16 500” (Dias, 2006, p. 55), excetuando “5 peças marcadas com numeração muito anterior (série 2 500 / 2 600)” (Dias, 2006, p. 55), cujos verbetes a autora da tese não encontrou mas que se verificou posteriormente corresponder a um levantamento sepulcral integral, com o verbete de inventário número 18 760, tal como consta do processo de sítio.

Após a apresentação deste trabalho académico, procedeu-se à revisão sistemática desta estação arqueológica pelo SIC. Este trabalho foi tido em conta, no que diz respeito à reconstituição do espólio, mas percebeu-se que algumas das peças inicialmente atribuídas eram, afinal, pertencentes a outras proveniências – caso das peças 16 585 e 16 586 que se entendeu pertencerem à sepultura 4 do sítio da Tapada das Eiroses (código de sítio 368) –, bem como o contrário, como a peça com o número 16 487 (Anexo 8, Figura 8-2. e Figura 8-3., e Anexo 9). Depreende-se então que o inventário nem sempre é um processo fechado. Estas incongruências podem ter surgido pelo facto de a autora ter privilegiado “a informação da ficha de inventário” (Dias, 2006, p. 55), quando estes verbetes foram elaborados entre 1918 e 1923, portanto quase 20 anos após as escavações e a entrada das peças na instituição.

Na constituição do processo (Anexo 8, Figura 8-1.), fez-se uso dos materiais recolhidos pela autora da tese, incluindo a transcrição que fez dos relatórios de escavação. Percebe-se que a tese foi também utilizada para a elaboração da descrição152

e designação dos objetos cerâmicos aquando do inventário em Matriz, ainda que nem sempre se verifique uma cópia exata e nem se utilizem os mesmos termos para a designação dos objetos, verificando-se que o SIC preferiu designar, por exemplo, como ‘púcaros’ ou ‘vasos’ diversos ‘potinhos’, e diversas ‘bilhas’ como ‘jarros’ ou vice-versa.

No referente às fichas de complexo, verifica-se o cuidado de separar as atribuições a complexos seguros, de atribuições a complexos que ainda suscitam alguma dúvida, de onde se destacam os objetos 16 486 (Anexo 9) e 16 512, talvez provenientes da sepultura 2, e o conjunto de peças atribuído pela autora à sepultura 6 (Anexo 8, Figura 8-4.).

Neste último caso, verificou-se que o inventário das peças em verbetes, com os números 16 488, 16 536 (Anexo 9) e 16 549 (Anexo 8, Figura 8-5.), continham na indicação de proveniência a sepultura 6 da Fraga, Marco de Canaveses (ou “mesma proveniência” quando as peças foram inventariadas sequencialmente com outras desta proveniência). No entanto, tendo-se verificado a existência de um levantamento integral, identificado com o já mencionado número 18 760 nos verbetes de inventário (Anexo 8, Figura 8-7.), que continha em si mesmo indicações que foram coligidas, no processo de desmontagem dos anos de 1980, em fichas de contentor e que nos informam de que corresponde à sepultura 6 deste sítio arqueológico, preferiu-se manter este contexto/complexo separado do restante (Anexo 8, Figura 8-6.). A estas peças, as referidas como estando marcadas com uma numeração mais baixa que a dos verbetes e para as quais não se encontrou ficha ou verbete de inventário153 nem número de

entrada, o SIC atribuiu um novo número de complexo, 2006.379 (Anexo 8, Figura 8-8. e Anexo 9).

Há, portanto, um esforço na revisão, mesmo quando o espólio já foi estudado e inventariado de forma, digamos, mais sustentada e apoiada em documentação, de

152 Quando retirada ipsis verbis é citada, no final da descrição, a obra e página entre parêntesis retos,

remetendo para a bibliografia disponível na mesma ficha.

153 Verifica-se a existência de verbetes com estes números, mas cuja descrição não corresponde a este

confirmação das proveniências, voltando-se ao mesmo sempre que se encontrem novos elementos, decorrentes do estudo e inventário de outros sítios arqueológicos.