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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-EMPÍRICA

2.2 O surgimento da responsabilidade social corporativa

Em toda sua história o homem efetuou suas escolhas, baseando-se na reflexão ética, na busca das virtudes. Durante a idade média a ética praticada era

pela busca da glória, honra e louvor; dinheiro e poder eram relegados, considerados indignos da natureza humana.

Hirschman (1979) descreve as linhas básicas de conduta ou pensamento, onde o homem deveria repudiar três paixões: ânsia por dinheiro e bens materiais, o poder e o desejo sexual. Já na Renascença, Spinoza argumenta que o homem deveria ser percebido como ele realmente é, um ser que não consegue controlar suas paixões. A partir de então, passou-se a buscar não mais reprimir as paixões humanas, mas sim, justificá-las. Esta nova ordem de pensamento buscou guarida no fato de que, no uso de suas paixões o homem busca o bem comum.

Da ferocidade, da avareza e da ambição - os três vícios que levaram toda a humanidade à sua perdição (a sociedade) - fa z a defesa nacional, o comércio e a política, e, assim, ela produz a força, a riqueza e a sabedoria das repúblicas; desses três vícios que seguram ente acabariam por destruir o homem na terra, a sociedade faz desse modo surgir a felicidade civil. (...) por obra de suas leis inteligentes, as paixões dos homens inteiramente ocupados na busca de sua vantagem privada são transformadas em uma ordem civil que permite aos homens viver em sociedade humana. (VICO , 1725 apud H IR SC H M A NN , 1979, p.25)

Adam Smith baseia sua obra, A Riqueza das Nações, na afirmação acima, na certeza de que são as paixões que contribuem para o desenvolvimento da humanidade. Lux (1993, p.81) menciona a frase em que Adam Smith admite que é o interesse próprio que favorece e beneficia o homem, “não é da benevolência do açougueiro, do cervejeiro ou do padeiro que devemos esperar nosso jantar, mas de sua atenção para com seus próprios interesses”.

O entendimento de que é o interesse próprio (as paixões) e não a dádiva, glória, a benevolência, a virtude aristotélica que contribui com o desenvolvimento do homem, sustenta a economia de mercado, que é para muitos economistas por definição, o aproveitamento, a utilidade social do interesse próprio. Ao que parece a economia de mercado, deveria ser a solução para controlar as paixões humanas e ainda, fazer com que estas trabalhem pelo social, buscando a melhoria da condição humana.

Porém, o mercado, inicialmente concebido como grande fonte de melhoria da condição humana, provou não ser o que se idealizou. Seu grande objetivo passou a ser o lucro, advindo da produção de mercado. A condição humana passou a ser colocada em segundo plano. O Estado passa então, a ser a grande fonte provedora do bem estar social. O Estado do bem-estar social com seus serviços de baixa qualidade, aliados a falta de recursos financeiros, passa também a não mais atender as demandas sociais.

A crise de confiança na capacidade do Estado fez com que alternativas fossem criadas para então, atender a população excluída, cada vez mais numerosa. O surgimento do Terceiro Setor acontece quando o Primeiro e o Segundo Setor não correspondem às necessidades humanas.

A definição de Terceiro Setor surgiu na primeira metade do século XX, nos Estados Unidos. Este Setor seria uma mistura com os tradicionais, Primeiro Setor - o Estado e o Segundo Setor - as empresas. Melo Neto e Froes (1999) consideram que, espontaneamente, os movimentos sociais, as Organizações não Governamentais (ONG’s), as igrejas e os cidadãos criaram uma nova ordem social. Esta nova ordem social promoveu mudanças no relacionamento entre o Estado, as empresas e a sociedade civil. O Quadro 1, explicita as características do Terceiro Setor.

Elementos Indicadores Descrição

Foco Bem-estar público. Interesse Comum. ; Questões cruciais Pobreza, desigualdade e exclusão

social.

Entidades participantes ONG’s, Estado, sociedade civil e empresas privadas.

Nível de atuação Comunitário e de base.

! Tipos de ações Ações de caráter público e privado, associativas e voluntaristas.

Quadro 1 - Características do terceiro setor Fonte: Melo Neto e Froes (1999, p.8)

O Terceiro Setor ganha força a partir da década de 60 em quase todo o mundo. Salamon (1998) comenta o florescimento do Terceiro Setor nos países

sem fins lucrativos, foram criadas após 1960. Na França, na década de 60 surgiam 11 mil por ano. Nos países em desenvolvimento a atividade social é ainda mais marcante, a índia possui mais de 10 mil ONG’s, nas Filipinas elas perfazem 21 mil organizações.

Segundo Fernandes (1994) o surgimento das ONG’s na América Latina e também no Brasil foi marcante a partir da década de 60. As ONG’s foram criadas como resposta à repressão dos regimes políticos implantados - eram uma forma que a sociedade civil encontrou para protestar.

Não era intenção inicial de que as ONG’s, criadas para afrontar os regimes militares se perpetuassem, imaginava-se que filantropia, auxílio social, deveriam ser a incumbência do Estado. No entanto, à medida que os governos militares cederam à democracia, as ONG’s permaneceram.

A permanência da ONG’s aconteceu pela descoberta de que o Estado não poderia suprir as necessidades sociais. As ONG’s poderiam contribuir neste sentido, uma vez que estas não estão diretamente ligadas a questões políticas, principalmente questões político-partidárias.

O governo brasileiro está engajado em causas sociais, mesmo com suas limitações, exemplo disto é o Programa Comunidade Solidária. O Programa Comunidade Solidária busca prestar auxílio social, enfrentando algumas críticas. Para Leite (1998), o Estado no Brasil está com descrédito social, e este além de não contribuir com os objetivos do Terceiro Setor, ainda vai tumultuá-lo, pois as decisões tomadas pelo Comunidade Solidária, são por vezes, somente com viés político.

A sociedade civil também é atuante nas ações sociais. No Brasil, a prática filantrópica de doações é pouco comum, no entanto, segundo Melo Neto e Froes (1999) nos Estados Unidos, cerca de 50% dos recursos das entidades sociais é proveniente de doações de pessoas físicas. Porém, nos Estados Unidos a prática da filantropia vem perdendo força, 8 em cada 10 americanos que ganham mais de US$

1 milhão por ano não legam nada para a caridade em seus testamentos”. (Gazeta Mercantil, 1998).

Por sua vez, a atuação das empresas, organizações com fins lucrativos, em causas sociais é crescente, acreditando-se ser relevante e importante para aumentar

a justiça social. Com maior justiça social, não somente a comunidade ganhará, mas também a própria empresa. Essa consciência ou expectativa vem estimulando empresários de todos os setores a se comprometerem com as ações sociais.

Cardoso (2000) argumenta que a tradicional divisão entre púbico e privado foi rompida, crescendo a mobilização de recursos privados para fins lucrativos. Dessa ruptura surgiu um setor diferenciado do primeiro e do segundo, uma esfera inédita, o terceiro setor, onde os cidadãos e as empresas buscam atender os interesses sociais coletivos.

Martinelli (2000) procura distinguir a empresa como agente do segundo setor e do terceiro setor. Como integrante do segundo setor a empresa se utiliza de marketing, publicidade, propaganda para alcançar seus objetivos comerciais e econômicos. Já a atuação no terceiro setor está relacionada ao serviço pelo bem- comum.

A participação das empresas em prol de causas sociais tem recebido diversas nomenclaturas: responsabilidade social corporativa, responsabilidade social, ética empresarial, cidadania empresarial, empresa solidária, reponsividade social corporativa, rectitude social corporativa, performance social corporativa, performance social dos stakeholders, auditoria social, inovação social, filantropia empresarial, dentre outras. Acredita-se que todos os nomes concedidos à participação das empresas referem-se a uma única finalidade, o atendimento a causas sociais.

Neste estudo serão explorados os três conceitos mais comumente utilizados: responsabilidade social corporativa, cidadania empresarial e ética empresarial. A opção pro falar destes três termos, deve-se a dois fatores: por serem mais ' comumente utilizados e por serem considerados, às vezes, por alguns acadêmicos e empresários, sinônimos. É importante esclarecer que será adotado o termo responsabilidade social corporativa, como modo de diferenciar a responsabilidade social das empresas - corporativa, da responsabilidade social de outras instituições sociais.