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O TRABALHO DA PROSTITUIÇÃO E OS SEUS VIESES

No documento PR BRIENA PADILHA ANDRADE (páginas 93-98)

Não era feliz o tempo todo, mas isso ninguém é em nenhuma profissão. (GABRIELA LEITE).

A prostituição, assim como qualquer ocupação, apresenta distintos vieses perpassando os positivos e negativos. Esses podem ser constatados nos discursos das profissionais do sexo em que algumas dão maior ênfase ao lado negativo e outras ressaltam que, apesar de todo o estigma, conseguem ver a prostituição sob uma ótica mais positiva.

A vantagem desse trabalho é que tu tem dinheiro, tu ganha, e nunca vai ficar sem dinheiro, além disso, nada é bom. (MONALISA).

O bom de trabalhar aqui, não tem. Não gosto de trabalhar, não gosto, eu gosto das minhas migas, de conversar com as meninas, digamos, que estamos todas conversando, bebendo é legal (SABRINA).

Na fala das participantes fica em evidência a visão negativa sobre a prostituição, poderia dizer que não seria sobre a prostituição, mas como a atividade se dá. Ambas, mesmo que de forma acentuada, destacaram positividades na profissão, seja pelo lazer e diversão, como é o caso da primeira, seja pelo dinheiro, esse último podendo ser o fator mantedor e de destaque quando o assunto são os benefícios ou os pontos positivos de se exercer a prostituição.

O lado bom de trabalhar aqui é porque ganho bem, a única coisa boa que eu levo é o dinheiro. Já ruim tem muitos, a bebida faz mal, somos conscientes disso, envelhecemos mais cedo, são muitas coisas ruim,

mínimas, mas são, pois mais tarde trarão problemas. Enquanto estou nova, tudo bem é só envelhecer que os problemas vão chegando, a única coisa boa mesmo, que levo daqui, é o dinheiro. Eu acostumei a viver bem, então eu sei que se eu não trabalhar, são muitos gastos da minha casa que terei que cortar, então prefiro vir trabalhar e não diminuir meus gastos, não cortar o que acostumei os meus filhos (LOLA).

Eu acho que o único ponto de eu trabalhar na prostituição é o fato de poder dar uma vida melhor para meus filhos, como eu falei, se eu estivesse trabalhando, como não tenho estudos, se eu estivesse trabalhando de doméstica, haveria muitas coisas que eu ia ter que privar os meus filhos, pois com o salário de doméstica eu não ia conseguir dar para eles, então eu acho que o único ponto bom é esse (HILDA).

No discurso das profissionais, o prazer de ser profissional do sexo está atrelado totalmente ao dinheiro e à vida confortável que esse poderá oferecer para ela e seus familiares; a chance de ascensão ou de conquista de bens capitalistas para manter um posicionamento vantajoso, no que se refere aos bens materiais, faz com que, mesmo não gostando do trabalho, da atividade, ela tenha uma ligação positiva com a profissão em si, pois é através dela que seus rendimentos são possíveis; uma mescla de prazer e sofrimento luta e conquista. Barreto (2008) constatou que, em várias atividades laborais, a ocupação se coloca como condicionante de prazer e, ao mesmo tempo, de sofrimento, angústia e opressão.

Russo (2007) expõe em seu estudo que, de todos os aspectos positivos existentes na atividade prostituinte, o dinheiro se destaca; é pelo simbolismo nele presente que as mulheres adentram e permanecem na prostituição, um simbolismo ligado ao que a sua materialidade propicia, sendo percebido como o agente facilitador que torna possível as relações da vida e da subsistência. O autor cita, também, que o dinheiro pode apresentar distintas acepções para as pessoas, podendo estar ligado à conquista da independência, sobrevivência, ostentações, comodidade, dignidade, entre outros. Ressalta, em todos esses, o poder que esse componente monetário pode acarretar principalmente no que tange à autonomia de quem o detém para realizar ou adquirir algo por meio dele. Sendo que, segundo Russo, na prostituição o dinheiro é visto como uma espécie de compensação. Compensação essa, por vivenciar todas as atividades e situações não desejosas, sejam elas dentro do trabalho, ou na vida cotidiana.

O bom de trabalhar aqui, em meu ponto de vista, é a experiência, uma coisa a mais que vou aprender. Outro ponto bom é que somos uma família, tem a questão do dinheiro também (CAMÉLIA).

sexo, mesmo que mencionado por último em sua lista, esse não deixou de soar como um fator benéfico proporcionado pela prostituição. Junto a ele, ela elencou dois pontos positivos, um que é a experiência, ou seja, a prostituição lhe possibilitou adquirir uma nova habilidade, ressaltando, o que já foi anteriormente colocado no capítulo que, para exercer tal trabalho, faz-se necessária certa preparação.

A questão de companheirismo e fraternidade, sentida na relação com as outras habitantes da casa, também foi proferida no discurso das profissionais, essa que poderia ser um conforto, um auxílio e uma referência dentro desse universo. Ainda mais no caso de Camélia, que veio de uma realidade familiar não tão próxima, essa vivência comunitária, fraternal com outras pessoas, propiciada pela dinâmica da prostituição é, para ela, um enlevo em sua vida.

Aqui sempre tem aqueles fedorentos, chatos, mas o bom de tudo, é que sempre tem o cara legal para conversar, fazer festa, brincar, sempre tem uma amizade verdadeira, sempre tem uma picuinha, uma fofoca, acho que isso é o gostoso do trabalho. Eu gosto, porque gosto me sinto bem. Eu sou bagunceira nata, prefiro viver tudo hoje ao invés de esperar amanhã e acabar não vivendo. Eu vivo tudo. Acho que tudo é em torno do dinheiro, o que fazemos a vida mais ou menos boa, do que posso comprar adquirir. (CAPITU).

Gaspar (1985) alega que o espaço da casa noturna, devido a toda a sua dinâmica, caracteriza-se como um ambiente de socialização e diversão. Sendo assim, a atividade prostituinte está intrinsicamente ligada ao lazer, à diversão, à dança, à música, à liberdade e, em muitos casos, é essa demanda que o cliente vem buscar, cabendo à profissional do sexo, adentrar todo esse universo. O que para as profissionais do sexo pode ser prazeroso, pois, apesar de estarem trabalhando e enfrentarem algumas adversidades em seu labor, é o fato de poderem aproveitar a ocasião e divertir-se com o que lhes é proporcionado, até mesmo encontrando o prazer nessas pequenas coisas. Barreto (2008), em sua pesquisa verificou que o prazer em exercer a prostituição está atrelado ao prazer sexual, conversas com os clientes e pelas experiências de vida que a atividade traz.

No trecho acima, retirado da narração de Capitu, ela demonstra que o viés positivo de seu trabalho atrela-se, à diversão, à distração e às conversas. A todo o momento em seu discurso ela volta para isso, demonstrando que consegue sentir contentamento em seu trabalho. E, assim como as outras, refere-se ao fator dinheiro como motivador e mantedor, ressaltando o simbolismo em torno do

dinheiro, que é o que ele pode propiciar, como bens materiais, status, dentre outros. Como em qualquer trabalho, pois trabalha- se, dedica-se, esperando o dinheiro o que soa mal aos ouvidos de grande parte dos indivíduos é que esse dinheiro advém de atividades ligadas a sexo.

O lado negativo da prostituição sobressaiu-se, no conjunto de discurso das entrevistas, em relação os benefícios por essa trazidos.

O ruim é o preconceito que as pessoas têm, nem todas, mas sempre tem, eu acho que cada um é um. Sempre saio, vou a mercado, normal (CAMÉLIA).

A discriminação aparece como um viés negativo da prostituição, arriscando- me a dizer que esse seria o início de todas as outras adversidades encontradas nessa profissão. Desde a falta de respeito, até as privações sofridas pelo exercício da prostituição, como saúde, socialização, educação; em todos esses campos o preconceito se faz bastante presente e prejudica, de forma nada singela, as profissionais do sexo.

Ao refletir sobre o que é ou não é o ser feminino, reflete-se sobre determinadas atitudes, comportamentos e performances adotas. O ser feminino tem um estereótipo e é caracterizado por uma série de atributos ligados à forma de agir e se portar. No que cerne à mulher, em cada sociedade e tempo, existe algumas imposições que ela deve seguir para ser socialmente afirmada como pessoa de valor (RUSSO, 2007). A autora assegura que, conforme o meio sociocultural que a mulher habita, ela deve desempenhar determinados papéis e ações que a faz ser ou não reconhecida e respeita enquanto mulher, enquanto um ser social.

Munhoz (2009) explica que ao adentrarem o universo da prostituição, as profissionais do sexo identificam a exclusão social que viviam, experiências essa que é expressa sob a forma de preconceito e discriminação. Porém, elas são complacentes com isso devido aos benefícios que o dinheiro ganho com essa atividade podem lhes fornecer.

É ruim também pegar um homem nojento, tão nojento que nem gosta do meu perfume, do meu cabelo, e vem com ignorância, geralmente são os mais riquinhos. Chegar um homem fedido, com cheiro de bunda, axila, mau hálito, é horrível, terrível mesmo (SABRINA).

E, de ruim é muitas vezes você ter que encarar uma pessoa a qual nunca viu na vida, e ficar com ela aqueles minutos que mais parecem uma eternidade (HILDA).

O relacionamento sexual com desconhecidos é algo muito comum na prostituição, porém, esse fator é visto como incômodo para a maioria das profissionais do sexo, pois nem sempre o prazer é sentindo nesse tipo de relação. A negatividade agrava-se quando o cliente não tem uma aparência que agrada a mulher, ou apresenta condições de higiene precárias, está alcoolizado, entre outros. Barreto (2008) encontrou no relato das profissionais do sexo que entrevistou, queixas a respeito de terem que manter relações sexuais com clientes que não gostam, ou estão sob o efeito de álcool e drogas. As profissionais acabam vendo isso como um fato bastante negativo, ocasionando repúdio e nojo a esses tipos de relação, mesmo que algumas delas tenham o poder de escolha, o fator lucro, às vezes, as condiciona a conviver com essas situações, assim como outras negativas citadas.

De ruim é não poder sair na hora que quero, ter que esperar fechar, acho que é só de ruim, ficar olhando bebida e não poder beber, não tem muita coisa de ruim (CAPITU).

Tu tem que estar mentindo para a família, namorado, a todo o tempo, é complicado ficar longe da família e dos meus filhos (MONALISA).

Outro fato elencado pelas profissionais do sexo como ponto negativo em sua profissão é a questão de uma rotina de trabalho que as aprisiona por muito tempo e, também, pode fazer com que fiquem mais tempo longe de sua família e amigos. O horário de funcionamento das casas noturnas visitadas era muito estafante e as mulheres ficavam a maior parte dos dias em função do trabalho, o que pode prejudicar a relações de socialização fora da casa. O fato de a casa noturna ser um ambiente proibido para menores de idade faz com que as mulheres mães não possam receber a visita de seus filhos; essa distância se torna mais pesada quando elas têm que trabalhar fora de suas cidades ou de forma escondida. Geralmente, esses ficam sob a tutela de um familiar próximo ou de uma babá.

Os vieses positivos e negativos da prostituição se manifestam com maior e menor intensidade, de acordo com a forma como a mulher experiência essa profissão, ou seja, pela forma como a sociedade a visualiza e respeita as condições de trabalho, o seu poder dentro da prostituição, o lucro, a relação com as outras profissionais, é algo subjetivo de cada história. Todos esses fatores irão influir para que elas tenham mais ou menos prazer com a prostituição, veja-a com mais ou menos sofrimento.

No documento PR BRIENA PADILHA ANDRADE (páginas 93-98)