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Capítulo III – A evolução do tempo de trabalho

3. A revisão do Código do Trabalho

3.2. O tempo de trabalho no Código do Trabalho de 2009

3.2.5. O trabalho intermitente

O contrato de trabalho intermitente168 que na sistematização do CT está inserido na secção IX, relativa às modalidades de contrato de trabalho, reveste grande importância no quadro da organização do tempo de trabalho, justificando-se por isso que seja analisado neste contexto. Como refere BERNARDO DA GAMA LOBO XAVIER sobre esta modalidade de contrato de trabalho:

“As exigências de flexibilidade do ordenamento laboral, postuladas pelas actuais formas de funcionamento das organizações produtivas, reflectem-se não apenas em modulações do regime (como vimos, p. ex., a propósito dos limites à duração de trabalho,

168 Este regime tem como antecedente legislativo a Lei 4/2008, de 7 de Fevereiro, relativa ao regime dos

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com a adaptabilidade), mas também na introdução de novos modelos de aproveitamento da prestação de trabalho, de que é, justamente, exemplo o trabalho intermitente.”169

Esta nova modalidade de contrato de trabalho, prevista nos artigos 157.º a 160.º do CT/2009, está sujeita aos seguintes requisitos:

i. Pode ser celebrado quando esteja em causa empresa que exerça actividade com descontinuidade ou intensidade variável e cuja prestação de trabalho é intercalada por um ou mais períodos de inactividade (exemplos: turismo, agricultura, organização de eventos.)170;

ii. Não pode ser celebrado a termo resolutivo ou em regime de trabalho temporário; iii. A prestação de trabalho não pode ser inferior a seis meses a tempo completo, por

ano, dos quais pelo menos quatro meses devem ser consecutivos;

iv. Durante o período de inactividade, o trabalhador tem direito a compensação retributiva em valor estabelecido em IRCT ou, na sua falta, de 20 % da retribuição base, a pagar pelo empregador com periodicidade igual à da retribuição e pode exercer outra actividade.

O contrato de trabalho intermitente está sujeito a forma escrita e deve conter, nomeadamente a indicação do número anual de horas de trabalho, ou do número anual de dias de trabalho a tempo completo; na ausência destes dois requisitos considera‐se que o contrato foi celebrado sem período de inactividade (artigo 158.º).

Esta modalidade de contrato de trabalho tem vantagens, sobretudo no domínio de actividades com procura irregular, tendo como inovador o facto de poderem existir períodos de inactividade, mais ou menos prolongados, em que o trabalhador é remunerado por um valor inferior171.

Um aspecto importante a assinalar é a circunstância de, face à alteração introduzida no regime do trabalho a tempo parcial, que vamos analisar no ponto seguinte, ser por vezes difícil definir a fonteira entre estas duas modalidades de contrato de trabalho. Como sublinha PEDRO MADEIRA BRITO,

169 XAVIER, Bernardo da Gama Lobo - op. cit., p. 529.

170 Conforme refere PEDRO BRITO MADEIRA, “O trabalho intermitente pode ter duas modalidades consoante

exista (ou não) programação prévia dos períodos de inactividade e trabalho. Se a intermitência está pré- programada e as partes fixam previamente os períodos de trabalho e de inactividade estamos perante uma situação de trabalho alternado. Porém, se as partes não estabelecem essa programação e se o contrato tem um regime de intermitência imprevisível, dependente das necessidades do empregador, temos uma situação de trabalho à chamada”. BRITO, Pedro Madeira in MARTINEZ, Pedro Romano [et. al.] – Código do Trabalho

Anotado, 9.ª ed. Coimbra: Almedina, 2012, p. 398-399. 171

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“A possibilidade aberta pelo Código do Trabalho de 2009 de haver um período anualizado de trabalho a tempo parcial vertical veio colocar o problema das fronteiras entre esta figura e o trabalho intermitente. Contrariamente ao regime do trabalho a tempo parcial, os períodos de inactividade podem ser variáveis (o que não acontece no trabalho a tempo parcial) sendo que o trabalhador pode ser chamado a trabalhar sem necessidade de uma pré-programação contratual quanto aos momentos em que é chamado a trabalhar.”172

3.2.6. O trabalho a tempo parcial

O regime do trabalho a tempo parcial, regulado nos artigos 150.º a 156.º do CT/2009, sofreu grandes alterações com a revisão de 2009, desde logo de ordem sistemática; deixa de ser tratado em sede de duração e organização do tempo de trabalho e passa a estar inserido na Secção IX, relativa às modalidades de contrato de trabalho. Para além desta alteração, foram introduzidas outras alterações de natureza substancial.

A primeira respeita à eliminação do limite máximo da duração do trabalho a tempo parcial, que nos termos do n.º 1 do artigo 180.º do CT/2003 correspondia a 75% do praticado a tempo completo numa situação comparável. Deste modo, o n.º 1 do artigo 150.º do CT/2009 vem estabelecer que o tempo parcial corresponde a um período normal de trabalho semanal inferior ao praticado a tempo completo em situação comparável. Esta alteração corresponde à proposta da CLBRL, que se pronunciou a favor da supressão da percentagem, como vimos no ponto 3.1.2.

A segunda alteração a assinalar está relacionada com o facto de se permitir que o trabalho a tempo parcial possa ser prestado em alguns dias por ano; nos termos do regime anterior apenas era possível em alguns dias por semana ou por mês, que o actual regime também mantém (n.º 3 do artigo 150.º). Podemos assim distinguir segundo BERNARDO DA GAMA LOBO XAVIER entre tempo parcial horizontal (diminuição de horas em cada dia), vertical (diminuição de dias na semana) e cíclico (algumas semanas ou meses por ano)173.

No entanto, esta alteração tem suscitado alguma discussão, sobretudo, porque a par desta o CT/2009 introduziu uma nova modalidade de contrato de trabalho intermitente, que já analisámos. Como escreve CATARINA DE OLIVEIRA CARVALHO,

172 Ibidem. 173

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“O CT 2009 introduziu dissimuladamente uma alteração no regime do contrato de trabalho a tempo parcial com um alcance prático muito significativo e capaz de reduzir a utilidade da nova figura do trabalho intermitente.

Com efeito, o n.º 3 do art. 150.º do novo CT veio dispor não apenas que o trabalho a tempo parcial pode ser prestado em todos ou alguns dias da semana (tal como resultava do revogado art. 180.º, n.º 2, do CT de 2003), mas também que pode ser prestado somente alguns dias por mês ou mesmo por ano. Consagrou-se, então, a admissibilidade do trabalho a tempo parcial anualizado, solução compatível com a Directiva que admite que o tempo normal de trabalho seja calculado como média «ao longo de um período de emprego até um ano».”174

Uma outra alteração ao regime do trabalho a tempo parcial foi introduzida no n.º 4 do artigo 155.º, sobre a reversão da situação do trabalhador a tempo completo para trabalho a tempo parcial: de acordo com o n.º 4 do artigo 186.º do CT/2003 era conferido ao trabalhador o direito de reversão, desde que o termo fosse inferior a três anos. O CT/2009 vem conferir ao trabalhador o direito de reversão após o esgotamento do prazo, seja este qual for175.

3.2.7. O regime da redução temporária do período normal de trabalho ou suspensão do