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Objectivo: Avaliar os procedimentos de diagnóstico de GIST no esófago, que é uma localização rara deste tipo de tumores, e rever as opções terapêuticas mais adequadas nesta localização

KITMolecular alterations of

II. Objectivo: Avaliar os procedimentos de diagnóstico de GIST no esófago, que é uma localização rara deste tipo de tumores, e rever as opções terapêuticas mais adequadas nesta localização

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II. Objectivo: Avaliar os procedimentos de diagnóstico de GIST no esófago, que é uma localização

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dos tumores343, 344. No entanto, este procedimento pode comprometer a remoção completa da pseudo-cápsula, facilitar a persistência de células tumorais viáveis e associar-se a maior risco de ruptura tumoral, eventualmente não cumprindo os princípios da cirurgia oncológica213.

A cirurgia laparoscópica no GIST tem vindo a expandir-se rapidamente nos últimos anos, sobretudo na abordagem de GISTs localizados no estômago. A cirurgia minimamente invasiva pode aplicar-se também a GISTs noutras localizações, mas os dados disponíveis relativamente a ressecções de casos localizados no esófago são escassos e na generalidade referentes a enucleação tumoral. A localização do tumor não pode ser considerada contra-indicação absoluta para cirurgia minimamente invasiva, desde que assegurada a experiência técnica necessária224 e que os procedimentos sigam rigorosamente os mesmos princípios oncológicos da cirurgia por via aberta:

ressecção completa do tumor com margens livres (R0), evitando a ruptura e disseminação de células tumorais24, 138, 219.

No presente caso foi realizada uma esofagectomia transtorácica de tipo Ivor Lewis, que estava indicada em função das características clínico-imagiológicas do GIST, e obtiveram-se margens cirúrgicas livres de tumor (R0). No exame histológico, o tumor era constituído por células fusiformes, com baixo índice mitótico (2/50 CGA) e com expressão imuno-histoquímica de KIT (CD117) e CD34. Tratava-se de um GIST de alto risco de agressividade. No estudo molecular (incluído no trabalho III desta dissertação) verificou-se a existência de uma mutação no exão 11 do gene KIT (557del558).

Não foi efectuada terapêutica adjuvante porque à data do tratamento do caso (2003) esta opção não estava indicada nem aprovada. O doente está vivo e sem evidência de recidiva da doença, 7 anos após a cirurgia.

Nas séries publicadas, a sobrevida dos doentes com GIST, após ressecção de toda a doença macroscópica, varia consideravelmente. Estes doentes apresentam taxas de sobrevida aos cinco anos entre 35% e 65%, dependendo da inclusão de maior ou menor percentagem de casos com doença disseminada27, 190, 345.

O uso de inibidores tirosina-cinásicos veio revolucionar a terapêutica dos GISTs, e em particular dos tumores localmente avançados. Estes casos podem beneficiar do tratamento pré-operatório com imatinib (neoadjuvante), com o objectivo de facilitar a obtenção de margens cirúrgicas R0 e permitir uma cirurgia com preservação da função e do órgão, como é o exemplo dos GISTs localizados na junção esófago-gástrica214. Esta é a recomendação de consenso da ESMO e da NCCN também para GISTs noutras localizações igualmente raras e de abordagem cirúrgica particularmente mutilante, como são a segunda porção do duodeno e o recto baixo24, 138.

Um aspecto prático muito relevante para a indicação de terapêutica neoadjuvante com imatinib, particularmente nestas localizações (esofágica, duodenal e rectal), é a necessidade da obtenção de um diagnóstico anátomo-patológico pré-terapêutico. Actualmente aceita-se que a biópsia com agulha fina ou a microbiópsia (core biopsy) guiada com ultrassonografia endoscópica estão particularmente indicadas nestes doentes, porque do seu resultado depende a eventual abordagem terapêutica a adoptar24, 172.

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Recentemente, com base nos resultados do ensaio clínico do ACOSOG (Z9001), o imatinib (400 mg/dia, durante 1 ano) foi aprovado como terapêutica adjuvante no GIST. Segundo as recomendações actuais, o tratamento adjuvante com imatinib é amplamente aceite como opção para doentes com GISTs de risco biológico intermédio/elevado24, 138. No entanto, permanecem por esclarecer algumas questões fundamentais, incluindo a heterogeneidade biológica reconhecida nos GISTs, sobre esta opção terapêutica: a taxa de recidiva absoluta após maior tempo de follow-up (casos com recidiva precoce vs. recidiva tardia); o benefício obtido no intervalo de tempo livre de recidiva; e, aquando da eventual recidiva, o tempo para ocorrência de resistência secundária ao imatinib.

Conclusão:

A opção terapêutica mais adequada para os GISTs do esófago depende da confirmação diagnóstica prévia, da localização no esófago, da dimensão/extensão loco-regional do tumor e do risco cirúrgico do doente. Nos GISTs com dimensões < 2 cm é de ponderar a abordagem conservadora com vigilância periódica do doente. A esofagectomia, seguindo os princípios oncológicos, é o procedimento cirúrgico indicado na maioria dos casos, para uma ressecção R0. A cirurgia minimamente invasiva pode ser considerada, quando é possível respeitar os mesmos princípios da cirurgia oncológica. A terapêutica neoadjuvante deve ser uma opção a considerar nos casos localmente avançados. A terapêutica adjuvante é uma opção possível, que carece de mais evidências para GISTs nesta localização específica.

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III. Objectivo: Avaliar o estado mutacional dos genes KIT e PDGFRA numa série de doentes, para correlacionar as características clínico-patológicas e moleculares identificadas e o seu impacto no prognóstico dos doentes com GIST.

A investigação intensiva na biologia dos tumores verificada na última década destacou o papel fundamental dos receptores tirosina-cinásicos, em especial do KIT e do PDGFRA, na patogénese dos GISTs55. Estes receptores apresentam actualmente grande importância na abordagem terapêutica dos GISTs, relacionada com o desenvolvimento de inibidores tirosina-cinásicos como o imatinib e o sunitinib9, 346.

Não existem ainda dados epidemiológicos consistentes sobre a frequência e o tipo de mutações nos genes KIT e PDGFRA em GISTs diagnosticados nos países da Europa do Sul, nomeadamente em Portugal.

No nosso estudo, verificámos que 92% dos GISTs expressavam CD117 (KIT), independentemente da topografia, idade ou género, de acordo com os resultados de estudos anteriores efectuados noutras populações38, 347. Não foi detectada qualquer associação estatisticamente significativa entre a expressão de CD117 e a presença de mutações do KIT. De facto, dois dos seis GISTs sem expressão de CD117 (KIT) apresentavam mutações do KIT (uma mutação missense no exão 9 e uma delecção de 3 pb no exão 11). Apesar dos GISTs negativos para o CD117 poderem corresponder a tumores wild-type (sem mutações KIT/PDGFRA) ou a tumores com mutações do PDGFRA106, 107, foi também descrita a existência de mutações do KIT em casos CD117-negativos107. A análise molecular efectuada nos nossos doentes foi importante para o diagnóstico definitivo de GIST em 2 dos 6 casos negativos para CD117. A frequência de casos negativos para CD117 e wild-type para as mutações do KIT e do PGDFRA encontrados na nossa série de doentes (5%) coaduna-se com os resultados descritos na literatura107.

Nos 78 doentes analisados, identificámos a presença de mutações do KIT em 56,4% (44/78) dos casos, sendo 91% (40/44) localizados no exão 11 e 9% (4/44) no exão 9. Estes valores estão em conformidade com os resultados anteriormente publicados por outros autores (30-80%), particularmente na Península Ibérica55, 102, 348.

As mutações no exão 11 do gene KIT são descritas em GISTs que, habitualmente, ocorrem em todo o tracto gastrointestinal (GI), sem preferência por qualquer localização específica38, 94-98. Não foi ainda estabelecida uma relação clara entre os diferentes tipos de mutações do KIT neste exão e a morfologia celular dos tumores. Na nossa série, foi possível observar uma correlação significativa entre a morfologia celular epitelióide e a ausência de mutações do KIT (p=0,0064).

Vários tipos de mutações podem ser observadas no exão 11, mas as delecções são as que se identificam mais frequentemente. Em 75% (30/40) dos casos da nossa série, as mutações encontravam-se entre os codões 550 e 561, conhecida por ser a região mais frequentemente envolvida no exão 11, com 57% (17/30) dos casos a corresponderem a mutações nos codões 557 ou 558. Alguns autores descreveram existir uma associação entre as mutações nestes dois codões e um comportamento mais agressivo dos GISTs55, 101. No entanto, apenas quatro destes 17 casos da

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nossa série recidivaram (4/17, 24%). Apesar de ter sido anteriormente descrito que todas as mutações pontuais ocorrem exclusivamente nos codões 557, 559, 560 e 576, encontrámos uma mutação pontual nova no codão 570 (Y570F)348.

As mutações no exão 9 do KIT têm sido relacionadas com a localização no intestino delgado, mas apenas 1 dos 4 casos de GIST da nossa série com mutação neste exão tinha esta localização55, 348.

O impacto prognóstico das mutações nos genes de receptores tirosina-cinásicos foi avaliado em diversos estudos retrospectivos publicados, mas existe ainda alguma controvérsia relativamente ao significado prognóstico das mutações do KIT no exão 11 dos GISTs. No presente estudo, e de acordo com resultados anteriormente publicados55, 99, o estado mutacional KIT positivo associou-se a pior prognóstico e a sobrevida mais curta dos doentes (p=0,046).

Estudos mais recentes sugerem que os diferentes tipos de mutações no exão 11 podem correlacionar-se com a evolução clínica dos tumores75. Os GISTs gástricos com delecções neste exão parecem ter tendência para cursar, na ausência de tratamento com imatinib, com um comportamento clínico mais agressivo do que os tumores com substituições de um nucleotídeo38. Na nossa série, não se observou relação significativa entre o tipo de mutação do KIT (mutação pontual, delecção ou mutação mista), ou a sua localização (exão 9 ou exão 11), e a sobrevida dos doentes (dados não publicados).

A análise do gene PDGFRA nos nossos doentes revelou a presença de mutações em 6% (5/78) dos casos (15% dos GISTs KIT wild-type), o que está de acordo com os resultados publicados por outros autores.

Foi também descrita a existência de uma associação entre alguns aspectos clínico-patológicos dos tumores, como a localização gástrica, e a presença de mutação no gene PDGFRA72, 106, 108, 349. Embora o número de casos com mutações do PDGFRA na nossa série seja baixo para avaliação estatística (n=5), 80% (4/5) das mutações ocorreram em tumores gástricos. Todos os GISTs com mutações no gene PDGFRA apresentavam expressão de CD117.

O uso do mesilato de imatinib (Glivec® /Gleevec®, Novartis), um inibidor selectivo dos receptores tirosina-cinásicos, trouxe novas perspectivas para o tratamento dos doentes com GIST.

Foi demonstrado que a resposta clínica objectiva ao imatinib depende da presença e do tipo de mutações nos genes KIT e PDGFRA9, 55, 350. As taxas de resposta objectiva ao imatinib obtidas em diferentes ensaios clínicos efectuados em GISTs com mutações no exão 11 e no exão 9 do KIT, e em GISTs wild-type, foram 72-86%, 38-48% e 28%, respectivamente9, 21, 87, 152, 205, 206. Os doentes com mutações no exão 9 do KIT apresentam sobrevida livre de progressão tumoral mais longa quando tratados com uma dose inicial de 800 mg/dia87, 89, 263.

É reconhecido que algumas mutações específicas são responsáveis pela resistência ao imatinib:

mutações do KIT V654A e W670I (exão 13), D816V e T823D (exão 17), e a mutação do PDGFRA D842V (exão 18)269, 350, 351. De todas estas mutações resistentes ao imatinib, apenas a mutação D842V foi detectada em dois GISTs da nossa série de doentes.

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A FDA e a EMA aprovaram recentemente um novo inibidor dos receptores tirosina-cinásicos, o sunitinib (Sutent ®, Pfizer), para o tratamento de segunda linha dos doentes com GIST que apresentam progressão da doença sob terapêutica com imatinib, principalmente devida a mutações resistentes primárias ou secundárias, ou nos casos de intolerância ao imatinib272, 292, 346.

Resultados de estudos efectuados com sunitinib, em doentes com GIST avançado, mostraram benefício clínico em todas as principais mutações do KIT207. Foi publicada evidência de benefício clínico para os três genótipos mais comuns: 34% nos tumores com mutações no exão 11 do KIT, 58% nos casos com mutações no exão 9 e 56% nos tumores wild-type para o gene KIT ou com mutações do PDGFRA. A taxa de resposta parcial (37%) obtida nos GISTs com mutações primárias no exão 9 indica que o sunitinib pode ser particularmente eficaz nos doentes que apresentam mutações do KIT neste exão.

A introdução dos inibidores tirosina-cinásicos na terapêutica dos doentes com GIST veio realçar a importância dos parâmetros de avaliação patológica (diagnóstica/ prognóstica/preditiva) nos doentes com GIST, incluindo a caracterização molecular dos genes KIT e PDGFRA, potencialmente útil numa abordagem terapêutica eficaz e ajustada a cada caso individual.

Actualmente, a opção pela realização da análise molecular de rotina em todos os GISTs continua a ser um assunto controverso. O estudo mutacional dos genes KIT e PDGFRA deve ser especialmente considerado para confirmação do diagnóstico definitivo dos GISTs sem expressão de CD117 (e DOG1), e porque permite prever a resposta dos tumores à terapêutica com inibidores tirosina-cinásicos, pode ser útil para seleccionar os doentes que realmente poderão beneficiar do tratamento com imatinib, sobretudo quando candidatos a administração de doses mais elevadas (800 mg/dia)24, 138 ou de outro tratamento alternativo.

O estudo molecular pode também ser considerado um auxiliar importante para a decisão de tratamento adjuvante com imatinib, em GISTs primários de risco intermédio e alto24, 138. Deste modo, podem desde logo ser excluídos os GISTs com mutações reconhecidamente resistentes ao imatinib (ex: mutações D842V do PDGFRA). Estes testes, na opção neoadjuvante, permitem também ajustar o esquema terapêutico de forma mais adequada.

Finalmente, os resultados deste estudo são também úteis para potenciar um banco de dados multi-institucional com o objectivo de contribuir para o esclarecimento da epidemiologia, biologia e tratamento dos doentes com GIST em Portugal.

Conclusão:

Neste estudo descrevemos pela primeira vez a frequência de mutações do KIT e do PDGFRA numa grande série de doentes portugueses com GIST. A incidência global de mutações do KIT e do PDGFRA nestes doentes (63%) é concordante com os resultados de outros estudos, especialmente em populações ibéricas. Foram identificadas mutações no gene KIT em 56% dos casos e mutações do PDGFRA em 6% dos casos. A presença de mutações do KIT parece associar-se com a

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sobrevida mais curta dos doentes. A grande maioria (91%) das mutações activantes do gene KIT localizou-se no exão 11, indicando a possibilidade de uma resposta favorável à terapêutica destes doentes com imatinib.

O imatinib continua a ser actualmente a opção de escolha no tratamento de primeira linha dos doentes com GISTs irressecáveis e metastáticos. Em geral, as taxas de resposta ao imatinib mais favoráveis são observadas nos GISTs que têm mutações no exão 11 do KIT. No entanto, as evidências mais recentes sugerem que o sunitinib, aprovado para a terapêutica de segunda linha, pode ser particularmente eficaz no tratamento dos GISTs que têm mutações do KIT no exão 9 e nos GIST wild-type.

O estudo mutacional dos genes KIT e PDGFRA deve ser considerado no diagnóstico definitivo dos GISTs negativos para CD117. Nas circunstâncias actuais, e na ausência de evidências conclusivas, a análise molecular deve ser imprescindível na selecção dos casos de GISTs avançados para ponderar o tratamento (ex: inibidor tirosina-cinásico) mais indicado em cada doente particular com GIST.

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IV. Objectivo: Esclarecer as alterações moleculares alternativas em GISTs wild-type, procurando identificar alterações potencialmente úteis para o diagnóstico e eventualmente preditivas de resposta a terapêuticas dirigidas a novos alvos moleculares em doentes com GIST.

A maioria dos GISTs tem origem em mutações activantes no gene KIT, com uma frequência que varia, nos diferentes estudos publicados, entre 30% e 85 % dos casos10, 11, 55, 64. A maior percentagem de mutações do KIT ocorre no exão 11, seguida pelas mutações no exão 9 e, raramente, nos exões 13 e 17. Adicionalmente, os GISTs KIT wild-type podem ter mutações activantes noutro gene de receptor tirosina-cinásico classe III, o PDGFRA (platelet-derived growth factor receptor A), que ocorrem, na maioria dos casos, no exão 18 e, raramente, nos exões 12 e 1455, 72,

75. Foi possível verificar que os doentes com GISTs com mutações activantes nestes genes (KIT e PDGFRA) podem ser tratados eficazmente com inibidores tirosina-cinásicos específicos352, 353. No entanto, existe um subgrupo de doentes com GIST (10-15%, até 40% dos casos) que são wild-type para os genes KIT e PDGFRA10, 38, 102, 352. Esta variação observada na frequência das mutações do KIT e do PDGFRA nos GISTs pode depender, em parte, da localização do tumor, da metodologia e do tipo de tecido (congelado ou fixado em formol e incluído em parafina) usado nos diferentes estudos55, 64, 75, 354.

Este trabalho teve como objectivo estudar as características moleculares ainda pouco esclarecidas dos GISTs wild-type para os genes KIT e PDGFRA. Pretendia-se, deste modo, identificar novos marcadores de prognóstico e potenciais agentes terapêuticos para este subgrupo de GISTs.

Inicialmente, avaliou-se a possibilidade da existência de eventuais mutações (duplicação no exão 11 do KIT), não identificadas no estudo prévio (trabalho III) da nossa série. Lasota et al. sugeriram que as duplicações no exão 11 do KIT podem não ser detectadas em amostras fixadas em formol e incluídas em parafina, devido à amplificação preferencial da PCR (reacção em cadeia da polimerase) do alelo do KIT wild-type, não permitindo identificar um fragmento grande do alelo mutante317. Em face destas evidências, decidiu-se reavaliar todos os casos wild-type (n=29) da nossa série. Foi assim possível identificar três casos com duplicação no exão 11, permitindo ajustar para 33% (26/78) a percentagem efectiva de GISTs wild-type na nossa série, o que está de acordo com os resultados descritos noutras séries, designadamente da Península Ibérica102.

Nos 26 GISTs wild-type assim definidos, foi avaliada a expressão imuno-histoquímica do KIT (CD117), do factor de crescimento SCF (stem cell factor; ligando KIT) e do estado de activação do KIT (fosfo-KIT). A expressão conjunta do ligando (SCF) e do receptor KIT (CD117) em cerca de 65% e a expressão de fosfo-KIT em aproximadamente 30% dos casos com expressão de KIT e SCF suporta a possibilidade da existência de mecanismos autócrinos/parácrinos como via patogénica alternativa em GISTs wild-type. Os nossos resultados são concordantes com os obtidos num estudo recente, que descreveu co-expressão do KIT/SCF na maioria dos GISTs, independentemente do estado mutacional dos genes KIT e PDGFRA313. A activação do KIT (fosfo-KIT), avaliada por western blot em linhas celulares e tecidos congelados, foi descrita em 70-80% dos GISTs wild-type na mesma proporção e nível de activação observados em GISTs com

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mutações do KIT/PDGFRA16, 313. Tal como neste estudo, outros autores também descreveram que a co-expressão do KIT/SCF não induz sempre a activação do receptor KIT313. Esta discrepância observada no número de casos com activação do KIT pode ser explicada por diferenças na metodologia utilizada e no tipo de fixação tecidular dos tumores. O anticorpo usado no nosso estudo reconhece a fosforilação do KIT na tirosina 703, enquanto nos estudos anteriormente referidos o anticorpo usado reconhece a fosforilação do KIT na tirosina 72116, 313. Apesar das vantagens reconhecidas na avaliação imuno-histoquímica de tecidos fixados em formol e incluídos em parafina, este método é menos consistente do que a análise por western blot para avaliação do estado de fosforilação das proteínas. Consequentemente, serão necessários estudos adicionais para determinar a frequência da activação do KIT e, muito especialmente, sobre o seu impacto na eficácia dos tratamentos possíveis e adequados para doentes com GISTs wild-type.

Outro aspecto pouco estudado e muito importante é esclarecer as alterações moleculares implicadas na patogénese dos GISTs (KIT e PDGFRA) wild-type. De facto, contrastando com o conhecimento substancial actual sobre os efeitos da activação dos receptores KIT e PDGFRA resultantes das respectivas mutações oncogénicas, há poucos estudos publicados sobre as alterações nas vias de sinalização intracelular, incluindo a do KIT/PDGFRA, independentes das mutações referidas16, 63,

76, 355. A via da MAPK (RAS/RAF/MEK/ERK) é uma das cascatas de fosforilação a jusante do receptor KIT, que está preservada e implicada no crescimento, diferenciação, migração e sobrevida celular356. Em vários tipos de tumores sólidos, incluindo o carcinoma do pâncreas, do cólon, o carcinoma papilar da tireóide e o melanoma, esta via de sinalização MAPK pode ser regulada constitutivamente por mutações activantes nos genes da família RAS (RAt Sarcoma) ― H-RAS, K-RAS e N-RAS (Harvey-Ras, Kirsten-Ras, Neuroblastoma-Ras), e no gene BRAF, membro da família RAF (proto-oncogene serine/threonine-protein kinase)67, 356-359.

Neste trabalho, a avaliação da contribuição de alterações na via de sinalização MAPK nos GISTs wild-type consistiu na análise mutacional dos genes da família RAS e BRAF e na avaliação dos níveis de expressão imuno-histoquímica de ERK fosforilada. Apesar da elevada frequência de mutações nos genes da família RAS em vários tipos de tumores, incluindo os carcinomas do pâncreas, o carcinoma papilar da tireóide, o carcinoma do cólon e o carcinoma do pulmão de células não-pequenas356, 360, não se identificou em nenhum dos 26 GISTs desta série mutações do H-RAS, do K-RAS, nem das regiões hotspot do N-RAS. A análise do BRAF, outro oncogene importante da via MAPK, permitiu identificar a presença da mutação activante V600E em cerca de 4% (um caso) dos GISTs wild-type desta série. A mutação V600E é responsável por 90% das mutações do BRAF nos tumores malignos humanos e associa-se a maior actividade cinásica, que induz a activação de ERK, independente do estado de activação de RAS361. Por outro lado, não se identificou nesta série qualquer mutação do BRAF nos GISTs com mutações do KIT ou do PDGFRA, sugerindo que as mutações do BRAF, KIT e PDGFRA são mutuamente exclusivas.

Quando o presente trabalho foi iniciado, não existiam publicações sobre a análise de mutações do RAS ou BRAF em GISTs. Posteriormente, outros estudos descreveram mutações V600E no exão 15 do BRAF em 5-13% dos GISTs wild-type de adultos (5%= 3/61 casos115, 7%= 2/28 casos114, 13%= 9/70 casos116). Os GISTs com mutação do BRAF parecem localizar-se preferencialmente no

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intestino delgado, sendo ainda controversa a sua associação com o comportamento biológico em GISTs de alto risco.

Para melhor esclarecimento do papel da via da MAPK em GISTs wild-type, avaliou-se a expressão de fosfo-ERK que foi identificada em 30% dos casos wild-type da nossa série. Estudos previamente publicados sugeriram que a activação de ERK (extracellular signal-regulated kinase) em GISTs depende da sinalização KIT63 e que algumas linhas celulares KIT wild-type também têm activação de ERK76. Os nossos resultados estão de acordo com estes resultados publicados, salientando-se que identificamos uma correlação significativa (p=0,02) entre a expressão de fosfo-ERK e a expressão de fosfo-KIT. No entanto, a expressão de fosfo-ERK em 50% dos casos da nossa série sem expressão de fosfo-KIT, sugere que a activação de ERK independente da activação de KIT nos GISTs wild-type é causada provavelmente por outras vias (ex: AKT/PI3K e JAK/STAT) de sinalização intracelular16, 353.

Os factores de prognóstico dos GISTs wild-type são ainda controversos. Alguns estudos sugerem um prognóstico melhor nos GISTs wild-type, quando comparados com os tumores com mutações55, sendo que estes resultados não foram confirmados num estudo de base populacional362. Nesta nossa série, verificámos que parâmetros clínico-patológicos habitualmente associados a comportamento agressivo nos doentes com GIST, incluindo a maior dimensão do tumor e o grupo de alto risco de agressividade, são também factores de mau prognóstico em doentes com GISTs wild-type.

Existem trabalhos publicados de ensaios clínicos fase II e III descrevendo que os doentes com GISTs wild-type raramente respondem ao tratamento com imatinib9, 87, 205, 258. Estes doentes constituem um desafio terapêutico muito importante. As evidências mais recentes sugerem que o sunitinib pode ser particularmente eficaz no tratamento dos GISTs com mutações do KIT no exão 9 e nos GISTs com genótipo wild-type (sem mutações do KIT / PDGFRA)89, 207, 272, mas as indicações terapêuticas precisas para este último subgrupo de doentes não estão ainda claramente estabelecidas.

A activação constitutiva da via de sinalização intracelular RAS/RAF/MEK/ERK pode também regular a resposta dos doentes a terapêuticas dirigidas aos receptores tirosina-cinásicos, independente do estado a montante dos receptores tirosina-cinásicos.

Alguns fármacos dirigidos contra moléculas RAS/RAF/MEK são actualmente objecto de estudo em ensaios clínicos ou pré-clínicos em curso. Não foram ainda descritos inibidores de ERK1 ou ERK2 com aplicabilidade clinicamente relevante360. O inibidor anti-RAF sorafenib (Nexavar ®) é um inibidor tirosina-cinásico potente do BRAF wild-type e do BRAF com mutação V600E, e descreveu-se que é um inibidor multi-cinásico que inibe outros receptores tirosina-cinásicos, incluindo o KIT, o receptor do factor de crescimento endotelial vascular (VEGFR) -2, o VEGFR-3 e o PDGFRB363. A FDA aprovou o sorafenib para o tratamento do carcinoma de células renais e do hepatocarcinoma avançados, estando também a ser avaliado no carcinoma do pulmão de células não-pequenas, nos carcinomas da próstata, da mama e do pâncreas e no melanoma363, 364. Vários

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estudos descreveram a associação da actividade tumoral do sorafenib a um efeito anti-angiogénico363, 364.

Em contraste com o sorafenib, as pequenas moléculas inibidoras da MEK1/2 (MAPK/ERK kinase 1 / 2) são consideradas inibidores mais específicos. Os estudos pré-clínicos com AZD6244 (ARRY-142886) revelaram resultados promissores e levaram ao desenvolvimento de ensaios clínicos adicionais365, 366. Neste contexto, é interessante sublinhar que Solit et al. descreveram que os tumores com mutação do BRAF são muito sensíveis à inibição cinásica de MEK367.

Os resultados promissores recentemente descritos com o inibidor da cínase RAF PLX4032 (Plexxikon), também conhecido como RG7204, em doentes com melanomas que têm mutação V600E, sugerem a possibilidade de se obter respostas semelhantes noutros tipos de tumores que partilhem dependência oncogénica do gene RAF na sua patogénese368, 369.

Conclusão:

A via da MAPK (RAS/RAF/MEK/ERK) a jusante do receptor KIT está implicada na patogénese de vários tipos de tumores sólidos. O nosso estudo constitui uma análise compreensiva da desregulação da via MAPK nos GISTs wild-type para os genes KIT e PDGFRA. Na ausência de mutações RAS sugere-se que a via da MAPK pode ser activada através de mecanismos autócrinos/parácrinos de SCF/KIT e/ou por mutação do gene BRAF num subgrupo de GISTs wild-type. A mutação activante V600E do BRAF foi observada num (4%) dos GISTs wild-type da nossa série. Posteriormente, outros estudos descreveram mutações V600E no exão 15 do BRAF em 5-13% dos GISTs wild-type de adultos.

Alguns fármacos dirigidos contra moléculas RAS/RAF/MEK são actualmente objecto de estudo em ensaios clínicos ou pré-clínicos. As mutações activantes V600E nos GISTs wild-type levantam a possibilidade de terapêutica com inibidores da cínase RAF [ex: PLX4032 (Plexxikon)] neste subgrupo de tumores. Apesar da reduzida frequência das alterações moleculares da via da MAPK, são necessários estudos adicionais que avaliem o potencial do tratamento dirigido a moléculas desta via em GISTs (KIT e PDGFRA) wild-type.

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V. Objectivo: Avaliar a expressão de RKIP, a sua associação com diferentes parâmetros