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Obra literária, artística e científica

D. metodologia a ser utilizada

2. PRESSUPOSTOS DE PROTEÇÃO

2.5. Obra literária, artística e científica

Sob o ponto de vista artístico, uma obra constitui, especificamente, um objeto tátil, material, definitivo e permanente, que resulta de um trabalho técnico e espiritual (um texto, uma composição pictória, um filme, uma escultura, uma edificação arquitetônica ou uma partitura musical). Com este significado, difere de uma ação artística, cuja visualização ou execução depende de uma interpretação oferecida em ato, ou seja, de movimentos, ritmos ou acréscimos formais que podem modificar o resultado (encenações dramática ou coreográfica, concerto etc). Comumente, no entanto, aplica-se a ambas as formas a denominação de obra, tanto quanto a qualquer produção artesanal ou espiritual (obra filosófica, histórica ou genericamente científica) 111.

Do ponto de vista jurídico, é possível admitir-se que a expressão “obra” traduza uma realidade incorpórea exteriorizada de alguma forma, ainda que sem suporte físico, se perceptível ao ser humano. A exteriorização pode até mesmo ser somente imaterial, desde que seja perceptível aos sentidos do ser humano, o que justifica caber direitos de autor sobre o corpo místico da obra - parte incorpórea e independente do direito de propriedade, este inerente aos suportes físicos – corpos mecânicos que fixam ou comunicam o conteúdo místico112.

O Conselho Nacional de Direito Autoral foi provocado a se manifestar se cinco folhetos sob o título “Conjunto Normativo para Segurança”, contendo textos de instruções para uso de extintores de incêndio, deveria ser reconhecido como obra literária.

111CUNHA, Newton. op. cit., p. 473. E, vide, ainda, Id. Ibid., p. 39. “Qualquer objeto ou ente sofre modificações, súbitas ou graduais, ao longo do tempo, sem que haja interferência da atividade humana, ou seja, apenas por motivos naturais. Já um processo pensado, isto é, espiritualmente concebido, revela um conjunto de faculdades humanas que agem simultaneamente, mesmo que as “dosagens” empregadas possam ser bastante diferenciadas: intuição, imaginação ou representação de imagens (isto é, o fato de sermos afetados por coisas ausentes, tornando-as presentes), emoção (ou o sentimento de ressonâncias íntimas), vontade, pensamento (entendimento ou reflexão racional sobre a atividade imaginativa), seleção ou escolha de elementos. E essa conjugação de faculdades determina um universo próprio de significações que só pode ser percebido na obra (ou ação) – uma exigência indispensável do processo artístico. A arte, portanto, determina-se pela criação de uma forma ou estrutura física artificial, na qual se fundem conteúdos psíquicos e intelectivos de ordem subjetiva, envolvidos, no entanto, pela objetividade do mundo sociocultural.” (negrito nosso)

A deliberação sob a relatoria de Cláudio de Souza Amaral foi negativa, dada a constatação de ausência de originalidade - enquadramento como criação de espírito convenientemente exteriorizada, decisão fundamentada na doutrina de Henry Hessen que considera ser a originalidade a condição sine qua non para o reconhecimento da obra como produto da inteligência criadora.

Só a criação personalíssima permite o nascer de uma obra intelectual com originalidade. A originalidade, porém, será sempre essencial, pois, é nela que se consubstancia o esforço criador do autor, fundamento da obra e razão da proteção. Sem esforço criador não há obra, e, por conseguinte, não há proteção113.114 A citada decisão administrativa muito bem ilustra a função dos mais basilares princípios do direito de autor. O CNDA em muito colaborou para o aperfeiçoamento da interpretação da Lei 5.988 de 1973, na resolução extrajudicial de conflitos, e consequente formulação de doutrina e jurisprudência especializadas.

Tanto para a Convenção de Berna, como para a Lei 9.610 de 1998, todas as formas de expressão devem ser protegidas indistintamente à sua destinação, qualidade ou mérito. Entretanto, um sistema jurídico não é composto apenas da lei especializada, e do tratado internacional que a influenciou. O sistema é mais amplo, e, por essa razão, não nos parece correto afirmar que toda forma de expressão, ainda que exemplificada no rol do artigo 7º deva de pronto ser considerada obra literária, artística ou científica. Estas para se abrigarem sob o sistema do Direito de Autor deverão ter forma original e função estética destacável no caso da presença também da função utilitária.

Sobre a proteção das obras científicas, destacam Oliveira e Willington115 que “não restam dúvidas quanto ao acolhimento no Direito Autoral dos projetos relativos à geografia, topografia, engenharia, arquitetura e cenografia”.Porém, pairam dúvidas sobre a melhor interpretação a ser dada ao termo ciência. Os autores se socorrem das decisões administrativas do Conselho Nacional de Direito Autoral – CNDA para adotar a corrente que confere ao termo “ciência” o significado referente ao campo da ciência stricto sensu.

113Deliberação nº 31 – 1ª Câmara, Aprovada em 27.05.1981 Processo nº 616/80. Interessado: Gilberto Blas Bifulco. Assunto: Pedido de Registro do “Conjunto Normativo para Segurança”. Relator: Cláudio de Souza Amaral in Deliberações do Conselho Nacional de Direito Autoral.1980-81, 3º Ed. Revisada, Minc/CNDA: Brasília, 1984 apud JESSEN, Henry. Direitos intelectuais. Rio, de Janeiro: Ed. Itaipu, 1967. p. 55.

114O CNDA – Conselho Nacional de Direito Autoral em muito colaborou para a interpretação da Lei 5.988 de 1973, em vigência durante sua existência, oferecendo decisões administrativas importantes que hoje podem compor a doutrina de Direito de autor.

115OLIVEIRA, J. N.; WILLINGTON, J. Anotações à Lei do Direito Autoral: Lei 9.610/98. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 26-27.

Podem ser considerados como obra científica os livros ou escritos que contenham, a expressão, elucidação ou crítica dos resultados, real ou pretendidamente, obtidos pela ciência, em todos os seus ramos, inclusive as obras didáticas e as lições de professores. Constitui crime violar direito de autor de obra científica116. Já em 1979, no Supremo Tribunal Federal, concluiu o Ministro Cordeiro Guerra117, em discussão sobre os limites de citação de obra científica no bojo de bula de remédio pela legitimidade da referencia feita na bula ao trabalho cientifico, independente de remuneração, posto que o Direito Autoral, nos trabalhos científicos protege as formas de expressão, e não as conclusões cientificas ou seus ensinamentos, que pertencem a todos, no interesse comum.

116Cf. OBRA Científica. JusBrasil. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/topicos/288846/obra- cientifica>. Acesso em: 12 ago. 2012. E, vide decisão: DIREITO AUTORAL Pedido de indenização por danos materiais e morais Ação procedente em parte Reprodução indevida de obra científica (curso apostilado de telemarketing) [...] (9098507672005826 SP 9098507-67.2005.8.26.0000, Relator: João Carlos Saletti, Data de Julgamento: 26/07/2011, 10ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 05/08/2011) e a decisão: [...] AÇÃO DECLARATÓRIA DE VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL. [...] USO INDEVIDO DE OBRA CIENTÍFICA EM 'SITE' ESPECIALIZADO. CASO DECONFIGURAÇÃO DE PLÁGIO. CULPA CARACTERIZADA. DANO EXISTENTE. AÇÃO PROCEDENTE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO. INDENIZAÇÃO. DIREITO AUTORAL. DANO MORAL. [...]. (9129811842005826 SP 9129811-84.2005.8.26.0000, Relator: Vito Guglielmi, Data de Julgamento: 29/09/2011, 6ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 06/10/2011).

117STF. 2ª TURMA-RJ, 1979. RECURSO EXTRAORDINÁRIO n° 68.705-9 RELATOR: MINISTRO CORDEIRO GUERRA. RECORRENTE: CYANAMID QUIMICA DO BRASIL LTDA. RECORRIDO: AROLDO MINITI E OUTRO.