• Nenhum resultado encontrado

A obra literária de Vasco da Gama Rodrigues molda-se pela interpretação mística e espiritual das raízes ancestrais dos portugueses em quem, através do mito, do símbolo e da profecia, procura encontrar um desígnio profético anunciando o “Reino do Amor, ou seja, o Reino do Paracleto”.291

Gama Rodrigues está muito próximo da linha profética Joaquimita e a sua linha utópica e messiânica emerge na “metempsicose” ou transcendência das raízes mais remotas da nacionalidade. Agostinho da Silva mostra Vasco da Gama como um místico, “isto é, convicto que o possível é mais vasto que o real,

287 Rodrigues, Vasco da Gama (1972), As Três Taças, Tipografia Ideal, Lisboa

288 Rodrigues, Vasco da Gama (1961), Os Atlantes, Tipografia Ideal, Lisboa, [Exemplar fotocopiado pela editora

Roger Delraux em 1980, Lisboa]

289 Quadros, António (1987), A Filosofia Portuguesa de Bruno à Geração do 57 seguido de O Brasil Revisitado,

Instituto Amaro da Costa, Lisboa. (online) consultado em 02.08.2016. Disponível em: http://antonioquadros.blogspot.pt/p/escola-do-porto.html

290 Rodrigues, Vasco da Gama (1983), Carta (manuscrito) dirigida a António Quadros (1983.06.03), (02 fólios),

Lisboa. FAQ., cx. 0009, cod. PT/FAQ/AQ/01/001/0283/00001

e a ele aderindo em suas crenças, raciocínios e vida, respeita a ciência, mas ultrapassa-a, e acha, por outro lado, que o divino é mais importante que o bancário”292.

As três obras literárias que apresentaremos em seguida, segundo A. C. Teixeira que realizou o prefácio da última obra do poeta “O Cristo das Nações”, são um “tríptico” que se completa e esta última produção literária consagra um “Quinto Império já referenciado por Daniel e da Idade do Espírito Santo, que outra não é que a do culminar na derradeira Terceira Taça”293.

O messianismo na sua obra poética explana um trajeto Crístico genuíno que transforma Cavaleiros de Cristo ou da Ordem de Avis em hábeis nautas que “mapeiam o globo de uma ponta a outra” lançando “as bases da Nova Ciência” transportando consigo a palavra do messias até ao outro lado do mundo, “cumprindo nada mais do que a velha palavra de Ourique” através “da proteção do Anjo Guardião”294

A utopia em Gama Rodrigues está presente na ideia de um “Cristo-Nação” para “todas as Nações” onde nação e Cristo se fundem num propósito único, o da “salvação humana” através de uma “Alma Lusa ou de Luz” capaz de emergir e fundar um “Novo Cosmos - A Atlântida” ou “O Advento do Espírito Santo”. 295 Segundo A. C. Teixeira “não é, de facto, algo utópico, uma vez que é o regresso ao estado original, primordial e puro, que a humanidade tivera antes da queda”296. Gama Rodrigues considera esse regresso estruturando-o em várias fases denominadas Lusitânia e Portugal.

Os Atlantes (1961)

A obra poética Os Atlantes é acima de tudo uma revelação interpretativa da história profética de Portugal. Segundo explica o Professor José Luís Conceição Silva, amigo e confesso confidente do autor desta obra, debatendo muitas ideias com ele, esta produção literária contém “todas as ideias mestras originais do poeta e presta-se, por isso, a uma tentativa de interpretação geral daquilo que eu chamo a sua visão profética de uma missão portuguesa no mundo”.297

Esta produção literária está dividida em três capítulos; O primeiro capítulo chama-se “Lusitânia” em que se inserem três partes intituladas “O Amor de Luzia”, “As Três Batalhas” e “O rapto da Luzia”; O segundo capítulo chama-se “Portugal” correspondendo também a três partes intituladas “Letargia”, “Vigília” e “Consciência”; por fim o terceiro e último capítulo que se chama “Atlântida” e tem três partes intituladas “A voz do Tempo”, “O Príncipe Descobridor” e “O Encoberto”.

Segundo Conceição Silva, os avanços que a humanidade está a ter são essencialmente eficazes no domínio da “matéria”, todavia esse avanço, segundo o mesmo, é “acompanhado lamentavelmente” pela perda de valores morais e espirituais. Num ambiente de lutas sociais e questões entre nações, segundo o

292 Rodrigues, Vasco da Gama (1995), O Cristo das Nações, Tertúlia, Lisboa 293 Rodrigues, Vasco da Gama (1995), O Cristo... p. 11

294 Rodrigues, Vasco da Gama (1995), O Cristo... p. 11 295 Rodrigues, Vasco da Gama (1995), O Cristo... p. 12 296 Rodrigues, Vasco da Gama (1995), O Cristo... p. 10

297 Rodrigues, Vasco da Gama (1961), Os Atlantes, Tipografia Ideal, Lisboa, [Exemplar fotocopiado por Roger

autor, “sente-se a aproximação do caos e não se vislumbra em parte alguma um princípio de sã reacção a este estado das coisas, capaz de trazer um pouco de esperança num melhor futuro para os homens”298. O futuro imprevisível e o comportamento da sociedade levam Conceição Silva a afirmar que Vasco da Gama Rodrigues transmite a mensagem profética neste sentido regenerador da humanidade, acreditando numa reação da “alma lusitana” ao trajeto decadente em que a sociedade caminha.

Nas seguintes passagens da obra constatamos esta intenção espiritual e mística de regeneração de uma sociedade que se encontra decadente, evocando os seus feitos mais remotos. No primeiro capítulo, “Lusitânia”, a que corresponde a parte intitulada “O Amor de Luzia” o poeta escreve: “Neste Lugar - começo e fim - / Do formoso e rico lar da Princesa Europa, / Viriato - audaz guerreiro - / Conquista montes e vales sem par. / E galgando ufano terras opulentas, / Canta alegre, como um rouxinol, a fortuna, / Preso de Amor pela divina Luzia, / A Senhora aos pés de quem se humilha a Treva.”299

Na terceira parte do segundo capítulo intitulada “Consciência” Gama Rodrigues escreve: “O que não poude Henrique haver, / Houve a golpes de rude força o Filho. / Despertando-lhe a memória vaga o lúcido galo, / Pouco a pouco a secreta Missão realiza, / Até que sua cabeça ao extremo da ibéria a encosta. / É o carneiro encarnado, seu profundo recorte que ali fica, / Preso ao encanto duma sinfonia, vinda aos longos do Mar, / Que o torna indiferente aos rogos firmes, constantes, de Catela.”.300

Para o autor, a primeira dinastia reinante em Portugal opera a missão Crística, que explora o primeiro passo para atingir o “Reino do Amor” ou a “Atlântida Oculta”. O mar é o itinerário místico e espiritual que encaminha a glória deste povo “protegido”. A crença messiânica na conquista, acaba por eternizar os feitos coletivos do povo português. Gama Rodrigues enaltece e solicita o retomar do espírito e mística que triunfaram outrora.