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O conhecimento torna a alma jovem e diminui a amargura da velhice. Colhe, pois, a sabedoria. Armazena suavidade para o amanhã.

Leonardo da Vinci, s.d.

Bom jogo posicional, mudança de atitude no momento de perda de posse de bola, divisão dos jogadores entre os que participam activamente no ataque e os que salvaguardam o momento de perda de posse de bola e uma evoluída cultura táctica individual são todas condições para realizar uma boa transição ataque-defesa, integralmente assumidas pelos treinadores e autores que consideram importante conservar o equilíbrio defensivo mesmo quando se detém a posse de bola.

No entanto vejamos mais detalhadamente como vários treinadores implementam nas suas equipas o equilíbrio defensivo no ataque. Nomeadamente, quantos jogadores consideram ser necessários para manter esse equilíbrio, se os colocam em função dos jogadores mais avançados

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adversários ou do espaço, se os jogadores são sempre os mesmos em função dos seus postos específicos ou se podem alternar, entre outros aspectos.

Guilherme Oliveira (2003a: 2) argumenta que “a equipa tem algumas preocupações em termos de organização no sentido de, por um lado, ser possível atacar como se pretende e, por outro, mal se perca a posse de bola, ter possibilidade de a recuperar com uma certa rapidez.” Para ter sucesso o mesmo treinador preconiza uma ocupação de espaços que permita manter alguma qualidade ofensiva e, em simultâneo, recuperar facilmente em situações de perda da posse de bola. A regra fundamental é o preenchimento dos espaços que têm que ser ocupados mesmo em caso de trocas posicionais. O actual treinador adjunto da selecção nacional explica (2003: 2): “se existirem, em termos ofensivos, espaços não ocupados, pode acontecer que o adversário, ao ganhar a bola, consiga fazê-la entrar em zonas onde não temos jogadores que logo de imediato a possam tentar recuperar. Estamos a falar de um conjunto de preocupações que têm a ver com uma ocupação racional dos espaços (ainda que com a possibilidade de permutas entre jogadores), ocupação essa que permite, tanto em termos ofensivos como defensivos, termos uma certa qualidade ao nível da organização de jogo.

Um dos pressupostos para se jogar bem defensivamente é a abordagem ao primeiro tempo defensivo, ou seja, a perda da posse da bola. Nesse momento é importante ter um ou dois jogadores, dos mais próximos do local onde se perdeu a posse de bola, que imediatamente sustenham o ataque do adversário e permitam um reagrupamento dos colegas e nunca procurar ser eficaz através de pressões individuais ou por ondas. Nos princípios defensivos específicos do futebol – a contenção num primeiro tempo, depois as coberturas defensivas e o fecho das linhas de passe mais importantes, e equilíbrio e a concentração espacial –, aliados com uma dinâmica que sirva os propósitos da equipa é que se encontra a resposta (Garganta, 2003).

Em organização ofensiva o primeiro interesse foca-se no ataque e no consolidar o que queremos fazer para chegar ao golo mas também devemos considerar a oscilação dos jogadores de zonas onde a probabilidade da bola ser jogada pelos seus colegas de equipa é menor, como meio de fechar esses

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espaços que poderiam ser utilizados pelos adversários para contra-atacar quando recuperassem a bola. Assim, no treino, não se deve esquecer os momentos de alternância da posse de bola o que leva os jogadores a adoptarem um posicionamento que não seja fundamentado exclusivamente no momento ofensivo, mas também tendo em conta a possível perda da bola (Leal, 2003).

José Gomes (2003: 2) explica-nos detalhadamente o modo como José António Camacho concebia o equilíbrio defensivo no Benfica: “quando estamos a atacar, já devemos estar preocupados em como é que vamos defender, caso percamos a bola. E, a este nível, é fundamental a colocação dos dois médios mais recuados e dos quatro defesas. Por exemplo, se um lateral subir no terreno e ficarem só três defesas, aquilo que tem que acontecer é os dois médios mais recuados ficarem em situação de cobertura e os três defesas ficarem mais recuados, para que os cinco, numa situação de contenção e concentração, consigam parar um contra-ataque.” Para o ex-treinador adjunto do Benfica, o objectivo da colocação dos jogadores é estar em superioridade posicional e temporal (mais até do que em superioridade numérica) no momento de perda da posse de bola e, assim, o seu posicionamento é sempre realizado em função da bola.

Essa relevância do jogo posicional é também reclamada por Rui Quinta (2003: 6), sendo que na sua perspectiva, confrontado sobre quais jogadores que participam no equilíbrio defensivo “não faz sentido colocar as coisas da seguinte forma: este médio-centro só ataca e aquele só defende. Não! Desde que se proporcione, eu quero que as acções ofensivas sejam participadas por todos, desde que de uma forma equilibrada.”

Em síntese, parece confirmar-se que o fundamental no equilíbrio defensivo no ataque é a existência permanente de um equilíbrio posicional na equipa, o qual se traduz na ocupação cuidada e inteligente dos espaços no ataque, no sentido de permitir uma reacção rápida e eficaz à perda da posse de bola. Constitui-se, no fundo, na garantia da permanente gestão colectiva do espaço e do tempo no jogo, com vista ao domínio dos momentos de perda da posse de bola (transição ataque-defesa). Desta forma, esta questão do

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equilíbrio defensivo no ataque, deve exigir uma lógica de comportamento zonal pois, apenas dessa forma, a equipa se pode manter conectada.

O equilíbrio defensivo no ataque é uma gestão colectiva uma vez que, apesar de alguns jogadores, pelos postos específicos que ocupam, poderem desempenhar funções mais importantes relativamente a esta salvaguarda, esta nunca pode deixar de ser uma questão colectiva. É a equipa como um «todo» que o assegura. (Quinta, 2003; Amieiro et al. 2006).

Carvalhal (2003: 1) surge em concordância esclarecendo que pretende “que os espaços estejam ocupados racionalmente. Nós damos uma grande margem de flexibilidade, em termos ofensivos, aos nossos jogadores e isso pressupõe que eles façam muitas trocas. Dentro das trocas que possam fazer (as quais são treinadas), quem assume posições de equilíbrio tem que estar a equilibrar a equipa. Agora, tanto pode ser um médio como, circunstancialmente, um avançado a fazer um equilíbrio, por estar, momentaneamente, nessa posição. Portanto, há sempre jogadores que estão preparados para equilibrar a equipa, mas não discriminamos que é o A, o B e o C. Alguns jogadores, pelas suas posições naturais, cumprem mais essas funções, mas, como privilegiamos muitas trocas e as situações são abertas, em função das jogadas, da posição da bola e do posicionamento do adversário e dos nossos jogadores, esse equilíbrio tem uma componente aleatória muito grande, ainda que não deixe de ser treinado e organizado.”

O equilíbrio defensivo não deve ser algo totalmente predefinido, dado que devemos contemplar o maior ou menor perigo que nos pode causar o adversário pelo número de jogadores que coloca para a sua transição ofensiva (Queiroz, 2005).

Quanto ao número de elementos a colocar Carvalhal (2006) não prescinde de ter sempre superioridade numérica em relação ao adversário e para além desses jogadores, define dois jogadores a cobrirem à largura o espaço do campo, o mais aproximado possível do apoio ao ataque, numa posição que lhes permita tanto apoiar o ataque como apoiar defensivamente a equipa. Embora salvaguardando que os elementos colocados em equilíbrio defensivo dependem sempre do adversário, o actual treinador do Marítimo SC,

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aponta como regra geral três defesas à largura, ocupando racionalmente o espaço e dois médios como suficiente.

No sector defensivo os centrais e um lateral equilibram a liberdade concedida ao outro lateral, não sendo uma situação muito mutável. No meio campo esse facto já não acontece com maior liberdade para se fazerem permutas, no entanto, caso exista um médio claramente ofensivo, com grande capacidade de último passe e penetração, ele nunca vai ficar numa posição de médio defensivo, aquele que assume uma postura mais posicional no equilíbrio defensivo (Carvalhal, 2006).

Rui Quinta (2003: 6) tem uma opinião idêntica relativamente ao posicionamento dos jogadores do sector defensivo em organização ofensiva: “Não quero ver, por exemplo, os meus dois laterais em profundidade. Se o lateral do lado da bola participar na jogada, os dois centrais e o lateral do lado contrário ajustam ligeiramente para o corredor por onde a jogada se está a desenrolar. Isto é o quê? É contemplar a eventual perda de bola. Eu quero sempre pelo menos três homens na linha defensiva quando estamos a atacar.” Por sua vez, Guilherme Oliveira (2003a: 2) também julga ser imprescindível manter três jogadores do sector defensivo, no entanto, não cerra a subida de um dos elementos deste sector aos laterais: “na minha equipa é impensável não existirem sempre três defesas na estrutura defensiva. Apenas permito que suba um defesa, nunca podendo subir dois ao mesmo tempo. Para além disso, certos jogadores que fazem parte da organização do meio campo têm que estar posicionados em determinados locais de forma a terem, simultaneamente, um papel ofensivo e defensivo.”

Quanto ao número de jogadores a permanecer no equilíbrio defensivo no ataque Guilherme Oliveira (2006) não atribui um número fixo, embora, prepare uma estrutura quase fixa, retirando alguma mobilidade (relativamente aos restantes companheiros de equipa) aos jogadores que participam nessa estrutura. Esses jogadores são a base de equilíbrio de toda a equipa procurando ter um jogo de posições sempre correcto e tendo como principais intervenientes os centrais, o pivot e um dos laterais que não sobe (Guilherme Oliveira, 2006).

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2.4.3 – Transição Ataque-Defesa: uns breves instantes, uma