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Parte III. Mediação Sócio-Educativa: o desenvolvimento de um Projecto de Estágio em

3.1. Os sentidos de um projecto de intervenção em contexto desportivo

3.1.2. Organização do Espaço Aberto

A organização do espaço revelou-se fundamental para a relação educativa que se estabeleceria com as crianças e jovens, uma vez que, esta organização condiciona de forma

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positiva ou negativa o relacionamento e envolvimento que se cria com os sujeitos, desejou-se então organizar um espaço que desenvolvesse «condições favoráveis à cooperação» (Piletti, 2003:25).

Inicialmente a sala encontrava-se em forma de rectângulo, o que na nossa opinião não permitia o contacto desejado a ter com as crianças e jovens, não tornando possível criar um maior contacto e diálogo. Na disposição de rectângulo as crianças e jovens permaneceriam «imóveis [nas] suas carteiras, realizando (…) o trabalho que lhes é imposto». Sendo que circular-se-ia pela sala «controlando e supervisionando» as crianças e jovens. Assim, se esta disposição se tivesse mantido acabaria por conceber uma «educação centralizada» em quem “supervisiona”, onde ser-se-ia vista como ser superior, investida de autoridade, «a quem cabe tomar todas as decisões e impor um sistema de trabalho [em que] o resultado [seria] o individualismo, a passividade e a submissão» das crianças e jovens (Piletti, 2003:11).

Como o objectivo para o espaço assentou em estabelecer proximidade com as crianças e jovens, pensou-se numa disposição que o permitisse e onde também fosse possível as crianças e jovens estarem mais isoladas, quando tivessem que estudar, sendo possível acompanhar-se esse estudo individualmente, ou seja, usou-se «o chamado “modo individual” […] que recria de certo modo o espaço doméstico onde coabitam diferentes pessoas com tarefas diferentes e simultâneas» (Barroso, 1995:70). Portanto, este modo permitia que as crianças que necessitassem de estudar pudessem estar isoladas e ser acompanhadas, enquanto as restantes poderiam realizar outras tarefas, também com acompanhamento.

Assim, a sala deixaria de ficar em forma de rectângulo (Apêndice 2 – Imagem 1), sendo que, se optou por encostar 3 mesas à parede, com o objectivo destas mesas ficarem para as crianças e jovens que pretendessem realizar os TPC ou estudar mais isoladamente e sem grande perturbação. As outras 4 mesas ficaram encostadas duas a duas no centro da sala (Apêndice 2 – Imagem 2). Esta disposição da sala revelou-se positiva, porque permitiu acompanhar todas as crianças e jovens praticamente ao mesmo tempo e eles/as conseguiam estabelecer entre si e connosco um maior contacto. Desta forma, conseguia-se estimular «a comunicação, (…) o trabalho cooperativo e a participação [não só entre eles/as, mas também entre eles/as e nós, criando uma relação] de igual para igual com os [/as] educandos [/as], como alguém que, tendo mais experiência, pode orientar a aprendizagem. [Ou seja, nesta disposição] os objectivos da educação [são] a solidariedade, a participação e a independência» das crianças e jovens (Piletti, 2003:11).

De facto, esta disposição levou não só a uma maior proximidade entre nós e as crianças e jovens, como proporcionou uma interacção positiva entre crianças e jovens, facilitando

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também quando se sugeria que se ajudassem entre eles/as, pois «o acto de ensinar […] supõe a reciprocidade, condição básica da cooperação, e atesta o processo de comunicação» (Souza, 2001:64). Portanto, o “acto de ensinar” não esteve apenas presente em nós e eles/as, mas também entre eles/as, pelo facto de se acreditar que ao ajudarem-se mutuamente estão a enriquecer os seus conhecimentos escolares, assim como a enriquecerem-se, enquanto seres humanos.

As mudanças nos espaços são muitas vezes difíceis de acolher, na medida em que constituem também mudanças em termos de rotinas, dinâmicas e práticas que neles ocorrem, implicando «transformações inequívocas no modo como se organizam os espaços e os tempos» que neste caso seriam dedicados a um processo educativo, «na qualidade dos apoios que se disponibilizam neste âmbito e também na gestão dos recursos e dos dispositivos pedagógicos que se utilizam» (Trindade, 2003b:60). No caso que aqui referimos estas questões tornaram-se visíveis por alguma resistência sentida numa fase inicial às transformações espaciais que o Projecto Espaço Aberto implicava. Sendo uma sala multiusos e aquele projecto apenas mais uma dinâmica havia que fazer ajustamentos e frequentes alterações da disposição de mobiliário e materiais para que tudo pudesse funcionar. Esta organização nem sempre funcionava da melhor forma exigindo adaptações da nossa parte. O processo de negociação em torno da organização da sala onde funcionava o Espaço Aberto acabou por ser um elemento interessante de reflexão. Por um lado, obriga-nos a pensar sobre o modo como se podem gerir diferentes necessidades, interesses e até poderes. Por outro lado, foi igualmente um indicador da evolução da nossa presença e identidade na Dragon Force.

Ao longo do tempo foi possível organizar a sala de acordo com aqueles que eram os objectivos presentes no projecto e que exigia modos de funcionamento específicos. Se numa fase inicial foi necessária uma argumentação que assentava na ideia de que era essencial um espaço para as crianças e jovens estarem satisfeitos/as e sentirem que ali faziam parte da

Dragon Force num outro sentido, sendo eles e elas igualmente produtores desse mesmo

espaço.

«Propuseram-nos colocar as mesas todas duas a duas, para que depois eles pudessem apenas separá-las e dessa forma ficava numa configuração aceitável para quem usa o espaço antes de nós, mas infelizmente a configuração por eles proposta não nos agrada, e portanto, diariamente alguém tem que ajustar a sala às necessidades do espaço aberto e às restantes actividades programadas para aquela sala, admito que não é uma tarefa fácil para quem tem que ajustar a sala às necessidades, mesmo para nós seria mais cómodo se a sala pudesse ficar sempre ou quase sempre com a configuração que planeamos. Mas de facto, não podemos dispensar de colocar a sala como pensamos que esta funciona melhor para as crianças e jovens, e pensamos também que quando se assumem compromissos, como abrir um espaço para as

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crianças e jovens temos que ser capazes de lhes proporcionar bem-estar, e um ambiente que os agrade e fascine para frequentar o espaço aberto» (NT3).

Deste modo, a sala foi passando a ficar sempre na configuração proposta, sendo que, neste momento essa disposição só é alterada quando existem reuniões. De facto, pensa-se que isso facilita tanto o trabalho da equipa de manutenção, assim como o nosso trabalho se torna mais cómodo e estável. Chegar a este ponto significou, também simbolicamente, que foi sendo reconhecida identidade e pertinência ao Espaço Aberto e ao trabalho desenvolvido.