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Parte V. Reflexões Teóricas e Metodológicas

5.1. Questões teóricas emergentes

5.1.3. Relação entre a Escola e a Família

Sendo a escola considerada por excelência a instituição da educação, torna-se evidente que esta ocupe um lugar central na educação/ formação dos sujeitos. Contudo, defende-se uma educação libertadora, que ensina a ter consciência dos seus actos. Ou seja, as crianças e jovens «através do diálogo, tornam-se capazes de ver a sua situação e como transformá-la. [Os sujeitos … libertam-se] em grupo. À medida que a reflexão e a acção [se encontram] intimamente ligadas, pronunciar a palavra verdadeira implica transformar o mundo» (Gomes, 2005:56).

Este conceito de educação permite compreender que a escola deve desencadear nas crianças e jovens a autonomia necessária para que estes/as sejam capazes de transformar a realidade que os/as envolve e não apenas reconhecer que deve existir uma mudança, ou seja, a educação deve ensinar os/as seus/suas alunos/as a reflectir e a agir. Assim, esta linha de força adquire toda a relevância, uma vez que a ligação entre a escola e a família esteve sempre muito presente no desenvolvimento deste estágio, isto em dois pontos fundamentais que assentam na importância que a família atribui ao Espaço Aberto, enquanto local que estabeleceria a ligação com a escola, através da realização dos TPC e do apoio ao estudo.

«tanto o D como o R tinham trabalhos de casa para fazer, portanto, começamos por realizar os trabalhos de casa» (NT6).

E também no Projecto Bolsa de Mérito, onde a mediação com a escola era um ponto fundamental do projecto, estabelecendo-se durante todo o processo o contacto com a família. Esta relação entre a Escola e a Família no Projecto Bolsa de Mérito será desenvolvido posteriormente, ainda neste capítulo.

A questão do apoio na realização dos TPC e da importância atribuída por parte da instituição desportiva à realização dos mesmos fica a dever-se à necessidade que a família apresenta para ser apoiada. Ou seja, se por um lado, e como já foi referido anteriormente a elaboração dos TPC no Espaço Aberto não foi directamente uma prioridade deste projecto,

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uma vez que, desejava alcançar objectivos educativos, que embora estando relacionados com a escola não se dirigiam propriamente aos conteúdos escolares. Por outro, a instituição

Dragon Force acolhe por parte das famílias o pedido de auxílio na elaboração dos TPC, isto

por falta de tempo e para uma melhor gestão do tempo livre das crianças, após a escola e para que as famílias se possam libertar um pouco deste compromisso de estarem junto dos/as seus/suas filhos/as a estudar e a realizar os TPC, no entanto, fazendo com que as crianças cumpram na mesma o seu compromisso da realização dos mesmos e como consequência destes factores, há uma solicitação ao Espaço Aberto para que se preste esta colaboração, que é dada como uma forma de corresponder às expectativas e necessidades do contexto.

Esta é uma questão que deve ser debatida em termos sociais e familiares, uma vez que, desde a década de 80, que se recomenda «aos [/às] professores [/as] que estabeleçam uma colaboração estreita com as famílias, a fim de situar melhor as crianças no seu ambiente e suscitar o envolvimento dos pais e encarregados [/as] de educação nas actividades escolares dos [/as] seus [suas] educandos [/as]» (Diogo, 1998:21). E de facto, acredita-se que o ideal seria que os pais ou encarregados de educação acompanhassem atentamente o percurso dos/as seus/suas filhos/as na Escola, contudo, por diversos motivos, essencialmente temporais, nem sempre é possível aos pais dar o acompanhamento que desejam e anseiam.

Isto traduz-se, por exemplo, na tarefa da realização dos TPC, onde os pais solicitavam que os mesmos se realizassem no Espaço Aberto, de modo a simplificar o seu quotidiano e a não terem, assim que chegados a casa de encontrar tempo para auxiliar os/as seus/suas filhos/as nessa tarefa, como se pode compreender pelo seguinte excerto:

«O AC […] vinha muito animado, porque pela primeira vez tinha trabalhos de casa para fazer. Então dissemos-lhe para se sentar que o ajudaríamos a realizar os trabalhos de casa, e o pai disse que gostaria de ver como é que ele está a acompanhar as aulas, então sugerimos que ficasse ali connosco para ver o que ele tinha para fazer, mas […] o pai do AC é muito pouco paciente, tem um tom de voz muito alto e estava sempre a gritar com o menino por causa dos trabalhos de casa, dizendo-lhe que ele tem a mania que sabe tudo, que pensa que ninguém tem que o ensinar, que na escola deve ser uma desgraça, virando-se para mim e dizendo: “ele não vai dar nada na escola, já viu como ele é!”. Eu tentei apaziguar a situação! […]» (NT20).

Consegue perceber-se que para além da falta de tempo, por vezes existente, por parte dos/as encarregados/as de educação, nem todos/as têm a paciência e sensibilidade necessária para acompanhar as crianças na realização desta tarefa, quase diária. É interessante analisar-se esta questão do ponto de vista de que «os “deveres” parecem ser, por vezes, a longa mão dos professores avaliando os pais» (Sá, 2002:67). Ou seja, encontra-se aqui a perspectiva de que

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será por vezes, esta a forma encontrada pela escola de tentar envolver os pais na educação? De facto, parece que sim, e se assim for, pensa-se que este é um meio viável para que os pais não percam por completo, o controlo do que se passa na escola, pois «duas décadas de investigação em Ciências da Educação têm demonstrado que o envolvimento parental na vida escolar contribui para melhorar significativamente as performances sociais e académicas dos alunos» (Diogo, 1998:21).

Contudo, deve salientar-se que não se pode generalizar a postura verificada anteriormente, no que respeita ao acompanhamento educacional e escolar, por parte dos pais, junto das crianças e jovens que frequentavam o Espaço Aberto, como se pode perceber com o que se apresenta de seguida:

A mãe do C transmitiu «que ele sempre tinha sido muito bem comportado na escola e também queria que ele tivesse o mesmo tipo de comportamento naquele espaço. Nós aproveitamos para dar os parabéns à mãe do C, porque de facto é um menino muito educado na forma de falar, de reagir e de estar […]. Considero que esta atitude […] por parte da mãe do C demonstra realmente que o C é um menino bem acompanhado pelos pais» (NT10).

Assim, e para concluir este sub-capítulo pode consolidar-se que a relação entre a Escola e a Família para além de ser uma relação necessária e benéfica, principalmente para as crianças, é também uma relação que no caso concreto deste estágio, assenta essencialmente na relação com os saberes escolares e com o acompanhamento necessário a dar às crianças, para consolidarem esses mesmos saberes. Com esta questão de as crianças trazerem TPC pode compreender-se que a Escola consegue assim e «cada vez mais [emitir] uma base de juízo sobre os próprios pais, sobre os seus recursos económicos, mas também culturais, sobre os seus modelos educativos, etc.» (Saraceno, 1997:152), uma vez que, tenta através do envio de TPC perceber se os pais acompanham os/as filhos/as no seu percurso escolar, o que por vezes, dificulta o papel dos pais, que enquanto pais encontram nos TPC e nas actividades extra- escolares uma dificuldade de gestão do tempo, no entanto, não devem esquecer que realizar actividades com os/as filhos/as faz parte do seu papel de serem pais.