• Nenhum resultado encontrado

3.1.2.1.2 Organização Politica

Os integralistas defendiam um “regime anti-individualista”, para contrapor à ideologia revolucionária “que - como acusa Leão Ascensão - colocou os indivíduos, feitos cidadãos eleitores, em face do Estado, sós e isolados, sem os enquadrar em qualquer dos grupos que eles naturalmente deveriam constituir, derivados dos laços de sangue e das afinidades de vizinhança, ou de profissão: a Família, a Freguesia ou o Município, a corporação ou o grémio profissional. O individualismo, que informa os regimes politicos saídos da Revolução Francesa, desconheceu esses grupos naturais”130.

Daí se parte para o ataque à Democracia, que estruturalmente tem a ver com o indivíduo e com a manifestação da sua vontade livre e soberana.

Os integralistas eram profundamente antidemocráticos, pois para eles a democracia, com o seu cariz internacionalista, descaracterizava qualquer povo. Portugal tinha aderido aos ideais estrangeiros e daí a razão da nossa decadência.

A Democracia criava ainda o que chamavam a “despatriatização” do Estado a todos os níveis, pelo que o país perdia a sua soberania e qualquer crise internacional tinha óbvios reflexos internos.

Vimos já que os integralistas eram visceralmente anti-democratas e anti- parlamentares. A Monarquia orgânica e tradicionalista é “irredutivelmente anti- parlamentar”, escreveu Leão Ascensão, acrescentando que o Parlamento é condenado pelo Integralismo “pelo vício da sua constituição e origem”.

“O sufrágio universal é a guerra civil, é a desordem dos espíritos, é a demagogia, é o triunfo dos incompetentes”131, refere ainda, para vincar que, mesmo sem considerar a sua origem, o Parlamento, assembleia politica deliberativa, seria um erro funesto. O Governo de muitos não é bom, relembra, com Homero, para advogar que assembleias deliberativas podem admitir-se quando as suas atribuições se restrinjam a interesses particulares limitados, como é o caso das assembleias profissionais e locais.

130

_______________________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________________ 62

O sufrágio universal, “além de profundamente anárquico”, era considerado “injusto”, porque, através dele, “o voto do homem instruído e o do ignorante têm o mesmo valor, ficam no mesmo plano”. O parlamentarismo era também considerado “um regime de irresponsabilidade geral, em que o poder está dividido e é ilimitado”.

Assim, para os integralistas a origem do poder tinha fundamentos metafísicos e religiosos e era corporizada na Monarquia e no Rei.

Ao nível da representação politica, aceitavam apenas a eleição por sufrágio na esfera restrita do poder municipal.

Por outro lado, defendiam a descentralização como a politica mais adequada ao espírito da Monarquia Integral, permitindo a salvaguarda das liberdades corporativas, eclesiásticas, artísticas, científicas, bem como das autonomias municipais e administrativas e o apego às regalias, às tradições e aos costumes locais132.

Os órgãos da Monarquia, segundo os integralistas (v.g. Cartilha

Monárquica), eram a Câmara Municipal, a Junta Provincial, a Assembleia Nacional

ou Cortes, os Conselhos Régios, o Ministério e o Rei.

A Câmara Municipal devia ser a representação de todos os interesses do agregado, dela devendo fazer parte delegados de todas as freguesias, das associações de classe ou corporações, dos sindicatos, o chefe militar, o director da escola mais importante, etc. Deste modo, “a representação é económica, técnica ou profissional e nunca politica”, como quer Alberto Monsaraz133.

A Junta Provincial seria constituída por delegação de todos os municípios da circunscrição, pelos representantes dos sindicatos patronais e operários, pelos directores das escolas e dos institutos de grande utilidade pública, “realizando-se mais perfeitamente o fim da representação natural que já vimos estabelecida para o município”134.

131 Ibidem, p. 120. 132

CUNHA, Norberto, Tradição e Tradicionalismo no Integralismo Lusitano., p. 18.

133 V.Cartilha Monárquica, p. 15. 134 Ibidem, p. 17.

____________________________________________________________________________________ 63

Em lugar dos partidos e dos interesses particulares, como sucedia na República, os integralistas propunham uma Assembleia Nacional ou Cortes, composta por representantes das províncias, dos municípios, das escolas, das corporações, da Igreja, da força armada, dos tribunais, além dos antigos representantes da Nobreza, do Clero e do Povo, enfim, uma assembleia orgânica, representante da Nação orgânica, com funções predominantemente técnicas e consultivas. Esta assembleia seria o centro onde todos os legítimos interesses se representavam, por meio dos seus delegados naturais, cuja designação era feita por cada classe, depois de devidamente organizada.

Os Conselhos Régios ou “Conselhos d’El-Rei”, como lhes chama Pequito Rebelo, funcionavam como organismos técnicos especializados junto do Soberano, sobretudo com o objectivo de apoiar o ofício de legislar. “Nos Conselhos d’El-Rei existem as várias competências profissionais, as quais, depois que a Assembleia Nacional expôs os seus desejos, sentimentos e necessidades e o soberano afirmou a sua vontade, desenvolvem a sua inteligência na confecção esclarecida das leis”- como esclarece Pequito Rebelo135.

O Rei escolhia o seu conselho dentre os nomes de maior prestígio dentro de cada classe profissional, sendo os seus membros vitalícios.

O Ministério era, naturalmente, composto por ministros, afinal os intérpretes junto das Cortes das propostas dos Conselhos do Rei. No ministério não existe solidariedade politica: cada um responde pelo que faz. A exoneração de um ministro não acarreta, por isso, a demissão dos seus colegas.

Finalmente, a coroar a organização politica da Monarquia Integral eis a figura do Rei. O Poder não era partilhado e estaria nas mãos do Rei, que governaria através dos seus ministros e de conselhos técnicos especializados. O Rei era encarado como “o melhor defensor e intérprete dos interesses da grei”, o garante pessoal da competência, da unidade, da coesão e continuidade nacionais, além de se instituir como “garantia da ordem, da tranquilidade e da paz e é também a certeza da justiça para todos”.

_______________________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________________ 64

O “supremo magistrado”, cuja superioridade consistia na transmissão hereditária do poder, sendo Rei por nascimento, fica independente daqueles que tem de dirigir e é educado, desde criança, para o exercício da função monárquica. Assegura assim a continuidade do poder e a permanência da ordem social, sendo o “máximo disciplinador e coordenador dos interesses nacionais”, como refere Monsaraz. Não sendo eleito, nem tendo de respeitar pressões ou grupos de interesses, o poder real era apenas limitado pelos costumes, pela tradição, pelas leis consuetudinárias, pelas liberdades contidas nos foros e regalias (“leis fundamentais” anteriores à própria monarquia) e sobretudo pelos preceitos religiosos a que alegadamente os reis se submetiam, como o mais humilde dos seus súbditos.

Para os integralistas, a soberania residia na Nação –não no Povo ou no Rei. A este cabia a função de supremo árbitro dos egoismos sociais, o que eficazmente apenas se conseguia com um poder uno, contínuo e isento –o poder hereditário. Inamovível, porque hereditário e não dependente dos resultados do sufrágio universal, o Rei não dependia assim de estratégias de interesses, ou do exercício de politicas demagógicas. Decidindo sozinho, ouvidos os seus ministros e o seu Conselho, o Rei procedia com justiça e equidade, assegurando o exercício de uma politica de verdade e de unidade nacional.

O monarca tradicional era assim – em suma - o “garante pessoal e responsável, da competência, da unidade, da coesão e da continuidade nacionais”136.

____________________________________________________________________________________ 65