• Nenhum resultado encontrado

3. A CRISE DE 2008 NOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA

3.1. A origem e o desenvolvimento da crise

O mercado imobiliário não foi o único afetado pela crise, o setor financeiro, a indústria automobilística, os serviços, o varejo e o mercado de ações também foram afetados.

A suposta raiz da crise remonta de 2001 quando o Fed, equivalente ao Banco Central no Brasil, tentou impedir uma recessão baixando as taxas de juros. Em 2000 o mercado de ações entrou em colapso e o estouro da bolha da Nasdaq (National Association of Securities Dealers Automated Quotation), conhecida também como a bolha da internet, foi praticamente o início da crise de 2008 que só foi comumente aceita no final de 2007 quando a crise das hipotecas estava óbvia. (PAUL, 2009)

Outra perspectiva da crise de 2008, diz que ela é a própria crise em consequência da quebra da Nasdaq. De acordo com essa perspectiva, a verdadeira crise foi adiada por conta da política monetária do Fed. Porém, inevitavelmente veio à tona em 2008 e dessa vez ainda mais forte. (PAUL, 2009)

A meta da federal funds target rate que no Brasil equivale à taxa de redesconto, caiu de 6,5% em janeiro de 2001 até 1% em junho de 2003 onde permaneceu neste nível por um ano inteiro. Depois de junho de 2004 a taxa começou a aumentar até chegar em 5,25% em junho de 2006. O nível da federal funds target rate praticado pelo Fed estavam muito abaixo dos seus menores valores históricos. O gráfico 1 mostra a federal funds target, calculada em taxas diárias, no período de 2000 até 2008 tornando evidente a queda iniciada em 2001 até metade de 2004, onde atingiu em 2004 o seu menor nível histórico.

36

Os ideais por trás da política monetária do Fed também tem um contexto político, na época haviam ocorrido os ataques terroristas de 11 de setembro e o país estava em clima de guerra. A ideia era que o país não fosse derrotado tanto economicamente como politicamente pelos terroristas. Um dos objetivos do Fed era criar uma impressão que o país não estava abalado, que a economia estava mais forte. (PAUL, 2009)

Gráfico 1 - Federal funds target rate de 2000 até 2008

Fonte: Federal Reserve Bank of St. Louis Economic Data

Para reduzir a federal funds target rate, o Fed expandiu a base monetária que no fim de 2000 era de 598305 milhões de dólares. Em 2007 a base monetária já atingia 837192 milhões de dólares, o que equivale há um crescimento de aproximadamente 40%, com relação ao valor em 2000. O gráfico 2 mostra a evolução da base monetária ao longo de 2000 até 2012, sendo os valores calculados no fim de cada período. Fica evidente o rápido crescimento da base monetária pela inclinação do gráfico.

As taxas hipotecárias que incidem sobre os empréstimos concedidos para compras de imóveis, tendo como garantia o imóvel adquirido pelo mutuário. Com a queda da federal funds target rate, as taxas hipotecárias atingiram o menor valor histórico, saindo de 7,03% em janeiro de 2001 até 5,23% em junho de 2006 onde atingiu o menor valor até então. O gráfico 3 ilustra o comportamento da taxa

37

hipotecária convencional de trinta anos, calculada em taxas mensais, de 2000 até 2010. Fica evidente a queda iniciada em 2000 onde atinge o mínimo em 2003.

Gráfico 2 – Base monetária ajustada de 1985 até 2012

Fonte: Federal Reserve Bank of St. Louis Economic Data

Gráfico 3 – Taxa hipotecária (30-Year Conventional Mortgage Rate) de 2000 até 2010

38

Fonte: Federal Reserve Bank of St. Louis Economic Data

Com as taxas hipotecárias baixas, os empréstimos dos bancos comerciais para o setor imobiliário aumentaram drasticamente. O gráfico 4 mostra o comportamento dos empréstimos imobiliários dos bancos comerciais de 1947 até 2013. Em janeiro de 2001, o total de empréstimos era de aproximadamente 1641 bilhões de dólares. Já em maio de 2009, onde atingiu o seu valor máximo, os empréstimos eram de aproximadamente 3875 bilhões de dólares. De janeiro de 2001 até maio de 2009, totalizando um período de oito anos e cinco meses, os empréstimos cresceram aproximadamente 136%. Entre 1990 e 2001, totalizando um período de onze anos, o crescimento foi de aproximadamente 114%. O crescimento do período mais curto foi superior ao crescimento do período mais longo, o que só foi possível devido à política monetária praticada pelo Fed.

Gráfico 4 – Empréstimos imobiliários dos bancos comerciais de 1947 até 2013.

Fonte: Federal Reserve Bank of St. Louis Economic Data

A demanda por empréstimos imobiliários aumentou devido às taxas de juros baixas praticadas pelo Fed no período antes da crise. Outro fator que também influenciou o aumento da demanda e da oferta de empréstimos imobiliários foi a atuação de duas leis que vigoravam na época, a Community Reinvestment Act de 1977 e a Equal Credit Opportunity Act de 1974. As duas leis forçavam os bancos, ou

39

as agências emprestadoras, a fazerem empréstimos de riscos elevados, que caso as duas leis não existissem tais empréstimos seriam negados pelos bancos. Os bancos faziam os empréstimos sem que pudessem verificar os riscos de cada mutuário. Algumas análises padrões do perfil financeiro do mutuário, como a magnitude do pagamento hipotecário em relação à renda do mutuário, o histórico da poupança e até mesmo a verificação de renda, não eram levados em consideração na hora da aquisição dos empréstimos. (DILORENZO, 2008)

As empresas Fannie Mae (Federal National Mortgage Association) e Freddie Mac (Federal Home Loan Mortgage Company) também tiveram uma forte contribuição para a expansão dos empréstimos imobiliários e consequentemente da formação da bolha imobiliária. A Fannie Mae foi criada em 1938 por Franklin Delano Roosevelt, durante o New Deal. Sua função era fornecer liquidez ao mercado hipotecário. Tornou-se uma corporação privada em 1968. A Freddie Mac foi criada em 1970, no governo Nixon, para expandir o mercado secundário de hipotecas. As funções das duas empresas são a de realizar empréstimos e dar garantias de empréstimos. Elas atuam comprando dos bancos hipotecas no mercado secundário e as revendem no mercado aberto como títulos lastreados em hipotecas. (ROCKWELL, 2008)

A Fannie Mae e a Freddie Mac são empresas privadas, mas com propósitos públicos. Elas usufruem de um apoio implícito do governo americano, apesar de não ter obrigações diretas com ele, o que permite a essas empresas fazerem financiamentos a taxas vantajosas. Os credores imaginavam que, em caso de insolvência, o governo ajudaria essas empresas, com pacotes de resgate por exemplo. (ROCKWELL, 2008)

Quando um banco comercial concedia um empréstimo imobiliário, o valor total do empréstimo entrava em seus ativos contábeis. Ele podia vender esse ativo, ou título hipotecário, para a Fannie Mae e a Freddie Mac, por um valor superior ao que ele havia emprestado. Com a venda do título, esse saía dos seus ativos contábeis e ele recebia o valor da quantidade que ele emprestou. Esse esquema permitia os bancos comercias concederem cada vez mais empréstimos sem que a meta da relação entre ativos e patrimônio líquido, estabelecida pelo Fed, fosse ultrapassada. Com a compra dos ativos pela Fannie Mae e a Freddie Mac, os tomadores de empréstimos imobiliários tinham relação direta com as duas. Caso os tomadores de empréstimos continuassem o pagamento de suas dívidas o fluxo de caixa da Fannie

40

Mae e da Freddie Mac não estariam comprometidos. Caso contrário, se os tomadores de empréstimos parassem de pagar sua dívida o prejuízo iria direto para as duas empresas. Os bancos comerciais estavam livres de qualquer risco, pois, a função deles era apenas de conceder os empréstimos e vender esse ativo no mercado secundário. Assim, os incentivos eram que os bancos comerciais concedessem cada vez mais empréstimos, mesmo esses possuindo alto risco. (ROQUE, 2013)

A Fannie Mae e a Freddie Mac podiam manter os títulos em suas posses, ou poderiam vender esses empréstimos para investidores ao redor do mundo. Esses empréstimos eram conhecidos como títulos lastreados em hipotecas, ou mortgage- backed securities. Como elas tinham uma linha especial de crédito junto ao Tesouro americano no valor de 2,25 bilhões de dólares, os investidores que compravam os títulos dessas duas empresas sabiam que caso as coisas dessem errado, o governo americano estaria disposto a socorrê-las. (ROQUE, 2013)

Gráfico 5 – Índice de preço das casas para os EUA de 1990 até 2011.

Fonte: Federal Reserve Bank of St. Louis Economic Data Nota: 1990 = 100.

A atuação da Fannie Mae e da Freddie Mac no mercado secundário de hipotecas teve uma grande contribuição para a estimulação do mercado imobiliário. Com toda essa facilidade ao crédito, com praticamente a extinção dos riscos aos

41

bancos comerciais e tendo o governo americano como um segurador em última instância, gerou uma alocação artificial dos recursos para o mercado imobiliário. Essa alocação não seria possível caso as intervenções do governo americano não existissem.

O efeito de todos esses incentivos no mercado imobiliário foi um grande aumento no preço das casas. O gráfico 5 mostra a evolução do índice de preços das casas nos EUA, anual de 1990 até 2013.

O índice de preços das casas, durante o período de dez anos, entre 1990 e 2000, cresceu aproximadamente 42%. Saindo de 100 em 1990 até chegar em 142,2 em 2000. No período de 2001 até 2007, seis anos, o crescimento foi de 49%. Saindo de 152,8 em 2001 até chegar em 227,8 em 2007, sendo esse o valor máximo atingido. Toda essa inflação de preços agiu como um sinal para os consumidores de que eles estavam de fato aumento sua riqueza, porém esses preços não estavam refletindo os verdadeiros preços de mercado. A inflação monetária criou uma espécie de riqueza ilusória. Os proprietários de imóveis viviam acima do que suas condições financeiras permitiam.

Gráfico 6 – Taxas hipotecárias e a federal funds target rate de 2000 até 2009.

Fonte: Federal Reserve Bank of St. Louis Economic Data

Nota: Taxa hipotecária ajustável de um ano (Linha azul), taxa hipotecária convencional de 30 anos (Linha vermelha) e federal funds target rate (Linha verde)

42

Quando começou a aumentar o valor da a federal funds target rate em junho de 2004 até parar em 5,25% em julho de 2006, onde permaneceu nesse valor até agosto de 2007, tanto a taxa hipotecária de um ano ajustável, quanto à taxa hipotecária convencional de 30 anos começaram a subir. A taxa hipotecária ajustável saiu de 3,88% em maio de 2004, período anterior à elevação da federal funds target rate, e atinge 5,79% em julho de 2006. A taxa hipotecária convencional saiu de 6,27% em maio de 2004 e atinge 6,76% em julho de 2006. Esse aumento dos juros e consequentemente o aumento das taxas hipotecárias, acabou diminuindo a demanda por imóveis, gerando uma excessiva oferta desse bem o que acarretou na queda dos preços das casas. A relação dessas três taxas de juros está expressa no gráfico 6.

Dois efeitos ocorreram sobre os consumidores de imóveis. O primeiro foi que com um juro mais alto, o pagamento das prestações da hipoteca das casas não era possível para certo grupo de pessoas que não tinham capacidade de honrar seus pagamentos da dívida. Aquele outro grupo de pessoas que adquiriram imóveis apenas para especulação, já que o preço dos imóveis crescia a cada ano, apenas deixou de pagar as hipotecas. Esses dois efeitos resultou em um aumento extremamente elevado das inadimplências, o gráfico 7 mostra esta evolução.

Gráfico 7 – Inadimplências securitizadas em imóveis de 2000 até 2012.

43

A partir de janeiro de 2007 as inadimplências começaram a disparar, saindo de 37194 milhões de dólares até atingir 237824 milhões de dólares em janeiro de 2010. De janeiro 2005 até janeiro de 2010 as inadimplências cresceram aproximadamente 1013%. O que de fato revelou a bolha imobiliária, a crise de 2008 e a má alocação de recursos ou os maus investimentos.

O gráfico 8 mostra o forte crescimento da economia americana iniciado em 2001 até 2003 onde atinge pico do crescimento com uma taxa de crescimento de 4,3%. Em 2004 o crescimento desacelera e transforma-se em recessão, atingindo o vale em 2008 com uma taxa de crescimento de -2,8%. Indicando que o forte crescimento da economia iniciado em 2001 é um crescimento artificial, de acordo com a TACE, iniciando o ciclo econômico.

Gráfico 8 – Taxa de crescimento do PIB americano de 2000 até 2012.

Fonte: Federal Reserve Bank of St. Louis Economic Data

A crise de 2008 nos EUA se iniciou e se desenvolveu de acordo como a TACE tenta prevê o processo do ciclo econômico. O principal agente na criação do ciclo econômico foi o Fed, que através da manipulação da taxa de juros da economia desencadeou o processo do ciclo econômico. Como essa expansão do crédito não foi lastreada em um aumento prévio do nível de poupança, esse aumento do crédito entra na economia como dinheiro criado do nada. Por meio do

44

sistema de reservas fracionárias é que a expansão do crédito pode ser articulada, sem que haja aumento da poupança.

A nova oferta monetária diminui a taxa de juros de equilíbrio. Essa nova taxa de juros estimula os investimentos, principalmente os de longo prazo ou as etapas iniciais do processo produtivo. Muitos desses investimentos não seriam possíveis, caso a taxa de juros não estivesse artificialmente baixa. São esses investimentos avaliados erroneamente que constituem os maus investimentos.

Os setores mais estimulados durante o início do ciclo, o bancário e o imobiliário, foram os que mais sofreram com a crise. Como indicado pela teoria, os EUA experimentaram um forte crescimento econômico após a diminuição da taxa de juros que estimulou principalmente o setor imobiliário e o bancário, o que acarretou na concepção de maus investimentos. São os maus investimentos que transformam o crescimento em recessão. Posteriormente, quando os maus investimentos são revelados é que a eminente recessão se caracteriza e torna-se evidente. Os efeitos negativos da crise atingiu a economia americana por um todo e até mesmo outros países foram afetados.

O controle da taxa de juros, ou uma política de expansão de crédito pelo Fed, não estimulam a economia. Aumentar a oferta de moeda por meio de crédito sem lastro em poupança não tem a capacidade de gerar riqueza. O que ocorre é apenas um crescimento econômico artificial que inevitavelmente se transforma em recessão, isso é o que a TACE tenta demonstrar.

Documentos relacionados